Acórdão nº 530/10.6TVPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 19 de Junho de 2012

Magistrado ResponsávelMÁRCIA PORTELA
Data da Resolução19 de Junho de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Apelação 530/10.6TVPRT Acordam no Tribunal da Relação do Porto 1. Relatório B…, em representação de seu filho C…, intentou acção declarativa com processo ordinário contra D…, pedindo que o A. seja reconhecido como filho do R. para todos os efeitos legais.

Alega para tanto, e em síntese, que o C… nasceu em 16 de Abril de 2003, sendo que a sua mãe manteve relações de cópula exclusiva com o R. no período legal da concepção, tendo o demandante nascido em resultado de relações de sexo que a sua progenitora manteve com aquele.

Contestou o R., negando ter praticado qualquer acto sexual com a mãe do autor.

Replicou o autor concluindo como no articulado inicial.

Foi proferido despacho saneador e fixou-se a matéria de facto relevante.

Procedeu-se a julgamento, tendo sido proferida sentença que declarou que C…, nascido a 16 de Abril de 2003, é filho do R..

Inconformado, recorreu o A. apresentando as seguintes conclusões: «a) o Tribunal considera não provado que o Réu não teve relações sexuais com a Mãe do Autor, quando ao invés, deveria ter dado resposta positiva ao mesmo, uma vez que resulta, salvo mais douto entendimento, provado pelo depoimento prestado pelas testemunhas E…, F… e G…, cujos excertos atrás se transcrevem; b) o Tribunal considera não provado que a Mãe do Autor teve relações sexuais com vários homens, quando ao invés deveria ter dado resposta positiva ao mesmo, uma vez que resulta, salvo mais douto entendimento, provado pelo depoimento das testemunhas F… e E…, cujos excertos atrás se transcrevem; c) merecendo estes factos controvertidos resposta positiva, deverá a decisão de que se recorre ser reformada, porque se funda em errónea interpretação fáctica pelo Ilustre Julgador, substituindo-se por outro decisório que declare a improcedência da acção; d) deve a sentença ser anulada, já que nos termos do artigo 668.º, n.º 1, c) do C.P.C. os fundamentos estão em oposição com a decisão; e) em consequência, deve ser alterada a decisão da 1.ª instância, no uso do artigo 712.º, n.º 1,

  1. C.P.C., já que do processo constam todos os elementos de prova que serviram de base à errónea decisão, e tendo ocorrido gravação dos depoimentos, a mesma foi impugnada nos termos do artigo 685.º -B do C.P.C.; f) devendo a, apesar de tudo, Douta Sentença, ser revogada e reformada no sentido já exposto.

    g) Em alternativa, sendo imprescindível o aditamento da matéria factual constante da reclamação da base instrutória, dai decorrendo necessariamente a anulação do julgamento; h) Sendo indispensável a ampliação da matéria de facto (dada a deficiência, obscuridade e ambiguidade da decisão da matéria de facto) com a subsequente repetição do julgamento por imposição e na técnica do artigo 712.º, n.º 4 do CPC; i)Sem prescindir e subsidiariamente, deve a sentença ser considerada nula por inconstitucionalidade, na medida em que viola os princípios da igualdade, do contraditório, do acesso ao direito e tutela jurisdicional e ainda do Estado de Direito, expressamente plasmados nos artigos 1.º, 2.º, 13.º e 20.º da C.R.P.; j) e por violar o direito à integridade física e moral do Réu e o seu direito à reserva da vida privada, previstos nos artigos 25.º e 26.º da C.R.P.; k) e ainda em Douto Suprimento.

    Assim se Fazendo Mais e Melhor Justiça!» Contra-alegou o A., assim concluindo: 1) O Tribunal a quo valorou e bem as provas produzidas quanto à matéria do recurso.

    2) Igualmente bem, valorou o Tribunal a quo a flagrante violação pelo apelante do princípio da cooperação.

    3) A douta sentença recorrida não viola o disposto no artigo 668º, nº1, alínea c) do C.P.C.

    4) Assim como também não viola os princípios da igualdade, do contraditório, do acesso ao direito e tutela jurisdicional e do estado de direito.

    5) Muito menos violará o direito do apelante à reserva da vida privada.

    6) Carecem, assim, de fundamento as conclusões do Apelante.

    Nestes termos e nos melhores de direito que V. Ex.cias muito doutamente suprirão, deverá improceder o recurso apresentado pelo recorrente, mantendo-se a douta sentença proferida, pelo que deve a Apelação ser julgada totalmente improcedente, com as legais consequências.

    Assim fazendo V. Ex.cias inteira JUSTIÇA» Também o MP contra-alegou pugnando pela manutenção do decidido.

    1. Fundamentos de facto A 1.ª instância considerou provados os seguintes factos: 1.º- O autor nasceu no dia 16 de Abril de 2003, em …, Brasil, tendo sido registado como filho de B….

      1. - B… conheceu o réu, em Junho de 2002, num bar de alterne onde aquela prestava serviço.

      2. - O réu teve relações sexuais de cópula com B… nos primeiros cento e vinte dias dos trezentos que precederam o nascimento do C….

      3. - O nascimento do C… ocorreu no termo da gravidez que sobreveio à sua mãe em consequência de relações sexuais que esta manteve com o réu.

    2. Do mérito do recurso O objecto do recurso, delimitado pelas conclusões das alegações (artigo 684.º, n.º 3, e 685.º A, n.º 1 CPC), salvo questões do conhecimento oficioso não transitadas (artigo 660.º, n.º 2, in fine, e 684.º, n.º 4, CPC), consubstancia-se nas seguintes questões: — ampliação da matéria de facto e a violação do princípio da igualdade, do contraditório, da tutela jurisdicional e do Estado de direito; — impugnação da matéria de facto; — nulidade da sentença por contradição entre a decisão e os fundamentos; — nulidade da sentença por inconstitucionalidade por violação da reserva da vida privada.

      3.1. Da ampliação da matéria de facto e a violação do princípio da igualdade, do contraditório, da tutela jurisdicional e do Estado de direito Pretende o apelante a anulação do julgamento, nos termos do artigo 712.º, n.º 4, CPC, para ampliação da base instrutória por forma a contemplar factos que foram alegados na contestação e não passaram a constar do elenco dos factos controvertidos, apesar de reclamação formulada ao abrigo do disposto no artigo 511.º, n.º 2, CPC.

      São os seguintes os factos em discussão: — O Réu e a Mãe do Investigante namoraram? — Assumiram algum namoro, em pleno ou de forma dissimulada? — O Réu, quando saía com os seus Amigos, tratou a B… como sua namorada? — Esta última alguma vez dependeu do Réu? — Abandonou a vida de alternadeira, por indicação do Réu? — O Réu e a Mãe do Investigante tiveram relações sexuais, de qualquer índole? — A B… esteve grávida, daí nascendo o menor investigante? — O Réu prometeu reconhecer a paternidade do menor investigante? — O Réu propôs-se arrendar casa para a B… viver, em nome desta ou de sua irmã? — O Réu prometeu quaisquer quantias à B…? — A Mãe do Investigante teve relações sexuais com vários amigos do Réu, entre Junho e Setembro de 2002? — Entre esses amigos está o Senhor G…? — Assim como o Sr. F…? — E ainda o Sr. E…? — Era voz corrente que a B… era conhecida como alternadeira muito bem sucedida, dedicando-se ao exercício remunerado de prostituição? — A B… aliciava à prática de actos sexuais, todos quanto passavam pelo bar de alterne referido nos autos? — Fazia propostas e promessas, relativas à concretização de actos sexuais? — À B… eram conhecidas diversas companhias masculinas, nos primeiros cento e vinte dias dos trezentos que antecederam o nascimento do C…? À base instrutória apenas devem ser levados os factos relevantes, ou seja, os factos constitutivos, modificativos, impeditivos e extintivos das pretensões aduzidas, devendo ser seleccionados de acordo com as regras de distribuição do ónus da prova.

      Dos factos supra enunciados, os relevantes prendem-se com o relacionamento sexual da mãe do A. com outros homens no período legal da concepção — a exceptio plurium.

      O despacho de selecção da matéria de facto, considerando que tinha sido invocada a exclusividade de relacionamento sexual entre a mãe do A. e o apelante, entendeu — bem, face ao Assento 4/83, agora com força de jurisprudência uniformizadora (cfr. artigo 17.º, n.º 2, do Decerto-lei 329A/95, de 12 de Dezembro)— que o ónus da prova da exclusividade cabia ao apelado.

      Não havia, pois, que questionar se a mãe do menor tinha tido relacionamento sexual com outros homens no período legal da concepção, sem prejuízo de o apelante ter direito a produzir essa prova em sede de contraprova.

      A circunstância de não terem sido levados à base instrutória os factos supra enunciados em nada prejudicou, pois, o apelante, não se verificando a violação de qualquer princípio constitucional, designadamente o princípio do contraditório.

      Jorge Miranda e Rui Medeiros, Constituição Portuguesa Anotada, Coimbra Editora, tomo I, pg. 194, resumem o alcance do...

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