Acórdão nº 1902/07.9TTLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Junho de 2013

Magistrado ResponsávelANTÓNIO LEONES DANTAS
Data da Resolução19 de Junho de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I AA intentou a presente acção declarativa de condenação com processo comum contra CENTRO HOSPITALAR DE LISBOA CENTRAL, E.P.E., pedindo seja o R. condenado a reintegrá-la e a pagar-lhe todas as retribuições vencidas desde a data do despedimento e vincendas até trânsito em julgado da sentença, a tudo acrescendo os legais juros moratórios. Mais peticionou desde logo a condenação do R. como litigante de má fé.

Invocou como fundamento das suas pretensões, em síntese, que: - foi admitida ao serviço do R, em 01/03/2005, ao abrigo de um contrato de trabalho a termo incerto, para exercer as funções de administradora hospitalar de 3.ª classe; - em 24/05/2006, o R. pôs fim àquele contrato de trabalho invocando a nulidade do mesmo; - o contrato não padece da referida nulidade, sendo além do mais um verdadeiro abuso de direito fazer-se valer de circunstância que foi criada pelo própria R; - foi assim despedida de forma ilícita.

O processo prosseguiu normalmente os seus termos vindo a ser decidido por sentença de 17 de Abril de 2009, cujo dispositivo é do seguinte teor: «Face ao exposto, julgamos a presente acção procedente por provada e em consequência: a) condenamos o R a pagar à A a correspondente indemnização, no valor de € 12.255,80; b) mais condenamos o R a pagar à A todas as retribuições vencidas desde 14/05/2007 e vincendas até trânsito em julgado desta decisão, por referência à retribuição mensal de € 2.639,35.

Sobre as quantias supra referidas incidem juros de mora, contados à taxa legal, desde a data dos respectivos vencimentos e até integral pagamento.

Custas pelo R – artigo 446.º do Código de Processo Civil».

Inconformado com esta decisão dela recorreu o Réu para o Tribunal da Relação de Lisboa, que veio a conhecer do recurso interposto por acórdão de 27 de Junho de 2012, nos termos do qual se acordou «em julgar procedente a apelação, pelo que se revoga a decisão recorrida, absolvendo-se o Réu do pedido. Custas pela Apelada em ambas as instâncias».

Irresignada com esta decisão, dela recorre de revista para este Supremo Tribunal a Autora, integrando nas alegações apresentadas as seguintes conclusões: «a) A matéria de facto apurada prova que o contrato de trabalho a termo incerto celebrado entre a Autora ora Recorrente e o Réu ora recorrido é válido, não estando ferido de nenhuma irregularidade que o torne NULO, ao contrário do que se refere no douto acórdão recorrido, que assim interpretou erroneamente o direito aplicável; b) A lei n° 23/2004 consagrou a possibilidade da admissibilidade da celebração do contrato de trabalho por tempo indeterminado; c) O contrato de trabalho a termo certo ou incerto está previsto nos art°s 8.º e 9.º da Lei antes referida; d) O contrato celebrado entre Recorrente e Recorrida obedeceu, formal e substancialmente, aos requisitos previstos na referida Lei e designadamente aos previstos nos seus art°s 8.º e 9.º, pelo que o douto acórdão ora recorrido violou os citados preceitos, interpretando-os erroneamente ao considerar que o citado contrato não cumpria tais requisitos.

  1. O contrato mostra-se totalmente justificado quanto ao motivo da sua celebração e nada obriga que a identificação da trabalhadora substituída tenha de, obrigatoriamente, constar do mesmo contrato sob pena de nulidade deste, ao contrário do que o douto acórdão recorrido, erroneamente, refere, interpretando e aplicando erroneamente ao caso os art° 8.º da Lei n° 23/2004 e o art° 131° do Código do Trabalho; f) A considerar-se, ainda assim, que o contrato padeceria de uma invalidade que o próprio Recorrido provocou, ao elaborar a respectiva minuta, que a ora recorrente se limitou, como trabalhadora e parte mais frágil da relação, a aceitar, sempre terá de se considerar que o ora Recorrido, ao invocar tal invalidade, procurou libertar-se de uma relação de que usufruiu durante largos meses, excedendo manifestamente os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes e pelo fim social e económico do direito de pedir judicialmente a declaração de nulidade do mesmo contrato.

  2. Ao considerar que não se verificou o abuso de direito referido, o douto acórdão interpretou erroneamente o disposto no art° 334° do Código Civil, o que se invoca».

Termina pedindo que seja concedida a revista.

O Recorrido respondeu ao recurso interposto, sustentando o acerto da decisão recorrida.

Neste Tribunal a Exm.ª Procuradora-Geral Adjunta proferiu parecer, nos termos do n.º 3 do artigo 87.º do Código de Processo de Trabalho, pronunciando-se no sentido da improcedência do recurso.

Notificado este parecer às partes não motivou qualquer tomada de posição.

Sabido que o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente, nos termos do disposto nos artigos 684.º, n.º 3 e 690.º, do Código de Processo Civil, na redacção anterior ao Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto, que é a aplicável ao presente processo, ressalvadas as questões de conhecimento oficioso, está em causa na presente revista: a) - A nulidade do contrato de trabalho a termo incerto celebrado entre a Autora e o Réu; b) - A existência de abuso do direito na invocação da nulidade do contrato por parte do Réu.

II 1 - A matéria de facto fixada pelas instâncias é a seguinte: «1. A A foi admitida sob a autoridade e direcção do R, mediante a celebração, em 1 de Março de 2005, do acordo escrito intitulado «CONTRATO DE TRABALHO A TERMO RESOLUTIVO INCERTO», que se mostra junto a fls. 20 e 21 e cujo teor damos aqui por integralmente reproduzido.

  1. A minuta daquele documento foi elaborada pelo R.

  2. A A. foi admitida para exercer funções correspondentes à categoria profissional de Administradora Hospitalar de 3.ª Classe, entrando o contrato em vigor a 1 de Março de 2005.

  3. A contratação da A. resultou de aprovação da deliberação do Conselho de Administração do R, datada de 28 de Fevereiro de 2005.

  4. Tal deliberação foi precedida de uma outra deliberação do Conselho de Administração do R, datada de 25 de Janeiro de 2005, cujos termos constam da Acta n.º 48, junta por fotocópia a fls. 22, do seguinte teor: «8. Os membros do conselho de administração deliberam por unanimidade autorizar a abertura de um procedimento de selecção para contratação a termo resolutivo de um administrador hospitalar, nos termos da alínea c) do artigo 9º da Lei nº 23/2004, de 22 de Junho cuja área de actuação funcional é a Assessoria e Comunicação. Deverá o profissional possuir como requisitos legais: licenciatura e Curso de Especialização em Administração hospitalar da Escola Nacional de Saúde Pública, Universidade Nova de Lisboa.» 6. Na sequência dessa deliberação, o R fez publicar nos jornais Correio da Manhã e Capital, em aviso, no qual era «tornado público que se encontrava aberto procedimento de selecção para contratação a termo resolutivo de um administrador hospitalar, nos termos da alínea c) do artigo 9º da Lei n.º 23/2004, de 22 de Junho».

  5. E na sequência do processo de contratação assim iniciado, o R produziu o despacho de 28 de Fevereiro de 2005, junto a fls. 28, de que se transcreve a parte final: «c) Acresce que as vicissitudes apontadas, à míngua, só podem ser superadas por recurso a contratações, nas condições facultadas pela Lei nº 23/2004, de 22 de Junho, designadamente nas contratações a termo resolutivo com vista à substituição da administradora hospitalar de 2ª classe do quadro de pessoal transitório do Hospital de S. José, Drª. BB, ausente do Centro Hospitalar (Zona Central) por licença sem vencimento.

    “Considerando que a única candidata ao processo de selecção com vista à contratação de um administrador hospitalar preenche os requisitos técnicos e profissionais deliberados pelo Conselho de Administração, autorizo a contratação da licenciada AA, a partir de 1 de Março de 2005, com a categoria equiparada à de administradora hospitalar de 3ª classe, pelo período em que decorrer a ausência da administradora hospitalar de 2ª classe do quadro de pessoal transitório do Hospital de S. José, Dra.BB».

  6. O local de trabalho da A foi sempre na sede do R, sita na Rua ..................., em Lisboa.

  7. O horário de trabalho que a A se obrigou a cumprir, e cumpriu, consistia em 35 horas semanais e 7 horas diárias, sob o regime de isenção de horário.

  8. Em contrapartida do seu trabalho, a A auferia a quantia mensal de € 2.451,16, acrescida de € 85,90 e € 188,19, a título de subsídio de refeição e despesas de representação, respectivamente.

  9. O contrato de trabalho a termo incerto ora em causa foi celebrado com o fundamento que consta da respectiva cláusula primeira e que se transcreve: «(...) O primeiro outorgante, por insuficiência de pessoal no Gabinete de Assessoria e Comunicação que compromete a prestação de cuidados de saúde admite ao seu serviço a segunda outorgante com a categoria profissional de Administradora Hospitalar de 3ª classe para substituir a trabalhadora que se encontra em situação de licença sem vencimento».

  10. E resulta da respectiva cláusula sexta que o contrato em causa teve início na data da sua assinatura (01.03.2005) e duraria enquanto a trabalhadora substituída se encontrasse em situação de licença sem vencimento, ou, no caso de cessar a referida licença, a trabalhadora substituída não viesse a reiniciar o exercício de funções no Centro Hospitalar de Lisboa – Zona Central.

  11. A trabalhadora substituída pela A. foi a funcionária Drª. BB, com a categoria profissional de administradora hospitalar de 2.ª Classe, a qual se encontrava, e ainda se encontra, em situação de licença sem vencimento de longa duração.

  12. Em 24 de Maio de 2006, o R. comunicou à A. a cessação do acordo escrito celebrado em 1 de Março de 2005 e supra mencionado, através da entrega da carta cuja cópia está junta a fls. 29 e cujo teor damos aqui por integralmente reproduzido. 15. O R fundamentou a sua decisão de fazer cessar o contrato de trabalho a termo resolutivo incerto que havia celebrado com a A. da seguinte forma: «O...

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