Acórdão nº 707/09.7TBPVZ.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 14 de Março de 2013

Magistrado ResponsávelMARIA AMÁLIA SANTOS
Data da Resolução14 de Março de 2013
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 707/09.7TBPVZ.P1 – Apelação 1ª Tribunal Judicial da Póvoa de Varzim Relatora: Maria Amália Santos 1º Adjunto: Desembargador Aristides Rodrigues de Almeida 2º Adjunto: Desembargador José Amaral* Acordam no Tribunal da Relação do Porto: *“B…., S.L.”, com sede em …., …. …, Pontevedra, Espanha, intentou a presente acção declarativa com processo comum ordinário contra “C….., S.A.”, com sede na …, nº .., Lisboa, pedindo que a ré seja condenada a pagar-lhe a quantia de € 108 727,95, acrescida dos juros legais contados desde a data da citação até efectivo e integral pagamento.

Alegou para o efeito, em resumo, que: - é legítima portadora dos cheques identificados no art. 1º da petição, sacados sobre uma conta do Banco réu, que foram entregues para pagamento de uma dívida da sociedade “D….., Lda”; - apresentados a pagamento nas datas neles apostas numa agência do réu, foram devolvidos com os seguintes dizeres apostos nos versos: “cheque revogado Justa causa – F.V.F.V”; - todos os cheques foram apresentados a pagamento no prazo de oito dias e na data em que foram apresentados a conta apresentava fundos monetários suficientes que possibilitavam o seu pagamento; - a conduta do réu causou prejuízos à autora na medida em que impediu a cobrança dos cheques, privando-a dos respectivos montantes.

* A ré deduziu contestação, impugnando parcialmente o alegado e alegando, por sua vez, em síntese que: - a autora já recebeu pelo menos parte dos valores dos cheques em causa; - não era expectável que ao decidir aceitar a revogação de um cheque com base em falta ou vício na formação da vontade, contasse com a circunstância de o beneficiário do cheque, por causa dessa devolução, tivesse de pagar comissões que se cifravam entre os € 229,00 e os € 707,00, por cada cheque; - à data em que foi apresentado a pagamento cada um dos cheques a conta sacada não continha fundos bastantes para permitir o respectivo pagamento; - a ré, ao aceitar o pedido do sacador dos cheques, fê-lo convencida da veracidade da causa que o mesmo invocou; - tais cheques eram pré-datados.

Conclui que a acção deverá ser julgada não provada e improcedente, absolvendo-se a ré do pedido.

Requereu ainda a intervenção principal acessória do sacador dos cheques, E….. e de “D….., Lda”, actualmente denominada “F…., Lda”.

* A autora apresentou réplica, concluindo como na petição.

*Foram admitidas as requeridas intervenções acessórias, sendo os intervenientes citados para a causa e não apresentaram contestação.

* Foi proferida decisão a julgar improcedente a acção e, consequentemente, a absolver a ré do pedido contra ela formulado.

*Não se conformando com tal decisão, veio a A. dela interpor recurso de Apelação, apresentando alegações e formulando as seguintes conclusões:

  1. Da avaliação da prova produzida, nomeadamente dos extractos bancários juntos pelo banco R. e testemunhal, conjugados com as regras de experiência comum e da prática bancária, resulta que o tribunal deveria ter respondido de forma diferente à matéria de facto constante do quesito 28º da Base Instrutória.

  2. Na resposta ao referido quesito, a Ex. Ma Senhora Juiz partiu de um pressuposto errado, ou seja, que o saldo da conta não era suficiente para pagar os cheques e que não estava autorizado o descoberto.

  3. É que a falta de provisão na data da apresentação de cada um dos cheques a pagamento não é equivalente a falta absoluta de provisão.

  4. Pois se os cheques apresentados a pagamento fossem recusados por falta de provisão, nada nos diz que apresentados novamente a pagamento não seriam pagos, com o accionamento dos mecanismos previstos nos artºs 1º-A, 3ºA e 11º do Decreto-Lei nº454/91, de 28 de Dezembro.

  5. É sabido que muitas vezes os contratos de depósito bancário permitem que as contas fiquem a descoberto até determinados limites (convencionados entre o banco e os titulares da conta) e seja, ainda assim, possível o pagamento dos cheques, apesar das mesmas se encontrarem a descoberto e até com saldo negativo.

  6. O facto de um funcionário do banco R. dizer que não estava autorizado o descoberto, não implica a resposta positiva ao quesito, pois que, atenta a relação de subordinação subjacente ao contrato de trabalho existente entre a testemunha e o Banco R. e a possibilidade de o banco vir a ser responsabilizado pelo pagamento de uma indemnização, o depoimento desse funcionário como testemunha não pode ser valorado sem quaisquer reservas.

  7. O ónus da prova de que os cheques não seriam pagos mesmo que devolvidos por falta de provisão, depois de accionados todos os mecanismos dos artigos 1º-A, 3ºA e 11º do Decreto-Lei nº454/91, de 28 de Dezembro, por constituir matéria de excepção que exclui a obrigação de indemnizar, compete, nos termos do artigo 342º, nº2 do C.C., ao banco R.

  8. Tudo factores que não foram considerados pela Ex.ma Senhora Juiz na resposta dada ao quesito 28º, pois caso fossem considerados, a resposta ao mesmo teria forçosamente de ser: NÃO PROVADO.

  9. A alteração da matéria de facto sustenta-se na força probatória dos extractos bancários, regras de experiência comum e da prática bancária.

  10. SEM PRENCINDIR, MANTENDO-SE A MATÉRIA DE FACTO INALTERADA sempre a solução de direito, face aos factos dados como provados, deveria ter sido outra.

  11. A sentença em crise conclui que a autora não logrou provar um dos pressupostos de que depende a obrigação de indemnizar, a saber, o nexo de causalidade entre o facto ilícito da R. e o dano sofrido pela A., seguindo o entendimento preconizado no Acórdão STJ de 02/02/2010 no processo 1614/05.8TJNF.S2, publicado no sítio da internet www.dgsi; L) Com o devido respeito, a tese preconizada no referido Acórdão, para além de violar o Acórdão Uniformizador e os princípios que estão subjacentes ao instituto da responsabilidade civil extracontratual levaria, as mais das vezes (ou sempre), à exclusão da obrigação de indemnizar.

  12. O instituto da responsabilidade civil, além de uma componente compensatória, possui igualmente uma função sancionatória ou preventiva – em casos como o constante dos presentes autos - em que é inequívoca a existência de acto ilícito e culposo por parte do banco e a existência de prejuízo.

  13. Seguir a tese acima referida é colocar a cargo da A./lesada, se assim quisesse ser indemnizada, a diabólica prova da não concorrência no caso de toda e qualquer causa virtual.

  14. Ou seja, obriga a Autora a demonstrar, depois de provar que ainda não foi paga do valor titulado pelos cheques (ou seja, depois de comprovar o dano), a verificação de todo um conjunto de factos (trilhando o longo caminho das hipóteses) tendentes á demonstração do mesmo resultado, mas agora como se não tivesse havido actuação ilícita.

  15. A revogação dos cheques é, por si só, causa adequada do dano, ainda que, posteriormente, ocorresse um facto susceptível de conduzir ao mesmo resultado, pois este outro facto (inexistência de fundos), não está legalmente previsto como causa susceptível de suplantar a outra.

  16. A aceitação da ordem de revogação teve como consequência inevitável o não pagamento dos cheques, podendo afirmar-se que a sua revogação ilícita foi causa adequada à produção do dano e, nessa medida, não pode ser afastada a causa real do dano, nem prevalecer sobre ela a causa virtual.

  17. Esta foi igualmente a orientação que teve vencimento no Acórdão Uniformizador do STJ nº4/2008: “(…), um banco que recusa o pagamento de um cheque revogado determina que, segundo as regras da experiencia e a partir das circunstâncias do caso, o tomador se veja privado do respectivo montante”, tanto mais que “da revogação resulta normalmente o afastamento do pagamento voluntário por parte do sacador e é utópico presumir-se que este disponha de outros bens acessíveis que garantam solvabilidade (se a ordem de revogação visa evitar o pagamento de um cheque validamente emitido e detido pelo tomador, naturalmente que o sacador...

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