Acórdão nº 0180/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 05 de Julho de 2012

Magistrado ResponsávelFERNANDA MAÇÃS
Data da Resolução05 de Julho de 2012
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: I- RELATÓRIO 1.

O A………, S. A., identificado nos autos, credor reclamante nos autos de execução fiscal nº. 1848200101003453, em que é executado B………, arguiu, no Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel, a nulidade de todo o processado nestes mesmos autos de execução fiscal, que foi julgada procedente, anulando-se o acto da venda.

  1. Inconformada, a Fazenda Pública veio interpor recurso para este Supremo Tribunal formulando as seguintes conclusões das suas alegações: A. Nos autos em referência a douta sentença recorrida julgou a anulação de venda procedente com base na consideração de que “estamos perante uma nulidade susceptível de afectar o acto de venda e que leva à sua anulação nos termos dos artigos 201°, n°1 e 909°, n°1, alínea c), do CPC e do art. 257°, n°1, alínea c), do CPPT”.

    1. Ressalvado o respeito devido, que é muito, não se conforma a Fazenda Pública com a decisão proferida, por ter sido efectuada errada aplicação do direito aos factos, uma vez que a omissão da notificação ao credor com garantia real não constitui nulidade nos termos exarados na douta sentença e a venda não foi em exclusivo beneficio do exequente.

    2. Atentando no primeiro dos aspectos, os fundamentos de direito invocados, radicam na nulidade da venda derivada da tutela do credor hipotecário, por falta de notificação do despacho a ordenar a venda por negociação particular, nos termos dos artigos 886°-A, nº 4 (corresponde ao actual n° 6, com a redacção do Artigo 1° do Decreto-Lei n.° 226/2008, de 20 de Novembro), 909°, n° 1, alínea c) e 201°, todos do CPC.

    3. As formalidades necessárias, e suficientes, de publicitação (conhecimento, notificação) da venda por negociação particular em processo de execução fiscal, são as previstas, de modo especial, no n° 3, do artigo 252°, do CPPT — as quais não foram alegadas como omitidas nestes autos.

    4. A jurisprudência do STA tem sustentado que o CPPT regula de modo suficiente os termos da venda executiva, pelo menos no que respeita à fase de negociação particular, pelo que, as normas do CPC — artigos 886°-A, n° 6 (anterior n°4), 909°, n° 1, alínea e) e 2010 — não serão aplicáveis no processo de execução fiscal, face ao preceituado no n° 3 do artigo 252°, n° 3 do CPPT.

    5. Com a devida vénia permitimo-nos estribar a posição aqui defendida no Acórdão do STA de 28-03-2007, tirado no processo 026/07, em que se afirma ter sido opção do legislador excluir do processo de execução fiscal a audição do credor com garantia sobre a modalidade da venda e consequente notificação da decisão, o mesmo acontecendo com a necessária aceitação, do dito credor, no caso de negociação particular, do comprador ou do preço, atentas as características da execução fiscal.

    6. No aresto citado considerou-se que, em vista do interesse público e celeridade processual, o legislador fiscal regulou integral e imperativamente os regimes da modalidade da venda (ditos artigos 248°, 252.° e 255.° do CPPT) e do valor base dos bens (artigo 250.° do mesmo diploma), pelo que, falecendo o requisito da omissão previsto no artigo 2.° do CPPT, as normas do Código de Processo Civil relativas à notificação da decisão sobre a venda ao credor com garantia sobre os bens a vender — artigo 886.°-A, n.° 4 — e à audição do credor com garantia real sobre o comprador e apreço de venda por negociação particular — artigo 904°, alínea a) - não são subsidiariamente aplicáveis ao processo de execução fiscal.

    7. Em sentido equivalente, relativamente ao artigo 886°-A, n° 4, do CPC, por razões idênticas, o acórdão deste STA de 17-12-2003, no processo n°01951/03.

      I. Se no tocante à venda por negociação particular existe maior uniformidade de posições, quanto à venda executiva por propostas em carta fechada, reconhece-se existir certa divisão na jurisprudência desse Alto Tribunal, como salienta o Procurador-Geral Adjunto no STA, no Ac. do STA de 03-11-2010, processo n.° 0244/10: “A jurisprudência deste Supremo Tribunal a respeito da questão objecto do recurso encontra-se dividida. Enquanto os acórdãos de 30/04/2008, processo n.° 117/08; de 14/07/2008, processo n.° 222/08; de 2/04/2009, processo n.° 805/08 e de 22/04/2009, processo n.° 146/09, entenderam que no processo de execução fiscal tem aplicação supletiva o disposto no artigo 886°-A do CPC, nos acórdãos de 17/12/2003, processo 1951/03; de 28/03/2007, processo n.° 26/07; de 28/11/2007, processo n.° 662/07 e de 4/11/2009, processo n.° 686/09 entendeu-se não haver lugar àquela aplicação supletiva”.

    8. Alinhamos pelo segundo entendimento, de que o CPPT regula a questão, sem necessidade de recurso às normas supletivas do CPC, tal como aliás, entende Jorge Lopes de Sousa, in CPPT anotado e comentado, 2007, Volume II, nota 4 ao artigo 148°, pág. 540.

    9. Relativamente à farta de notificação da venda judicial mediante propostas em carta fechada, regulam os Art.° 248° e 249°, dedicando-se este último à publicidade da venda, ora, tendo em conta que o CPPT regula esta matéria de forma completa, não prevendo a notificação dos credores com garantia real, não ocorre qualquer violação do disposto no Art.° 886°-A do CPC, na medida em que a lei especial afasta a aplicação da regra geral aí prevista.

      L. Encontrando-se cumprido o formalismo prescrito no Art.° 249° do CPPT, não era de notificar o requerente, até porque esta tinha sido tempestivamente citado nos termos do Art.° 239°, e, esta citação aos credores com garantia real tem por função “permitir-lhes acompanhar a praça, além de reclamarem os créditos respectivos, para poderem providenciar para que não ocorra uma degradação do preço da venda e, em consequência a insolvabilidade do crédito.” (transcrição parcial da anotação 11, ao Art.° 239°, Jorge Lopes de Sousa, Código de Procedimento e Processo Tributário, Anotado, 3ª Edição, Vislis, 2003).

    10. No que concerne ao facto de o requerente não ter sido ouvido sobre a venda por negociação particular, a argumentação que a nosso ver refuta a sua posição é em tudo idêntica à acima exposta, sendo que o artigo do CPPT que em especial regula esta matéria é do 252°, cujo cumprimento foi integralmente observado, com a opção pela única modalidade pertinente para a alienação de bens imóveis: a negociação particular (neste sentido se pronunciou o STA, no acórdão tirado no processo 0173/05, de 16-03-2005).

    11. Finalmente, no que se refere ao valor que serviu de base à venda por negociação particular, o Art.° 250º do CPPT prescreve uma regra própria para a determinação de tal valor sendo que nos termos do douto aresto citado na conclusão M. supra, cabia ao órgão de execução fiscal estabelecer o preço mínimo, ou mesmo não o estabelecer.

    12. A factualidade dada como provada na douta sentença é insusceptível de ser enquadrada no Art.° 201° do CPC, dado que não ocorreu a prática de qualquer acto que a lei não admita ou a omissão de um acto ou de uma formalidade que a lei prescreva, e, P. não sendo de aplicação subsidiária o regime do CPC previsto nos artigos 886°-A, n° 6, 909°, n° 1, alínea c) e 201°, não podia ter-se julgado verificada a omissão determinante da nulidade que acarretou a anulação do acto de venda.

    13. No que concerne ao ultimo dos aspectos focados na conclusão B. destas alegações, tendo em vista o interesse público subjacente aos processos executivos e o princípio da estabilidade das vendas, a que se refere o douto Acórdão n° 77/02 do Tribunal Constitucional, ainda mais impressivo no domínio da venda em processo de execução fiscal, dada a conveniência que ela tem para incentivar potenciais compradores a fazerem aquisições neste tipo de processo executivo, conforme se depreende do estipulado no art° 257° do CPPT, a anulação das vendas, adjudicações, remições ou pagamentos já efectuados, subordinar-se-á ao regime do n°10 do art. 864° do CPC, ou seja, a venda ou adjudicação só será anulada, quando a Fazenda Pública tenha sido a exclusiva beneficiária.

    14. Nos termos da alínea a) do n.° 1 do artigo 165.° do CPPT, “são nulidades insanáveis em processo de execução fiscal (...) a falta de citação, quando possa prejudicar a defesa do interessado” e de acordo com o n.° 4 do mesmo artigo 165°, “as nulidades mencionadas são de conhecimento oficioso e podem ser arguidas até ao trânsito em julgado da decisão final”.

    15. Sob a epígrafe “Citação dos credores preferentes e do cônjuge”, o artigo 239.° do CPPT dispõe, no seu n.° 1, que “Feita a penhora e junta a certidão de ónus, serão citados (...) relativamente aos bens penhorados (...), sem o que a execução não prosseguirá”.

    16. O n.° 10 do artigo 864.° do CPC estabelece, porém, que “a falta das citações prescritas tem o mesmo efeito que a falta de citação do réu, mas não importa a anulação das vendas, adjudicações, remições ou pagamentos já efectuados, dos quais o exequente não haja sido exclusivo beneficiário”.

    17. Quer dizer os efeitos da falta de credor com garantia real, e o indevido prosseguimento da execução sem serem efectuadas as citações aqui referidas tem os efeitos previstos no artigo 864°, n.° 10, do CPC, conjugado com o artigo 165°, n.° 1, alínea a), do CPPT.

      V. Então, aquela falta de citação tem os mesmos efeitos que a falta de citação do executado, mas não importa a anulação das vendas, adjudicações, remições ou pagamentos já efectuados das quais o exequente não haja sido o exclusivo beneficiário.

    18. Não há qualquer razão que possa justificar que em execução fiscal o comprador dos bens mereça menor protecção do que a que merece o comprador dos bens em execução comum, porquanto é idêntico o objectivo legal de promover a venda e o seu respectivo rendimento, na linha do qual estará a diminuição dos casos de risco de anulação do acto em que o comprador hão seja interessado.

      X. Na verdade, o alcance desta disposição será o de afastar a aplicabilidade da norma em causa, permitindo a anulação da venda, nos casos em que o adquirente é o próprio exequente, casos estes em que não estão em jogo interesses de...

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