Acórdão nº 1087/10.3TJCBR-J.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 12 de Junho de 2012

Magistrado ResponsávelJAIME CARLOS FERREIRA
Data da Resolução12 de Junho de 2012
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra: I No Tribunal Judicial da Comarca de Coimbra – 1º Juízo Cível, corre termos o processo de insolvência com o nº 1087/10.3TJCBR, contra a sociedade “S… & C.ª, L.da”, com sede na Av. …, no qual e no apenso de reclamação de créditos foi proferida sentença nos seguintes termos: “Nos presentes autos de insolvência de “S… & Cª, L.da”, o Sr. Administrador de insolvência apresentou a lista de credores por si reconhecidos e não reconhecidos, nos termos do artº 129º do CIRE - cfr. fls. 86 a 96.

I - Conforme consta da referida lista, o Sr. Administrador reconhece a existência dos seguintes créditos: … Sucede que posteriormente foram reconhecidos outros créditos em acções de verificação ulterior de créditos, designadamente: … Para a massa insolvente foram apreendidos os seguintes imóveis: 1 - a fracção autónoma, designada pela letra B, do prédio urbano constituído em propriedade horizontal, sito na Avª …, descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Coimbra sob o número … e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo …; 2 - o prédio rústico sito em …, composto de mato, descrito na Conservatória do Registo Predial de Porto de Mós sob o número … e inscrito na respectiva matriz predial sob o artigo …; 3 - o prédio rústico sito em …, composto de terreno de cultura arvense, descrito na 2ª Conservatória do Registo Predial de Sintra sob o número … e inscrito na respectiva matriz predial sob o artigo …; Foram também apreendidos diversos bens móveis, melhor identificados no auto de apreensão de fls. 116 a 122 do apenso D.

O credor Banco …, S.A., impugnou a lista de credores reconhecidos, alegando, em suma, o seguinte: “Foi-lhe reconhecido um crédito no valor total de € 237.589,06. O valor supra referido emerge de várias relações contratuais entre o impugnante e a insolvente: a) Contrato de mútuo em que foi concedido à insolvente crédito no montante de € 100.000,00; b) Contrato de abertura de crédito em conta corrente caucionada, em que foi concedido à insolvente um crédito de € 125.000,00; c) Contrato de conta de depósito à ordem (descoberto) e cartão B…; d) Letra de câmbio aceite pela insolvente, no valor de € 1.500,00; e) garantias bancárias prestadas a favor da Câmara Municipal de … e da Escola …, no montante total de € 39.532,55. Tudo nos termos da documentação junta aquando da apresentação da sua reclamação de créditos. No âmbito da referida lista de créditos reconhecidos, e uma vez que se encontravam garantidos por hipotecas registadas sobre a fracção B, correspondente ao 1º andar do prédio urbano, sito em Coimbra, na Avª …, inscrito na respectiva matriz sob o artigo … e descrito na Conservatória do Registo Predial de Coimbra sob o nº …, foram os montantes relativos aos contratos referidos nas alíneas a) e b) do artigo anterior graduados como créditos de natureza garantida. No entanto, a realidade é que é que a hipoteca constituída sobre a fracção referida, nomeadamente a hipoteca constituída no âmbito do contrato de abertura de crédito em conta corrente caucionada, e que se encontra registada sob a apresentação AP 63 de 2003/11/14, garante “o cumprimento de todas e quaisquer responsabilidades que existam ou venham a existir, até ao limite de € 150.000,00, decorrentes da respectiva actividade social e emergentes ou resultantes de operações de crédito que lhe tenham ou venham a conceder, por contratos de empréstimo ou de abertura de crédito, por financiamentos titulados por livranças, por desconto de papel comercial, por crédito por descoberto em contas de depósito à ordem e por crédito documentário de importação” - cfr. cópia de certidão do registo predial já junta com a petição inicial de reclamação de créditos, mas que se junta (fls. 107 e ss.). Isso mesmo resulta também da escritura da referida hipoteca, outorgada em 27.11.2003 no 4º Cartório Notarial de Coimbra, Lic. …, inscrita no Livro de escrituras diversas n.º 259-D, de fls. 55 a 57, cfr. registo de hipoteca - cfr. doc. de fls. 109 e ss.. Ora, não pode deixar de concluir-se que para além do crédito no montante de € 125.000,00, concedido pela impugnante no âmbito do contrato de abertura de crédito em conta corrente caucionada, também os restantes créditos concedidos, nomeadamente os constantes das alíneas c), d) e e) se encontram garantidos pela hipoteca genérica constituída sobre a fracção acima identificada e registada na competente Conservatória do Registo Predial de Coimbra sob a AP 63 de 2003/11/14. Razão pela qual devem também ser aqueles graduados como créditos de natureza garantida. Nesse sentido, deverá a totalidade do crédito da ora impugnante - € 237.589,06, acrescidos dos juros de mora até efectivo e integral pagamento às taxas indicadas na reclamação de créditos - ser reconhecido e graduado como garantido, sendo que o valor respeitante às garantias bancárias prestadas a favor de terceiros conforme indicado na reclamação de créditos apresentada, e na alínea e) do n.º 2 do presente articulado, no montante de € 39.532,55 – deverá ser graduado como garantido, ainda que sob condição, nos termos e ao abrigo do disposto no artigo 50º nº 1 do CIRE. Face ao exposto, deverá a totalidade do crédito do impugnante, no valor de € 237.589,06 proveniente dos contratos indicados no ponto 2 do presente articulado e garantidos por hipotecas ser reconhecido como crédito garantido (alínea a) do nº 4 do artigo 47º do CIRE).

Nos termos da lista definitiva de credores junta pelo administrador de insolvência, foram reconhecidos e graduados como privilegiados nos termos do artigo 333º do C.T. os créditos identificados com os números 1 a 10, 12 a 14, e 16 a 18 da referida lista, no montante total de € 249.472,96. Sucede que a natureza privilegiada dos referidos créditos não vem especificada na lista de credores junta, não se identificando se os créditos em questão beneficiam de privilégio creditório mobiliário geral, ou privilégio creditório imobiliário especial. E esta diferenciação é essencial, pois, como se sabe, os créditos dos trabalhadores apenas beneficiam do privilégio imobiliário especial sobre bem imóvel do empregador no qual o trabalhador presta a sua actividade. A este facto acresce que “o privilégio imobiliário especial sobre determinado imóvel do empregador, concedido aos seus trabalhadores pelo artigo 337º do CT para contratos de trabalho vigentes à data da sua entrada em vigor, depende da alegação e prova, por tais trabalhadores, de exercerem a sua actividade profissional nesse imóvel” - Ac. STJ, de 31.1.2007; Proc.07A4111.dgsi.net. Assim, apenas os créditos cuja respectiva alegação e prova referida supra sejam efectuadas pelo respectivo reclamante podem ser considerados como créditos que gozam de privilégio imobiliário especial, nos termos da alínea b) do nº 1 do artigo 333º do CT. Ainda a este respeito, apenas poderão ser considerados como detentores de créditos privilegiados com privilégio imobiliário especial todos os trabalhadores/credores reclamantes que efectivamente exercessem a sua actividade no imóvel/sede da empresa ora insolvente. Será assim vital determinar-se o âmbito espacial da actividade de cada trabalhador, sendo certo que nos termos do artigo 193º, nº 1 do C.T. “o trabalhador deve, em princípio, exercer a actividade no local contratualmente definido...”. O que desde logo implica que os trabalhadores, ao reclamarem o seu crédito, e caso pretendam fazer-se valer do privilégio imobiliário especial previsto no artigo 333º, nº 1, alínea b) do C.T., devem juntar à reclamação apresentada o respectivo contrato de trabalho celebrado, com o intuito de se perceber qual o local acordado entre as partes no qual o trabalhador deveria exercer a sua actividade. A insolvente dedicava-se à construção civil, exercendo por isso a maior parte dos seus trabalhadores a respectiva actividade nas obras contratadas e não no imóvel sede da empresa insolvente.

Concluindo, o privilégio imobiliário especial agora consagrado incide apenas sobre os bens imóveis onde o trabalhador preste a sua actividade e não em outros “que sejam propriedade do empregador e onde aquele não preste o seu trabalho”. Face a tudo quanto supra exposto, vem impugnar, enquanto créditos privilegiados detentores de privilégio imobiliário especial nos termos e para os efeitos do artigo 333º, nº 1, alínea b) do C.T., os seguintes créditos reclamados: ….

Razões pelas quais, acrescendo a tudo quanto exposto, deverá entender-se que os créditos supra referidos não gozam do privilégio imobiliário especial previsto no artigo 333º, nº 1, alínea b) do C.T., não devendo por isso ser graduados como tal para efeitos do artigo indicado.

Deste modo, requer: a) seja reconhecido como garantido o montante total do crédito da ora Impugnante, no valor de € 237.589,06 proveniente dos contratos indicados e garantidos por hipotecas, nos termos do disposto na alínea a) do nº 4 do artigo 47º do CIRE; No que concerne aos créditos dos trabalhadores indicados, que se considere que estes não são detentores de privilégio imobiliário especial, nos termos e para os efeitos do artigo 333º, nº 1, alínea b) do C.T., graduando-os nos termos legais.”.

O credor G… apresentou a sua resposta, alegando: Carece de fundamento o alegado pela impugnante porquanto o crédito que o trabalhador/credor reclamante detém pode efectivamente ser considerado e qualificado como privilegiado, detentor de privilégio imobiliário especial nos termos e para os efeitos do artigo 333º, nº 1, alínea b) do Código do Trabalho. Não juntou o respectivo contrato de trabalho reduzido a escrito, pois, não obstante o ter solicitado por diversas vezes à sua entidade patronal, nunca lhe foi disponibilizado. Todavia, tal não...

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