Acórdão nº 2006/09.5TTPNF.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Abril de 2013
Magistrado Responsável | ISABEL SÃO MARCOS |
Data da Resolução | 10 de Abril de 2013 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório 1.
Em 28 de Outubro de 2009, no Tribunal do Trabalho de Penafiel, AA intentou acção emergente de contrato de trabalho contra a Junta de Freguesia de Várzea ..............
, pedindo que fosse declarada nula a cláusula do contrato de trabalho celebrado, em 1 de Outubro de 2002, entre a autora e a ré e o mesmo convertido em contrato de trabalho sem termo certo ou incerto, devendo, se improceder tal pretensão, ser convertido o contrato de trabalho celebrado em 15 de Setembro de 2003 em contrato sem termo, porquanto resulta nula a cláusula que estipulou o termo e respectivas renovações. Em consequência disso, deverá condenar-se a ré a proceder à reintegração da autora no seu posto de trabalho e bem assim a pagar-lhe: i) a quantia de € 5.000,00, a título de danos não patrimoniais; ii) os salários devidos desde 30 dias antes da propositura da acção e até ao trânsito em julgado da decisão. Finalmente, para o caso de se entender que o contrato de trabalho não se converteu em contrato sem termo, deverá a ré ser condenada a pagar à autora uma compensação pela não renovação no valor de € 3.600,00.
Para tanto, invocou os seguintes fundamentos: Em 1 de Outubro de 2002, a autora celebrou com a ré um contrato de trabalho a termo certo, pelo período de 10 meses, para exercer as funções de auxiliar de cozinha no Jardim-de-Infância de .........., cumprindo o horário de segunda a sexta-feira, das 10 horas às 18 horas, com uma hora de intervalo para almoço e mediante a retribuição mensal de € 375,00.
Em 15 de Julho de 2003, findo o ano escolar e encerrado o Jardim-de-Infância em causa, a autora permaneceu em casa até à reabertura do mesmo.
Em 15 de Setembro de 2003, a autora e a ré celebraram um novo contrato de trabalho, com termo a 15 de Julho de 2004, para a primeira exercer iguais funções, mediante idêntica retribuição.
No final do ano lectivo, mais precisamente em 15 de Julho de 2004, o Jardim-de-Infância fechou para reabrir em 15 de Setembro de 2004, tendo, no entretanto, a autora permanecido em casa.
A ré jamais comunicou à autora a caducidade dos contratos de trabalho a termo certo celebrados em 1 de Outubro de 2002 e em 15 de Setembro de 2003.
Em 15 de Setembro de 2004, a autora retomou as suas funções e, em 15 de Julho de 2005, quando o ano escolar findou e o Jardim-de- Infância encerrou, permaneceu em casa até 15 de Setembro de 2005, data em que retomou o trabalho, exercendo as mesmas tarefas, com idêntico horário de trabalho e igual remuneração mensal.
Esta situação repetiu-se ao longo dos anos que se sucederam, sendo certo que, a partir de 15 de Julho de 2004, a autora nunca assinou qualquer contrato de trabalho com a ré.
Acontece que, em 19 de Maio de 2009, a ré enviou à autora uma carta a comunicar-lhe a não renovação do contrato de trabalho celebrado em 15 de Setembro de 2008.
As cláusulas constantes dos contratos de trabalho que estipularam o seu termo são, porém, nulas e a carta remetida pela ré à autora a comunicar a não renovação do contrato configura um despedimento ilícito.
A ré contestou (cfr. fls. 37 a 49), arguindo a incompetência material do Tribunal de Trabalho e bem assim alegou a prescrição dos créditos laborais relativamente aos contratos verbais ou escritos referentes aos anos de 2002 a 2007, a validade dos contratos a termo celebrados com a autora, concluindo pela procedência das invocadas excepções e pela total improcedência da acção. Requereu ainda a ré a intervenção acessória provocada do Município do Marco de Canaveses, que foi indeferida.
A acção prosseguiu seus termos e, após a realização de audiência de julgamento, foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e, por via disso, declarou a nulidade do contrato celebrado entre a autora e a ré e condenou esta a pagar àquela a compensação correspondente ao valor das retribuições que a autora deixou de auferir desde o dia 28 de Setembro de 2009 a 14 de Dezembro de 2009, compensação a que haviam de deduzir-se as quantias que a autora tivesse recebido, a título de subsidio de desemprego, no referido lapso de tempo, a entregar pela ré à Segurança Social, a liquidar em incidente de liquidação. Dos demais pedidos foi a ré absolvida.
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Inconformada, a autora apelou, tendo o Tribunal da Relação do Porto, por acórdão de folhas 399 a 440: i) considerado nulo o contrato de trabalho a termo certo celebrado em 1 de Outubro de 2002 entre autora e ré e declarado a sua conversão em contrato de trabalho por tempo indeterminado, com efeitos reportados àquela data; ii) condenado a ré a reintegrar a autora no seu posto de trabalho e bem assim a pagar à autora as remunerações devidas desde 28 de Setembro de 2009 e até ao trânsito em julgado do acórdão, sem prejuízo do disposto no artigo 390º, nº 2, alínea c) do Código do Trabalho de 2009, a liquidar oportunamente; iii) absolvido a ré dos demais pedidos.
É contra esta decisão que, agora, a ré se insurge, mediante recurso de revista, em que formula as conclusões que se passam a transcrever: « 1. A Recorrida foi contratada a termo certo pela Recorrente para exercer a função de auxiliar de cozinha na gestão de fornecimento do serviço de refeições aos Jardins-de-Infância; 2. O exercício de tal actividade por parte da Recorrente foi objecto de um protocolo anual celebrado pela Câmara Municipal de Marco de Canaveses; 3. A contratação visava satisfazer necessidades temporárias dos serviços decorrentes do mesmo protocolo; 4. Não é da competência da Recorrente ou atribuição sua por força do seu estatuto legal o exercício de tal actividade; será, sim, da competência da Câmara Municipal; 5. A Recorrente não possui quadro para pessoal auxiliar; 6. Cada protocolo vigorava pelo período coincidente com o ano lectivo e sujeito a renovação expressa ou tácita; 7. A Recorrida sempre teve conhecimento da existência do protocolo celebrado entre a Recorrente e a Câmara Municipal de Marco de Canaveses e de que a sua actividade era anual, correspondendo o seu trabalho ao início e fim de cada ano escolar; 8. A Recorrida beneficiou do subsídio de desemprego a partir do ano de 2006; 9. Das declarações emitidas pela Recorrente para obtenção do subsídio de desemprego e das declarações para inscrição de trabalhadores constam todos os elementos referentes ao início e fim de cada contrato, de cada ano escolar, documentos que a Recorrida assinava, disso tendo plena consciência e conhecimento; 10. Do extracto de remunerações da Segurança Social consta[m] os períodos de trabalho da Recorrida relativos a cada ano escolar; 11. A Recorrente não assumiu para com a Autora o compromisso de a contratar para cada um dos anos seguintes; 12. No ano de 2009/2010 as trabalhadoras BB e CC trabalharam a tempo parcial, uma de manhã e outra de tarde, mas apenas três horas por dia cada uma, para as funções de auxiliar de cozinha e apoio às crianças no prolongamento, o que é substancialmente diferente das funções da Recorrida e da sua colega DD; 13. A Recorrente, no início a cada um dos anos lectivos entre 2002/2003 e 2008/2009, admitiu a Recorrida ao serviço com base no protocolo que aquela celebrava e renovava anualmente, sendo os acordos de trabalho coincidentes com o ano lectivo e terminando cada um no fim de ano lectivo, ou seja, em 15 (quinze) de Julho; 14. Em 19.05.2009 a Recorrente comunicou, por escrito, à Recorrida a caducidade do seu contrato a ocorrer em 15.07.2009; 15. A Recorrida, ao não assinar o contrato referente ao ano de 2008/2009, agiu de má fé e com manifesto abuso do direito; já então pretendia ser trabalhadora permanente da Recorrente; 16. A ora Recorrente, por falta de condições para cumprir o protocolo, denunciou-o para o ano 2010/2011, cessando a partir daí a actividade em causa e deixando de existir qualquer posto de trabalho; 17. O Venerando Tribunal da Relação, ao considerar a contratação para satisfazer necessidades permanentes e duradouras da Recorrente, além de contrariar matéria assente, contrariou a própria denúncia do protocolo e, nessa medida, conheceu de matéria que lhe era vedado alterar, o que consubstancia nulidade que se invoca; 18. A Recorrida beneficiou conscientemente de toda a protecção social que a Segurança Social atribui aos trabalhadores desempregados; 19. A Directiva em apreço, transposta para a ordem interna, deve ser interpretada no sentido de que se opõe a uma legislação nacional que proíbe de modo absoluto, apenas no sector público, a conversão em contratos sem termo os contratos de trabalho a termo sucessivo que, de facto, se destinaram a satisfazer «necessidades estáveis» da entidade patronal e devem ser considerados abusivos; 20. A fls. 19 do douto acórdão em apreço refere-se "os tribunais nacionais, na medida do possível, [devem interpretar o direito interno, a partir do termo do prazo de interposição, à luz do teor e da finalidade da directiva em causa, para alcançar os resultados por esta prosseguidos], privilegiando a interpretação das normas nacionais. Daqui resulta a possibilidade de existência de "constrangimentos" a tal directiva, como será o caso da Lei nº 23/2004, de 22 de Junho e da interpretação que resulta do Acórdão do Tribunal Constitucional nº 368/2000 e da jurisprudência unânime do Supremo Tribunal de Justiça; 21. A actuação da Recorrente foi conforme à Lei nº 23/2004, de 22 de Junho, designadamente, quanto ao disposto nos artigos 2°, 8°, 9°, 10º e 26º; 22. Não há lugar à conversão pretendida também por força do referido Acórdão do Tribunal Constitucional e do decidido, de forma uniforme, pelo Supremo Tribunal de Justiça, entre outros, nos Processos 08S2451, 06S2445, 08S1536, 08S1982, 08S3443 e 1846/06.1YRCBR.S1; 23. O contrato em causa é nulo e, como tal, foi judicialmente declarado, pelo que as suas consequências são as resultantes da douta decisão de 1ª Instância quanto à pretendida reintegração e prestações devidas, a qual respeitou o direito aplicável, numa apreciação correcta e legal...
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