Acórdão nº 6709/10.3TBVNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 08 de Outubro de 2012

Magistrado ResponsávelANA PAULA AMORIM
Data da Resolução08 de Outubro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

ImpugPaul-6709-10.3TBVNG-176-12TRP Trib Jud Vila Nova de Gaia – 1ª Vara CompMista Proc. 6709-10.3TBVNG Proc. 176-12 -TRP Recorrente: B… Recorrido: C… e outros - Juiz Desembargador Relator: Ana Paula Amorim Juízes Desembargadores Adjuntos: Soares Oliveira Ana Paula Carvalho * * *Acordam neste Tribunal da Relação do Porto (5ª secção – 3ª Cível) I. Relatório Na presente acção que segue a forma de processo ordinário em que figuram como: - AUTORES: C… e mulher D…; e - RÉUS: E… e mulher F…; B… e mulher G…; H… e mulher I… pedem os Autores: - que se declare nulos, por simulação, os contratos referenciados na petição; e Subsidiariamente, - que se julgue procedente, por provado o pedido de impugnação das vendas referenciadas na petição, restituindo-se ao património dos primeiros Réus o prédio referido na petição, permitindo-se que o mesmo seja executado no património dos terceiros Réus para pagamento da dívida dos primeiros Réus aos Autores, como se não tivesse sido alienado com todas as legais consequências; e ainda, subsidiariamente, - não se entendendo que os terceiros Réus agiram com má-fé, a condenação dos segundos Réus, nos termos do art. 616º/2 CC, a pagar aos Autores o valor do bem alienado no exacto montante da segunda venda realizada: € 76.500,00 (setenta e seis mil e quinhentos euro).

Alegam para o efeito e em síntese que por escritura pública de assunção de divida celebrada em 09.08.2001, assumiram-se os primeiros Réus e J… devedores perante os Autores da quantia de € 99.759,58, que não pagaram.

Mais referem que em 08.07.2002 os Autores instauraram o competente processo de execução contra os primeiros Réus e J…, no qual os primeiros Réus vieram a deduzir oposição, que foi julgada improcedente, por sentença de 26.01.2006.

Alegam, ainda, que por escritura pública de compra e venda celebrada em 23.09.2005 os primeiros Réus declararam vender aos segundos Réus, que declararam comprar um imóvel fracção autónoma designada pela letra “F”, sita em Vila Nova de Gaia. Em 27.09.2005 a aquisição foi registada a favor dos segundos Réus. A segunda Ré apesar de não participar no acto tomou conhecimento e aceitou o procedimento. Os segundos Réus são padrasto e mãe da primeira Ré.

Referem, ainda, que por escritura pública de compra e venda celebrada em 30.10.2009 os segundos Réus declararam vender aos terceiros Réus, que declararam comprar o mesmo imóvel, procedendo os terceiros réus ao registo de aquisição a seu favor em 30.10.2009.

Alegam os Autores, que os contratos em causa são nulos por simulação, ou não se entendendo assim, deve considerar-se que os primeiros e segundos Réus em comum acordo pretenderam prejudicar os Autores, agindo de má-fé, pois sabiam que o prédio em causa constituía o único bem que os primeiros Réus possuíam, constituindo, por isso, a forma dos Autores poderem ver ressarcidos os seus créditos e desta forma assiste-lhes o direito a impugnar a venda. Quanto aos terceiros Réus, referem que também os Réus sabiam da situação do imóvel e mesmo assim adquiriram-no, contribuindo para a diminuição das garantias dos Autores.

Alegam, por fim, que a considerar-se que os terceiros Réus não agiram de má-fé, então, devem os segundos Réus ser responsáveis perante os Autores pelo preço da segunda venda - € 76.500,00.

-Citados os Réus contestaram a primeira Ré e os segundos e terceiros Réus.

Os segundos Réus B… e mulher defendem-se por impugnação e por excepção.

Alegam, em síntese, que não se verifica o alegado pressuposto de impossibilidade de satisfação integral do crédito, porque o imóvel em causa estava onerado com hipoteca a favor do K…, SA e com a venda do prédio, os primeiros Réus liquidaram as obrigações que tinham junto do Banco, sendo certo que a vender-se o prédio no âmbito do processo executivo, nunca os Autores poderiam ver satisfeito o seu crédito.

Mais referem, que constituíram-se fiadores dos primeiros Réus e por esse motivo, assumiram o pagamento da divida ao Banco e usaram este meio, por ser o único que lhes permitia pagar a divida e adquirir o imóvel.

Alegam que sempre usaram o imóvel para sua habitação e até à data em que procederam à sua venda aos terceiros Réus. Referem, ainda, que procederam à venda do prédio aos terceiros Réus por se revelar uma transacção vantajosa, uma vez que se encontram reformados e possuem outro imóvel para residir.

Concluem que não estão reunidos os pressupostos da impugnação pauliana.

Terminam por pedir a condenação dos Autores como litigantes de má-fé, no pagamento de uma indemnização não inferior a € 1.500,00.

-Os terceiros Réus H… e mulher defendem-se por impugnação e por excepção.

Alegam, em síntese, que decidiram alterar a sua residência de Santarém para Vila Nova de Gaia, para passarem a residir junto da mãe da terceira ré. Venderam a habitação que possuíam em Santarém e diligenciaram pela aquisição de uma nova habitação, o que os conduziu a adquirir a fracção em causa nos autos, passando a residir nesse local onde recebem os seus amigos e organizam a sua vida familiar. Consideram, ainda, que os Autores não alegam factos susceptíveis de integrar o requisito da má-fé e por isso, não se pode considerar preenchidos os pressupostos da impugnação pauliana ou da simulação.

Terminam por pedir a condenação dos Autores como litigantes de má-fé.

-A primeira Ré contestou impugnando os factos alegados na petição.

-Na Réplica os Autores mantêm a posição inicial e alegam, ainda, que os segundos Réus adquiriram o imóvel livre de ónus e encargos e por esse motivo verifica-se o requisito que a lei prevê para o exercício da impugnação pauliana.

-Elaborou-se o despacho saneador e procedeu-se à selecção da matéria de facto, despacho do qual não coube reclamação.

-Realizou-se o julgamento com gravação da prova.

O despacho que contém as respostas à matéria de facto, consta de fls. 206 a 208.

-Proferiu-se sentença com a decisão que se transcreve: “Pelo exposto, decide-se: 1). Julgar improcedente o pedido de declaração de nulidade dos contratos referidos em 3) e 4), dos factos provados.

2). Julgar parcialmente procedente o pedido impugnação das vendas em questão e, em consequência, condenar os Réus B… e G… a pagarem aos Autores a quantia de € 60.053,30.

3). Absolver os restantes Réus dos pedidos.

Custas por Autores e Réus B… e G… na proporção ¼ e ¾, respetivamente. “-Os Réus B… e mulher vieram interpor recurso da sentença.

-Nas alegações que apresentaram os recorrentes formularam as seguintes conclusões: “A.

Ora salvo o reiterado respeito não podem de forma alguma os ora recorrentes conformar-se com a conclusão do MM. Juiz a quo quando este afirma que existiu má fé das partes uma vez que sabiam que com o negócio celebrado prejudicavam o credor.

B.

Até porque entendem que no âmbito da prova produzida no decurso da audiência de julgamento resultou precisamente o contrário, ou seja, que as partes agiram sem qualquer propósito de prejudicar os credores, ora recorridos.

C.

Na senda do entendimento perfilhado no Acórdão do STJ de 13-12-2005, “a consciência do prejuízo causado ao credor, que caracteriza a má-fé, pode consubstanciar-se num dolo eventual ou numa negligência consciente, ficando afastada a negligência inconsciente. O apuramento da existência dessa consciência do prejuízo é uma questão de facto.” (sublinhado e negrito nosso).

D.

O Exmo. Sr. Juiz a quo conclui pelo apuramento da existência dessa consciência do prejuízo ao dar como provados os factos 9º e 10º da base instrutória, afirmando que “Os Réus B… e G… conheciam da existência da origem e dívida referida em 2) (facto 9º) e sabiam que com a compra em causa os Réus E… e F… ficavam sem outros bens penhoráveis (10º).” E.

Utilizando tais factos para sustentar a conclusão de que as partes agiram de má fé, referindo até na sua, aliás douta, decisão, que “o devedor, para afastar tal má fé, na nossa visão, teria de demonstrar que não tinha outra alternativa viável que não fosse vender o imóvel para pagar a dívida hipotecária.” F.

E ainda que “no caso concreto, nem se demonstra que as prestações do empréstimo não eram pagas, que estivesse eminente a instauração de uma execução ou que a única forma de se solucionar a questão fosse a de vender o imóvel.” G.

Salvo o elevado respeito, entendem os aqui recorrentes que ficou amplamente demonstrado que já eram estes que assumiam o pagamento das prestações do empréstimo por impossibilidade dos 1ºs Réus.

H.

Ora, tais depoimentos, salvo o reiterado respeito foram completamente desconsiderados pelo MM Juiz a quo, uma vez que não é feita qualquer referência aos mesmos e é mesmo referido na acta de audiência de julgamento de 22/09/2011 que versou sobre a leitura da resposta à matéria de facto que “não foi junta qualquer prova documental ou testemunhal que pudesse confirmar qualquer pagamento de prestação bancária pelos 2ºs Réus”.

I.

Ora nos termos do disposto no art. 515.º do CPC, no momento da decisão, a cada uma das partes aproveita, ou prejudica, toda a instrução realizada no processo, independentemente de quem a tenha realizado (ANSELMO DE CASTRO, Direito Processual Civil Declaratório, III, 1982, pág. 174.).

J.

Nesse sentido não podem ser desconsiderados os depoimentos de parte que foram consistentes, claros e precisos por parte dos quatro Réus e donde resultou, sem margem para dúvidas, que eram já os ora recorrentes quem procediam ao pagamento das prestações do empréstimo.

K.

Na mesma medida, também não pode ser desconsiderado os depoimentos de parte que esclareceram de forma cabal a motivação da celebração do negócio que se visava impugnar e que nada tiveram a ver com o intuito de causar prejuízo aos credores, ora recorridos.

L.

Atendendo à prova produzida e supra reproduzida, não podem, de modo algum, os recorrentes, conformarem-se com a conclusão de que as partes, designadamente os ora recorrentes agiram de má fé, com o propósito e consciência de que estariam a prejudicar os credores, ora recorridos.

M.

Como se pode atestar, a motivação para a celebração do negócio foi única...

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