Acórdão nº 08A3162 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Outubro de 2008
Magistrado Responsável | URBANO DIAS |
Data da Resolução | 21 de Outubro de 2008 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1.
Fundação Dr. FC intentou, no Tribunal Judicial de Entroncamento, procedimento cautelar de restituição provisória de posse contra Município de Vila Nova da Barquinha, com vista a obter a restituição do prédio urbano, sito na Rua ...., o qual foi objecto do contrato de comodato que, em 27 de Novembro de 2006, outorgaram.
Em abono do deferimento da sua pretensão, alegou que o requerido, através de ofício, datado de 28 de Julho de 2007, lhe comunicou a resolução do dito contrato, e que, posteriormente, "tomou de assalto" o edifício com arrombamento dos portões de acesso ao logradouro e das portas do edifício, privando-a, assim, do seu uso, certo que suportou despesas com a realização de obras levadas a cabo no âmbito do cumprimento do programa contratual estabelecido.
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A providência em causa foi indeferida in limine com o argumento de que a instauração da mesma no foro comum transgredia as regras da competência em razão da matéria, devendo, por isso mesmo, ser proposta nos tribunais administrativos.
Inconformada, a requerente agravou, sem êxito para o Tribunal da Relação de Évora.
Eis que, de novo, recorre, pugnando pela competência dos tribunais judiciais para decidir a providência, tendo, para o efeito, apresentado a respectiva minuta que fechou com as seguintes conclusões: - A agravante é uma pessoa colectiva de direito privado embora beneficie de estatuto de utilidade pública.
- A providência cautelar tem por objecto a violação do contrato de comodato e não o programa Progride, constante do Despacho nº 25/2005.
- O contrato de comodato é um contrato de direito privado e rege-se por normas de direito privado.
- As partes contratantes fixaram expressamente a aplicação ao contrato das normas constantes do Código Civil.
- O que importa o reconhecimento de que se trata de um diferendo relativo a contrato de direito privado.
- A actividade do agravado não tem por objecto a prossecução de fins sociais.
- O que obsta a que a relação contratual entre agravante e agravado seja classificada como relação entre pessoas colectivas de direito público ou entre órgãos públicos.
- Mostram-se violados os artigos 212º, nº 3, da Constituição, 1º, nº1 e 4º, nº 1, alíneas f) e j) do ETAF e 393º do Código de Processo Civil.
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Importa, pois, decidir.
Para além dos factos já referidos, anota-se, ainda, que a cedência do edifício por parte do Município requerido surgiu na sequência da candidatura por ele apresentada, em parceria com a requerente, ao Programa Progride, no âmbito do Despacho nº 25/2005, de 3 de Janeiro.
Decorre do nº 3 do artigo 212º da Constituição que "compete aos tribunais administrativos e fiscais o julgamento das acções e recursos contenciosos que tenham por objecto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais".
Compete, assim, a estes tribunais "o julgamento das acções que tenham por objecto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas, sendo que a sua competência é excepcional, sendo a jurisdição regra dos tribunais judiciais (artigos 18º, nº 1, da LOFTJ - Lei nº 3/99, de 13 de Janeiro - aqui aplicável - e artigo 66º do Código de Processo Civil).
A lei ordinária desenvolveu estes princípios, afirmando no artigo 1º, nº 1, do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais que os tribunais administrativos são órgãos de soberania competentes para resolver os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais e enumerando, exemplificativamente, no artigo 4º as várias hipóteses em que a competência lhes pertence.
Estribou-se a decisão da 1ª instância no facto de o litígio se enquadrar no incumprimento de um contrato de comodato celebrado na sequência da apresentação do Município, em parceria com a requerente, ao programa Progride, cujo Regulamento consta do Despacho nº 25/2005, de 03/01, convocando em seu abono o preceituado na alínea j) do nº 1 do artigo 4º do ETAF.
Já a Relação confirmou a decisão da 1ª instância socorrendo-se já não da citada alínea j), que considerou inaplicável ao caso, mas sim da alínea f) do mesmo preceito legal.
E justificou a sua posição dizendo que se está "perante uma situação emergente de um contrato especificamente a respeito do qual existem normas de direito público que regulam aspectos específicos do respectivo regime, perante uma situação em que o Município actuou no...
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