Acórdão nº 237/11.7JASTB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Abril de 2013
Magistrado Responsável | RAUL BORGES |
Data da Resolução | 17 de Abril de 2013 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
No âmbito do processo comum com intervenção do tribunal colectivo n.º 237/11.7JASTB do 2.º Juízo de Competência Especializada Criminal da Comarca de Almada, integrante do Círculo Judicial de Almada, foi submetido a julgamento o arguido: - AA, solteiro, estudante, nascido a 23-02-1991, natural da freguesia de S. Sebastião da Pedreira, concelho de Lisboa, residente na Avenida ..............., nº. ..., ........, Corroios, actualmente detido no Estabelecimento Prisional Regional de Setúbal, em prisão preventiva, à ordem destes autos.
Era-lhe imputada a prática, em autoria material, e em concurso real, de um crime de homicídio, p. e p. pelo artigo 131.º, do Código Penal e de um crime de profanação e ocultação de cadáver, p. e p. pelo artigo 254.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal.
BB (admitido a intervir como assistente, a fls. 410) e CC deduziram pedido de indemnização civil, na qualidade de pais da vítima DD, contra o arguido, pedindo a condenação deste no pagamento da quantia de € 70 000,00 a título de danos não patrimoniais e da quantia de € 611,80, a título de danos patrimoniais, quantias acrescidas de juros de mora legais devidos desde a data do vencimento e vincendos, até integral pagamento.
Por acórdão do Colectivo de Almada, datado de 12 de Outubro de 2012, constante de fls. 691 a 739, do 4.º volume, depositado no mesmo dia (fls. 743), foi deliberado: Parte Criminal Condenar o arguido, como autor material e em concurso efectivo, de um crime de homicídio, p. e p. pelo artigo 131.º do Código Penal, e de um crime de profanação de cadáver, p. e p. pelo artigo 254.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, nas penas especialmente atenuadas de: - 7 (sete) anos e 6 (seis) meses de prisão pelo crime de homicídio; - 10 (dez) meses de prisão pelo crime de profanação de cadáver.
Em cúmulo jurídico, foi o arguido condenado na pena unitária de 8 (oito) anos de prisão.
Parte Cível Condenar o arguido/demandado a pagar aos demandantes BB e CC a quantia de € 70 611,80, acrescida de juros de mora vencidos, contados sobre a quantia de € 611,80 desde a data da notificação do demandado para contestar o pedido de indemnização civil deduzido e, contados sobre a quantia de € 70 000,00 desde a data do acórdão, e vincendos, até integral pagamento, absolvendo-o do restante peticionado.
Inconformados interpuseram recurso: - O Ministério Público na Comarca de Almada para o Supremo Tribunal de Justiça, apresentando a motivação de fls. 745 a 768; - O arguido, igualmente para o Supremo Tribunal de Justiça, apresentando a motivação de fls. 774 a 783; e, - O assistente BB para o Tribunal da Relação de Lisboa, conforme fls. 808 a 817.
O Ministério Público rematou a motivação apresentada com as seguintes conclusões (incluídos realces):
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O Colectivo do 2.º Juízo Criminal de Almada, no acórdão ora posto em crise deliberou aplicar ao arguido o regime penal dos jovens delinquentes.
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Deste modo o Colectivo condenou o arguido pela prática, como autor material e em concurso efectivo de um crime de homicídio simples p. e p. pelo artº 131 do CP e de um crime de profanação de cadáver p. e p. pelo artº 254 nº 1 alínea a) do CP, em cúmulo, na pena de 8 anos de prisão.
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O aludido regime não é de aplicação automática sendo que não se deverá fazer uso da atenuação especial prevista no arte 4 do citado diploma, quando é grande o grau de ilicitude dos factos praticados pelo arguido e é grave a sua culpa, na forma de dolo directo.
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A pena aplicada ao arguido peca pela excessiva e injustificada benevolência.
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O arguido é jovem. Porém, a vítima (filho único) também era jovem e encontrava-se de férias com os pais em Portugal.
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O arguido matou esse jovem com as suas próprias mãos.
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De forma violenta e brutal, conforme o Colectivo fez constar do acórdão.
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O facto de o arguido ser jovem e não ter antecedentes criminais não justifica, por si só, conforme consta da parte decisória do acórdão, a aplicação, “in casu”, do regime dos jovens delinquentes.
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O ponto 7 do preambulo do citado diploma legal aponta, de forma firme, ao referir que: “...as medidas propostas não afastam em última ratio da pena de prisão aos imputáveis maiores de 16 anos, quando isso se torne necessário, para uma adequada e firme defesa da sociedade e prevenção da criminalidade...”.
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O crime em apreço nos autos é o de homicídio em que o bem supremo (vida) foi posto em causa de forma irreversível.
I) O arguido agiu com dolo directo. O grau de ilicitude dos factos relativamente ao homicídio revela-se muito elevado.
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Mal andou o Colectivo quando aplicou ao arguido o regime penal dos jovens delinquentes ao arguido.
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Por força disso, o Colectivo do 2º Juízo Criminal de Almada violou o disposto no artº 4 do regime penal dos jovens delinquentes.
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A pena a aplicar devia ser próxima do seu limite máximo.
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Sendo certo que, conforme resulta do libelo acusatório a conduta do arguido não preenche o tipo legal de crime vazado no artº 131 do CP (homicídio simples), mas o tipo de homicídio qualificado.
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À luz das disposições conjugadas dos artsº 131 e 132 nsº 1 e 2 alínea e) “in fine” e j) ambos do CP.
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Como o Mº Pº defendeu em sede de alegações.
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Uma alteração da qualificação jurídica dos factos, sem que haja qualquer modificação dos factos constantes da acusação, está sujeita ao regime do artº 358 nº 3 do CPP.
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Caso esse Venerado Tribunal concorde com a tese aqui expendida, caber-lhe-ia ordenar a notificação do arguido para, querendo, se pronunciar, sobre essa alteração da qualificação jurídica, em prazo que lhe fosse doutamente estabelecido.
Porém, Vossas Excelências como sempre não deixarão de fazer a Costumada JUSTIÇA O assistente rematou a motivação com as seguintes conclusões (incluídos realces): 1. O tribunal “a quo” ao condenar o arguido, aqui recorrido, na pena unitária de 08 anos de prisão não fez, na nossa humilde opinião e, com o mais subido respeito, uma correcta valoração da prova produzida e consequente interpretação e aplicação do direito, mormente, dos Arts. 40°, 70°, 71°, 77°, 131°, 132° n.°s 1 e 2 alíneas h) e j), 272°, n.° 1, alínea a), todos do C. Penal.
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Os factos provados preenchem cabalmente a previsão legal para o Homicídio Qualificado, pp no art.° 132.° Código Penal Português.
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Ora, tendo presente os critérios definidores para se qualificar determinado como Homicídio como Qualificado, esta assenta na culpa e critério para qualificar é a “especial censurabilidade ou perversidade” onde o agente actue com uma exigibilidade acrescida logo, não nos restam grandes dúvidas de que estaremos perante esta qualificação jurídica errada, pois, ao invés de atenuada, deveria era ser agravada.
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Ao invés, foi aplicada ao arguido uma Atenuação Especial da pena, prevista no DL n° 401/82 de 23 de Setembro e que não deve ser aplicado ao arguido uma vez que o mesmo cometeu dois crimes um de homicídio e outro de profanação de cadáver.
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No caso concreto, muito embora o arguido tenha confessado, com algumas reservas, o essencial da factualidade julgada provada, dada a elevada ilicitude dos factos, o dolo intenso e persistente com que agiu, a sua conduta posterior aos factos, bem como a circunstância de a sua postura não evidenciar verdadeiro arrependimento, prendendo-se o discurso do arguido mais com as consequências que lhe advieram para si próprio do acto que praticou e não tanto no dano irreversível causado a outrem, entendemos que não existem razões para crer que da atenuação especial da pena resultam vantagens para a reinserção social do arguido, razão pela qual não se procederá à mesma.
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Pois não poderemos olvidar a elevada ilicitude dos factos e do dolo intenso e persistência com que o arguido agiu antes, durante e após o homicídio.
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Em casos graves e com contornos de violência, como o presente, não se vê como pode o julgador do tribunal “a quo” ter-se alheado da gravidade do comportamento ajuizado, não podendo ignorar-se que estamos perante um homicídio que embora não tenha sido considerado homicídio qualificado, o mesmo foi perpetrado em circunstâncias que revelam especial censurabilidade e perversidade do arguido.
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Assim e, pelo exposto e face à matéria dada como provada no Tribunal “A Quo”, entende-se que houve uma má aplicação da lei e, consequentemente deverá a pena aplicada em concreto, no que concerne à parte criminal, ser revista e aumentada, não se aplicando a Atenuação Especial da Pena, que foi aplicada, por descontextualizada e a qualificação jurídica do Crime ser alterada para Homicídio Qualificado, nos termos e com os fundamentos expostos.
Termos em que deverá o presente recurso ser julgado procedente e, dando-lhe provimento, deverá a sentença ser alterada, de modo a que, seja o tempo de prisão efectiva aumentado e se faça, como sempre, a sã e plena Justiça.
O arguido sintetizou a pretensão recursória com as seguintes conclusões (incluídos realces): 1º - O arguido foi condenado, em cúmulo jurídico, na pena de 8 anos de prisão, resultante de 7 anos e 6 meses de prisão pela prática de um crime de homicídio, mais 10 meses de prisão pela prática de um crime de profanação de cadáver.
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- Salvo o devido respeito, que é todo e salvo mais apurada sensibilidade jurídica, o Tribunal “a quo” violou o Principio da proporcionalidade da pena, tal como previsto no art. 40°, n.° 2 e n.° 3 do Código Penal.
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- Devendo a aplicação do preceito acima indicado conduzir a uma atenuação ainda mais especial da pena que aqui expressamente se requer, reduzindo a desproporcional medida concreta de 8 anos de prisão.
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- A idade do arguido, a ausência de antecedentes criminais, a colaboração com a Policia Judiciária e com o Tribunal, a sua inserção familiar, social e laboral, deverão resultar na especial atenuação da pena a aplicar.
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- Ao verificarmos o inverso, foram violados os preceitos constantes dos arts. 70°, 71° e 72° do Código Penal.
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- A especial atenuação da pena que deverá conduzir a uma mais acentuada redução do tempo de prisão efectivamente a cumprir...
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