Acórdão nº 00278/09.4BEPNF de Tribunal Central Administrativo Norte, 16 de Novembro de 2012

Magistrado ResponsávelCarlos Lu
Data da Resolução16 de Novembro de 2012
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO MC. …, inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF de Penafiel, datada de 29.11.2010, que julgou improcedente a ação administrativa especial pela mesma deduzida contra o “FUNDO GARANTIA SALARIAL, IP” (doravante apenas «FGS»), na qual peticionava, por um lado, a declaração nulidade ou anulação do ato de indeferimento proferido pelo Presidente do «FGS» [que recaiu sobre o respetivo requerimento de pagamento de créditos emergentes de contrato de trabalho que havia apresentado junto dos serviços do Instituto de Solidariedade e Segurança Social no serviço local de Paredes], e, por outro lado, a condenação do R. no pagamento das quantias ali peticionadas.

Formula a A., aqui recorrente jurisdicional, nas respetivas alegações (cfr. fls. 131 e segs.

- paginação processo em suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário), as seguintes conclusões que se reproduzem: “...

1) O direito de audiência prévia consagrado no art. 100.º do CPA visa associar o Administrado à formação da vontade da Administração por forma a permitir-lhe a influenciar a decisão final.

2) Tal direito visa também facilitar o controle da legalidade do ato, tornando claras todas as circunstâncias e os pressupostos concretamente tidos em conta pelo A. do ato.

3) Constitui, por isso, a consagração do princípio e direito ao contraditório, visto ser através dele que se possibilita o confronto dos pontos de vista da Administração com os do Administrado, 4) E é uma importante garantia de defesa dos direitos do Administrado o que tem como consequência que o seu cumprimento seja considerado uma formalidade essencial.

5) Por se tratar de formalidade essencial as restrições ao princípio da audiência prévia estão subordinadas ao princípio da tipicidade - art. 103.º do CPA e 100.º do CPA.

6) Não estão tipificadas como restrições ao princípio da audiência prévia as situações em que estando em causa uma atividade vinculada da Administração, depois de o Tribunal apurar que o ato não padece de qualquer outro vício, designadamente o de violação de lei, conclui que a decisão administrativa não poderá ser outra que não a decisão efetivamente tomada. Por outro lado 7) O direito de audiência dos interessados tem consagração na Constituição da República Portuguesa quando esta refere no seu artigo 267.º, n.º 5 que «o processamento da atividade administrativa … assegurará … a participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhes disserem respeito» e bem pelo contrário o princípio do aproveitamento dos atos válidos não tem consagração constitucional, tendo acolhimento é certo, junto de alguma Doutrina e Jurisprudência.

8) A acolher tal princípio como acontece na Sentença recorrida, tal constituiria uma violação clara da hierarquia das normas, permitindo que uma orientação Jurisprudencial ou Doutrinal se sobrepusesse a um normativo constitucional.

9) Deve improceder por isso o apelo, feito pela Sentença Recorrida, ao princípio do aproveitamento do ato - segundo qual não se deve anular um ato, ainda que enferme de um vício de violação de lei ou de forma, sempre que, estando em causa um comportamento vinculado, o ato que haja de proferir não possa ter outro conteúdo senão aquele que lhe foi dado.

10) Assim o ato administrativo em questão nos autos é assim anulável.

11) Acresce que, mesmo que assim não fosse, como mais à frente se verá, não estava em causa uma atividade vinculada em que a Administração não pudesse tomar outra decisão que não aquela que foi proferida. De facto, 12) A interpretação do n.º 2 do artigo 319.º da Lei 35/2004 de 29/7, quando aos créditos abrangidos na sua previsão, tem de ser conjugado com o disposto no artigo 91.º, n.º 1 do CIRE.

13) Sob pena de os créditos laborais previstos no n.º 2 do artigo 319.º da Lei 35/2004 de 29/7 se restringirem ao curto período que medeia entre a data da propositura da ação de insolvência e a data de declaração da insolvência, o que certamente não esteve no espírito do legislador, a interpretação do n.º 2 do artigo 319.º da Lei 35/2004 de 29/7 deverá ser a seguinte: - Nos termos do n.º 2 do artigo 319.º da Lei 35/2004 de 29/7 caso não existam créditos laborais que se tenham vencido nos seis meses que antecederam a data da propositura da ação de insolvência, o Fundo de Garantia Salarial pagará qualquer outro crédito laboral previsto na Lei 35/2004 de 29/7, até aos limites previstos naquela Lei, uma vez que os créditos laborais, à semelhança de todos os outros (com exceção dos subordinados a condição suspensiva) se vencem na data de declaração de insolvência (art. 91.º, n.º 1 CIRE), logo, após a data de propositura da ação de insolvência. Acresce que, 14) Nenhuma razão do ponto de vista do apoio e segurança social existe para distinguir e tratar de modo diverso, os trabalhadores e respetivos apoios sociais, pela perda de créditos salariais, consoante os seus créditos salariais se tenham vencido no período de seis meses anteriores à data da propositura da ação de insolvência ou anteriormente a este período.

15) A interpretação do n.º 2 do artigo 319.º da Lei 35/2004 de 29/7 que é feita na Sentença recorrida, no sentido de que na sua previsão não abrange o pagamento de créditos laborais pelo Fundo de Garantia Salarial anteriores ao período de seis meses previsto no n.º 1 daquele artigo viola claramente os artigos 13.º e 63.º da Constituição da República Portuguesa.

16) O ato em causa é assim nulo.

17) Revogando-se a Sentença recorrida e proferindo-se Acórdão que acolha as conclusões precedentes e condene o Recorrido no pedido se fará Justiça …”.

O R., aqui recorrido, devidamente notificado veio produzir contra-alegações (cfr. fls. 153 e segs.

), nas quais em síntese conclui nos termos seguintes: “...

  1. A questão objeto do presente recurso prende-se com a interpretação da norma contida no n.º 1, do art. 319.º, da Lei n.º 35/2004, de 29/07.

  2. Por despacho do Presidente do Conselho de Gestão do Fundo de Garantia Salarial de 05.01.2009, o requerimento da Recorrente foi indeferido, com fundamento na falta de preenchimento do requisito legal estabelecido pelo n.º 1, do art. 319.º, da Lei n.º 35/2004, de 29/07.

  3. O n.º 1, do art. 319.º, da Lei n.º 35/2004, de 29/07, estabelece que «O Fundo de Garantia Salarial assegura o pagamento dos créditos previstos no artigo 317.º que se tenham vencido nos seis meses que antecedem a data da propositura da ação ou apresentação do requerimento referido no artigo anterior».

  4. A Recorrente no requerimento apresentado requereu o pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho e da sua cessação e violação vencidos até à data da rescisão do contrato de trabalho, ou seja, até 04/07/2005.

  5. Tendo a ação de insolvência da entidade empregadora da Autora sido proposta em 11 de agosto de 2006, e o período de referência previsto pelo n.º 1, do art. 319.º, da Lei n.º 35/2004, de 29/07, fixado entre 11/02/2006 e 11/08/2006, verifica-se que esses créditos não se venceram naquele período, ou seja, no período de seis meses que antecede a data da propositura da ação de insolvência.

  6. Nessa conformidade, o ato administrativo de indeferimento do requerimento apresentado pela Autora ao abrigo do regime jurídico do Fundo de Garantia Salarial, praticado pelo Presidente do Conselho de Gestão do Fundo de Garantia Salarial, é perfeitamente legal …”.

    O Digno Magistrado do Ministério Público (MºPº) junto deste Tribunal notificado nos termos e para efeitos do disposto no art. 146.º do CPTA emitiu pronúncia no sentido do não provimento do recurso (cfr. fls. 174/175), pronúncia essa que objeto de contraditório mereceu resposta discordante da recorrente (cfr. fls. 179).

    Por despacho do Juiz Relator inserto a fls. 182 dos autos foi aberto contraditório quanto à possível utilidade/suscetibilidade de dedução de pedido de reenvio prejudicial junto do Tribunal Justiça da União Europeia (abreviadamente «TJUE») nos termos do art. 267.º do Tratado de Funcionamento da União Europeia (doravante «TFUE») (ex-art. 234.º do TCE), tendo a A. vindo manifestar expressa posição concordante com a necessidade de proceder àquele reenvio nos termos dos requerimentos de fls. 186/191 e 198/199 que, notificados, não mereceram qualquer discordância por parte do R., tendo o MºPº emitido expressa pronúncia no sentido da realização do aludido reenvio (cfr. fls. 205/205 v.

    ).

    Dispensados os vistos legais juntos dos Exmos. Juízes-Adjuntos foram os autos submetidos à Conferência.

  7. DELIMITAÇÃO DAS QUESTÕES A APRECIAR Cumpre nesta sede aferir e decidir da admissibilidade do pedido de reenvio prejudicial nos autos “sub judice” e, verificados os respetivos pressupostos, formular o competente pedido.

    I.

    Estipula-se no art. 267.º do TFUE que o “… Tribunal de Justiça da União Europeia é competente para decidir, a título prejudicial: a) Sobre a interpretação dos Tratados; b) Sobre a validade e a interpretação dos atos adotados pelas instituições, órgãos ou organismos da União. (…) Sempre que uma questão desta natureza seja suscitada perante qualquer órgão jurisdicional de um dos Estados-Membros, esse órgão pode, se considerar que uma decisão sobre essa questão é necessária ao julgamento da causa, pedir ao Tribunal que sobre ela se pronuncie. (…) Sempre que uma questão desta natureza seja suscitada em processo pendente perante um órgão jurisdicional nacional cujas decisões não sejam suscetíveis de recurso judicial previsto no direito interno, esse órgão é obrigado a submeter a questão ao Tribunal. (…) Se uma questão desta natureza for suscitada em processo pendente perante um órgão jurisdicional nacional relativamente a uma pessoa que se encontre detida, o Tribunal pronunciar-se-á com a maior brevidade possível …”.

    II.

    Em...

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