Acórdão nº 7-W/1994.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 29 de Outubro de 2012
Magistrado Responsável | LUÍS LAMEIRAS |
Data da Resolução | 29 de Outubro de 2012 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Recurso de Apelação Processo nº 7-W/1994.P1 Apelantes .
B…. Ld.ª .
C…… .
D…… SA --- Empresa falida .
E….. SA --- SUMÁRIO: I – No quadro normativo do Código de Processo Civil, a administração da massa falida está entregue ao administrador, que a exerce sob orientação do síndico (artigos 1210º, nº 1, daquele código, e 73º, alínea c), do Estatuto Judiciário); II – É enquanto órgão de apoio e auxiliar do tribunal que o síndico acompanha a admi-nistração, constituindo a sua autorização expressa para a prática dos respectivos actos pelo administrador, presunção forte de que eles vão ao encontro dos interesses envol-ventes; III – Se o administrador, com a concordância do síndico, entende que é conveniente para a administração da massa a constituição de mandatário judicial, e ainda que esta não seja imposta por lei, é-lhe facultada essa opção (artigo 1211º, nº 2, do Código de Processo Civil); IV – Exercido o mandato judicial, por advogado constituído pelo administrador, e apre-sentada a correspondente nota de honorários, tendo o síndico autorizado aquela cons-tituição, aprovado os actos praticados no seu exercício e aceite o volume dos honorários reclamados, opera a presunção forte referida em II–; V – Não está excluído do procedimento adjectivo da prestação de contas da adminis-tração a realização de diligências que o tribunal julgue convenientes para uma esclareci-da decisão (artigo 1265º, nº 1, final, do Código de Processo Civil); VI – Porém, essa conveniência só existe se for indiciado ou notado, em moldes ra-zoáveis e críveis, e que podem resultar de uma chamada de atenção de credores chama-dos a pronunciar-se (artigo 1265º, nº 1, princípio, do Código de Processo Civil), que as contas padecem de vício ou desajustamento (formal ou substancial) que permita duvidar da respectiva fiabilidade ou genuinidade; VII – Apresentadas, no correspondente apenso, as contas da administração e nelas es-pecificada, como verba de despesa, o valor de honorários, apoiado no documento da res-pectiva nota, e dando o síndico parecer positivo, decide bem, em princípio, a sentença que julgue como boas essas contas, assim organizadas; VIII – A esse julgamento só poderia obstar uma oposição dos credores à verba de des-pesa que se traduzisse numa alegação concreta e consistente de cada um procedimentos perpetrados pelo credor dos honorários, que retratasse o desvio ou a oposição aos inte-resses da administração, e para além disso com indiciação de uma sustentação proba-tória que, com solidez, o permitisse revelar; IX – Na falta dessa consistência na alegação, e indiciação probatória sólida a sustentá-la, prevalece a presunção da idoneidade dos actos, sustentada na autorização e aceitação (e no posterior parecer positivo) do síndico; afinal quem, em cada um dos momentos próprios, acompanhou e orientou o exercício daquele mandato.
Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I – Relatório 1.
Da instância da prestação de contas.
F….
, administrador da massa falida da em-presa E…. SA, apresentou contas da administração, organiza-das em modelo de conta-corrente (fls. 5 a 6), a terminar com resumo de receita e despesa, a 1ª com o volume de 11.488,34 € e a 2ª com o de 201.209,99 €, eviden-ciando o saldo final devedor de 189.721,65 € (fls. 2).
Fez acompanhá-las de parecer da síndica da falência, que se pronun-ciou no sentido da respectiva aprovação (doc fls. 3 a 4). E também de documen-tos de apoio a cada uma das verbas enunciadas (docs fls. 7 a 68).
Os credores e a falida foram notificados.
Pronunciaram-se os credores B…. Ld.ª, C….
e D…. SA (v fls. 78 a 85); em suma, para manifestarem a sua discordância no tocante à verba de “honorários Dr. G….
”, débito 82.236,00 € (fls. 6), sustentada em “no-ta final de honorários e despesas” (doc fls. 62 a 67), já que à longa batalha jurí-dica que permitiu integrar na massa património imobiliário foi alheio o mandato outorgado pelo administrador ao advogado Dr. António G….; ademais, é pessoal o exercício da administração (artigo 1211º, nº 2), havendo na nota de honorários actos não carentes de mandatário judicial e outros alheios a qualquer trabalho; e de todo o modo sem contributo (alguns à revelia) para o objectivo de administração da massa; por fim, exageradíssimos tais honorários, devem ser limitados ao montante de 15.000,00 €.
Na vista que teve, o Ministério Público sublinhou que o mandato foi conferido não só àquele, mas também a outro advogado, com a devida autorização da síndica; e igualmente quanto ao volume dos honorários apresentados por cada um; concluindo deverem as contas ser julgadas boas (v fls. 101 a 102).
O juiz “a quo” solicitou esclarecimentos ao administrador (fls. 103).
E este veio prestá-los (fls. 105).
Foi, por fim, proferida sentença (v fls. 107 a 110). No essencial, após sublinhar o estatuto do síndico das falências, acrescentou que, no caso, todos os actos do administrador foram por ele autorizados, “nomeadamente aqueles de que incumbiu o ilustre mandatário sr. Dr. G…. de praticar, mesmo não sendo exigível a constituição de mandatário”; por conseguinte, que autorizada foi a despesa inerente; aliás de valor devidamente comprovado pela junção da nota de honorários; que o escrutínio do excesso desse valor escapa à natureza dos autos (nem o credor é aqui parte); em suma, que a concordância do síndico (que fiscalizou, superintendeu e autorizou) permite considerar ajustado o valor de honorários indicado.
As contas são portanto boas; e assim foram julgadas.
-
Da instância do recurso de apelação.
2.1.
Os credores B…. Ld.ª, C….
e D…. SA interpuseram recurso de apelação.
O recurso foi liminarmente admitido no tribunal “a quo” (fls. 128).
Os recorrentes fizeram culminar a alegação com estas conclusões: a) Nos termos de sentença proferida, transitada em julgado, compete aos recorrentes, nos termos e decorrentemente do acordo de credores firmado, pagar as custas do processo de falência; b) A conta de custas foi apresentada pelo administrador da massa falida, nos termos constantes do disposto nos artigos 1261º a 1264º do Código de Processo Civil; c) Notificados para o efeito, os recorrentes (credores da massa falida) viriam a pronunciar-se sobre as contas, discordando da verba de despesa constante do documento respeitante à nota de honorários apresentada pelo mandatário da massa falida, sr. dr. António G....; d) E discordando, no essencial, porque na nota de honorários: i) constam trabalhos que deveriam ter sido efectuados, pessoalmente, pelo administrador da falência e não cometidos a terceiros (artigo 1211º CPC), ii) estão relacionados como diligências e trabalhos efectuados, meras alusões a actos c documentos de terceiros; iii) estão relatados serviços prestados a terceiros, pelo referido sr. advogado, que nada tiveram a ver com os interesses da massa falida e até lhe eram contrários; mormente a sua alegada colaboração contra o acordo de credores que permitiria (como permitiu) o pagamento de todos os credores e custas do processo; e) Ainda porque os honorários reclamados pelos serviços realmente prestados eram infundamentados, avultadíssimos e até absurdos; f) O tribunal “a quo”, entretanto, deu como boas as referidas contas por duas ordens de razões: 1.ª formalmente, por estarem apresentadas nos termos da lei; 2.ª substancialmente, por entender que essa matéria não cumpria apreciar e decidir nos presentes autos atenta (i.) a sua natureza, (ii.) o facto do credor dos honorários não sendo parte nos mesmos, estar impedido de exercer o respectivo contraditório e, por fim, (iii.) atenta a circunstância das contas já terem sido, anteriormente, aprovadas pelo síndico, que as “acompanhou, fiscalizou, superintendeu e autorizou”; g) No plano formal nada há a objectar; no plano substancial discorda-se, por três ordens de razões: 1.ª a matéria em causa (ponderação e decisão sobre contas dum processo de falência) não só cumpre apreciar e decidir nos autos de prestação de contas que lhe são próprios e lhe são apensos, como só em tais autos (especialmente para tal criados e vocacionados) a mesma deve ser apreciada e decidida; a natureza da “causa decidendi” assim o impõe; 2.ª o contraditório respeitante à pronúncia apresentada pelos recorrentes quanto aos citados honorários podia ter sido efectuado por quem os apresentou (o sr. administrador da massa falida, mandante do sr. dr...
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