Acórdão nº 563-B/2002.L1-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 26 de Junho de 2012
Magistrado Responsável | LUÍS ESPÍRITO SANTO |
Data da Resolução | 26 de Junho de 2012 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa ( 7ª Secção ).
I – RELATÓRIO.
Requereu D.
inventário por óbito de J. e mulher B.
, falecidos em 25 de Março de 1998 e 25 de Maio de 1998, respectivamente, que eram pai e madrasta do requerente.
Foi nomeada cabeça de casal M.
, a qual prestou juramento e declarações conforme fls. 60 a 61.
Veio a cabeça de casal apresentar a relação de bens de fls. 64, donde constam, como activo, um automóvel, a nua-propriedade de um imóvel e o respectivo recheio e, do lado passivo, o direito de usufruto vitalício sobre o mesmo imóvel em favor de M.
.
Juntou o testamento de fls. 65 a 66, donde consta : “ No dia dezasseis de Fevereiro de mil novecentos setenta e oito, na Secretaria Notarial do Funchal, perante mim ( … ) compareceu B. ( … ) a qual declarou : Que é casada segundo o regime de separação de bens com J. e que não tem descendentes, sendo também falecidos os seus ascendentes.
Assim, lega à sua afilhada M., solteira, consigo residente, todo o recheio ( móveis e utensílios ) que à hora da sua morte existir dentro da sua residência. ( …) “.
Juntou o testamento de fls. 67 a 68, donde consta : “ Aos vinte e nove dias do mês de Julho de mil novecentos e setenta e seis, na Secretaria ( … ) compareceu a outorgante B., ( … ), casada com J. , no regime imperativo de separação de bens, filha de… .
( … ) Disse que faz seu o testamento por forma que segue : Que constitui herdeira universal de todos os seus bens, direitos e acções, sua afilhada M., solteira, maior, com ela residente. ( … ) “.
Juntou o testamento de fls. 69 a 70, donde consta : “ Aos oito do mês de Fevereiro de mil novecentos e noventa e seis, no … Cartório Notarial do Funchal, perante mim ( … ) compareceu J. ( … ) Disse : Que é casado em regime imperativo de separação de bens com B. em segundas núpcias e tem um filho do seu primeiro casamento.
Que revogo qualquer testamento anteriormente feito nomeadamente o que fez em dezanove de Agosto de mil novecentos e setenta e seis, lavrado a folhas noventa e três verso no livro dezassete deste Cartório.
Que por conta da sua quota disponível lega à sua afilhada M. o usufruto vitalício do seu prédio urbano situado ao…, com todo o seu recheio e que é a casa da sua residência. Que a sua afilhada é solteira e residente na referida morada ( … ) “.
Após a realização de conferência de interessados foi dada a forma à partilha nos seguintes termos : “ Procede-se a inventário por morte de J. e B..
Para a forma à partilha importa atender ao seguinte : 1 – Os inventariados faleceram, respectivamente, em 25 de Março de 1998 e 25 de Maio de 1998.
2 – Eram casados um com o outro em segundas núpcias e segundo o regime de separação de bens.
3 – A inventariada deixou dois testamentos : um instituindo M. herdeira universal de todos os seus bens, outro legando-lhe todo o recheio da sua residência.
4 – O inventariado deixou testamento pelo qual lega, por conta da quota disponível, usufruto vitalício sobre o prédio com todo o seu recheio.
5 – Existe passivo.
6 – O inventariado deixou um filho do seu primeiro casamento.
7 – A inventariada não deixou ascendentes nem descendentes.
Assim, deve proceder à partilha do seguinte modo : Somam-se os valores de todos os bens relacionados acrescido do aumento proveniente das licitações e subtrai-se o passivo aprovado.
Herança de J..
Divide-se em três partes iguais, constituindo uma delas a quota disponível. As restantes constituem a legítima, sendo, por sua vez dividida em duas partes iguais, cabendo metade ao cônjuge sobrevivo e a outra metade ao filho do inventariado.
Por força da herança de J. dar-se-á pagamento ao legado que instituiu, na certeza de que, se o valor deste exceder a quota disponível, poderá o herdeiro legitimário lançar mão do mecanismo legal previsto no artigo 2164º do Código Civil. Se, pelo contrário, não a esgotarem, atribuir-se-á o que remanescer ao herdeiro legitimário do interessado.
Herança de B..
A inventariada instituiu a M. sua herdeira universal por testamento de 1976.
A considerar ainda o legado do recheio da sua residência.
A composição dos quinhões deverá ser feita atendendo às licitações e ao acordado na conferência de interessados.
O passivo deverá ser pago por ambos os interessados na proporção dos respectivos direitos. “.
( fls. 176 ).
Nesta sequência foi elaborado o mapa de partilha de fls. 178 a 179.
Veio a cabeça de casal M.
apresentar o requerimento de fls. 180 a 181, alegando essencialmente que para poder decidir sobre a bondade ou não do funcionamento da cautela sociniana, é indispensável determinar e fazer constar do Mapa de Partilha o valor do usufruto, não sendo, sem isso, possível verificar se a legítima subjectiva do reclamante foi atingida com o legado do usufruto.
Conclui requerendo que nas operações de partilha do respectivo mapa seja referido o valor do legado de usufruto a favor da ora reclamante.
Foi proferido despacho a fls. 182 deferindo o requerido.
Nesta sequência, procedeu-se ao cálculo do direito ao usufruto relativamente à verba nº 10, considerando-se a propriedade plena com o valor de € 50.000,00 ; o usufruto com o valor de € 15.000,00 ( 40% ) e a nua propriedade com o valor de € 35.000,00 ( cfr. fls. 183 ).
Seguidamente veio o interessado D.
, na sua qualidade de herdeiro legitimário de J.
e tendo em conta que a quota disponível é igual a 1/3, ou seja, 33,333…, sendo inoficioso o legado por ofender a legítima do herdeiro legitimário, ao abrigo do disposto no artº 2164º do Código Civil, oferecer à legatária M.
, em substituição do legado do usufruto, a quota disponível do inventariado.
Notificada, veio a cabeça de casal M.
responder, a fls. 185 a 187, alegar que o legado não ofende a legítima do herdeiro legitimário, uma vez que o valor do usufruto é de € 15.000,00, portanto menor do que o quinhão da legatária, que é de € 34.000,00.
Respondeu o interessado D.
pugnando pelo indeferimento do requerido ( cfr. fls. 188 ).
Foi proferido o despacho de fls. 191 a 192, nos seguintes termos : “ Elaborado o mapa de partilha vieram os interessados pronunciar-se sobre o carácter inoficioso, ou não, da liberalidade do inventariado a favor de M..
Resulta dos autos que : O inventariado deixou testamento pelo qual lega, por conta da quota disponível, usufruto sobre o prédio com todo o seu recheio.
A quota indisponível da herança do inventariado J. tem o valor de € 17.000,00.
Foi feito o cálculo do valor do usufruto : 40% - € 15.000,00 ( cfr. fls. 472 ).
Conforme ensina Lopes Cardoso (in Partilhas Judiciais, Volume II, 4ª edição, pag. 404) importa distinguir se a liberalidade foi feita a estranhos ou a herdeiros legitimários: ali pode haver excesso da parte disponível do inventariado, aqui excesso da quota do respectivo interessado.
Ora, in casu, tratando-se de legado a favor de estranho, o mesmo deverá ser imputado na quota disponível do testador. Assim, afigura-se-nos que em face dos cálculos efectuados o legado do usufruto a M. ( que vale € 15.000,00 ) não é inoficioso, uma vez que não ultrapassa o valor da quota disponível do testador ( € 17.000,00 ).
Pelo exposto, e sem necessidade de tecer quaisquer outras considerações, atendendo ao que fica dito, deverá ser alterado o mapa de partilha, nos termos requeridos a fls. 480. “.
Veio o interessado D.
apresentar o requerimento de fls. 193, onde referiu que existe um erro no mapa de partilha já que 40% de 50.000,00 não são 15.000,00, mas sim 20.000,00. Pede a respectiva rectificação.
Foi proferido o despacho de fls. 196, datado de 31 de Março de 2011, nos seguintes termos : “ No mapa elaborado para a determinação no valor do usufruto elaborado pela secção consta o seguinte : propriedade plena - € 50.000,00 ; usufruto 40% - € 15.000,00 ; Nua propriedade - € 35.000,00.
Verifica-se, assim, que existe um erro de cálculo já que 40% de 50.000,00 não são 15.000,00 mas sim 20.000,00. Trata-se de erro de cálculo ou de escrita que pode, e deve, ser rectificado.
Consequentemente, nos termos do disposto no artº 667º nº 1 do CPC ordena-se a rectificação do valor do usufruto que é o de € 20.000,000 e não de € 15.000,00 como erradamente foi escrito no mapa de partilha elaborado pela secção. “.
Procedeu-se a novo cálculo, rectificando-se os valores em conformidade com o ordenado.
Foi proferido o despacho de fls. 202, datado de 30 de Junho de 2011, nos seguintes termos : “ Corrigido o valor do usufruto legada à interessada M., cumpre retirar as conclusões do cálculo feito.
Conforme se disse no despacho datado de 22 de Fevereiro de 2011, importa distinguir se a liberalidade foi feita a estranhos ou a herdeiros legitimários : ali pode haver excesso da parte disponível do inventariado, aqui excesso da quota do respectivo interessado. Ora, in casu, tratando-se de legado a favor de estranho, o mesmo deverá ser imputado na quota disponível do testador. Assim, afigura-se-nos que em face dos cálculos efectuados, o legado do usufruto a M. ( que vale € 20.000,00 ) é inoficioso uma vez que ultrapassa o valor da quota disponível do testador ( € 17.000,00 ).
Consequentemente, nos termos do disposto no artigo 2164º do Código Civil, o herdeiro legitimário tem a faculdade de cumprir o legado ou entregar ao legatário tão somente a quota disponível.
Pelo exposto, declara-se inoficioso o legado do usufruto e defere-se a requerida substituição do legado pela quota disponível do inventariado. “.
Apresentou a cabeça de casal recurso desta decisão, o qual foi admitido como de agravo ( cfr. fls. 204 ).
Juntas as competentes alegações, a fls. 1 a 10, formulou a agravante, as seguintes conclusões :
-
O inventariado J.
, faleceu em 1998, no estado de casado em segundas núpcias dele, primeiras dela, deixou testamento, feito em 1996, onde legou à ora requerente o usufruto vitalício do prédio urbano, com o seu recheio, o qual é a residência da legatária.
-
Interessados na herança eram, então, (1) a viúva B. , (2) o filho único D.
, ambos herdeiros legitimários – art....
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