Acórdão nº 1128/09.7YXLSB.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 18 de Outubro de 2012

Magistrado ResponsávelMARIA MANUELA GOMES
Data da Resolução18 de Outubro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa: Relatório.

  1. O Ministério Público intentou a presente acção declarativa, sob a forma de processo sumário, contra o Banco, S.A., pedindo a declaração da nulidade de cláusulas constantes de formulários de contrato de crédito ao consumo utilizados pelo R. no exercício da sua actividade, e a sua condenação na abstenção de tal utilização, de acordo com o disposto no Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro.

    Alegou, em síntese, que o R. tem insertas nos seus formulários relativos a contratos de adesão, mais concretamente contratos denominados de “Crédito Pessoal”, cláusulas que lhe permitem, através do funcionamento de contas solidárias, obter o pagamento de dívidas por parte de pessoas alheias aos contratos de crédito celebrados e ainda cláusulas que lhe permitem a resolução do contrato de forma arbitrária e desproporcional, designadamente em face da verificação de certos eventos ou circunstâncias, algumas das quais totalmente alheias àquele, como por exemplo a execução por outra dívida, perante “quaisquer sinais objectivos de deterioração substancial da situação económica ou financeira do mutuário”, etc… Citado, o R. contestou, pugnando, em síntese, pela razoabilidade de tais cláusulas, pela sua interpretação conforme à lei, designadamente em face da confiança necessariamente estabelecida entre as partes.

    Logo de seguida, em sede de saneador, o tribunal, considerando estar já de posse de todos os elementos necessários, julgou a acção procedente e condenou o réu Banco, S.A., a: - reconhecer a nulidade das cláusulas 4ª e 9ª, n.º 1, alíneas a), b), c), d), e), g), h) e i) e nº 2 do clausulado intitulado “Crédito Pessoal”,utilizado nos contratos de crédito ao consumo que celebra; - abster-se de se prevalecer das mesmas cláusulas em contratos já celebrados e de as utilizar em contratos que de futuro venha a celebrar; - a, no prazo de vinte dias, publicar esta sentença em dois dos jornais diários de maior tiragem editados em Lisboa e no Porto, durante três dias consecutivos, em anúncios de tamanho não inferior a 1/4 de página.

    Inconformado, apelou o Banco réu.

    Alegou concluindo, em síntese, que: - As cláusulas contratuais impugnadas deviam ter sido interpretadas de acordo com o disposto nos artigos 237º e 239º do C. Civil – de harmonia com a vontade das partes, prevalecendo nos negócios onerosos, em caso de dúvida, o entendimento que conduzir ao maior equilíbrio – logo, consideradas válidas na medida em que a compensação se opere sobre valores de que o mutuário é titular em contas conjuntas ou colectivas solidárias.

    - Obtida/dada a autorização prévia (expressa) dos demais titulares da conta conjunta a declaração constante das cláusulas em causa tem necessariamente que ser interpretada como válida.

    - Se vingasse o entendimento expresso na sentença recorrida, seria impossível o débito (ou o crédito) de quaisquer quantias em contas solidárias, porquanto passaria a ser necessário averiguar permanentemente a quem pertencia o valor nelas depositado.

    - No que respeita à cláusula 9ª, havendo elementos de facto que permitam objectivamente ao credor (o Banco) recear pela satisfação dos seus créditos é perfeitamente legítimo que este exija ao sujeito devedor o cumprimento antecipado das obrigações resultantes do contrato, à semelhança do que se prevê (art. 780º do C. Civil) e /ou o dever de substituição ou reforço de hipoteca (art. 701º do mesmo Código).

    - No comércio e práticas bancária é normal, e comummente aceite a existências de cláusulas de “cross-default”, podendo as partes convencionar que o incumprimento de determinado contrato tenha como efeito o incumprimento de outros, que vigorem entre as partes.

    - Ao desconsiderar estes aspectos e declarar nulas as cláusulas em apreciação sem ater à rationem de cada uma, a sentença recorrida desequilibra o contrato a favor do devedor, violando a boa fé contratual e interpretando erradamente o regime previsto na LCCG.

    - No que toca à publicidade, esta terá efeitos directos e imediatos sobre a imagem do Banco e gerará distorções em termos de concorrência com outras instituições bancárias que têm/tenham cláusulas idênticas às que o tribunal considerou nulas.

    - O registo da sentença no serviço próprio criado pelo DL nº 220/95 acautela o interesse público da publicitação, interesse esse que fica igualmente satisfeito pela impossibilidade do Banco usar ou se prevalecer das cláusulas em causa nas relações com os seus clientes.

    - A publicidade da decisão recorrida deve, assim, ser revogada por ser desproporcionada e violar sem fundamento o direito ao bom-nome e imagem do Banco.

    Terminou pedindo a revogação da sentença e a sua absolvição do pedido.

    O Ministério Público contra alegou pugnando pela manutenção do decidido.

    Colhidos os vistos, cumpre decidir.

    Matéria de Facto.

  2. A decisão recorrida deu como provados os seguintes factos: A) O Réu tem por objecto social a actividade bancária, podendo praticar todas as operações legalmente permitidas aos bancos e pode participar noutras sociedades, de objecto igual ou diferente do seu, mesmo que regidas por leis especiais, bem como em agrupamentos complementares de empresas.

    1. No exercício de tal actividade, o Réu procede à celebração de acordos escritos intitulados “Crédito Pessoal” através dos quais...

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