Acórdão nº 5283/08.5TAMTS.P2 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 20 de Junho de 2012

Magistrado ResponsávelVASCO FREITAS
Data da Resolução20 de Junho de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Recurso Penal nº 5283/08.5TAMTS.P2 Acordam, em conferência, na 1ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto: I - RELATÓRIO No 4º Juízo Criminal do Tribunal Judicial de Matosinhos, em processo comum com intervenção do tribunal singular, foram submetidos a julgamento os arguidos B… e C…, devidamente identificados nos autos, tendo no final sido proferida sentença, na qual se decidiu: I - condenar o arguido B…, pela prática, em autoria material, na forma consumada, de um crime de falsificação de documento, p. e p. pelo artigo 256°, n°1, als. a), b) e c), do CP, na redacção anterior à entrada em vigor da Lei n°59/2007, de 4 de Setembro, na pena de 320 dias de multa, à taxa diária de € 4,00 perfazendo um total de € 1280,00.

- absolver o B… da prática dos crimes de condução perigosa de veículo rodoviário, p. e p. pelo artigo 291°, n°1, al. b); dano qualificado, p. e p. pelos artigos 212°, n°1 e 213°, n°1, al. a), com referência ao artigo 202°, al. a); furto, p. e p. pelo artigo 203°, n°1; e burla simples, p. e p. pelo artigo 217°, n°1, do CP.

- absolver o arguido C… da prática do crime de burla simples, p. e p. pelo artigo 217°, n°1, do CP.

- Relativamente ao pedido de indemnização cível formulado pela "D…": - Conhecer da excepção de caso julgado relativamente aos pedidos: a) De condenação no pagamento do valor do CD, DVD e GPS que faziam parte integrante da viatura ..-..-VI; b) De condenação no pagamento dos danos provocados no tejadilho da viatura ..-..-VI; e c) De condenação no pagamento das prestações do contrato de "leasing" para aquisição da viatura ..-..-VI; com a consequente absolvição da instância dos demandados B… e C…, e -julgar totalmente improcedente o pedido de indemnização cível relativamente aos demais pedidos formulados, com a consequente absolvição dos demandados B… e C….

Inconformado com tal decisão, dela interpôs recurso a assistente D…, Ldª, pretendendo que seja revogada e substituída por outra que condene os arguidos pela prática de um crime de burla e o arguido B… por crimes de burla agravada e dano agravado, com as subsequentes consequências quanto ao pedido cível, para o que apresentou as seguintes conclusões: 1. Face à prova deduzida e registada no sistema CITIUS nos dias 05.05.2010, 01.06.2010 e 27.10.2011 e pelo depoimento das testemunhas E… e F…, os factos provados em 4, 23 24 25 26 e 27, os documentos juntos aos autos (nomeadamente e-mails entre os arguidos e entre o arguido C… e o gerente da arguida), devem ser dados como provados os factos indicados em VI, VII e VIII da matéria não provada.

  1. Deverá também passar para o elenco dos factos provados o facto descrito em IV dos não provados, pela conjugação dos depoimentos supra e de G… com os factos provados em 15°, 16°, 17°, 18°, 19° e 20°.

  2. A alteração proposta deve ser atendida porque reflecte um juizo alternativo ao proferido; 4. E apelando às regras de experiencia comum, valorizando os depoimentos prestados e supra citados e a prova documental junta, deve o tribunal "ad quem" concluir pela evidência de suporte na convicção expressa quanto à pratica dos factos pelos arguidos, o que constitui notável erro de julgamento e, consequentemente, alterar a decisão nesse sentido; 5. Daí que deve ser alterada a matéria de facto assente como provada nos termos propostos; Por isso, da prova produzida (mesmo já de per si e sem alteração proposta) ressalta a prática pelos arguidos dum crime de burla simples previsto nos art. 217 e ss do CP pelo que, decidindo de modo diverso, violou o Tribunal recorrido esta norma legal; 7. O mesmo se poderá dizer da decisão de condenar o arguido B… por falsificação de documento quando se impunha uma condenação por burla agravada (e sempre outra mais gravosa do que a multa em que foi condenado), pois a falsificação de assinatura foi instrumental para o resultado obtido de uma fraude à segurança social no valor de mais de 40.000,00 euros; 8. Errou ainda o tribunal recorrido ao considerar como caso julgado factos que não foram julgados no mencionado processo 320/08, nomeadamente o furto (subtracção de acessório do veiculo - DVD, Cd e GPS), que sempre alterariam, agravando, a censura que existiu através da condenação pelo crime de abuso de confiança. Aqui trata-se de factos não julgados e por isso devem ser objecto de censura penal autónoma, seja por furto seja por abuso de confiança ou por dano (remoção de acessório e dano no veiculo pela condução perigosa) 9. Ao absolver os arguidos violou o Tribunal recorrido o disposto no art. 127. do CPP, por ter omitido da analise da prova outra relevante, não as valorando de acordo com as regras de experiencia comum, mais violando o art. 410, nº 2 al. a) do CPP por se ter bastado com insuficiente matéria de facto e assim ter feito errada apreciação.

Termos em que deverá a matéria de facto ser corrigida e alterada nos termos propostos, bem como a sentença recorrida, por forma a que os arguidos sejam condenados pela pratica em co-autoria de um crime de burla e o arguido B… por crimes de burla agravada e dano agravado (aqui pela remoção dos acessórios e pelo dano causado no cárter do veiculo), tudo com consequências quanto ao pedido cível, assim se fazendo JUSTIÇA.”*Na sua resposta, o MºPº defendeu o não provimento do recurso e a integral confirmação da decisão recorrida.

*O recurso foi admitido.

*Nesta Relação, o Exmº Procurador Geral Adjunto, subscreveu a posição do MºPº junto da 1ª instância, mas entendeu que o recorrente deveria ser notificado nos termos do artº 424º nº 3 do Cod. Proc. Penal, por entender que se configura, para além do crime de falsificação que o arguido B… foi condenado a prática por este de um crime de burla agravada à Segurança Social.

*Foi cumprido o disposto no nº 2 do art. 417º C.P.P., não tendo havido resposta.

*Colhidos os vistos, foram os autos submetidos à conferência.

Cumpre decidir.

*II FUNDAMENTAÇÃO Na sentença recorrida foram dados como provados os seguintes factos: 1º - Os arguidos foram sócios da sociedade "D…, Lda.", com sede na …, …, Matosinhos, dedicando-se estatutariamente à comercialização e industrialização de sistemas de engenharia de trânsito rodoviário e viário, detendo quotas, respectivamente de € 16.000,00 e € 8.000,00.

  1. - Eram também sócios daquela empresa, E… e H…, cada um deles com a quota de € 38.000,00, e que foram responsáveis pela entrada de capital na empresa.

  2. - A gerência de direito cabia a E….

  3. - Enquanto os dois primeiros sócios geriam de facto a empresa, os terceiro e quarto eram apenas sócios que haviam entrado para aquela sociedade com capital, possuindo pouco conhecimento na área objecto de acção comercial da empresa, deixando a gestão corrente, operacional e até estratégica para os dois primeiros sócios e arguidos.

  4. - Em meados de Abril de 2005, o arguido B… abandonou o trabalho e as instalações da "D…", levando com ele diversos bens.

  5. - Posteriormente, o arguido B… pediu que lhe fosse passado um documento que lhe permitisse auferir subsídio de desemprego, ao que a gerência se negou.

  6. - Então, o arguido fabricou um documento com o título de "Declaração", datado de 20 de Junho de 2005, do qual constava que havia deixado de exercer funções de Director Comercial da "D…" em Abril de 2005, por motivos de reestruturação da empresa, ou seja, por causa que lhe não era imputável, o que sabia ser mentira, e apôs-lhe a assinatura do gerente E…, que obteve de modo não concretamente apurado, bem como o carimbo da sociedade, sem autorização e conhecimento daquele.

  7. - Igualmente preencheu e assinou, imitando a assinatura de E…, e apondo-lhe o carimbo da sociedade, uma declaração de situação de desemprego, que datou de 30.06.2005, onde constava falsamente que o seu contrato havia cessado por motivos de reestruturação da empresa.

  8. - Na posse daqueles documentos, o arguido entregou-os no dia 14.09.2005, na Segurança Social do Porto, com o fito de obter subsídio de desemprego, o que conseguiu, tendo, deste modo, auferido ilegitimamente subsídio de desemprego por um período de 36 meses, com um valor mensal de € 1.124,10, perfazendo um total de € 40.467,60.

  9. - O arguido agiu livre e lucidamente, preenchendo documento e fabricando declaração que a "D…" nunca havia emitido, deles constando que havia sido despedido por razões de reestruturação financeira, o que não era verdade, colocando e imitando a assinatura do gerente daquela, com o fito conseguido de obter o subsídio de desemprego a que não tinha direito e de cujo montante se apropriou, não obstante saber que a sua conduta era proibida e punível por lei.

  10. - Na sequência das funções que exercia na "D…", e por causa delas, ao arguido B… foi-lhe atribuído pela sociedade um veículo "Peugeot …", de matrícula ..-..-VI, no valor de € 42.278,17, cuja devolução lhe foi exigida quando saiu da empresa em Abril de 2005.

  11. - O arguido sabia que tinha de proceder à entrega da viatura que lhe havia sido confiada pela empresa para o seu exercício de funções, mas nunca o fez voluntariamente.

  12. - Então, a "D…" apresentou queixa por furto da aludida viatura, que se encontrava a pagar em regime de "leasing" à "I…", tendo aquela empresa determinado que um seu colaborador, de nome G…, se encarregasse da recuperação daquela.

  13. - Em meados de Junho de 2005, mas em dia anterior a 20 desse mês, o G… abordou o arguido B… em Valongo, apresentou-se-lhe, pedindo-lhe que devolvesse a viatura, e mais informando que a locatária "D…" havia apresentado queixa por furto do veículo.

  14. - Porém, o arguido B… recusou-se a devolver a viatura, e, colocando-se em exercício de condução da mesma, pôs-se em fuga, a velocidade, pelo menos, superior a 70 km/h, circulando por diversas artérias da cidade de Valongo.

  15. - Ao iniciar a respectiva fuga, o arguido B… subiu um passeio destinado ao trânsito de peões.

  16. - Em virtude de tal facto, o arguido raspou com a parte inferior do veículo no dito passeio, colocando em perigo o veículo VI.

  17. - O arguido agiu livre e conscientemente, conduzindo à...

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