Acórdão nº 168/10.8TVLSB.L1-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 23 de Outubro de 2012

Magistrado ResponsávelCONCEIÇÃO SAAVEDRA
Data da Resolução23 de Outubro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa.

I- Relatório: JJG e mulher, TPF, vieram propor contra CFM, S.A.

, acção declarativa de condenação sob a forma ordinária, invocando, em súmula, que tendo adquirido um imóvel em…, outorgaram, para o efeito, em 2006, um contrato de financiamento com a … no valor de € 65.000,00 e um financiamento “multi-opções” no valor de € 35.000,00, aderindo obrigatoriamente a um contrato de seguro de grupo celebrado entre a C... e a R. seguradora de que a primeira era beneficiária, com capital equivalente ao total mutuado, cobrindo o risco de morte e invalidez absoluta e definitiva. Mais referem que na vigência do contrato, em Agosto de 2007, foi diagnosticado à A. mulher uma linfangioleimiomatose, conhecida por “Doença de Lam”, que se traduz numa obstrução brônquica muito grave e insuficiência respiratória parcial, conferindo-lhe uma IPP de 80% e deixando-a incapaz para o exercício de qualquer actividade remunerável e para as actividades da vida diária. Porém, tendo accionado o seguro referido, a R. considerou que a patologia que esteve na origem do pedido já fora diagnosticada antes da celebração do contrato, tendo havido declarações inexactas e sendo nulas as garantias do contrato, pelo que nega o pagamento da indemnização respectiva. Sustentam os AA. que o contrato é válido, sendo que a intervenção cirúrgica a que a A. fora sujeita em 1997, e se esqueceu de referir quando subscreveu o seguro dado que fazia uma vida normal, nada tem que ver com a patologia diagnosticada em Agosto de 2007. Mais referem que a R. continua a receber os valores mensais relativos ao prémio do seguro, o que desde 1.9.2008 se cifra em € 6.904,03€ Concluem, pedindo a condenação da R. a pagar: à C... o valor que vier a apurar-se ser devido à data do trânsito em julgado da sentença e que no momento da propositura da acção se cifrava em € 96.934,46; aos AA. o montante de € 6.904,03 a título de prestações pagas indevidamente desde 1.9.2008 até ao presente e vincendas até trânsito em julgado da sentença; e ainda aos AA. o montante de € 3.000,00 a título de honorários devidos ao mandatário (art. 447-D do C.P.C.).

Contestou a R., impugnando em parte o alegado e defendendo, em síntese, que a A. T, aquando das declarações prestadas no contrato de adesão, faltou à verdade sobre aspectos relevantes da sua saúde, pois já sofria necessariamente os sintomas da enfermidade que justificaram o accionamento posterior do seguro, omitindo que tinha sido sujeita a uma intervenção cirúrgica e respectivos tratamentos. Refere, ainda, que a mesma A. não se encontra necessitada da assistência de terceira pessoa, pelo que não se verifica a previsão da Apólice. Mais invoca que se a R. tivesse tomado conhecimento de quaisquer dos factos omitidos pela A. não aceitaria o seguro sem previamente exigir que lhe fossem dados a conhecer os relatórios de exame de diagnóstico e da cirurgia ou a realização de exames complementares, e jamais aceitaria a cobertura de risco de invalidez pelas doenças reveladas. Conclui que as omissões e as falsas declarações tornam nulas as clausulas do contrato de seguro em questão, pelo que nada tem a pagar, devendo ser absolvida do pedido.

Os AA. apresentaram réplica, impugnando a matéria de excepção deduzida e terminando como na p.i..

A convite do Tribunal, vieram os AA. suscitar o incidente de intervenção provocada da…, o qual foi admitido por despacho de fls. 153.

Uma vez citada, veio a interveniente apresentar o seu articulado a fls. 159 a 161, pedindo, para o caso de ser reconhecido o direito dos AA., seja a R. seguradora condenada a pagar à C... o valor do capital seguro à data do sinistro, com juros acrescidos desde a citação.

Foi proferido despacho saneador e procedeu-se à selecção da matéria de facto, elaborando-se Base Instrutória.

Realizada a audiência de discussão e julgamento e fixada a matéria assente, foi proferida sentença que decidiu: “Julgo a presente acção totalmente improcedente e, em consequência, absolvo os réus do pedido”.

Inconformados, recorreram os AA. da sentença, culminando as alegações apresentadas com as seguintes conclusões que se transcrevem: “ 1. Vem a presente apelação da douta sentença de fls. 385 e seguintes que julgou improcedente o pedido dos AA, porquanto, decidiu ser nulo o contrato de seguro (ramo vida) celebrado entre as partes e assim absolveu a R…, SA” do pagamento à …do capital mutuado que na data do trânsito da sentença viesse a apurar-se ser devido e bem assim dos valores das prestações pagas indevidamente desde 01.09.2008.

  1. A sentença recorrida absolveu a R. do pedido e decidiu, muito em síntese, que no momento da subscrição do contrato de seguro a Apelante mulher omitiu factos que viciaram a “segurado com exuberância…”, uma vez que, tendo subscrito o contrato de seguro em Novembro de 2006, não referiu o facto de ter sido sujeita a uma nefrectomia (extração de um rim), em 1997.

  2. Em Agosto de 2007 a Apelante mulher foi diagnosticada com a Doença de Lam, que se traduz numa obstrução brônquica muito grave e insuficiência respiratória parcial, conferindo-lhe uma IPP de 80% (em 09.05.2008 – cfr. fls. 67 dos autos) encontrando-se a partir dessa altura incapaz para o exercício de qualquer actividade remunerável.

  3. Da “fundamentação da decisão de facto” de fls. 382 e 383 não resulta qualquer explicação sobre a resposta restritiva oferecida ao ponto 1º da douta b.i., pelo que, os Apelantes desconhecem por que razão o Mmo. Juiz a quo considerou provado que a adesão ao contrato de seguro referido em D. dos factos assentes foi condição da aprovação e concessão do crédito aludido em B. dos factos assentes e não também do aludido em C.

  4. Do mesmo modo que, quanto à resposta ao ponto 10º da douta b.i. se desconhece porque veio afinal o Mmo. Juiz a quo a dar por provado que, “se a R. conhecesse o estado de saúde da A. não teria aceite a cobertura do risco da invalidez resultante de doenças dessa natureza”. Na verdade, o que resulta da “fundamentação”, ainda que não direcionado exclusivamente ao referido facto, é precisamente o contrário, senão vejamos: “...consoante a eventual gravidade da doença que motivou a nefrectomia, a seguradora avaliaria a oportunidade de segurar o risco.” (Cfr. fls. 382 in fine).

  5. Jamais poderia ter sido dado por provado o questionado no ponto 10º da douta b.i. quando se concluiu no sentido de que a R. ainda iria avaliar a oportunidade de segurar o risco.

  6. Não aceitam os Apelantes a decisão do Mmo. Juiz a quo a fls. 381 dos autos ao dar por não provado o ponto 4º, nem as respostas positivas e restritivas dos pontos 6º, 7º e 8º todos da douta b.i.. Com efeito, 8. O que consta e resulta de fls. 244 dos autos, documento que terá determinado o Mmo. Juiz a quo a dar por não provado o questionado no ponto 4º da douta b.i., só quando relacionado com a doença que foi diagnosticada pouco mais de 6 (seis) meses após ter contratado o seguro com a R. é que assume relevância. Com efeito, sinais de cansaço como os que foram relatados PELA MÃE DA APELANTE (note-se o que ali consta sobre a presença da mãe nessa e na consulta seguinte, cf. ainda pp. 62, 72 do ANEXO A) ao médico de família no centro de saúde da Pontinha, não suscitaram ao mesmo, que conhecia os antecedentes clínicos da Apelante, a necessidade de sujeitar a mesma a nada mais do que a meros exames de rotina, questionando-se ainda sobre a ansiedade...

  7. Não pode ser com base no que se encontra anotado a fls. 244 dos autos que será de dar-se por não provado o questionado no ponto 4º da douta b.i. quando, conforme resulta do relatado pelas pessoas que diariamente privavam com a Apelante (cfr. transcrições a pp. 6 e 7 das presentes alegações que aqui se dão por reproduzidas), a mesma fazia a sua vida de forma normal e sem sobressaltos.

  8. Naturalmente que, conforme também explicou a testemunha SS, o diagnóstico da Apelante foi precedido de sintomatologia associada ao cansaço, que se foi revelando de forma insipiente (Cfr. pp. 43 do ANEXO A às presentes alegações)... No entanto, essa sintomatologia, não fosse o diagnóstico conhecido em Agosto de 2007, não deixaria de ser comum à maioria dos que trabalham árdua e afincadamente, com responsabilidades de organização e chefia de pessoas, como era o caso da Apelante (Cfr. fls. 66 dos autos, a que o Mmo. Juiz não fez qualquer referência).

  9. Como parece evidente, caso a Apelante não fizesse, em data anterior a Novembro de 2006, a sua vida e o exercício da sua profissão com normalidade, achar-se-iam nos autos as provas das baixas médicas que por força da sua incapacidade anormal se teriam que verificar.

  10. As testemunhas da Apelante responderam com transparência, clareza e objetividade, pelo que não se afiguram quaisquer razões de facto para que o Mmo. Juiz a quo tivesse desconsiderado, como desconsiderou, os respetivos depoimentos.

  11. Por tudo é que o ponto 4º da b.i. deve ser tido por provado.

  12. Perguntava-se nos pontos 6º a 8º, respetivamente se, “A doença de que a A. padece tem uma evolução progressiva desde há vários anos, anterior a Novembro de 2006?”, “Existindo correlação entre a doença que motivou a nefrectomia e a doença que levou à incapacidade da A.?”, “Em Novembro de 2006 a A. padecia de doença crónica, com sintomas de falta de ar e de momentos de aflição?” 15. O que resulta de fls. 216 dos autos é que em julho de 2007 a Apelante mulher tinha dispneia de esforço há dois anos. Sendo certo que, no ano de 2006 o que sentia e foi relatado pela sua mãe ao médico de família foi ter sintomas de cansaço.

  13. O que o Mmo. Juiz a quo fez, salvo o devido respeito, foi responder a questões reportadas a Novembro de 2006 com base em relatos médicos conclusivos posteriores. Os Apelantes não negam que a tarefa de possuir um olhar distanciado do cenário atual e que se conheceu em Agosto de 2007 exige uma abstração e compreensão da vida da Apelante mulher difícil de alcançar naquele período de finais do ano de...

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