Acórdão nº 154/12.3JDLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Maio de 2013

Magistrado ResponsávelSANTOS CABRAL
Data da Resolução15 de Maio de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça O arguido AA veio interpor recurso da decisão que, pela prática, em autoria material, e na forma consumada, de um crime de homicídio qualificado, p. e p. pelos artºs 131º e 132, nºs 1 e 2, als. b) e c) do CP, o condenou na pena de 19 (dezanove) anos de prisão.

Mais determinou a sua expulsão do território nacional, ao abrigo do disposto no 151°, n° 1 da Lei n° 23/2007, de 4 de Julho, alterada pela Lei 29/12, de 9/8, pelo período de CINCO ANOS.

As razões de discordância encontram-se sintetizadas na respectiva motivação de recurso onde se refere que: 1- Arguido, ora Recorrente, foi condenado em pena de 19 (dezanove) ANOS de prisão, efectiva, como autor material, na forma consumada, de um crime de homicídio qualificado, previsto e punido pelos artigos 131 ° e 132°, nºs 1 e 2, aI. b), e c), do Código Penal.

  1. Considera o arguente que a medida da pena é excessiva, face a todos os circunstancialismos existentes, nos termos do art. 71 ° do CP; Nomeadamente, o manifesto arrependimento do arguido. Com efeito, 3 Ao contrário do que se pode retirar do douto acórdão proferido pelo Tribunal a quo não é meramente a confissão dos factos plasmados na acusação, no tocante ao crime de homicídio qualificado, que nos permite concluir que o arguido se encontra profundamente arrependido pelos seus actos.

  2. Não se considera, sequer, justa, salvo o devido respeito, que o Tribunal a quo considere que há indícios de "algum arrependimento", conforme se pode ler no ponto IV do douto acórdão, quando são tidos em consideração os vários factores que influem na medida da pena.

  3. Efectivamente, o arrependimento não se consubstancia meramente na declaração do arguido em sede de audiência e julgamento que se encontra arrependido, antes se consubstanciando numa interiorização da sua culpa e da gravidade dos seus actos.

    7-Ora, pese embora a confissão dos factos seja indiciadora de que o arguido se encontra arrependido, a grande prova de tal são as circunstâncias em que foi detido pelo crime que cometeu, e as diversas tentativas de suicídio que se sucederam, que levaram, em última análise, a que o arguido fosse para a ala psiquiátrica do Hospital Prisional de São João, onde se encontra até à data, sob efeito de medicação.

    8-De tal modo o arguido interiorizou a sua culpa, que achou que não era merecedor de viver.

  4. As condições psicológicas do arguido após a percepção daquilo que havia feito, o que se prolongou no tempo, que levaram a que tentasse por várias vezes o suicídio, não podem deixar de ser consideradas como atenuantes e, como tal, conducentes a uma medida inferior da pena aplicada, que o douto acórdão acaba por não valorar, violando assim, o disposto no art. 71°, nº 2, alínea e) do Código Penal.

  5. Sendo certo que, não se tratando de um crime reparável, toda a sua conduta não deixou dúvidas acerca do seu arrependimento.

  6. O seu arrependimento sincero, por demais demonstrado, deveria ter sido tido em conta, como factor atenuante, nos termos do art. 72°, nº 2, alínea c) do Código Penal.

  7. A isto acresce o facto de que o arguido, de acordo com várias testemunhas, era de natureza pacífica e mantinha boas relações com a vítima; 13° Que tinha sérias intenções de se legalizar no país para poder arranjar um emprego que lhe permitisse prover ao sustento da sua família, a vítima e o filho nascituro de ambos, tendo, inclusiva mente contactado um advogado para tal; 14° Concluindo-se que este trágico desfecho se deveu a um acto completamente irreflectido do arguido, que se encontrava sob pressão por a sua extradição para o seu país de origem se encontrar iminente, e o arguido não queria deixar a vítima grávida e desamparada.

  8. Não obstante nada justificar o seu comportamento, o que o arguido manifestamente reconhece, o facto é que quando agarrou o pescoço da vítima, não tinha intenção de matar, mas apenas de a calar e imobilizar para que este a ouvisse.

  9. Não mediu a força dos seus actos, tendo, quando muito, utilizado de dolo eventual, prevendo como possível este desfecho, mas não como desejável.

  10. Resulta, assim, dos fundamentos apresentados, a necessidade de revisão da medida da pena, de modo a que sejam tidos em conta todos os factores atenuantes, nomeadamente o seu manifesto arrependimento, por demasiado perceptível através da sua conduta posteriormente ao crime.

    Termina pedindo que seja julgado procedente o presente recurso, desde logo revogando-se a decisão sub judice e determinando-se a sua reforma no sentido das conclusões formuladas.

    Foi produzida resposta pelo Ministério Publico concluindo que: 1. O arguido veio interpor recurso da decisão que o condenou na pena de 19 (dezanove) anos de prisão/ como autor material de um crime homicídio qualificado/ p. e p. pelos artigos 1310 e 1320/ números 1 e 2/ alíneas b) e c) do Código Penal e na sanção acessória de expulsão do país/ pelo período de cinco anos.

    1. Alega/ em síntese/ que não foram considerados factores relevantes para a determinação da medida da pena/ como a confissão e arrependimento do arguido/ arrependimento que se revelou também nas tentativas de suicídio que se seguiram aos factos pelos quais foi condenado/ além de sempre ter assumido uma postura colaborante com as autoridades policiais e judiciárias e considera que actuou com dolo eventual e não com dolo directo/ concluindo dever ser o acórdão revogado e substituído por outro que condene o arguido em pena que tenha em consideração todos os factores invocados.

    2. Contrariamente ao alegado pelo recorrente, da leitura do acórdão condenatório resulta que os factores a que se reporta a motivação de recurso foram tidos em consideração, embora o colectivo não lhes tenha dado a relevância pretendida pelo recorrente.

    3. O modo de execução do crime, evidencia elevada ilicitude (o arguido com a sua conduta patenteia uma indiferença impressionante pela vida de outrem, ainda para mais quando estava perante a pessoa com quem vivia e que se encontrava grávida de um filho comum).

    4. Além disso, agiu o arguido com dolo directo intenso - intenção inequívoca de causar a morte, o que fez com as próprias mãos, e apesar de ter visto que a vítima estava aflita, manteve o pescoço apertado até sentir que a vítima jazia sem vida, o que afasta, de todo, a possibilidade de o crime ter sido cometido com dolo eventual, como pretende o recorrente.

    5. Ora tendo em conta estes elementos e sendo a vida um bem jurídico inviolável, até porque se trata do maior valor humano e social, a pena de 19 anos de prisão, fixada pelo tribunal recorrido, numa moldura de 12 a 25 anos de prisão, não merece qualquer censura, por não ultrapassar a medida da culpa e satisfazer as exigências preventivas.

    6. Deve, portanto, a douta decisão recorrida ser confirmada nos seus precisos termos.

      O ExºMº Sr. Procurador-Geral Adjunto emitiu proficiente parecer referindo em primeiro lugar a questão da irrecorribilidade e, em segundo, pronunciando-se sobre a substância do recurso admitindo uma diminuição da pena aplicada para dezoito anos de prisão. Os autos tiveram os vistos legais.

      * Em sede de decisão recorrida encontram-se provados os seguintes factos: 1. BB, conhecida por "D...." nasceu no dia 23 de Novembro de 1991 no Brasil e à data de 18 de Março de 2012 encontrava-se grávida de 8 semanas e 5 dias de idade gestacional, sendo o arguido o progenitor.

    7. Em data não apurada do ano de 2011, BB conheceu o arguido AA e encetaram uma relação de namoro, tendo os mesmos começado a viver juntos, em comunhão de cama, mesa e habitação na residência sita na .........., nº ...., ....direito, em Queluz, desde Janeiro de 2012. --- 3. Em data não apurada do mês de Fevereiro de 2012, BB convidou CC a deslocar-se à supramencionada residência e a assistir às práticas sexuais entre o casal, o que aquele aceitou.

    8. Uma vez naquele local, BB foi deitar-se na cama enquanto o arguido e CC foram para a cozinha beber cerveja, após o que se deslocaram para o quarto.

    9. O arguido colocou um vídeo no computador de cariz pornográfico, despiu-se e introduziu-se na cama, sendo que BB ao observar tal vídeo chamou-o de "porco nojento".

    10. Após gerou-se uma discussão entre o arguido e AA tendo o arguido confrontado aquela com o convite dirigido a CC para assistir às cenas de sexo entre ambos.

    11. No decurso da discussão AA levantou-se da cama e dirigiu-se para a cozinha, tendo o arguido ido no seu encalço.

    12. Uma vez na cozinha continuou a discussão entre ambos. --- * 9. No dia 18 de Março de 2012, pelas 23h30m, após terem jantado, no interior da residência o arguido e AA mantiveram relações de cópula.

    13. De seguida, AA começou a acusar o arguido de a ter traído, o que originou uma discussão entre o casal, tendo aquela virado as costas ao arguido, recusando-se a ouvir o que aquele tinha para lhe dizer, após o que a discussão evoluiu para a possibilidade de o arguido ser extraditado para o Brasil, tendo-lhe AA dito que caso tal acontecesse não ia ter o filho de ambos, afirmando que iria terminar a relação e que mataria o filho.

    14. O arguido tentou demover AA daquela intenção, mas aquela recusou-se a ouvi-lo, e virou-lhe a cara, após o que se tentou levantar da cama.

    15. O arguido ao se aperceber de tal intenção, agarrou-a pelo braço esquerdo ao mesmo tempo que lhe dizia que ia resolver o problema e que a relação de ambos não ia terminar.

    16. AA colocou os pés no chão, para tentar sair da cama, posto o que o arguido a agarrou pelos ombros e puxou-a para trás.

    17. Ao puxá-la, AA ficou deitada em cima da cama com os pés virados para a cabeceira da cama e a cabeça virada para os pés da cama, tendo-se o arguido colocado em cima do corpo daquela para que ela se calasse e o ouvisse.

    18. AA começou a arranhar os ombros e os braços do arguido, posto o que este colocou a mão esquerda no pescoço de AA e apertou, até esta arregalar os olhos.

    19. O arguido apenas deixou de apertar o pescoço de AA quando esta já estava inconsciente.

    20. Em consequência do arguido lhe ter apertado o pescoço AA sofreu lesões...

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