Acórdão nº 12095/01.5TJLSB-B.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 15 de Novembro de 2012

Magistrado ResponsávelPEDRO MARTINS
Data da Resolução15 de Novembro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo assinados: Em Agosto de 2002 o Banco “A”, SA, requereu execução no valor de 10.297€ contra “B” e mulher (= executados), pedindo a realização de várias diligências com vista à penhora de bens, que foram ordenadas por despacho de 23/09/2002, tendo-se apenas conseguido penhorar bens móveis no valor de 300€. Em 22/10/2010, o exequente requereu a realização de novas diligências, que foram ordenadas por despacho de 17/11/2010, sem resultado útil.

A 17/03/2011, o exequente apresentou o seguinte requerimento (transcreve-se apenas no essencial): “[…] tendo sido notificado dos docs. de fls. 56 a 71 vem, atento o que dos mesmos consta e [o] que mais dos autos consta, e uma vez que […] não tem conhecimento da existência de bens ou valores penhoráveis pertencentes aos executados, requerer, ao abrigo do disposto nos arts. 287.º/e) e 919.º/1 parte final do CPC, na sua versão anterior aos Decs. Lei 38/03, de 08/03 e 199/03, de 10/09, se digne ordenar a remessa dos autos à conta, por impossibilidade e inutilidade superveniente da lide, com custas a cargo dos executados, uma vez que foi o mesmo quem deu causa à presente execução, de harmonia, aliás, com a jurisprudência do STJ, maxime, constante do ac. de 17/06/2010, e o ac. do TRP de 15/11/2004, ambos disponíveis em www.dgsi.pt”.

Perante este requerimento foi, em conclusão aberta a 11/10/2011, proferido o seguinte despacho: “Salvo o devido respeito por opinião diversa, não me parece que haja motivo para a remessa dos autos de execução à conta com custas a cargo do executado.

Tal remessa apenas poderia ocorrer caso o executado tivesse pago a quantia exequenda, ou tivesse sido declarada falido.

Efectivamente, a instância executiva só se toma inútil com o pagamento da quantia exequenda e das custas da execução, pois só nesse momento se alcança o objectivo de tal instância - o que não sucedeu ainda.

Por outro lado, o facto de não se conseguir apurar da existência de bens do executado não determina a impossibilidade da lide, visto que desde logo não está afastada a possibilidade de futuramente averiguar que o executado tem bens penhoráveis capazes de garantir o pagamento da quantia exequenda e custas da execução. A insuficiência do activo para satisfação do passivo apenas tem como consequência, a meu ver, a extinção de uma execução quando é declarada a insolvência do executado, nos termos do art. 88.° do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, por acarretar a impossibilidade superveniente da lide. Sem a declaração de insolvência, entendo não haver fundamento para ser imputada ao executado a responsabilidade das custas do processo de execução, no ponto em que os mesmos estão.

Finalmente, e visto que o impulso da lide cabe, em última análise, à exequente, entendo que na falta de impulso, deverão os autos aguardar nos termos dos arts. 51.º/2b) do Código das Custas Judiciais e 285.° do Código de Processo Civil, ficando a cargo do autor-exequente o risco de insucesso da providência requerida — no caso, a cobrança coerciva de um crédito -, sendo certo que antes de ser proposta uma determinada providência judicial, cabe a quem a requer averiguar se a mesma pode ser bem sucedida.

Por todo o exposto, indefiro o requerido pela exequente.

Aguardarão os autos que a exequente requeira o que tiver por conveniente, sem prejuízo do disposto no art. 51.º/2b) do CCJ e no art. 285.° do CPC.

O exequente vem recorrer desta decisão – para que seja revogada e deferido o requerido, ordenando-se a remessa dos autos à conta, para liquidação -, terminando as alegações do seu recurso com as seguintes conclusões (que agora se sintetizam minimamente): 1. Com o disposto no art. 51.°/2, alínea b), do CCJ, pretende-se prevenir a inércia da parte motivada por negligência ou desleixo, ou seja, pela falta de exigível diligência.

  1. A prática de acto processual adequado e oportuno interrompe o prazo consignado naquelas disposições legais.

  2. Não se conhecendo outros bens ou valores aos executados, para além dos logo indicados no requerimento executivo, o único comportamento processual útil da exequente é, como o fez, requerer a remessa dos autos à conta, para liquidação, assim o recorrente requereu que se ordenasse a remessa dos autos à conta, por impossibilidade e inutilidade superveniente da lide, com custas a cargo do executado uma vez que foi o mesmo quem deu causa á presente execução.

  3. Como bem salientou recentemente o STJ no recurso 43-A/1999.L1.S1, da 6ª Secção, ac. de 17/06/2010: “(...) Perante a demonstração da inexistência de bens penhoráveis (ou a impossibilidade da sua detecção), deixa de fazer sentido a acção executiva, que tem como objecto o cumprimento de uma obrigação pecuniária, através da execução do património do executado. Consequentemente, não existindo bens para ser penhorados, deverá a instância ser julgada extinta por impossibilidade da lide, porque se tornou impossível a obtenção de mais bens para a cobrança do crédito. (...) Quando a instância se extinguir por impossibilidade ou inutilidade da lide, as custas ficam a cargo do autor, salvo se a impossibilidade ou inutilidade resultar de facto imputável ao réu, que neste caso as pagará — art. 447.º do CPC. No caso concreto, não podem restar dúvidas que foram os executados que deram causa à execução, na medida em que não procederam ao pagamento da quantia exequenda. Por isso também é imputável aos executados a remessa dos autos à conta, por não lhe serem encontrados bens penhoráveis, quando a exequente procura obter a satisfação coerciva do seu crédito. Daí que as custas devam ser pagas pelos executados. De outro modo, a exequente seria duplamente penalizada, por não ver satisfeito o seu crédito e por ter de suportar os encargos para tentar obter a sua satisfação. O que não é razoável”.

  4. Deveria, pois, o Sr. juiz a quo ter deferido o pedido formulado pelo exequente, da remessa dos autos à conta, para liquidação.

  5. Ao indeferir o requerido, o Sr. juiz a quo violou, por erro de interpretação e de aplicação, os arts 287.° e 919.° do CPC.

    Não foram apresentadas contra-alegações.

    * Questões que cumpre solucionar: se a falta de bens conhecidos pode ser causa de inutilidade da execução e por isso de extinção da mesma e nesse caso por conta de quem é que devem ficar as custas: do exequente ou do executado? * Os factos a considerar são aqueles que resultam do relatório que antecede.

    * Antes de 1997 Antes da reforma de 1995/96 do CPC, um autor pronunciava-se expressamente no sentido de que a impossibilidade ou inutilidade superveniente não se aplicava às execuções: Lopes Cardoso, Manual da acção executiva, cuja última edição data, salvo erro, de 1964, com aditamentos efectuados em 1968 para o pôr de acordo com a alteração de 1967 do CPC, que dizia (pág. 673 da edição de 1987 da INCM): “Impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide, de que é exemplo típico falecer uma das partes em acção de divórcio, não se concebe que possa verificar-se relativamente à execução”. No ac. do TRP de 17/04/2007, publicado na CJ.2007.II, págs. 186/188, esta citação (agora da 3ª edição, mas da mesma página 673) tem antes o seguinte teor: “A impossibilidade ou inutilidade superveniente da lide pressupõe a ocorrência de um facto, posterior à entrada em juízo da acção, que extingue os direitos e obrigações cuja existência se discute na acção. Assim, numa acção declarativa, se a obrigação é cumprida, a lide torna-se inútil porque já não há que definir direitos nem obrigações. Ora, na acção executiva não se discutem direitos nem obrigações: o que se pretende é a reparação efectiva de um direito que já se encontra definido (art. 4.º, nº. 3). Por isso, se a obrigação exequenda foi cumprida, a lide não se torna inútil porque a execução alcançou o seu fim. E se a obrigação exequenda não foi cumprida, então a lide não perdeu utilidade porque a execução ainda não atingiu o seu objectivo”.

    Daquilo que era dito por Anselmo de Castro, n’A acção executiva singular, comum e especial, Coimbra editora, com edições publicadas entre 1970 e 1977 - pág. 257 da edição de 1970, ou seja: “Se a condição do pagamento de toda a [a parte sublinhada foi substituída por “integral da” na edição de 1977, pág. 260, segundo transcrições que são feitas da mesma] obrigação exequenda se não verifica, a execução não pode ser declarada extinta e subsistirá aberta até esse pagamento ser feito, por penhora e venda de novos bens, ou do executado, ou de outros co-obrigados à dívida; característica diferenciadora do processo de execução e lógica exigência de que sirva ao fim para que é instituído: a integral satisfação do credor, como a outros propósitos ficou assinalado” - tirava-se igual posição.

    O ac. do TRP de 17/04/2007, referido acima, diz que no mesmo sentido ainda ia José João Baptista, Acção executiva, Universidade Lusíada, 1988, pág. 192.

    Outros autores, ao falarem das causas de extinção das execuções não se referiam à impossibilidade ou inutilidade superveniente [caso, por exemplo, de Lebre de Freitas, A acção executiva, Coimbra Editora, 1993, pág. 291, que dizia: “podem, finalmente, dos casos de extinção da instância (em geral) indicados no art. 287, verificar-se na acção executiva a deserção (art. 291; cf. art. 285), a transacção (com alcance paralelo ao da desistência do pedido) e a falta de preparo inicial”] e por isso considerava-se que tinham o mesmo entendimento.

    E por isso toda (salvo erro) a jurisprudência acompanhava esta posição, apesar de, por exemplo, Castro Mendes, A acção executiva, AAFDL, 1980, ter uma posição que se podia considerar contrária a esta: “Entre as formas previstas no art. 287, não é possível o compromisso arbitral e a confissão; as outras parece que são possíveis […]”.

    * A reforma de 1995/96 Em 1995/96 (a revisão ao CPC introduzida pelo DL 329-A/95, de 12/12, com as alterações do Dec. Lei 180/96, de 25/09 – aqui, como de seguida, foram tidas em...

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