Acórdão nº 01490/09.1BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 26 de Outubro de 2012
Magistrado Responsável | Antero Pires Salvador |
Data da Resolução | 26 de Outubro de 2012 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, no Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo:I RELATÓRIO 1 . ESTADO PORTUGUÊS e AM. …, identif. nos autos, inconformados, vieram, cada um por si, interpor recurso jurisdicional da sentença do TAF do Porto, datada de 27 de Junho de 2011, que julgou parcialmente procedente a acção administrativa comum, sob forma ordinária, instaurada pela A./recorrente AM. …, declarando que o Estado Português violou o art.º 6.º, n.º 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e o art.º 20.º, ns. 1 e 4 da CRP, no seu segmento "direito a uma decisão em prazo razoável" e assim condenou o Estado Português a pagar à Autora a quantia de € 10.000,00, atribuídos a título de equidade e julgou improcedente o demais peticionado, assim como a ampliação do pedido.
* O Estado Português, nas suas alegações, formulou a final, as seguintes conclusões: 1.º Em 30 de Junho de 2003, a A. instaurou acção declarativa ordinária de responsabilidade civil extracontratual contra o Estado por prática de facto ilícito [violação do direito a uma decisão jurisdicional em prazo razoável] que corre os seus termos na 2.ª Secção da 5.ª Vara Cível do Porto, sob o n.º 3687/03.9TVPRT, pretendendo ser indemnizada por danos patrimoniais e morais que diz ter sofrido em consequência da violação desse direito.
Ora, 2.º A eventual responsabilidade civil do Estado por actos ilícitos de gestão pública, estava prevista no artigo 2.º do DL n.º 48 051, de 21 de Novembro de 1967 e actualmente no art. 12.º da Lei n.º 67/2007, de 31 de Dezembro, a qual depende da verificação cumulativa dos pressupostos da responsabilidade civil geral: o facto, a ilicitude, a imputação do facto ao lesante, o prejuízo ou dano e o nexo causal entre este e o facto.
Assim, 3.º São ilícitos os actos jurídicos que violem normas legais e regulamentares ou os princípios gerais aplicáveis e os actos materiais que infrinjam estas normas e princípios ou ainda as regras de ordem técnica e de prudência comum que devam ser tidas em consideração – art. 6º do referido DL 48 051.
Por outro lado, 4.º A CRP e a CEDH conferem aos sujeitos de uma causa perante a justiça o direito a obterem uma decisão em prazo razoável – arts. 20, nº 4, e 6º, nº 1, respectivamente.
Por sua vez, 5.º As leis de processo fixam os prazos, a forma e a ordem por que hão-de reger-se os actos que permitem o desenvolvimento do processo como instrumento dirigido à aplicação da lei substantiva nesse dito prazo razoável.
6.º Segundo doutrina do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, a concretização do conceito indeterminado de prazo razoável assenta basicamente em quatro critérios: a conduta do Estado (em sentido amplo), conduta do/a requerente, complexidade da causa e importância do litígio.
Por outro lado, 7.º Conforme repetidamente o Supremo Tribunal Administrativo vem afirmando, a violação dos preceitos legais que estabelecem prazos ordenadores ou disciplinadores da actividade processual não constitui, só por si, facto ilícito.
Pois que, 8.º A lei não se basta com uma qualquer violação ou excesso de prazo, exigindo que tenha sido posto em xeque o já referido prazo razoável, a determinar, segundo os critérios acima propostos, em face das circunstâncias concretas de cada caso.
De todo o modo, 9.º O processo não registou qualquer atraso imputável indesculpável à máquina da justiça e ao Estado que por ela é responsável; antes pelo contrário, a A. é que teve um comportamento processual assaz atípico que levou a atrasos sucessivos na marcha do processo.
Acresce que, 10.º A A. não alegou e por isso também não foi dado como provado na sentença ora ajuizada qualquer facto concreto que aponte para uma violação do prazo razoável imputável ao Estado, que possa consubstanciar a alegada responsabilidade civil do Estado por acto ilícito de gestão pública.
A não ser que, 11.º Genericamente ainda não foi proferida decisão final com trânsito em julgado.
Pese embora este facto seja verdadeiro, 12.º Este arrastar que o processo registou – sublinhe-se - deve-se apenas e tão só ao comportamento processual das partes, principalmente à A., onde compulsado o processo que dá causa a esta acção, pontua: - a inércia processual (falta de impulso processual quanto à perícia que foi realizada oficiosamente pelo tribunal a quo); - os adiamentos de diligências (maxime, em plena audiência de julgamento o mandatário da A. renunciou ao mandato); - a suspensão da instância (em que a ora A. é co-participante); e - outros incidentes a que as partes deram causa [especialmente a ora A.], e sobretudo as delongas ocasionadas com as recorrentes substituições de mandatários e de patronos oficiosos provocadas pela A. e a influência altamente perniciosa que isso teve na anormal lentidão do processo.
Na verdade, como se disse atrás, 13.º A concretização do conceito indeterminado de prazo razoável assenta basicamente em três critérios: a complexidade do processo, o comportamento das partes e o comportamento das autoridades.
Sendo que a necessidade de 14.º Uma decisão em prazo razoável não pode deixar de se articular com o direito a um processo justo e equitativo, o que convoca o concurso de um outro elemento, qual seja o da exigência de averiguação da verdade material e de ponderação da decisão.
Ora, 15.º O que se constata e resulta iniludivelmente da acção em análise é que a A. muda igualmente com frequência de advogados constituídos – alguns, aliás, de renome nacional e pública e notoriamente experientes –, por cuja outorga de mandato só ela é responsável.
Acresce que, 16.º Apesar da A. ter obtido sentença parcialmente condenatória, datada de 10 de Fevereiro de 2009, a mesma interpôs recurso [somente ela], ao qual foi fixado efeito de meramente devolutivo.
Mas, 17.º Inexplicavelmente, a A. não executou a sentença de prestação de facto positiva.
Por outro lado, 18.º Relativamente ao procedimento de apoio judiciário, incluindo a fase de impugnação judicial, a A. poderia tê-lo feito sem intervenção de advogado, devendo-se a ela a sua demora porque não efectuou o pedido correctamente e a tempo [o que também se estranha sendo a própria A., licenciada em Direito].
Em resumo, 19.º Não se verifica a comissão de qualquer ilícito por parte do Estado, cuja máquina e agentes não violaram o direito à decisão em prazo razoável.
20.º Para além de que, mesmo que se considerasse haver ilicitude, o que não se concede, não há nexo de causalidade entre a demora do processo e os danos que a A. invoca, 21.º Visto que os mesmos danos não patrimoniais aqui alegados já o haviam sido pelo menos nas Acções n.º 3.139/04.0BELSB, 2.192/07.9BEPRT, 2.718/07.8BEPRT e 423/08.7BEPRT, e voltam a sê-lo numa outra mais recentemente proposta, que tramita sob o n.º 1.966/09.0BEPRT, as quais correm os seus termos neste TAF do Porto.
Sem prescindir, 22.º E levando em linha de conta os factos provados, continuamos a entender que os danos não patrimoniais ora ajuizados não revestem objectivamente a gravidade necessária e suficiente à tutela do direito prevista no n.º 1 do art. 496.º do Código Civil.
Ainda assim e sem prescindir, 23.º Sendo que, de todo o modo e ainda assim, afigura-se-nos exorbitante o montante fixado, a esse título, atenta as últimas decisões do TEDH sobre esta matéria, em que o quantum arbitrado a título de indemnização é muito inferior ao ora fixado.
Em suma, 24.º Foram violados os art. 22.º da CRP, art. 6.º da CEDH, art. 12.º da Lei n.º 67/2007, de 31/12 e arts. 496.º, n.º 1 e 3 e 494.º ambos do CC.
25.º Nestes termos e nos mais de direito deve a sentença a quo ser revogada por outra em que se determine a absolvição do Réu-Estado Português do pedido que veio a ser condenado, em virtude de não se encontrarem preenchidos alguns dos pressupostos [ilicitude] da responsabilidade civil extracontratual do Estado, por facto ilícito".
* Por sua vez, a recorrente AM. … concluiu as suas alegações do seguinte modo: "1.
A decisão da matéria de facto sofre de deficiência, obscuridade ou contradição em relação a diversos pontos de facto, sendo imprescindível e necessária a sua alteração, ao abrigo do art.º 712º, n.º1 do C.P.C.
-
A apelante discordou das respostas aos quesitos 1º, correspondente ao 91º da petição inicial; 4º, correspondente ao 99º; 5º, correspondente ao 102º e 6º, correspondente ao 104º.
3 .
Os depoimentos das três testemunhas, que se transcreveram, permitem retirar a conclusão que existiram efectivamente interessados na aquisição do apartamento da Autora e que chegaram a oferecer o montante de 250 000,00 (duzentos e cinquenta mil) euros para aquisição do mesmo. Ainda que não se considerasse provado o montante proposto, haveria que considerar provada a existência dos interessados/proponentes na aquisição, que fundavam a expectativa da Autora poder negociar o mesmo andar.
-
Pelo que, a resposta ao quesito n.º1, correspondente ao art.º 91º da petição inicial deverá ser, no que à alínea m) do art.º 91º diz respeito: «Provado (pelo menos) que a Autora tinha ainda a expectativa de poder negociá-lo e comprar uma moradia».
-
O art.º 99º do petitório (quesito n.º4) referia-se a danos patrimoniais sofridos pela Autora, no que ao andar diz respeito, recaindo a sua razão de ser na desvalorização da habitação, quer para habitar, quer para vender.
-
Pelos depoimentos de todas as testemunhas, transcritos, foi provado em sede de audiência de julgamento a frustração da expectativa da Autora em destinar a habitação a sua residência ou vendê-la por cerca de 250 000,00 euros, para aquisição posterior de uma moradia.
-
Foram provados os melhoramentos efectuados pela Autora no seu apartamento, pelos depoimentos das testemunhas JG. … e MS. ….
-
Deverá ser alterada a resposta à alínea a) do art.º 99º, considerando «Provado que a Autora tinha a expectativa de destinar a habitação a sua residência permanente ou vendê-la por cerca de 250 000,00 euros, face aos melhoramentos que nela realizou e aos muitos interessados na sua...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO