Acórdão nº 2408/10.4TVLSB.L1-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 25 de Setembro de 2012
Magistrado Responsável | LUÍS ESPÍRITO SANTO |
Data da Resolução | 25 de Setembro de 2012 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
Acordam os Juízes do Tribunal da Relação de Lisboa ( 7ª Secção ).
I – RELATÓRIO.
Intentou F. Ld.ª, com sede em Lisboa, a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinário, contra o réu Banco S. SA, com domicílio profissional na sede em Lisboa.
Alegou, essencialmente, que : Tendo a autora, em Janeiro de 2007, um passivo bancário de € 4.949.788,59, celebrou com o réu três contratos de permuta de taxa de juro, nos quais se modificaram sucessivamente as condições em que os juros dos mútuos se encontravam negociados, vindo a autora ser injustamente penalizada a partir de Outubro de 2008 com a baixa das taxas de juro, tudo se devendo às complexas cláusulas negociais previstas no último negócio celebrado, as quais, por isso, eram ininteligíveis para a autora, para além que a evolução das taxas de juro era facto previsível e do conhecimento do réu, que não obstante propôs e levou a autora a negociar a gestão da taxa de juro com fortes penalizações acaso, a taxa de juros baixasse a partir de certo limite, como veio a acontecer, provocando graves prejuízos à autora. O réu violou vários deveres que o oneram aquando da formação do negócio, desde o de caracterizar o tipo de cliente que é a autora, ao especial dever de esclarecimento e de informação, circunstância que determinou que a autora houvesse celebrado o negócio em erro sobre o seu objecto, o que nos termos do art.251º do Código Civil determina a sua anulação, com a consequente restituição do que foi prestado e ainda a indemnização por danos.
Concluiu pedindo que se declare nulo o Contrato de Permuta de Taxa de Juro celebrado entre Autora e Réu em 10 de Março de 2008, com a consequente restituição das partes à situação em que se encontravam antes da celebração de tal contrato e concomitante restituição dos fluxos recebidos de parte a parte, ou seja, com a restituição pela Autora ao Réu de € 6.133,33 e com a restituição pelo Réu à Autora de € 183.400,10; a condenação do réu a indemnizar a autora por danos patrimoniais em montante a liquidar em execução de sentença correspondente aos juros vencidos e vincendos, acrescido de emolumentos, comissões e imposto de selo decorrentes do referido contrato de financiamento com o réu celebrado em 10 de Novembro de 2009 ; e a condenação do réu a indemnizar a autora no montante de € 25.000,00 por danos não patrimoniais.
Citado, veio o Réu impugnar a factualidade apresentada pela A. e concluir pela improcedência da presente acção.
Procedeu-se ao saneamento dos autos conforme fls. 77 a 93.
Realizou-se audiência de julgamento.
Foi proferida decisão de facto conforme fls. 102 a 105.
Foi proferida sentença que julgou a presente acção improcedente, com a consequente absolvição do Réu ( cfr. 108 a 122 ).
Apresentou a A. recurso desta decisão, o qual foi admitido como de apelação ( cfr. fls. 210 ).
Juntas as competentes alegações, a fls. 180 a 187, e após convite realizado nos termos do artº 685ºA, nº 2, alínea a) do Cod. Proc. Civil, formulou a A. apelante, as seguintes conclusões ( cfr. fls. 220 a 221 ) : 1ª – A apelante é uma microempresa com um capital social de € 50.000,00, com um gerente sem formação específica, ou seja, um investidor não qualificado ( artigos 304º nº 3 e nº 5 e 312º do CVM ).
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– Ao invés da douta sentença em apreço e dos factos provados, não possui a apelante qualquer historial em instrumentos financeiros de risco que permita incluí-la numa minoria de clientes de “ topo “ – como abusivamente a classificou o Banco ( artigo 314º do CVM e artº 712º, nº 1, alíneas a) e b) do CPC ).
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– Celebrou o primeiro contrato pelo prazo de cinco anos mas que o Banco, ao fim de dois meses veio ( sem cabal explicação ) solicitar a rescisão e a celebração de novo contrato por igual prazo, mas novamente foi rescindido, a seu pedido, ao fim de nove meses e proposto um terceiro contrato.
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– Os contratos estipulam uma base nocional ou fictícia de seis milhões de euros ( que nunca foram disponibilizados ) base esta que o Banco justificava corresponder às responsabilidades da apelante no Banco Central, quando a verdade é que essas responsabilidades não chegavam aos cinco milhões.
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– Até à data da celebração do primeiro contrato a apelante não registava qualquer situação de incumprimento perante o sistema bancário.
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– Nos termos dos artigos 304º, nº 1, e 317º, nº 1 do CVM, o Banco era obrigado a “ categorizar o cliente “, “ adequar o serviço prestado ao perfil do cliente “ e ainda dar cumprimento à “ regra da adequação ao serviço do Cliente. “ – o que não foi cumprido pelo Banco.
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– Aliás, o Banco também não deu cumprimento ao “ Questionário do Perfil do Investidor “ ( artigo 314º do CVM ) – vide Factos Provados nº 43 e 44.
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– Ora, se o primeiro contrato se processou “ em termos não apurados “ ( Facto Provado nº 43 ) não se pode concluir – como o fez a douta sentença em apreço – que a falta do“ Questionário do Perfil do Investidor “ se mostra suprida pela realização de anteriores contratos.
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– Para mais, a Directiva Comunitária nº 357-A/2007, de 31 de Outubro ( transposta para a ordem jurídica interna ) só se aplica ao terceiro contrato e não dois primeiros – logo, faltou à douta sentença em apreço a apreciação desta questão essencial submetida a julgamento ( artigo 660º, nº 2 do CPC ).
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- Daí consubstanciar-se aqui um ponto de facto incorrectamente julgado na douta sentença ( artigo 685º - B, alínea a) do CPC ).
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- Aliás, face à sistemática violação pelo Banco das regras básicas do CVM, a Comissão de Mercados de Valores Mobiliários ( CMVM ) analisou em Parecer detalhado tais procedimentos que, nos termos do artº 524º, por força do artigo 693º-B, ambos do CPC, se anexa.
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– Parecer este da CMVM que conclui poderem ser “ qualificados como instrumentos de protecção do risco de taxa de juro ao contrário do que é referido nas várias peças contratuais… “.
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– A douta sentença em apreço não só não resolve todas as questões que a apelada submeteu à apreciação do Tribunal a quo ( artigo 660º, nº 2 do CPC ), como não discrimina e indica os factos provados e erra na interpretação e aplicação das normas jurídicas correspondentes ( artigo 659º, nº 2 do CPC ), designadamente : artigo 304º, nº 3 e nº 5, artsº 312º, 314º, 317º, todos do CVM e ainda os artigos 685-B, alínea a) e 712º, nº 1, alínea a) e b), todos do CPC. Contra-alegou a recorrida, pugnando pela improcedência do recurso e pela manutenção da decisão recorrida.
II – FACTOS PROVADOS.
Foi dado como provado em 1ª instância : 1 – A F. Lda., é uma sociedade comercial por quotas com o capital social de € 50.000,00, com o número de matrícula e de identificação fiscal ..., com sede… Lisboa, que tem por objecto a construção civil, compra e venda de imóveis rústicos e urbanos e a revenda de bens adquiridos para esse fim (al. A) Fact.Assentes).
2 - Como consequência da dificuldade em alienar os imóveis “em carteira”, a Autora recorreu ao crédito bancário (al. B) Fact.Assentes).
3 - Por conseguinte, em Janeiro de 2007, a Autora tinha em curso as seguintes responsabilidades perante o sistema bancário português: a) Junto da C…, três financiamentos de curto prazo, de que se encontravam em dívida, respectivamente, € 201.914,84 (Duzentos e um mil, novecentos e catorze euros e oitenta e quatro cêntimos), € 549.630,53 (Quinhentos e quarenta e nove mil, seiscentos e trinta euros e cinquenta e três cêntimos), € 250.000,00 (Duzentos e cinquenta mil euros), no que perfaz o montante € 1.001.543,37 (Um milhão, mil quinhentos e quarenta e três euros, trinta e sete cêntimos); b) Junto do M… (ex- A…) três financiamentos de curto prazo, de que se encontrava em dívida € 272.730,31 (Duzentos e setenta e dois mil, setecentos e trinta euros e trinta e um cêntimos); c) Junto da CE…, seis financiamentos, de distintos prazos, que somavam, todos eles, um total de € 3.675.512,91 (Três milhões, seiscentos e setenta e cinco mil, quinhentos e doze euros e noventa e um cêntimos) (al. C) Fact.Assentes).
4 - Apesar de no início de 2007, a Autora apresentar um passivo bancário aproximado de € 5.000.000, com taxas de juro que oscilavam entre a Euribor a 6 meses acrescido de um “spread” entre 2% e 4%, o seu património constituído por um conjunto de imóveis permitia-lhe fazer face às obrigações emergentes dos créditos em curso, não se registando, portanto, qualquer situação de incumprimento perante o sistema bancário nacional ou estrangeiro (al. D) Fact.Assentes).
5 - Foi neste contexto, em data que situa entre Março e Abril de 2007, que a autora foi contactada pelo gestor de conta do Réu, que lhe propôs diferentes “medidas” visando a reestruturação do seu passivo bancário (al. E) Fact.Assentes).
6 - A primeira medida consistiu na celebração, em 22 de Maio de 2007, de um financiamento titulado por um Contrato de Abertura de Crédito por conta corrente com o limite de € 400.000 (al. F) Fact.Assentes).
7 - O referido financiamento tinha ainda como garantia constituída a favor do Réu, um penhor de um depósito do sócio gerente da Autora, B., no valor de € 200.000 (al. G) Fact.Assentes).
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O Primeiro Contrato de Permuta de Taxa de Juro 8 - Na mesma época, entre Março e Abril de 2007 o gerente da autora também foi visitado por um grupo de 3 colaboradores do Réu que convidaram a Autora a integrar uma minoria de clientes de “topo”, escolhidos pelo próprio Banco Réu para “subscreverem” um produto designado “Contrato de Permuta de Taxa de Juro” ou, na designação anglo-saxónica, “Interest Rate Swap” (al. H) Fact.Assentes).
9 - No primeiro contrato de permuta de taxa de juro, a autora tendo financiamentos em curso a taxa variável; esta acordou com a ré na troca de fluxos de diferenciais de juros a ocorrer em datas futuras, calculados com base num montante nocional do qual não há troca efectiva, permitindo fixar a taxas de juro dos financiamentos que a Autora tinha em curso (al. I) Fact.Assentes).
10 - Foi neste contexto que a Autora foi convidada pelo Réu a “subscrever” o...
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