Acórdão nº 0909/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 19 de Setembro de 2012

Magistrado ResponsávelVALENTE TORRÃO
Data da Resolução19 de Setembro de 2012
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1.A Fazenda Pública veio recorrer da decisão do Mmº Juiz do TAF de Aveiro, que julgou procedente a reclamação deduzida por A……, SGPS, SA, contra a decisão do órgão da execução fiscal que lhe indeferiu o seu pedido de constituição de garantia da dívida exequenda e do acrescido, no montante global de 1.645.326,06 euros, por meio de fiança prestada por A’……, SGPS, SA, apresentando, para o efeito, alegações nas quais conclui: 1ª). Vem o presente recurso interposto da douta sentença que julgou procedente a reclamação de atos do órgão de execução fiscal deduzida contra o despacho proferido em 0410412012, pelo órgão de execução fiscal, no âmbito do processo de execução fiscal n.° 3441201201004875, que corre termos no Serviço de Finanças da Feira 2 e que indeferiu a prestação de garantia para efeito de suspensão da execução através de fiança, por inidoneidade da mesma; 2ª). O despacho reclamado concluiu que tal pedido merecia indeferimento, por considerar que a garantia assim oferecida (fiança) não consubstancia uma garantia que proporcione o necessário grau de liquidez, atendendo, quer à prossecução do interesse público da regular cobrança dos tributos devidos ao Estado, quer ao facto do valor monetário que lhe está subjacente não ser realizável de forma certa e célere, em sede da respetiva execução, não sendo assim a fiança uma garantia idónea; 3ª). A douta sentença recorrida julgou então a presente reclamação procedente, com a consequente anulação do despacho reclamado, por entender que o mesmo se encontrava inquinado pelo vício de violação de lei, sustentando tal conclusão nas considerações constantes da transcrição de extrato do douto acórdão proferido pelo STA de 14/03/2012, proferido no processo n.° 0208/12; 4ª). Contrariamente ao sentenciado, e com o devido respeito que nos merece a fundamentação expendida pelo Venerando Tribunal superior, perfilha a Fazenda Pública o entendimento, já defendido na sua contestação, de que não padece o ato controvertido de qualquer ilegalidade, sofrendo a sentença recorrida de erro de julgamento de direito; 5ª). Vejamos, o artigo 52.° da LGT, nos seus nºs 1 e 2, permite a suspensão da cobrança da prestação tributária efetuada no processo de execução fiscal nos casos de reclamação graciosa ou impugnação judicial da liquidação desde que acompanhada da prestação de garantia idónea nos termos das leis tributárias; 6ª). Por sua vez, o artigo 169.° do CPPT condiciona a suspensão da execução à constituição de garantia, em conformidade com o artigo 195.° do mesmo diploma, à sua prestação, nos termos do disposto no artigo 199°, também do CPPT, ou à penhora em bens suficientes para garantir o pagamento da dívida exequenda e respetivo acrescido; 7ª). Especifica este último preceito que a garantia a prestar deverá ser idónea, consistindo em garantia bancária, caução, seguro-caução ou qualquer meio suscetível de assegurar os créditos da Fazenda Pública; 8ª). No n.° 1 do artigo 199.° do CPPT, o legislador enuncia expressamente os três tipos de garantia que a Administração Tributária terá de aceitar como idóneas: garantia bancária, caução, seguro- caução, terminando, no entanto, a redação desse n.° 1 com um conceito aberto “qualquer meio suscetível de assegurar os créditos do exequente”, que importa então concretizar; 9ª). Concretização essa, no nosso entendimento, que acontece logo de seguida, no nº 2 desse mesmo preceito “a garantia idónea referida no número anterior poderá consistir, ainda, a requerimento do executado e mediante concordância da Administração Tributária, em penhor ou hipoteca voluntária”; 10ª). E no n.° 4 acrescenta uma última situação passível de integrar o conceito de garantia idónea “vale como garantia para os efeitos do n° 1 a penhora já feita sobre os bens necessários para assegurar o pagamento da dívida exequenda e acrescido ou a efetuar em bens nomeados para o efeito pelo executado”; 11ª). A redação do artigo 199º do CPPT define então com exatidão os tipos de garantia aceitáveis; 12ª). No n.° 1 refere especificamente a garantia bancária, a caução e o seguro-caução, e acrescenta o conceito aberto, não para mostrar que se trata de uma configuração meramente exemplificativa (se assim fosse, seria desnecessário o nº 2, pois a hipoteca e o penhor seriam incluídas no nº 1 por qualquer intérprete que prosseguisse a leitura com mais exemplos de garantias), mas para dizer que além destes três tipos existem outros, que o legislador especifica nos números seguintes; 13ª). Ou seja, entendemos, ao contrário do entendimento vertido na sentença recorrida, que o n.° 2 e o n.° 4 do artigo 199.° do CPPT, serviram para o legislador especificar, então, o que se entende por “qualquer meio suscetível de assegurar os créditos do exequente”, 14ª). Desde logo porque em ambos os números é feita referência ao n.° 1: quer no nº 2, onde se diz que “a garantia idónea referida no número anterior poderá consistir, ainda”, quer no n.° 4, dizendo que “vale como garantia para efeitos do n.° 1”; 15ª). Entendendo nós que aquele “ainda” só pode significar “para além da garantia bancária, caução e seguro-caução”, sendo ilógico e contraditório entender como “para além de todos os meios suscetíveis de assegurar os créditos do exequente”, onde já se incluiriam o penhor e a hipoteca que o legislador de seguida repetia; 16ª). O quadro então definido é de tipificação das garantias atendíveis, com um tratamento diferenciado que se justifica pela posição da Administração Tributária em relação a cada uma: - garantia bancária, caução e seguro-caução, estando a Administração Tributária vinculada à sua aceitação, sempre que o valor assegure o cumprimento da obrigação; - penhor e hipoteca voluntária, mediante concordância da Administração Tributária, e; - penhora, por atuação da Administração Tributária na constituição da garantia; 17ª). Pelo que concluímos não ser de incluir a fiança como uma garantia admitida pelo legislador nos exatos termos em que preceituou no artigo em análise; 18ª). Porém, sem prescindir, e caso se considere ser de improceder este entendimento da Fazenda Pública, importa então analisar se, admitidas outras garantias que não as elencadas do artigo 199.° do CPPT, a fiança se inclui como uma garantia idónea em sede de execução fiscal com vista à suspensão do processo executivo, desde que preenchidos os demais requisitos; 19ª). Entendemos que não, pois, a configuração legal no que a esta matéria concerne, parece indiciar uma justificada preferência, atribuída pelo legislador às garantias com maior grau de liquidez, que melhor asseguram o cumprimento da obrigação, como acontece com a garantia bancária, caução e seguro-caução; 20ª). Com a utilização da expressão “garantia idónea”, pretende-se então significar que nem todas as garantias serão sempre adequadas e que a indicação exemplificativa dos meios de garantia bancária, caução ou seguro-caução, antes da alternativa “qualquer meio suscetível de assegurar os créditos do exequente”, tem de entender-se como uma restrição pretendida pelo legislador dos demais meios que poderão enquadrar-se no conceito de garantia idónea; 21ª). Isto é, a lei aponta preferencialmente para certos tipos de garantia, dos quais se evidencia a vinculação de um concreto bem ou valor à segura realização da dívida exequenda, precavendo a indiferenciação ou depreciação inerente a outros modos de garantir e, dentre os valores concretos, aqueles que pela sua natureza financeira tenham imediata ou mais rápida conversão em receita, como a garantia bancária, caução ou seguro-caução; 22ª). Do disposto no n.° 2 do artigo 199.° do CPPT, decorre que a Administração Tributária, expondo a falta de idoneidade da garantia concretamente apreciada, poderá recusá-la, uma vez que o critério pelo qual se há de aferir da idoneidade, diante dos preceitos legais aplicáveis, é o de que, para funcionar como garantia, a lei sugere que o meio concretamente oferecido terá de incidir sobre bens ou valores suficientes para assegurar o pagamento da dívida exequenda e respetivo acrescido em tempo útil; 23ª). O que implicará sempre um ato de avaliação ou apuramento do valor da garantia concretamente oferecida ou dos bens sobre que esta incida, sempre numa perspetiva de adequação ao montante do crédito do exequente e de mais fácil realização do crédito; 24ª). Também por isso a exigência de idoneidade para garantia da dívida e acrescido terá de ser colocada em busca da mais fácil e imediata realização do crédito e de ser, diretamente proporcional ao quantitativo em causa, afastando qualquer suscetibilidade de variação ou indefinição dos valores em que traduza; 25ª). Uma garantia apenas se pode considerar idónea caso, vindo a verificar-se o incumprimento por parte do devedor original, a entidade garante possa assegurar o pagamento da dívida ao credor em tempo útil, pois decorre da exigência estabelecida no n.° 2 do artigo 200.° do CPPT que essa liquidez se deve verificar no prazo de 30 dias; 26ª). De facto, sendo a expressão “garantia idónea” um conceito impreciso indeterminado, confere-se ao órgão competente para a direção do processo o poder de apreciar, no caso concreto, a adequação do meio oferecido para assegurar a cobrança efetiva da dívida exequenda, abrindo, apenas neste ponto, uma margem de discricionariedade à Administração, e na falta de uma definição legal, pode afirmar-se que o conceito de idoneidade depende da capacidade de, em caso de incumprimento do devedor e da correspondente necessidade de a executar, assegurar a efetiva cobrança dos créditos garantidos, devendo sempre ser balizado pelo interesse público da regular cobrança dos tributos legalmente devidos ao credor tributário e que se encontram em cobrança coerciva; 27ª). Na verdade, a arrecadação da receita fiscal, já em fase de cobrança coerciva, implica a realização, no processo de execução fiscal, do princípio da efetividade da tutela Judicial do...

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