Acórdão nº 2960/09.7TBVIS.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 06 de Junho de 2013

Magistrado ResponsávelSILVA GONÇALVES
Data da Resolução06 de Junho de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça No Tribunal Judicial da Comarca de Viseu, a sociedade comercial “AA, L.da “, com sede na .............., Rua .............., lote 00...... - A, em Viseu, instaurou contra BB e mulher CC-, residentes na ..........., Bairro do ..........., Vila Chã de Sá, em Viseu, a presente acção declarativa, com processo ordinário, pedindo o seguinte: - seja declarada procedente a invocada resolução contratual, por parte da locatária - autora, do contrato de arrendamento da fracção autónoma identificada no ponto 1.º da petição ou, subsidiariamente, a sua invocada nulidade; - sejam os réus condenados a pagar à autora, a título indemnizatório, a quantia de € 146.343,51, acrescida de juros de mora, desde a citação e até efectivo pagamento; - sejam os réus condenados a pagar à autora uma indemnização pelos factos alegados no ponto 61º da petição (perda de facturação e de clientela), a liquidar em execução de sentença; - sejam os réus condenados a pagar à autora a quantia de € 8.000,00, acrescida de juros de mora, contados desde a citação até integral pagamento.

Para tanto, em resumo, alegou a A. que, em 1 de Junho de 2008, celebrou um contrato de arrendamento com os réus, relativo à fracção autónoma designada pela letra “00”, correspondente ao../... do prédio urbano sito à Tapada ou...... , R.........Lote 00, em Viseu, inscrito na matriz predial urbana da freguesia de Coração de Jesus sob o artigo 1618, tendo por objectivo a instalação de uma clínica médica nessa dita fracção.

Esse contrato foi celebrado por 5 anos, com renovações por iguais períodos, e pela renda mensal de € 2.000,00.

Foi condição essencial para a outorga desse contrato o facto de o Réu marido ter prometido à A. que esta poderia usar o arrendado para prestar serviços de clínica médica, sem qualquer tipo de entraves.

A A. efectuou obras no arrendado e instalou o respectivo equipamento para o exercício da sua actividade de clínica médica, expectante de que o arrendado tinha licença para a actividade que ali pretendia desenvolver.

Porém, contrariamente ao prometido e contratado pelos réus, veio a verificar que o locado não estava licenciado para o exercício daquela actividade, sendo necessária a alteração do uso da fracção, para o que careciam da autorização de todos os condóminos, unanimidade que nunca conseguiram obter.

Nesta sequência e por carta enviada a 16/12/2008, a A. resolveu o dito contrato de arrendamento e exige, agora, ser indemnizada pelos RR. pelo valor das obras por si efectuadas no locado e que não foi possível retirar do local, ascendendo estas a € 146.343,51. A não se entender assim, sempre o contrato será nulo, por prever o arrendamento de uma fracção para fim diverso do licenciado, o que confere igualmente ao arrendatário o direito a ser indemnizado.

Para além das ditas obras, a indemnização deve ainda compreender as rendas pagas no montante de € 8.000,00, bem como o valor relativo à perda de facturação/clientela até à abertura do novo estabelecimento, o que só será possível quantificar depois da abertura da nova clínica.

Os RR contestaram, impugnando vários pontos da petição e alegando, em resumo, que a Autora, no acto de outorga do contrato de arrendamento, teve conhecimento de que a fracção arrendada se destinava a "comércio", conforme licença de utilização respectiva, estando ambas as partes então convencidas de que essa licença incluía a actividade que a autora se propunha desenvolver no locado.

O problema surgiu quando os condóminos do prédio tiveram conhecimento que o âmbito da clínica seria alargado, nela passando a incluir, entre outros, serviços de radiologia e TAC, manifestando alguns a sua total oposição a tal destino.

Nesta sequência, procuraram as partes saber junto da Câmara Municipal de Viseu se a exploração da clínica médica se encontrava englobada na actividade de comércio, tendo então sido informados de que necessitariam da autorização de todos os condóminos do prédio para alterar a finalidade da fracção para a finalidade de "prestação de serviços", o que efectivamente não conseguiram.

Não obstante ter tido conhecimento da oposição de alguns dos condóminos do prédio, a autora prosseguiu com as obras no locado, as quais, de resto, foram feitas de forma ilegal, sem a prévia e necessária licença camarária.

Após isso, os réus ainda procuraram proporcionar à autora um outro espaço comercial, mas estes não quiseram transferir-se para o dito local, pois já tinham em vista outras instalações.

Impugnam os valores apresentados pela autora, afirmando os RR, ainda, que a autora deixou o locado num estado de completa devassa, pelo que reclamam os RR obras de reparação no locado ou indemnização respectiva.

Com estes fundamentos, os RR deduzem pedido reconvencional contra a Autora, tendo concluído pela improcedência da acção e pela procedência da reconvenção, pedindo que seja a autora condenada a pagar aos réus, a título de indemnização pelos prejuízos causados, a quantia de €112.530,00, acrescida de juros, à taxa moratória legal, desde a citação da A. até integral pagamento.

Na réplica, a autora refutou a argumentação utilizada pelos réus, reiterando a responsabilidade destes pelo sucedido. No mais, refere que se limitou a retirar os materiais que poderiam ser reutilizados, minimizando os custos indemnizatórios, facto esse justificado pelo prévio incumprimento contratual por parte dos réus, sendo excessivos os valores de obras orçados para reposição do locado no estado em que se encontrava.

Conclui como na petição, pugnando pela improcedência da reconvenção.

Terminados os articulados foi proferido despacho saneador, no qual a presente acção foi considerada como processualmente apta, sem excepções dilatórias e sem nulidades secundárias, tendo-se então procedido à selecção da matéria de facto alegada pelas partes e tida como relevante para efeitos de instrução e de discussão da causa.

Seguiu-se a realização da audiência de discussão e julgamento, com junção de diversa prova documental e com a gravação da prova testemunhal aí produzida, finda a qual foi proferida decisão sobre a matéria de facto constante da base instrutória, com indicação da respectiva fundamentação.

Proferida a sentença sobre o mérito da causa, nela foi decidido julgar a acção parcialmente procedente e, em consequência, declarou-se nulo o contrato de arrendamento comercial celebrado entre as partes no dia 1 de Junho de 2008; Condenaram-se os réus a pagarem à autora as seguintes quantias: - €146.343,51, relativos às obras realizadas no locado; e - € 8.000,00, relativos às rendas pagas.

A estas quantias, acrescem juros de mora à taxa legal, contados desde a citação até integral pagamento.

Absolveram-se os réus do remanescente peticionado. Julgou-se a reconvenção parcialmente procedente e, em consequência, condenou-se a autora/reconvinda a pagar aos réus/reconvintes as seguintes quantias: - € 60.000,00, relativos às obras necessárias realizar; - € 3.850,00, relativos aos materiais inutilizados; e - € 2.000,00, relativos à privação do locado.

A estas quantias, acrescem juros de mora à taxa legal, contados desde a data da notificação do pedido reconvencional até integral pagamento.

Absolveu-se a autora/reconvinda do remanescente peticionado.

Desta sentença interpuseram os réus recurso para a Relação de Coimbra que, por acórdão de 19 de Dezembro de 2012 (cfr. fls.445 a 459), julgou improcedente a presente acção e procedente, em parte, a reconvenção, derrogando a sentença recorrida, com a consequente absolvição dos réus dos pedidos e com a condenação da autora a pagar aos réus a quantia de € 63.850,00, com juros de mora a contar da data da notificação da autora para esse pedido reconvencional.

Inconformada, recorreu agora para este Supremo Tribunal a autora “AA, L.da”, apresentando as seguintes conclusões: 1. O Douto Acórdão do Venerando Tribunal da Relação de Coimbra, não fez uma interpretação adequada da factualidade constante dos autos e, assim, não aplicou o direito que se impunha em concreto.

  1. A matéria de facto tida como assente e como provada deveria ter outro alcance que não o veiculado no Acórdão Recorrido, pois que, por um lado, sobrevalorizou determinados factos e, por outro, branqueou factos que pela sua relevância impunham distinta decisão.

  2. As partes acordaram as condições de arrendamento, tendo a Autora tomado posse da fracção em inícios de Maio de 2008.

  3. Com efeito, o contrato de arrendamento foi celebrado em 1 de Junho de 2008 e incidia sobre fracção autónoma designada pela letra "A", correspondente ao rés-do-chão do prédio urbano constituído em propriedade horizontal sito à Tapada ou ......, Rua ..... Lote 00, em Viseu, inscrito na matriz da Freguesia de Coração de Jesus sob o artigo 1618°.

  4. Com a celebração do antedito contrato pretendia a Recorrente exercer no locado a atividade de clínica médica, tal como alieis, deixou expresso na cláusula terceira do correspectivo contrato de arrendamento.

  5. A condição essencial, para a celebração de tal contrato, era justamente, o arrendado estar licenciado para a actividade de exploração de clínica médica.

  6. O contrato foi celebrado, na convicção do arrendado se encontrar devidamente licenciado para o exercício da actividade de clínica médica, razão pela qual iniciou, no arrendado, as competentes obras de adaptação do espaço para a finalidade pretendida.

  7. Ocorre que, num primeiro momento, nenhum dos condóminos expressou oposição, à instalação e desenvolvimento no arrendado da actividade de clínica médica.

  8. Em finais de Julho de 2008, a Recorrente foi informada pelo C. M. Viseu que a actividade em causa (clínica médica) se incluía no ramo "prestação de serviços" e não no de "comércio", pelo que, não poderia exercer a sua actividade, a não ser que se alterasse a finalidade da fracção arrendada, sendo para tanto, necessária a autorização de todos os condóminos.

  9. Munida de tal informação, a Recorrente, de imediato, contactou os Recorridos...

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