Acórdão nº 0286/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 05 de Julho de 2012
Magistrado Responsável | ISABEL MARQUES DA SILVA |
Data da Resolução | 05 de Julho de 2012 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo:- Relatório - 1 – A……, com os sinais dos autos, não se conformando com o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 29 de Novembro de 2011 (fls. 90 a 93, frente e verso), que concedeu provimento ao recurso interposto pela Fazenda Pública da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, de 12 de Setembro de 2011, que julgou procedente a reclamação deduzida pelo ora recorrente contra a decisão do Chefe do Serviço de Finanças de Santarém que indeferiu o seu pedido de dispensa de prestação de garantia, anulando o acto reclamado, vem, nos termos dos artigos 280.º, n.º 1, 282.º n.º 1, 283.º e 284.º n.º 1 do Código de Procedimento e de Processo Tributário, interpor recurso para este Supremo Tribunal, por oposição com o acórdão do Tribunal Central Administrativo Sul, de 20 de Setembro de 2011, proferido no recurso n.º 0489/11 (junto a fls. 129 a 141 dos autos), formulando as seguintes conclusões: - Quanto à alegada oposição de acórdãos (alegações de fls. 100/101): 1. No acórdão recorrido, folhas 2 ponto “B”. A fundamentação.”, é identificada a questão que opõe as partes.
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A mesma questão de mérito, mereceu igual identificação, a fls. 9, 4º parágrafo do acórdão no processo nº 04989/11 do TCA Sul.
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A questão de mérito decidida em oposição nos dois acórdãos refere-se à legalidade do despacho do OEF que decide condicionar o deferimento do pedido de isenção de garantia à apresentação dos extractos bancários do executado.
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Tratando-se da mesma questão de direito bem como de uma contextualização em tudo igual nas duas situações geradores dos dois acórdãos em oposição, deverá concluir-se pela verificação dos pressupostos legais para a admissão do presente recurso.
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Dada a identidade dos dois acórdãos relativamente aos sujeitos, do objecto, da situação fáctica, do pedido e da matéria de direito em discussão.
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Porém, as soluções apresentadas nos dois acórdãos são antagónicas sem possibilidade de conciliação.
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Na penúltima folha do acórdão recorrido, último parágrafo, fica expresso “…não vimos com a referida solicitação do OEF para o executado juntar aos autos de procedimento os citados extractos bancários, possa ser ilegal…” 8. Enquanto que o acórdão proferido no âmbito do processo 04989/11 do TCA SUL refere, a folhas 12 (penúltima folha), 3º parágrafo, “Ora, tal parece-nos absolutamente ilegítimo, na consideração de que, em face da ordem jurídica existente, o levantamento do sigilo bancário dos cidadãos é um procedimento limitado e, por regra, sujeito à autorização judicial, excepção feita aos casos elencados no nº1, do art. 63.º-B, da LGT”.
Termos em que, se julga ter demonstrado a existência de oposição entre o Acórdão de que se recorre e o TCA Sul no processo nº 04989/11 de 20 de Setembro de 2011, na medida em que o primeiro entende pela legalidade do despacho do OEF e o segundo entende pela sua ilegalidade tratando-se de idêntica situação de facto e de direito.
- Quanto ao mérito do recurso (alegações de fls. 112/118): 29. A questão controvertida centra-se no juízo de legalidade ou ilegalidade do despacho do órgão de execução fiscal, que fundamenta o indeferimento do pedido de isenção de garantia em processo executivo por falta de oferecimento dos extractos bancários.
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Note-se, que a motivação apresentada para o indeferimento do pedido de isenção da garantia, não resulta de qualquer falta de apresentação de provas pelo executado mas porque este não apresentou os extractos das suas contas bancárias.
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Na perspectiva do recorrente, o despacho do OEF é manifestamente ilegal, violador de basilares direitos com consagração constitucional.
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O direito de reserva à vida intima e privada na vertente do sigilo bancário tem consagração constitucional, pelo que a sua derrogação apenas poderia ocorrer ou voluntariamente ou por instrumento legal devidamente sopesado com os princípios constitucionais.
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Tal instrumento legal inexiste. Logo nos termos da lei e da constituição essa exigência do OEF, é ilegal e inconstitucional bem como o despacho que inviabiliza a dispensa da garantia pois expressamente indefere por considerar em falta, a produção da prova ilegalmente exigida.
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O OEF não pode indeferir o pedido como fez, motivado na falta de apresentação dos extractos bancários ilegalmente exigidos, em jeito de retaliação, dado que os elementos que exige, não constituem causa para o indeferimento da pretensão formulada pelo contribuinte.
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O indeferimento de pedido de isenção de garantia em processo executivo com fundamento na falta de junção de elementos não obrigatórios, não pode valer na ordem jurídica.
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O recorrente discorda em absoluto com a posição assumida no douto acórdão recorrido, para mais ainda, pela referência ao artigo 64º nº1 da LGT, como fortalecedora da posição da AT.
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Esta norma refere-se ao sigilo profissional sobre elementos de natureza pessoal obtidos em procedimento.
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O “procedimento” tem de revestir sempre a forma legal em obediência ao princípio da legalidade norteador de qualquer conduta da AT.
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O litígio que opõe o aqui recorrente à decisão vertida no douto Acórdão, tem justamente a ver, com a legalidade ou não do procedimento operado pela AT.
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Qualquer referência ao artigo 64.º nº 1 da LGT com o objectivo de sustentar a violação de direitos fundamentais constitui uma subversão interpretativa da norma.
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Constituindo ainda o cerne de questões ancestrais de direito sobre a violação de direitos fundamentais invocando a existência de normas protectoras, de acção posterior, sobre essa violação.
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Questões, que já mereceram consenso, no sentido do ordenamento não as permitir.
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Como tal, a violação ou o afastamento de qualquer direito fundamental seja qual for a situação só pode ser realizado através de lei.
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Inexistindo lei, que exija para o deferimento de um pedido de isenção de garantia, extractos bancários, não pode existir interpretação legal ainda que reflectida em decisão judicial, que determine a exigência de extractos bancários sob pena de, a não serem juntos, ser o pedido de isenção de garantia indeferido.
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A desproporcionalidade entre o prejuízo causado a direitos do executado protegidos constitucionalmente não seria de todo aceitável, não apenas pela incerteza do benefício do resultado da verificação dos extractos bancários; 46. Como ainda, porque, mesmo presumindo que da violação desses direitos resultaria a certeza (a qual seria sempre impossível) para o deferimento ou indeferimento da isenção de garantia, o eventual benefício extraído dessa informação seria completamente irrelevante (deferimento ou indeferimento do pedido) face ao prejuízo realizado num direito maior do executado.
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Reiteramos, a violação desses direitos do executado nunca de modo algum resultariam numa certeza da verdade quanto à verificação ou não dos pressupostos para a apreciação do pedido de isenção de garantia.
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O Estado de Direito não se coaduna com visões unidireccionais, de um presente que não aprende com a história, desagregadoras do ordenamento jurídico e da sociedade que regulam.
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No sentido do que se vem defendendo, veja-se a decisão vertida no acórdão fundamento, que curiosamente foi proferida no âmbito da...
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