Acórdão nº 10/11.2T2AVR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 05 de Dezembro de 2012
Magistrado Responsável | MARIA DOMINGAS SIM |
Data da Resolução | 05 de Dezembro de 2012 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
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Relatório Na comarca do Baixo Vouga, A...
e mulher, B...
, residentes na Rua ..., concelho de Ílhavo, vieram instaurar contra: C...
, viúva, residente na Rua ..., Vagos; D...
, divorciada, residente na Rua ..., no mesmo lugar de Vagos, e E...
e F...
, casados entre si no regime de comunhão geral de bens, residentes na Rua ... Mira, acção declarativa, a seguir a forma ordinária do processo comum, pedindo a final “a) seja declarada a anulação das Escrituras de Doação com base na falta de capacidade de exercício de direitos da doadora e na falta de consciência da declaração negocial, bem como dos seus efeitos; b) seja decretado o cancelamento da Inscrição Registral a favor da D... efectuada na Conservatória do Registo Predial de Vagos sob o nº x.../20081223, da freguesia do y..., pela Ap nº 1977 de 08.04.2010, concelho de Cantanhede, restituindo-se o referido bem ao património da primeira Ré;.
c) seja decretado o cancelamento da Inscrição Registral a favor de E... e F... efectuada na Conservatória do Registo Predial de Mira, restituindo-se o referido bem ao património da primeira Ré.
d) Subsidiariamente, e caso o douto Tribunal não considere a anulabilidade dos negócios jurídicos efectuados, deve a doação efectuada à Ré D... ser convertida em doação sem qualquer carácter remuneratório.”.
Em fundamento alegaram, em síntese útil, que são filho e nora da ré C..., a qual fez doação às 2.ª e 3.ª RR, respectivamente sua filha e sobrinha, em 31 de Março de 2009, dos prédios que identifica nos art.ºs 1.º e 31.º do petitório inicial, tendo ficado a constar da escritura que formalizou o negócio de doação em que foi donatária a ré D...que se destinava a remunerar os serviços por esta prestados à doadora com tratamentos, alimentação, vestuário, medicamentos e alojamento.
Sucede, porém, que a doação de que foi beneficiária a dita ré não teve carácter remuneratório, tendo antes constituído um acto gratuito de disposição de bens, sem qualquer reserva, ao que acresce o facto de, por força das referidas doações, ter ficado esgotado o património da doadora, sem que esta tivesse sequer assegurado a futura prestação de cuidados por qualquer uma das donatárias.
A doadora sofre de analfabetismo e surdez quase total, estando dependente de terceiros para a realização das suas tarefas diárias, contando 82 anos de idade. Não compreende aquilo que se lhe diz e desinteressou-se das coisas e bens, apresentando falta de discernimento, do que tudo decorre não ter vontade própria nem capacidade de entender o alcance dos actos praticados, o que já se verificava à data da outorga das escrituras aqui em causa.
A incapacidade da doadora é fundamento de anulabilidade dos negócios de doação praticados, o que requerem seja reconhecido e declarado ou, quando assim não for entendido, sempre deverá ser declarado que a doação de que foi beneficiária a ré D...não teve carácter remuneratório, podendo assim ser chamada à colação após o óbito da primeira Ré, tudo com assento nos art.ºs 150.º, 257.º e 287.º, todos do Código Civil, disposições legais que expressamente invocam, justificando a sua legitimidade para a causa pelo facto de ser o demandante marido também filho da 1.ª ré e, nessa medida, prejudicado pelos negócios celebrados e aqui impugnados.
* Regularmente citada, contestou a ré C..., arguindo a excepção dilatória da ilegitimidade activa, conducente à sua absolvição da instância, uma vez que, à luz do preceituado no art.º 287.º, os demandantes, enquanto detentores de meras expectativas de sucederem à doadora, não têm legitimidade para pedir a anulação dos negócios de doação efectuados.
Mais impugnou a demais factualidade alegada pelo que, a não proceder a excepção invocada, sempre deverá ser absolvida dos pedidos formulados.
Terminou pedindo a condenação dos demandantes como litigantes de má fé em multa e indemnização a seu favor, que deverá ser fixada em quantia não inferior a 2.500,00€, uma vez que alegaram aqueles em juízo factos que sabiam ser falsos, deduzindo pretensão infundamentada, conforme igualmente bem sabiam.
Também as RR D... e E... e marido apresentaram contestação, peça na qual arguiram a ilegitimidade dos AA para a causa, uma vez que apenas a doadora ou os herdeiros desta, após a sua morte, podem revogar as doações efectuadas, como decorre dos art.ºs 969.º, 974.º e 976.º do Código Civil, o que não é manifestamente o caso. Daqui decorreria igualmente, em seu entender, a ilegitimidade passiva das contestantes, a dar lugar à sua absolvição da instância, nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 494.º, al. e) e 493.º, n.º 2, ambos do CPC.
Mais impugnaram toda a factualidade alegada pelas AA em adverso da versão por si trazida aos autos, a impor a sua absolvição dos pedidos formulados, isto caso a excepção arguida não proceda.
Concluíram igualmente pedindo a condenação dos AA como litigantes de má-fé em multa e indemnização a seu favor, a fixar em quantia não inferior a 2.500,00€.
* Replicaram os AA, defendendo a sua legitimidade para a causa, atenta a sua qualidade de filhos e herdeiros legitimários da Ré C..., logo, detentores de direitos patrimoniais concretos e protegidos por lei, nomeadamente à herança/legítima, tendo assim um interesse directo em que os bens alienados regressem ao património da primeira Ré, de forma a virem integrar o património da herança, já que não existem quaisquer outros bens.
* Tendo sido determinado o registo da acção nos termos das disposições conjugadas dos art.ºs 2.º, n.º 1, al. a) e 3.º, n.º 1, als. a) e b), e 8.º-A, n.º 1, al. b), do Código de Registo Predial, veio a constatar-se ter o prédio doado à Ré D... sido objecto de operação de destaque e subsequente alienação da área destacada mediante um negócio de...
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