Acórdão nº 2229/11.7TBVNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 20 de Novembro de 2012

Magistrado ResponsávelRODRIGUES PIRES
Data da Resolução20 de Novembro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 2229/11.7 TBVNG.P1 2ª Vara de Competência Mista de Vila Nova de Gaia Apelação Recorrentes: B… e mulher C… Recorridos: D… e mulher E… Relator: Eduardo Rodrigues Pires Adjuntos: Desembargadores Márcia Portela e Pinto dos Santos Acordam na secção cível do Tribunal da Relação do Porto: RELATÓRIO Os autores D… e mulher, E…, intentaram contra os réus B… e mulher, C…, a presente acção declarativa, sob a forma ordinária do processo comum, pedindo que:

  1. Seja declarado serem os autores os titulares do terreno destinado a construção urbana inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 5738 e descrito na 2ª Conservatória sob o número 3410/041093; b) Seja ordenado o cancelamento do registo feito a favor dos réus; c) Sejam os réus condenados a reconhecerem aos autores aquele direito de propriedade; ou, subsidiariamente: d) Sejam os réus condenados a pagarem aos autores a quantia de euros 89.783,62 que corresponde ao valor do referido terreno destinado à construção.

    Alegam, para tanto, que: - Compraram em conjunto com os réus dois terrenos, tendo o registo de aquisição dos mesmos ficado em nome dos réus, então emigrantes, para beneficiar de isenção de sisa; - Autores e réus definiram, porque os terrenos se encontravam demarcados, qual dos terrenos cabia a cada uma das partes tendo os autores, desde então, exercido relativamente ao terreno reivindicado os poderes correspondentes à titularidade do direito de propriedade sobre o mesmo.

    Contestaram os réus, negando tal versão dos factos e alegando que os autores ocuparam o terreno em causa por mera tolerância daqueles e que, actualmente, tal ocupação é efectuada contra a sua vontade.

    Os autores replicaram.

    Dispensada a audiência preliminar, foram seleccionados os factos considerados assentes e organizada a base instrutória.

    Com observância do legal formalismo, realizou-se audiência de discussão e julgamento, tendo o tribunal respondido à matéria da base instrutória através do despacho de fls. 127/8, que não teve qualquer reclamação.

    Seguidamente, foi proferida sentença que julgou a acção procedente e, em consequência: 1) declarou que os autores são os titulares do direito de propriedade do terreno destinado a construção urbana com a área de 667,30 m2 sito no …, freguesia …, concelho de Vila Nova de Gaia, a confrontar do Norte com F…, do Sul com rego de água de consortes, do Nascente com caminho público e do Poente com G…, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 5738 e descrito na 2ª Conservatória sob o número 3410/041093 e condenou os réus a reconhecer tal facto; 2) determinou o cancelamento da inscrição efectuada pela Ap. 92 de 1997/07/18 (aquisição por compra em que são sujeitos activos os réus).

    Inconformados com o decidido, interpuseram recurso os réus, que finalizaram as suas alegações com as seguintes conclusões:

  2. Ao Meritíssimo Juiz “a quo” impunha-se uma análise crítica de todas as provas e especificando os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador, pelo que impunha-se decisão diferente sobre a matéria de facto.

  3. Em B) dos factos assentes foi dado como provado que, “sic”, “O A. marido era o representante dos RR., sendo o R. marido seu irmão, com poderes para comprar e para movimentar a crédito ou a débito a conta bancária existente na H… poderes esses que lhe foram conferidos por procuração celebrada no dia 24 de Fevereiro de 1994”.

  4. Em C) dos factos assentes foi dado como provado que, “sic”, “Por escrituras públicas celebradas em 12 de Maio de 1997 e 19 de Junho de 1997, os referidos RR, representados pelo A. marido, declararam comprar os referidos prédios pelos valores de, respectivamente, 7.500.000$00 e 3.600.000$00, tendo os RR. beneficiado da isenção do pagamento de sisa por serem emigrantes em França.” d) A testemunha I…, afirma que, “sic”, “(Juiz) Como é que o senhor tem conhecimento? Quem lhe disse que tinha sido estes dois? (sobre a compra); Resposta: Foi este senhor (indicando para o senhor D…). (Juiz) O que sabe foi da boca deste senhor? (resposta) Sim. Na altura compraram os terrenos e eram dos dois. (Pergunta) Quem tratava dos terrenos? (Resposta) No início, nos primeiros anos, 1º, 2º, talvez até 3º, não sei, havia uma limpeza geral, faziam limpeza dos dois. A partir daí chatearam-se por qualquer razão entre eles e passou o D… a tratar o de baixo e o outro senhor a tratar o de cima. O Sr. D… passou a tratar lá para 2001, 2002 só da limpeza daquele, anteriormente faziam dos dois. (Pergunta) O senhor viu também o senhor B… a fazer limpeza no terreno? (Resposta) Sim, este senhor também lá esteve a fazer limpeza. (Pergunta) O senhor B… também andou lá a limpar? (Resposta) Sim sim, também lá andou algumas vezes.” e) Por sua vez a testemunha J1…, afirma que, “sic”, “(Pergunta) O pagamento foi em dinheiro ou em cheque? (Resposta) o pagamento foi em cheque, não tenho a certeza mas acho que foi em cheque. (Pergunta) Qual o preço? (Resposta) Acho que foram 7 mil contos ou 7.500 contos.” f) A testemunha K…, afirma que, “sic”, “ Fizemos reuniões nos escritórios em que ambos se apresentavam como sócios. (Pergunta) Para que negócio, recorda-se? (Resposta) Para estes terrenos. (Pergunta Juiz) O senhor garante-me que já teve estes dois à sua frente e disseram que eram sócios? (Resposta) Sim, sim. (Pergunta Juiz) Foi feito o negócio? (Resposta) Depois não se fez o negócio porque eles não conseguiram, a Câmara não lhes deu aprovação. (Pergunta Juiz) Cada um restituiu os dois mil e quinhentos contos? (Resposta) Não, quem veio falar connosco para desfazer o negócio foi o B…, ele é que restituiu o sinal todo.” g) A testemunha L…, afirma que, “sic”, “(Pergunta) O senhor viu o senhor B… a limpar os dois terrenos ou só um? (Resposta) Na altura em que o senhor B… lá andou limpou os dois.” h) Da conjugação destes depoimentos com os documentos juntos aos autos, nomeadamente da procuração passada pelo R. marido ao A. marido e junta pelos próprios AA. na sua petição inicial, das escrituras assinadas pelo A. marido como procurador do R. marido, dos extractos bancários e cheques juntos pelos RR. comprovativos que os pagamentos foram feitos pelo R. marido e da sua conta e coincidentes com as datas das escrituras, do IMI pago pelo R. marido e das diligências feitas por este junto da Câmara Municipal …, impunha-se decisão sobre a matéria de facto diversa da supra indicada, havendo contradição entre a matéria de facto dada como provada e a fundamentação e a análise crítica das provas pelo Meritíssimo Juiz “a quo”.

  5. Nunca poderia ter sido dado como provado o nº 1 da base instrutória, uma vez que as testemunhas dos AA. não só apenas tinham conhecimento daquilo que o A. marido lhes disse, como não há qualquer elemento documental probatório de tal matéria, como competiria tal prova pelos AA..

  6. Não podia ter sido dado como provado o nº 3 da base instrutória, isto é, que “O A. marido e o R. marido acordaram que a escritura de compra e venda dos dois terrenos acima identificados fosse feita em nome do R. marido porque era emigrante e beneficiava da isenção do pagamento da sisa.”, uma vez que os pagamentos foram todos feitos pelo R. marido (seja de compra seja dos impostos devidos) e nenhum pelo A. marido que titulasse a propriedade de qualquer dos terrenos, sendo certo que o processo da compra de ambos os terrenos foi igual, podendo então também o A. marido dizer que o outro terreno também seria seu… k) Igualmente não podia ter sido dado como provado o nº 5 da base instrutória, isto é, que “Na altura da aquisição dos dois terrenos, contíguos mas murados, sem possibilidade de confusão, A. marido e R. marido acordaram, desde logo, qual era o terreno de cada um, e destinaram ao A. marido o terreno inscrito na matriz no artigo 5.738 e ao R. marido o terreno inscrito na matriz no artigo 5.787.”, porque nenhuma testemunha se referiu a tal facto, antes pelo contrário, no início os terrenos foram limpos os dois juntos pelo R. marido e os projectos de construção foram tratados pelo R. marido exclusivamente e abrangendo os dois terrenos.

  7. Também nunca poderia ter sido dado como provado o nº 7 da base instrutória, isto é, que “Os AA, por si e pelos anteriores ocupantes, há mais de 20 e até 30 anos, passaram a cortar as ervas e as silvas e a limpar o poço, à vista de todas as pessoas, que vivem, trabalham ou circulam na localidade, sem oposição de quem quer que seja como se coisa sua fosse, de forma ininterrupta e na intenção e convicção de que o mesmo lhes pertence, sem quaisquer reservas, ónus ou encargos.”, pois que não só a posse dos terrenos nunca foi dos AA., mas sim dos RR. após as escrituras de compra e venda, tendo sido o R. marido que inicialmente fez a limpeza dos dois terrenos, e só o foi pelo A. marido por mera tolerância do R. marido para aquele lá guardar apenas numa parte do terreno alguns pertences seus.

  8. Pelo que, por igual razão, deveria ter sido dado como provado o nº 11 da base instrutória, isto é, que “Os RR. autorizaram o A. marido, que lhes solicitou, a cultivar uma parte do terreno inscrito na matriz no artigo 5.738, por mera tolerância, o que o A. marido fez, fazendo uns pequenos arrumos em chapa para guardar os utensílios.” n) Deveria o Meritíssimo Juiz “a quo” ter analisado o preenchimento dos pressupostos da usucapião, fundamentando-os legalmente, o que não o fez, limitando-se a referir os artigos do Código Civil.

  9. Tal omissão constitui a nulidade prevista no art. 668º, nº 1 c) do CPC.

  10. A aquisição pela usucapião pressupõe uma...

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