Acórdão nº 00380/12.5BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 27 de Setembro de 2012

Magistrado ResponsávelAnabela Ferreira Alves Russo
Data da Resolução27 de Setembro de 2012
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: I - Relatório O Director-Geral da Autoridade Tributária e Aduaneira, inconformado com a sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga – que, julgando parcialmente procedente a impugnação apresentada, anulou a sua decisão de 1 de Agosto de 2011 no segmento em que determinava o acesso às contas bancárias relativamente aos anos de 2005 e 2006 - dela veio interpor o presente recurso jurisdicional, formulando as seguintes conclusões: «

  1. A sentença recorrida ao decidir anular a decisão do Recorrente relativamente ao acesso às contas bancárias do recorrido relativamente aos anos de 2005 e 2006, salvo o devido respeito e melhor opinião, não valorou correctamente o conjunto da prova produzida face aos pressupostos legais da decisão do levantamento de sigilo bancário ao Recorrido nos anos de 2005 e 2006, como não teve em conta todos os pressupostos legais de derrogação do dever de sigilo, enfermando por isso de erro de julgamento.

  2. Assente que os factos apurados que se reportam aos anos de 2005 e 2006 estão, tal como os factos referentes aos anos de 2007 e 2008, sob investigação no Inquérito nº 334/2008.61DBRG, não se vislumbra, salvo melhor razão, que o acesso à verdade fiscal do contribuinte, ao contrário do que entendeu a sentença recorrida, tenha como impedimento formal o âmbito temporal das acções inspectivas realizadas a coberto das Ordens de Serviço nº OI201101498 e nº OI201101499 se reportar aos anos de 2007 e 2008 e não o âmbito temporal do inquérito criminal suscitado por esse universo factual.

  3. No inquérito criminal, por força do disposto no nº 2 do art. 40º do Regime Geral das Infracções Tributárias (R.G.I.T.), cabem designadamente aos órgãos da administração tributária, os poderes e as funções que o Código de Processo Penal atribui aos órgãos de polícia criminal, presumindo-se-lhes delegada a prática de actos que o Ministério Público pode atribuir àqueles órgãos.

  4. E quanto aos crimes fiscais, refere a al. b), do nº 1, do art. 41º do R.G.I.T., a competência para os actos de inquérito a que se refere o nº 2 do art. 40º, presume-se delegada no director de finanças que exercer funções na área onde o crime tiver sido cometido ou no director da Direcção de Serviços de Inspecção Tributária ou no director da Direcção de Serviços de Investigação da Fraude e de Acções especiais nos processos por crimes que venham a ser indiciados por estas no exercício das suas atribuições, sem prejuízo de a todo o tempo o processo poder ser avocado pelo Ministério Público.

  5. É verdade que no presente caso, a competência para o inquérito criminal foi deferida pelo Ministério Publico à Polícia Judiciária, nos termos do art. 8º, nº 5, da Lei nº 49/2008, de 27 de Agosto (Lei de Organização da Investigação Criminal).

  6. Porém, o deferimento da competência de investigação dos crimes tributários à Polícia Judiciária não prejudica, no entanto, a cooperação da administração tributária no âmbito do processo de inquérito.

  7. É o que resulta da conjugação dos nºs 2 e 3 do art. 41º, nos termos dos quais respectivamente os actos do inquérito para cuja prática a competência seja legalmente delegada podem ser praticados pelos titulares dos órgãos e pelos funcionários e agentes dos respectivos serviços a quem tais funções tiverem sido especialmente cometidas e, se o mesmo facto constituir crime tributário ou crime comum ou quando a investigação do crime assuma especial complexidade, o Ministério Público pode determinar a constituição de equipas mistas também integradas por elementos a designar por outros órgãos de polícia criminal para procederam aos actos de inquérito.

  8. Para além de que o nº 1 do art.10º dessa Lei, por outro lado, estabelece para os órgãos de polícia criminal cooperarem mutuamente no exercício das suas atribuições.

  9. No presente caso, segundo informaria a DF de Braga, o deferimento da competência da investigação criminal à PJ não prejudicou a incumbência de a administração tributária proceder ao apuramento do imposto em falta, necessário à confirmação dos pressupostos do crime de fraude fiscal.

  10. Quando o apuramento efectuado no âmbito do inquérito dependa do acesso às contas bancárias, esse acesso segue o regime especial de derrogação do sigilo bancário constante do art. 63º- B da L.G.T..

  11. O procedimento inspectivo a que se refere o art. 63º, nº 1, da L.G.T. compreende, na verdade, não necessariamente o regulado no Regime Complementar do Procedimento de Inspecção Tributária, mas todas as diligências necessárias ao apuramento da situação tributária dos contribuintes.

  12. É o que resulta do art. 63º-B, nº 1, al. a) da L.G.T., que dispõe que a administração tributária tem o poder de aceder a todas as informações e documentos bancários, sem dependência do consentimento do titular dos elementos protegidos, quando existirem indícios de crime tributário.

  13. O acesso obtido, no presente caso, respeitou a lei em vigor, já que foi manifestamente requerido no âmbito de uma investigação criminal abrangendo os mesmos factos.

  14. Mormente, não ofende o princípio da proporcionalidade, porquanto o âmbito temporal da decisão do Director-Geral coincide com o âmbito temporal dos factos tributários detectados no Processo de Inquérito nº 334/2008.61DBRG e comunicados à administração tributária.

  15. E nessa medida não excede, antes conforma-se com o limite do princípio da proporcionalidade, também invocado pela sentença recorrida, de que o levantamento do sigilo bancário apenas pode ocorrer quando o acesso é necessário e adequado à determinação directa e exacta da matéria tributável, independentemente de essa determinação ter em vista a liquidação do imposto ou os fins de uma concreta investigação criminal pelo crime de fraude fiscal, independentemente de os seus presumíveis autores serem, ou não, arguidos no processo.

  16. Com efeito, a suspensão da caducidade a que se refere o nº 5 do art. 45º da L.G.T. abrange, na verdade, todos os factos relativamente aos quais tiver sido instaurado inquérito criminal, independentemente de os contribuintes serem ou não arguidos no processo.

  17. Ainda que assim se não entenda, o Tribunal Central Administrativo Norte, no Acórdão proferido no processo 01273/10.6BEPRT, com data de 03/02/2011, veio a consignar o entendimento de que o alargamento do acesso a contas e elementos bancários a anos anteriores ou posteriores aos anos abrangidos pela acção inspectiva tributária não ofende o princípio da proporcionalidade tutelado pelos artigos 63º-3 da L.G.T. e 7º do R.C.I.P.T. nem constitui abuso de direito, uma vez que a afectação de direitos subjectivos ou interesses legalmente protegidos do Recorrido é adequada e proporcional aos objectivos a realizar pela administração tributária, quais sejam a tributação real dos rendimentos auferidos e a repressão da fraude fiscal.

  18. Com efeito, os elementos carreados ao processo evidenciam factos concretamente identificados fortemente indiciadores da falta de veracidade do declarado que se estendem continuadamente por um período de 2005 a 2009, configurando uma conduta unitária e indivisível do Recorrido, s) Pelo que a verdade fiscal do contribuinte, ainda que respeitante aos exercícios de 2008 e 2009 só pode ser obtida através do conhecimento integral de todos os seus elementos, que seria prejudicado se a administração fiscal somente pudesse ter acesso, ainda que por razões meramente formais, a uma parte deles, ao contrário do que sustenta sentença recorrida, que procede a uma segmentação totalmente artificial dos factos que a administração fiscal pode conhecer através do acesso aos elementos protegidos bancários.

  19. Assim sendo, deve a decisão do Director-Geral da ATA que determinou o acesso às contas bancárias do Recorrido relativamente aos anos de 2005 e 2006 manter-se na ordem jurídica pois obedece aos pressupostos previstos na al. b) do nº1 do art. 63º-B da LGT e respeita integralmente o princípio da proporcionalidade.

Nestes termos e nos demais de Direito que V. Exas., Doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso jurisdicional, e em consequência, anular-se a sentença recorrida na parte que foi desfavorável ao ora Recorrente, mantendo-se a decisão de acesso às contas bancárias de que é titular o ora Recorrido relativamente aos anos de 2005 e 2006, com todas as legais consequências.».

Não foram apresentadas contra-alegações.

Neste Tribunal, o Exmo. Magistrado do Ministério Público emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

Com dispensa dos vistos legais, atenta a natureza urgente do processo [artigo 707º, nº 4 do Código de Processo Civil (CPC) e artigo 278º, nº 5 do CPPT], cumpre agora, já que a tal nada obsta, apreciar e decidir.

II – O Objecto do Recurso Como é sabido, sem prejuízo das questões que o Tribunal ad quem possa ou deva conhecer oficiosamente, é pelas conclusões com que o recorrente remata a sua alegação (aí indicando, de forma sintética, os fundamentos por que pede a alteração ou anulação da decisão recorrida: art. 690º, nº 1, do C.P.C.) que se determina o âmbito de intervenção do tribunal ad quem.

Assim, e pese embora na falta de especificação no requerimento de interposição se deva entender que este abrange tudo o que na parte dispositiva da sentença for desfavorável ao recorrente (art. 684º, nº 2, do C.P.C.), esse objecto, assim delimitado, pode vir a ser restringido (expressa ou tacitamente) nas conclusões da alegação (nº 3 do mesmo art. 684º), razão pela qual todas as questões de mérito que tenham sido objecto de julgamento na sentença recorrida e que não sejam abordadas nas conclusões da alegação do recorrente, mostrando-se objectiva e materialmente excluídas dessas conclusões, devem considerar-se definitivamente decididas e, consequentemente, delas não pode conhecer o Tribunal de recurso.

Acresce que, constituindo o recurso um meio impugnatório de decisões judiciais, neste apenas se pode...

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