Acórdão nº 6805/03.3TBCSC.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Março de 2013

Magistrado ResponsávelGABRIEL CATARINO
Data da Resolução21 de Março de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

I – Relatório Irresignada com a decisão proferida no Tribunal de Família e Menores da comarca de Cascais, que na procedência os pedidos impetrados pela demandante, AA, julgou a acção procedente e a reconvenção, que pelos demandados, BB e CC, havia sido esgrimida contra a demandante, improcedente, recorrem, de revista, per saltum, os demandados /reconvintes, havendo a considerar os sequentes: I.1. – Antecedentes Processuais. AA, residente em …, …, França, intentou acção declarativa de condenação, com forma ordinária, contra BB e CC, ambos com residência na Quinta ..., Lote …, ...º, Portimão, pedindo que se declare: “a) – Anulado o contrato promessa de cessão de quotas de que os RR. são titulares na sociedade comercial “DD, Lda.”, celebrado entre A. e RR., em 30 de Maio de 2003”; b) – Anulado o contrato promessa de cessão de créditos de que os RR. são titulares sobre a sociedade comercial “DD, Lda.” celebrado entre A e RR., em 30 de Maio de 2003; e condenando -se:: c) – Os RR. a restituir à A. a quantia por esta paga relativamente à licença n.º ... do estabelecimento comercial propriedade da sociedade de que os RR. são os únicos sócios no valor de € 2.138,06” Para os pedidos que impetram alegaram, em extenso e prolixo articulado – cfr. fls. 1 a 46 -, e em síntese muito apertada, que: - “por documento escrito datado de 30/05/2003, a A. e os RR. celebraram contrato promessa de cessão de quotas, bem como contrato promessa de cessão de créditos, relativamente às quotas na sociedade “Restaurante DD, Lda.”, titular do estabelecimento comercial “EE”, tratando-se de um restaurante-bar sito na ..., Portimão, quotas aquelas de que eram exclusivos titulares os RR.; - através daquele contrato promessa de cessão de quotas os RR. prometeram ceder à A., que declarou aceitar tal cedência, as suas quotas na dita sociedade, por um preço global de € 199.520,00, sendo o dito contrato promessa de cessão de créditos decorrência do primeiro, por referente a suprimentos prestados pelos sócios, ora RR., à sociedade; - os RR. bem sabiam, ao tempo das negociações estabelecidas entre as partes e ao tempo da celebração dos contratos promessa, da existência de um projecto de reestruturação, que se encontrava em curso, referente ao local onde se encontrava instalado o dito “EE”, e consequente condicionamento da prorrogação do alvará; - porém, não só não informaram a A. sobre tal circunstancialismo, como até lhe disseram que nada tinha a temer, pois que, muito embora o estabelecimento se localizasse em zona de concessão, a licença respectiva de ocupação era sempre renovada; - só após a celebração dos ditos contratos promessa a A. veio a saber, por terceiros, da existência de um projecto de reestruturação para o Areal da ..., projecto esse que era do conhecimento de todos os comerciantes e dos locais de Portimão, mas do que a A. não soubera antes, já que os RR. lhe esconderam tal facto, sendo a A. pessoa desconhecedora do local e da região, que esteve ausente do País durante vinte anos, cuja formação se resume à antiga 4.ª classe; - tal projecto de reestruturação pressupõe a demolição dos estabelecimentos existentes e a reconstrução dos novos estabelecimentos, posicionados de forma diversa daquela em que se encontram, sendo que tais obras ficarão a cargo dos respectivos comerciantes, podendo importar para a A um investimento de valores que ascendam a € 350.000,00, muito superior aos € 199.519,15 aceites em sede de contrato promessa; - por isso, a A. comunicou à R não estar interessada no negócio e que, se soubesse do referido projecto e suas consequências, nunca teria assinado os contratos promessa; - apercebendo-se de que tinha sido enganada pelos RR., em quem confiara desde o primeiro momento negocial, e que estes não pretendiam solucionar o problema, resolvendo consensualmente o negócio, a A. decidiu renunciar à gerência e proceder à entrega do estabelecimento comercial aludido, o que fez, bem como revogou o cheque emitido para pagamento do sinal convencionado; - cabia aos RR. esclarecer a A. da existência do referido projecto de reestruturação do Areal da ... e suas implicações, o que não fizeram, omitindo consciente e deliberadamente tal informação, donde que a A. tenha sido levada a celebrar um negócio que não pretendia, já que se encontrava em erro, desconhecendo um elemento essencial do negócio, bem sabendo os RR. que, se a A. tivesse conhecimento do mesmo, jamais celebraria os contratos promessa celebrados; - os RR. agiram, pois, com dolo, activo e essencial, procedendo em contrário aos ditames da boa fé, incorrendo em responsabilidade pré-contratual, pelo que o negócio é anulável, como agora peticionado na acção, devendo ser restituída à A. a quantia por esta paga, de € 2.138,06, a título de licença do estabelecimento comercial mencionado, propriedade da sociedade de que os RR. são os únicos sócios.” Na contestação que com que pretendiam alancear o impetrado, os demandantes/reconvintes – cfr. fls. 160 a 190 -, impugnaram a matéria constante da petição inicial e deduziram pedido reconvencional, com a matéria factual que, igualmente, em apertada síntese, se condensa, a seguir: “desde o início da negociação, a A. sabia que o estabelecimento da sociedade dos RR. se situava numa zona de concessão, sendo que a A. se encontrava acompanhada por advogada, que examinou os documentos pertinentes e preparou o contrato; - a pressa na celebração do negócio era da A., que queria abrir o estabelecimento para começar a facturar, tendo passado a explorá-lo a partir de 30/05/2003, sendo que, por o cheque emitido pela A. para pagamento do sinal acordado ter sido devolvido por falta de provisão, os RR. deduziram a respectiva queixa criminal; - os RR. falaram oportunamente à A. na existência de estudos no âmbito do aludido projecto, o qual ainda não estava definido, sendo do conhecimento geral na cidade de Portimão a existência de um Plano de Ordenamento da Orla Costeira, como o que existe para toda a orla costeira portuguesa, pelo que cabia à A. informar-se adequadamente, por forma a obter um conhecimento pormenorizado dessa circunstância (anteriormente à assinatura do contrato promessa, devia a A. certificar-se, junto da Câmara Municipal de Portimão e outras entidades, sobre todas as questões exteriores ao negócio mas que o pudessem afectar, tanto mais que acompanhada por advogada em toda a fase pré-contratual e na própria elaboração do contrato, sendo que os RR, por sua vez, não tinham conhecimentos acerca do projecto referido); sendo que para o pedido reconvencional, alegam que: - a A/Reconvinda, em 30/05/2003, entregou aos RR./Reconvintes o aludido cheque, no valor de € 99.520,00, para pagamento do sinal, tendo estes renunciado então à gerência da sociedade, sendo nomeada gerente a A., com entrega a esta do estabelecimento, tendo ocorrido devolução de tal cheque por falta de provisão em 03/06/2003; - após isso ainda os RR. adquiriram os vidros em falta no estabelecimento, que foram entregues à A./Reconvinda, tendo ainda a R/Reconvinte enviado ao estabelecimento um técnico de computadores para proceder aos arranjos necessários para que o mesmo ficasse em prefeito estado de funcionamento, o que aconteceu, e um filho da R acompanhou aquela A. ao supermercado e à garrafeira para fazerem compras iniciais para o EE, para além de a R/Reconvinte ter ainda dispensado à A. outros actos de ajuda inicial, demonstrativos da boa fé dos RR.; - o aludido cheque, porém, voltou a ser devolvido por falta de provisão, percebendo então os RR./Reconvintes que a A/Reconvinda não queria, ou não podia, pagar tal cheque, que titulava o sinal acordado; - em Julho de 2003 confirmou-se que o Plano da ... ainda não estava estabelecido, pelo que a A. não tem justificação para o seu incumprimento quanto ao pagamento do sinal titulado pelo aludido cheque; - a A/Reconvinda, que veio litigar de má fé, incumpriu, assim, o contrato promessa, não pretendendo celebrar o contrato prometido, com o que causou prejuízos aos RR., tendo estes direito a fazer seu o valor do sinal acordado e titulado pelo cheque sem provisão.

Concluem pedindo: - pela improcedência da acção, por não provada; - pela procedência da reconvenção, por provada, peticionando, em conformidade, por esta via: a) - se declare que o contrato promessa foi incumprido pela promitente cessionária; b) - condenando-se a A/Reconvinda no pagamento do sinal, titulado por meio de pagamento que, apresentado a desconto, veio devolvido por falta de provisão; c) - bem como na perda do sinal; d) - e como litigante de má fé.” Na réplica que exibiu – cfr. fls. 220 a 277 -, a demandante impugna a factualidade e a valia jurídica dos argumentos expendidos em sede de contestação e de reconvenção e concluindo, ante a improcedência da matéria de excepção e de reconvenção deduzidas, como na sua p. i., bem como pela sua absolvição dos pedidos reconvencional e de condenação por litigância de má fé, contra si deduzidos, e revertendo, ou reivindicando, para si a condenação dos RR., como litigantes de má fé, com o consequente pagamento de indemnização à A/Reconvinda, correspondente ao reembolso das despesas a que os RR. tenham dado causa, incluindo os honorários das suas mandatárias.

Por articulado de fls. 283 e segs., vieram os RR./Reconvintes apresentar articulado de tréplica, impugnando diversa factualidade alegada pela parte contrária e pugnando pela improcedência da matéria de excepção deduzida pela A./Reconvinda.

Por despacho de fls. 307 foi admitido o pedido reconvencional, com a consequente fixação à causa de adequado valor processual.

Dispensada (tacitamente) a audiência preliminar, foi proferido despacho saneador, vindo a afirmar-se a verificação dos pressupostos de validade e regularidades da instância.

Procedeu-se à elaboração do elenco dos factos assentes e da base instrutória, de que foi deduzida reclamação por parte dos RR./Reconvintes (cfr. fls. 330 e segs.), julgada esta intempestiva e, assim, indeferida, como consta do...

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