Acórdão nº 3744/06.0TBCSC.L1-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 18 de Setembro de 2012

Magistrado ResponsávelGOUVEIA DE BARROS
Data da Resolução18 de Setembro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa O Ministério Público, em representação do menor I. R, nascido em …-2005, propôs a presente acção de regulação do exercício das responsabilidades parentais contra os respectivos progenitores C. M.

e N. M.

alegando, em síntese, que os requeridos viveram juntos cerca de ano e meio, mas encontram-se separados de facto e não estão de acordo sobre a forma de exercer o “poder paternal”, residindo o menor com a mãe.

Designada data para realização de conferência de pais, não se logrou chegar a qualquer acordo, tendo sido fixado um regime provisório que atribuiu a guarda do menor à mãe, fixou um regime de visitas ao pai e ainda o pagamento de uma pensão de alimentos a cargo deste – cfr. acta de fls. 13 e 14.

Ordenou-se a realização de inquéritos sociais, os quais se encontram juntos a fls. 86 e ss (mãe e menor) e 91 e ss (pai) e, já no decurso da audiência, foi ordenada a realização de perícias de personalidade aos progenitores, menor e avós maternos.

Discutida a causa, foi proferida sentença cuja parte dispositiva determinou o seguinte: 1.

  1. O menor fica entregue à guarda e cuidados de seu pai, com quem residirá, sendo o respectivo poder paternal exercido pelo pai, sem prejuízo deste manter a mãe informada relativamente a questões de particular importância para a vida do menor.

  2. O menor só poderá viajar para fora do País na companhia do pai ou de quem este determinar.

    1. a) A mãe poderá ter o filho em sua companhia de 15 em 15 dias, indo para o efeito buscá-lo a casa do pai no Sábado, pelas 11:00, e entregá-lo na casa do pai no Domingo pelas 18:00.

  3. O menor passará os dias 24, 25 e 31 de Dezembro e 01 de Janeiro, alternadamente, com cada progenitor.

  4. No dia de aniversário do menor este poderá tomar uma refeição principal com a mãe.

  5. O menor poderá ainda passar o dia de aniversário da mãe e o dia da mãe na companhia desta, desde que não haja prejuízo para as suas actividades escolares.

  6. O menor poderá passar 15 dias de férias no verão na companhia da mãe, a qual deverá comunicar ao pai até 30 de Abril de cada ano qual o período que pretende utilizar. Na falta de acordo, e mantendo-se a mãe desempregada, o pai tem preferência. Se a mãe começar a trabalhar, e na falta de acordo, nos anos pares escolhe o pai e nos anos ímpares escolhe a mãe.

    1. A mãe contribuirá para alimentos do seu filho menor com a importância mensal de €150,00 (cento e cinquenta euros), que entregará ao pai até ao dia 8 de cada mês mediante transferência bancária, cheque ou vale postal.

      Tal quantia será actualizada todos os anos em Janeiro de acordo com o índice de inflação determinado pelo INE, sendo a primeira actualização em 2011.

      *** Inconformada, apelou a requerida C.M. para pugnar pela revogação da sentença, alinhando para tal as seguintes razões com que encerra a alegação oferecida: 1. O Tribunal ordenou a realização de relatório social e perícias psiquiátricas a ambos os progenitores.

    2. Ordenou igualmente que a requerida, ora recorrente, se submetesse a análises clínicas de despiste de consumo de estupefacientes.

    3. A requerida recusou ser submetida às mesmas pelos motivos aduzidos em sede própria.

    4. Após a audiência de discussão e julgamento em que a Mma Juiz, face à recusa da requerida, afirmou quem não deve não teme e porque de facto, nada tinha a temer, decidiu submeter-se, motu próprio, às análises clínicas que nada acusaram.

    5. Por requerimento datado de 15 de Julho de 2008 veio a ora recorrente comunicar ao Tribunal que não se opunha à perícia psiquiátrica.

    6. O Tribunal ordenou a sua realização e a perícia foi agendada para os dias 13 e 20 de Agosto de 2008.

    7. Sucede porém que, a requerida, foi notificada para comparecer à supra mencionada perícia na morada errada, sendo certo que comunicou atempadamente tal alteração aos autos, facto, aliás, reconhecido pelo Tribunal a quo.

    8. Ademais, quando a notificação da perícia ao menor foi devolvida o mandatário da requerida foi notificado e informou o Tribunal do requerimento com a alteração de morada que já tinha sido junto.

    9. Pelo que, não pode deixar de se estranhar que o Tribunal a quo, ao justificar o lapso, afirme não ter detectado a alteração do domicílio porque a comunicação é feita na segunda página de um requerimento da requerida.

    10. Como se a culpa fosse da requerida! 11. Não obstante, está sobejamente demonstrado que a requerida, apenas porque não teve conhecimento da data agendada, não compareceu.

    11. Acresce que, ao invés da notificação da data agendada para o julgamento ou da perícia ao menor, que foi comunicada ao advogado da requerida a data agendada para a perícia não foi.

    12. Pelo que, nada há de “curioso” em ter comparecido à audiência de julgamento de 5 de Maio de 2008, como se afirma na douta sentença recorrida. Compareceu à audiência porque o seu mandatário foi notificado no seu domicílio profissional tendo previamente falado com a sua constituinte.

    13. Devidamente notificada veio posteriormente a requerida, ora recorrente pronunciar-se, requerendo o agendamento de nova data invocando a nulidade da notificação.

    14. No entanto, apreciando a questão prévia, na douta sentença recorrida a Mmª Juiz de Direito, não reconhecendo a nulidade da notificação invocada, indefere o pedido de nova marcação por entender que os autos reuniam já todos os elementos necessários à decisão e já havia decorrido demasiado tempo.

    15. Sucede porém que, nem os autos reúnem todos os elementos, nem o decurso do tempo pode ser imputado à requerida.

    16. Os autos têm um relatório social aos requeridos, uma perícia psicológica ao menor e uma perícia psicológica ao pai deste, destinada a aferir das suas capacidades parentais. Não tem qualquer perícia à requerida.

    17. A perícia a que o Tribunal a quo se refere não passa de uma mera entrevista com os progenitores, por ocasião da avaliação pedopsiquiátrica feita ao menor.

    18. No entanto, dessa entrevista resulta apenas uma análise superficial dos progenitores, até porque o visado dessa análise era o menor.

    19. E é com base nos relatórios sociais, na entrevista aos progenitores, aquando da perícia ao menor, e da perícia ao recorrido que o Tribunal decidiu.

    20. Ora, a requerida não foi avaliada com base em critérios científicos nem submetida a testes susceptíveis de avaliar as suas competências parentais com algum rigor, ao invés do recorrido que foi sujeito a uma perícia com vista a responder a três quesitos: Se padece de doença do foro psíquico que determine a incapacidade para cuidar do menor, se tem capacidades parentais e se existem indícios de manipulação psicológica do menor.

    21. Perícia essa que teve por métodos uma pesquisa documental, um estudo biográfico, exame clínico e psicopatológico (baseado em entrevistas e na observação) e uma avaliação instrumental com a aplicação dos instrumentos a que se refere o relatório de Fls … e seguintes. Cfr Fls ….

    22. Pelo que, fica a recorrente numa posição de inferioridade face ao recorrido até porque, reitera-se, a perícia ao recorrido foi tida em conta na decisão.

    23. De igual modo o argumento de que os autos não podem aguardar mais tempo não colhe quando o Instituto de Medicina Legal remeteu aos presentes autos a informação da não comparência da recorrente à perícia em … de 2008.Cfr Fls … 25. Sendo que o Tribunal apenas em 18 de Janeiro de 2010 notifica a recorrente do despacho de … de 2010, onde se conclui: constata-se que a progenitora não revela interesse/vontade em fazer a perícia ordenada não podendo os autos aguardar mais tempo pelo que determino o prosseguimento dos autos sem a perícia à progenitora que aliás acaba por ser analisada na perícia ao menor. Cfr Despacho de Fls _, de …/2010.

    24. Não obstante o Tribunal a quo ter posteriormente retirado essa conclusão acaba por decidir que a perícia não é afinal importante.

    25. Ademais, demorou o Tribunal mais de um ano a comunicar à recorrente que havia faltado a uma perícia cuja data desconhecia por não ter sido notificada pelo que, dificilmente será legítima a conclusão que aquela não pode agora realizá-la porque os autos têm que prosseguir, não podendo aguardar mais tempo.

    26. Sobretudo quando se decide do destino de uma criança que é retirada à mãe com quem sempre viveu.

    27. E uma vez que o relatório da perícia ao recorrido data de Março de 2009 seguramente que não foi a recusa inicial da recorrida que atrasou a realização da sua perícia.

    28. Ora, tratando-se de um lapso do Tribunal que não notificou a requerida na morada que esta atempadamente comunicara, a recusa à perícia requerida e inicialmente ordenada pelo Tribunal a quo viola o princípio da igualdade das partes consagrado no art.º 3ºA do C.P.C 31. E viola porque foi o próprio Tribunal a quo a entender que a perícia era relevante para a decisão.

    29. O princípio da igualdade das partes é uma concretização do princípio da igualdade consagrado no art.º 13º da CRP e assenta na ideia de que cada uma das partes deve situar-se numa posição de plena igualdade perante a outra e ambas devem ser iguais perante o Tribunal.

    30. Assim, cumpre ao Tribunal assegurar, com isenção, ao longo do processo, um estatuto de igualdade substancial das partes, designadamente no uso dos meios de defesa, o que, salvo o devido respeito, não aconteceu.

    31. Sendo verdade que, nos encontramos perante um processo de jurisdição voluntária em que o Tribunal não está vinculado a um critério de legalidade estrita, está sujeito ao princípio da equidade que manifestamente viola com a recusa de agendamento da perícia.

    32. Por todo o exposto verifica-se a nulidade da notificação da perícia e bem assim, da violação do art.º 1410º do CPC e art.º 3.º A do mesmo diploma em consequência do art.º 13º da CRP, devendo a douta sentença proferida ser revogada e ordenada a perícia à ora recorrente.

    33. A douta sentença recorrida foi proferida sem que o Exmo. Magistrado do Ministério Público emitisse parecer e não obstante os motivos aduzidos sempre se dirá que o actual Magistrado do Ministério...

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