Acórdão nº 787/06.7TBMAI.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 30 de Outubro de 2012

Magistrado ResponsávelMÁRCIA PORTELA
Data da Resolução30 de Outubro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Apelação 787/06.7TBMAI.P1 Acordam no Tribunal da Relação do Porto 1. Relatório B….., casada, residente na Rua …., n.º …, …., Maia, e C…., casado, residente na Rua …., n.º …, …., Póvoa de Varzim, intentaram acção declarativa, com processo comum, sob a forma ordinária, contra D.…, casado, residente na Rua …., …., …, Maia, pedindo que: — seja declarado e reconhecido que D…. é pai biológico de E….., ordenando-se o correspondente averbamento no respectivo registo de nascimento do seu falecido filho, bem como nos registos de nascimento dos AA., neles passando a figurar o R. como seu avô paterno; — seja declarado que o R. se furtou culposamente ao dever legal de perfilhar E…., com o que violou o direito deste a ser perfilhado, constituindo--se na obrigação de indemnizar, bem como aos seus descendentes, aqui AA., em termos e montantes a fixar em execução de sentença; — não seja aplicado, in casu, por inconstitucionalidade, o n.º 5 do artigo 1817.º CC, na parte em que estabelece um prazo de caducidade.

Alegram para tanto, e em síntese, que: — No dia 4 de Outubro de 1947, na freguesia de …, concelho da Maia, nasceu E….., pai dos AA.; — O seu nascimento foi registado na C. R. Civil da Maia, constando F…. como sua mãe, não tendo havido investigação oficiosa da paternidade por parte do Mistério Público; — No início de 1946, na Trofa, o R. conheceu a F….., tendo-se estabelecido entre ambos uma grande empatia, em resultado da qual começaram a sair e a ser vistos juntos em público; — No seguimento desse relacionamento, a F….. teve com o R. por várias vezes relações sexuais de cópula completa, uma das quais foi fecunda, de cuja gravidez veio a nascer E…..; — No período compreendido entre 7 de Dezembro de 1946 e 6 de Abril de 1947, F…. manteve, única e exclusivamente, relações sexuais com o R.; — Ao longo do período da gravidez o R. e a F...... mantiveram o seu relacionamento, encontrando-se por diversas vezes; — Em meados de 1949, o R. e F...... desentenderam-se, diminuindo, consequentemente, a frequência dos encontros; — Posteriormente a essa data o R. conhece G….., com quem contraiu matrimónio no dia 21 de Outubro de 1950; — A partir dessa data, e devido a alteração na sua vida pessoal e familiar, o R. foi forçado a diminuir os contactos pessoais que mantinha com F...... e seu filho, dado que a sua mulher desconhecia a relação que mantivera com a F......; — Porém, nunca o R. deixou de prestar o seu auxílio, nomeadamente a nível económico, enviando sempre que podia uma quantia em dinheiro para as despesas relativas a alimentação, vestuário e educação de seu filho; — O falecido E…. viveu sempre com a sua mãe, na Rua …., n.º …, …., Castelo da Maia, morada em que o R. visitava, habitualmente, a F...... e o seu filho, entregando-lhes dinheiro, víveres, brinquedos e livros; — Tendo o R. acompanhado ainda toda a educação de E…., chegando mesmo a dedicar algum do seu tempo ao acompanhamento dos seus afazeres escolares; — O falecido E…. e H….. convidaram pessoalmente o R. para o casamento, tendo-se, para o efeito, deslocado ao local de trabalho do R., sito na Rua ….s, n.º …, na Maia; — Contudo, tal convite não pode ser aceite dado que E….. não era conhecido nem reconhecido como filho pela família do R.; — Entre 1972 e 1996, o R. decidiu, na condição de pai, ajudar financeiramente seu filho E….., pagando-lhe, reiteradamente, uma quantia mensal, inicialmente no valor de Esc. 50.000$00, a qual foi sendo actualizada anualmente, de forma em 1996 tal quantia havia ascendido ao valor de Esc. 350.000$00 mensais; — Não obstante não ter sido possível comparecer ao casamento de seu filho, o R. demonstrou interesse em conhecer a esposa do seu filho, tendo agendado com ele e com a Sra. D. H…. um encontro, no qual, pela primeira vez, H…., conheceu o R.; — Tendo este, uma vez mais, se disponibilizado a ajudá-los no que quer que fosse; — Tal ajuda ficou sujeita à condição de não ser do conhecimento da sua família, mais propriamente, da sua esposa e filhos desta; — Tendo concordado que qualquer contacto deveria ser feito para o local de trabalho do R., sito na Rua …, n.º …, na Maia, por volta das 13:45, dado que nesse horário ninguém se encontrava na drogaria; — Sendo também a esta hora que o R. ligava à mãe dos AA. para. combinarem os seus encontros, que normalmente se realizavam nas feiras da Senhora do Hora e de Custóias, com o propósito de se inteirar das novidades e de entregar, mensalmente, as já aludidas ajudas financeiras; — Em 1974, E….. emigrou para França, onde permaneceu até 1995; — Este facto não impediu o R. de se encontrar com H......, nem de continuar a efectuar as entregas monetárias que permitiram dar algum conforto à família do seu filho; — Nem tão pouco que se informasse acerca de E...... e dos seus netos, disponibilizando-se sempre para os ajudar; — Sempre que havia despesas extraordinárias, H...... (Mãe dos AA.), contactava telefonicamente o R., nunca este negando a ajuda financeira pedida pela mãe dos seus netos; — Em meados de 1997, H......, num dos contactos telefónicos que nunca deixara de manter com o R., foi surpreendida por um outro filho do mesmo; — Tendo sido por este informada de que conhecia toda a história; — E de que não iria permitir que seu pai continuasse periodicamente a efectuar as entregas monetárias; — Em resultado de tal facto os contactos quer telefónicos quer pessoais diminuíram de frequência, sem que o R., efectivamente, tivesse deixado de prestar o seu auxílio económico aos AA.; — Na altura da morte de E….., era o R. quem lhe pagava as rendas da casa e ajudava com as suas despesas; — E mesmo após o seu falecimento, o R. manifestava preocupação com os AA. mediante contactos telefónicos com a mãe daqueles, muito embora cada vez mais escassos; — A partir de 2005, os contactos do R. com os AA. ou com a sua mãe deixaram de existir, e as tentativas efectuadas por estes da manter contacto com o avô não lograram qualquer resultado.

Contestou o R., excepcionando a caducidade do direito dos AA. em accionar o R., pelo decurso dos prazos a que alude o artigo 1817.º, n.ºs. 4 e/ou 5, CC., Civil, e deduzindo impugnação. Afirmou ainda ter estado ausente do Continente desde 1944.04.02 até finais de Julho de 1946, a prestar serviço militar em Luanda, Angola, razão pela qual não era possível que no início de 1946, na Trofa, tivesse conhecido F....... E que não teve relações de amizade e/ou sexuais com a dita F......, nem nunca prestou qualquer auxílio económico à F......, ao E….., e muito menos aos AA..

Replicaram os AA., pugnando pela improcedência da excepção.

Foi proferido despacho de aperfeiçoamento abrigo do disposto no artigo 508.º, n.º 3, CPC, convidando os AA. a aperfeiçoar a petição inicial, no sentido de concretizarem factos que permitam preencher o requisito “reputação como filho pelo público” constante do artigo 1871.º, n.º 1, alínea a), CC.

Os AA. apresentaram articulado que foi impugnado pelo R..

Foi proferido despacho saneador que relegou para final o conhecimento da excepção de prescrição, tendo-se procedido à selecção dos factos relevantes.

Procedeu-se à instrução do processo, tendo sido proferido despacho de indeferimento do pedido de depoimento de parte do R., formulado pelos AA., do qual agravaram, apresentando as seguintes conclusões: «- Por despacho datado de 07.01.2008, os Recorrentes foram notificados da decisão do Mmº Juíz no sentido de indeferir o depoimento de parte do Réu dada a natureza indisponível do objecto da presente e o intuito da prova por depoimento de parte (confissão).

- Não se conformando com o despacho proferido, os Recorrentes agravaram da decisão proferida porquanto: - Os recorrentes interpuseram a presente acção, estruturando-a com dupla: causa de pedir – a posse de estado e a presunção resultante do facto da sua avó haver mantido com o recorrente relações sexuais de cópula completa período legal de concepção do pai daqueles, por um lado e na relação biológica pura, por outro.

- Se, por forma a dar provimento à sua pretensão, os recorridos alegaram factos reais que, caso não sejam ilididas, podem levar à procedência do pedido efectuado, os meios de prova admissíveis são os comuns, - No que toca à alegação da relação biológica pura (as chamadas acções de “bica aberta”) esta acção pode, tão somente, ser realizada por recurso a meios científicos; - Em sede de depoimento de parte do recorrido, na matéria constante nos quesitos 1.° a 45.º da Base instrutória, - Ou seja, quanto aos factos pessoais relativos ao relacionamento que está na origem da presente acção e que podem determinar a procedência das presunções.

- O requerido foi indeferido pelo que os Recorrente agravaram do despacho proferido, uma vez que, não se tratando de confissão de direitos indisponíveis, outrossim, repete-se, de factos pessoais que apenas são conhecimento dos autores do relacionamento em questão (o ora requerido) tal depoimento deverá ser admitido.

Com efeito - Se é de todo indiscutível que o depoimento de parte só pode ser exigido de quem tenha capacidade judiciária e apenas pode versar sobre factos pessoais que o depoente tenha conhecimento, - A alínea b) do artigo 354.° do CC dispõe serem insusceptíveis de confissão os direitos indisponíveis, - No entanto, este conflito substantivo-adjectivo da lei deverá ser solucionado ouvindo-se o pretenso pai numa acção de paternidade através do depoimento de parte não por forma a obter dele a confissão, mas apenas para contribuir para o esclarecimento da verdade material .

Pelo que o despacho proferido deverá ser, nesta consonância, substituído por outro em que se admita o depoimento de parte do recorrido.

Assim, revogando-se a decisão recorrida, farão V. Ex.as inteira e sã JUSTIÇA!» Contra-alegou o agravado, pugnando pela manutenção do decidido.

Foi proferido despacho sustentação.

Através do requerimento electrónico de 2009.06.15, o R. requereu a aplicação aos presentes autos da Lei n.º 14/2009, de 1 de Abril, em virtude de a mesma se aplicar aos...

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