Acórdão nº 1930/09.0T2AVR-D.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 15 de Janeiro de 2013

Magistrado ResponsávelCARLOS MOREIRA
Data da Resolução15 de Janeiro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA 1.

A (…) instaurou contra P (…), inventário pós divórcio para separação de meações, sendo este cabeça de casal.

Após prestar as legais declarações nas quais declarou existir um imóvel a partilhar, veio o cabeça de casal alegar que, afinal, inexistem bens comuns a partilhar, pois que: - o então casal separou-se de facto em 1990 e aquele imóvel adveio à sua titularidade em 1994 a título de prémio no âmbito de um concurso promovido pela x ( ...) J ( ...) , SA.

Contrapôs a interessada que se trata de bem comum pois que: - foram casados no regime da comunhão de adquiridos tendo o imóvel sido atribuído a título de prémio de concurso ao cabeça de casal no estado de casado com a requerente, não estando os prémios exceptuados da comunhão nos termos do art. 1733º do Código Civil, e presumindo-se o imóvel bem comum por se encontrar registado a favor de ambos na competente Conservatória.

E porque: - por referência ao art. 1724º do Código Civil, o dito bem não integra qualquer uma das previsões dos arts. 1722º, 1723º, 1726º, 1727º e 1728º do citado diploma.

  1. Seguidamente foi proferida decisão na qual: Na improcedência da reclamação, declarou bem próprio do interessado P (…) o imóvel identificado nos autos, com consequente adjudicação do direito de propriedade do mesmo, na qualidade de respetivo titular.

  2. Inconformada recorreu a interessada.

    Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões: 1ª – O Tribunal Recorrido decidiu sem fundamentar de facto, e inclusivamente em contradição com os provados, fazendo dessa forma enfermar a douta sentença recorrida das nulidades previstas nas alíneas b) e c) do n.º 1 do art.º 668.º do C.P.C., que aqui expressamente se alegam; 2.ª – No divórcio por mútuo consentimento da Apelante e Apelado não foi fixada a retroacção dos efeitos patrimoniais do divórcio; 3.ª Por isso, tais efeitos, quanto às relações patrimoniais entre os cônjuges, retrotraem-se à data da propositura da acção – artigo 1789º nº1 e 2 do C.C. -, ou seja, 08.02.2010; 4.ª A produção dos efeitos patrimoniais do divórcio está definitivamente decidida por sentença transitada em julgado, mostrando-se além do mais esgotado o poder jurisdicional para a apreciação desta questão; 5.ª A data da separação de facto e a produção dos efeitos patrimoniais do divórcio apenas podem ser fixados no respectivo processo de divórcio; 6.ª Violou assim a sentença recorrida o disposto nos artigos 666.º n.º 1 e 671.º e ss. do C.P.C. e 1789.º n.ºs 1 e 2 do C.C. e o caso julgado material; 7.ª O aqui Apelado quando se apresentou à insolvência nos autos principais, cumprindo com a obrigação legal de identificar os bens de que era titular, indicou apenas a meação no imóvel em causa, o agora declarado próprio, por considera-lo comum do casal; 8.ª Essa circunstância há-de ser havida como confissão judicial, ou pelo menos a expressão de confissão extrajudicial, ou em última instância forte indício dos factos que sustentam aquela declaração no processo, a impor, até porque o inventário comporta a prova por confissão, a declaração do bem em causa como comum do casal; 9.ª A Apelante juntou aos autos certidão da descrição predial do prédio em causa, de onde consta a inscrição a favor dos ex-cônjuges desde 27.08.1997 beneficiando assim da presunção legal, da existência e titularidade do direito – art.º 7.º do C.R.P.; 10.ª Ora o Apelado, visando ilidir a referida presunção no seu requerimento alegou estar separado de facto desde 1990 juntando, para o efeito, apenas uma declaração de IRS, única prova que requereu, apresentada em 1992 reportando-se ano de 1991, 11.ª Os meios de prova, constantes dos autos, produzida não sustentam a prova do facto 2.º dos provados que se deve ter por não provado; 12.ª Desde logo por via da confissão referida em 8.ª desta e presunção alegada em 9.ª; 13.ª No regime da comunhão de adquiridos de acordo com o que dispõe o art.º 1724.º do C.C. são comuns o produto do trabalho dos cônjuges e os bens adquiridos no matrimónio não exceptuados por lei; 14.ª Está demonstrado da factualidade assente, que o bem foi adquirido na constância do matrimónio; 15.ª Competia ao Apelado alegar que o bem estava excluído da comunhão e demonstrar os factos que sustentam essa alegação; 16.ª Por outro lado o 1725.º faz presumir a natureza comum dos bens móveis do casal; 17.ª Os bens exceptuados por lei à comunhão, estão taxativamente previstos e no caso dos autos o imóvel não é subsumível à previsão de nenhuma norma que estatua a exclusão, sendo assim comum; 18.ª Ora, sendo os rendimentos de trabalho dos cônjuges comuns na vigência do casamento, cujos efeitos patrimoniais cessaram apenas em 08.02.2010, e presumindo-se a comunicabilidade dos bens móveis, outra conclusão não é viável que não seja que também aqui o Apelado não logrou cumprir com o ónus de alegação e prova que lhe competia; 19.ª Na verdade, nenhum facto alegou e por isso provou tendente a demonstrar a aquisição gratuita, ou com dinheiro próprio, do imóvel; 20.ª Na dúvida impõe-se ao tribunal que se decida contra aquele que tem o ónus da prova – art.º 342.º do C.C. - 21.ª Andou mal o Tribunal de Primeira Instância na interpretação dos artigos 342.º, 350.º, 1722.º, 1723.º,1724.º, 1725.º, 1726.º e 1728.º do C.C. e art.º 7.º do C.R.P., que aplicou incorrectamente; 22.ª A forma de aquisição do imóvel não reúne nenhum dos elementos da doação tal como ela vem definida no C.C. – cfr. art.º 940.º e ss -, mas como tal foi incorrectamente classificada na sentença em crise; 23.ª A aquisição, tal como resultou provado, deveu-se a compra e venda de pessoa a nomear com subsequente ratificação em virtude de concurso (cfr. escrituras públicas de fls. … dos autos não impugnadas); 24.ª Acresce aliás que, conforme está demonstrado o Apelado assumiu, como comprador e sem reservas, todas os direitos e obrigações no contrato supra referido; 25.ª Ao classificar como doação a forma de aquisição do imóvel em causa nos autos a sentença recorrida violou o disposto nos artigos 452.º e ss. 940.º e ss., 874.º e ss. e 1245.º e ss. todos do C.C.; 26.ª Sem prescindir se dirá ainda que a prova da separação de facto não é ostensivamente suficiente para daí se concluir pela participação gratuita ou exclusiva do património próprio do Apelado na aquisição do imóvel já que, como ficou acima visto, os efeitos patrimoniais do divórcio apenas se produziram em Fevereiro de 2010; 27.ª No incidente de reclamação contra a relação de bens, embora devam as provas ser indicadas com o requerimento inicial e com a resposta, o Juiz deve, antes de decidir, atender não só às provas requeridas pelos interessados, mas, também promover as diligências “ probatórias necessárias”, com vista à justa decisão do incidente; 28.ª Apenas por cautela de patrocínio e para o caso de se entender existir uma insuficiência de factualidade para que a Mmª Juíza decidisse como decidiu essa mesma insuficiência de prova deveria ter conduzido a Mmª Juíza, nos termos do 1344º C.P.C. nº 2, a determinar as diligências probatórias necessárias para a questão em causa, o que não foi feito; 29.ª Posto que, a questão para ser decidida com segurança e consciência exigia uma aturada e complexa indagação, pelo que devia a Mmª Juíza determinado a suspensão da instância, até que ocorresse decisão definitiva, remetendo as partes para os meios comuns, nos termos do disposto no nº1 do artigo 1335º do C.P.C., o que também não sucedeu.

    Contra-alegou o recorrido pugnando pela manutenção do decidido com os seguintes, essenciais, argumentos: 1.

    Prescrevem os n.ºs 1 e 2 do artigo 1689, n.º 1 do Código Civil que: “Cessando as relações patrimoniais entre os cônjuges, estes ou os seus herdeiros recebem os seus bens próprios e a sua meação ao património comum, conferindo cada um deles o que dever a este património” e que “Havendo passivo a liquidar, são pagas em primeiro lugar as dívidas comunicáveis até ao valor do património comum, e só depois as restantes”.

  3. O processo de inventário em consequência de divórcio não se destina apenas a dividir os bens comuns dos cônjuges, e a liquidar definitivamente as responsabilidades entre eles e deles para com terceiros, mas também a separar do património comum os bens próprios de cada um.

  4. È na partilha que os cônjuges recebem os bens próprios e a sua meação no património comum, e que cada um deles confere o que deve ao património comum.

  5. O regime de bens que vigora no caso em apreço é o da comunhão de adquiridos, que tem como princípio base de que só fazem parte do acervo comum os bens adquiridos, a título oneroso, depois do casamento.

  6. Neste regime, a regra geral é a de que são comuns todos os bens adquiridos a título oneroso na constância do casamento, e são próprios de cada um dos cônjuges os bens levados por ele para o casamento ou adquiridos a título gratuito depois do casamento.

  7. Os bens que qualquer dos cônjuges eventualmente leve para o casamento ou adquira a título gratuito, por não resultarem do esforço conjunto do casal, não entram nessa comunhão e são considerados próprios nos termos do Artigo 1722º do Código Civil.

  8. Sendo o casamento uma comunhão de vida, a regra seja a de que tal comunhão também se estende à comunhão nos bens que sejam adquiridos na constância do matrimónio com a colaboração, a cooperação, e o esforço de ambos os cônjuges.

  9. O ingresso do bem na titularidade do Recorrido não decorreu do esforço patrimonial comum dos cônjuges.

  10. Não se pode dizer-se que aquando da separação de facto a Recorrente era titular de uma qualquer expectativa quando à natureza comum do bem em causa, porquanto o mesmo foi adquirido pelo Recorrido posteriormente à separação de facto do casal.

  11. Para prova da qualificação do bem adquirido na constância do casamento como próprio, nas relações entre os cônjuges é...

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