Acórdão nº 2392/09.7TBSTS.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 16 de Outubro de 2012

Magistrado ResponsávelMARIA JOÃO AREIAS
Data da Resolução16 de Outubro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 2392/09.7TBSTS.P1 – Apelação Relator: Maria João Areias 1º Adjunto: Maria de Jesus Pereira 2º Adjunto: Rui Moreira Acordam no Tribunal da Relação do Porto (2ª Secção): I – RELATÓRIO.

B… e mulher, C…, intentam a presente acção declarativa sob a forma de processo ordinário contra: Rede Ferroviária Nacional – REFER, EP., Pedindo a condenação da ré a pagar aos autores a quantia de €242.181,85, acrescida de juros de mora desde a citação, à taxa legal, até efectivo e integral pagamento, com fundamento em que a construção da linha … importou a criação, sobre um prédio dos autores, de uma zona non aedificandi a favor do domínio público ferroviário que desvaloriza o referido prédio.

A Ré contestou alegando, em síntese, que o estabelecimento da servidão não impede a construção na parte restante do prédio dos autores, sendo certo que a situação em apreço não cabe na previsão do artigo 8.º do Código das Expropriações. Mais impugna o valor peticionado pelos autores por totalmente desadequado.

Foi elaborado despacho saneador no qual foi fixada a base instrutória.

Realizada audiência de julgamento, foi proferido despacho de resposta à matéria de facto constante da Base Instrutória.

Foi proferida sentença a condenar a ré, Rede Ferroviária Nacional – Refer, E.P., a pagar aos autores a quantia de €159.672,01, acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados desde a data da citação e até efectivo e integral pagamento.

Inconformada com tal sentença, a Ré dela veio interpor recurso de apelação, concluindo a sua motivação com as seguintes conclusões: 1 – A certidão emitida pela C.M. …, em 14 de Dezembro de 2007 (doc.1 junto com a contestação), certifica que o terreno mantém a sua capacidade construtiva e, tendo em conta os afastamentos mínimos, refere que considerando “a construção da infra-estrutura ferroviária, que estabelece uma servidão “non aedificandi” de 10 m, o polígono de implantação, calculado de 1870 m2 sofre uma redução de 98 m2, o que perfaz 1772 m2.

2 – Dado que o terreno mantém a sua capacidade construtiva, não existe qualquer desvalorização por causa da servidão “non aedificandi” que sobre o prédio é imposta pelo DL nº 276/2003, de 4 de Novembro.

3 – Assim, porque não são aplicáveis, ao caso em apreço, nenhuma das situações previstas no nº2 do art. 8º do C.E., não há lugar ao pagamento de qualquer indemnização.

4 – Todavia, caso assim não se entenda, faz-se notar que na sentença recorrida refere-se que, como resulta da certidão emitida pela C.M. … “a Zona em que se insere o prédio dos AA – Zona de Construção Tipo I – destina-se à construção uni ou bifamiliar, sendo que o PDM em vigor permite a construção de um prédio constituído por r/c e dois andares, acima da cota da soleira”.

5 – Segundo determina o nº1 do art. 65º do Regulamento Geral das Edificações Urbanas, aprovado pelo DL nº 38 382, de 7 de Agosto, com a redacção introduzida pelo DL 650/75, de 18 de Novembro, a altura mínima, piso a piso em habitações destinadas à habitação é de 2,70 m, pelo que a altura de um prédio de r/c e dois andares não atinge os 10,50 m de altura, como é mencionado na dita sentença.

6 – Logo, aderindo aos cálculos efectuados pelos Srs. peritos no relatório pericial, o tribunal nunca poderia concluir, como concluiu, por um valor de uma desvalorização correspondente à diferença entre o valor que o prédio teria sem qualquer servidão “non aedificandi” e o valor que passa a ter depois de sujeito à servidão prevista no nº2 do art. 15, pois, como já referimos, esta disposição não se aplica à situação em apreço.

7 – Caso se considere que existe uma desvalorização, para o cálculo dessa desvalorização só se pode ter em conta 98 m2 indicados na certidão emitida pela Autarquia, que corresponde à redução do polígono de implantação, já que, embora não possam construir no terreno sujeito à servidão non aedificandi, os AA. poderão continuar a usufruir do mesmo como “solo apto para outros fins”.

8 – Considerando o valor comercial do prédio dos AA. que foi estabelecido pelos Srs. peritos e o valor do mesmo prédio apurado em tribunal caso o mesmo se destinasse exclusivamente para fins agrícolas, a indemnização nunca poderia ser superior à diferença, relativamente aos 98 m2, entre o valor do solo “apto para construção” e o valor do solo destinado a “outros fins”.

Conclui pela revogação da sentença que deverá ser substituída por outra que absolva a ré do pedido formulado pela autora.

Foram apresentadas contra-alegações pelos AA., no sentido da manutenção do decidido.

Dispensados que foram os vistos legais, ao abrigo do disposto no nº4 do art. 707º, do CPC, há que decidir.

II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO.

Tendo em consideração que as conclusões do recurso delimitam o respectivo âmbito (cfr. arts. 684, nº 3, e 685-A, do C.P.C.), as questões a decidir são as seguintes: 1. Existência de dano indemnizável.

  1. Fixação do respectivo valor.

    III – APRECIAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO.

    1. Matéria de Facto.

      São os seguintes, os factos dados como provados na decisão recorrida:

    2. No dia 30/4/1971, foi celebrada escritura pública de doação nos termos da qual foi doada à A. mulher, um terreno destinado a construção urbana, com área de 600m2, sito no …, que confronta a norte e nascente com D… e mulher, E…, do sul com F… e do poente com caminho público, a destacar do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Santo Tirso, sob o n° 33783.

    3. Por escritura de compra e venda datada de 2817/1982, os AA. adquiriram por compra a D… e mulher, E…, uma parcela de terreno com a área de 2.500m2, sito no …, a confrontar a norte com caminho e G…, do sul com caminho, do nascente com o comprador e do poente com os vendedores, a destacar do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial de Santo Tirso, sob o no 33783 e do inscrito na matriz rústica respectiva sob o art. 1776, destinando-se o dito terreno a rectificação de estremas do quintal do prédio urbano do comprador, sito no … e descrito na Conservatória do Registo Predial de Santo Tirso, sob o n° 48287 e inscrito na respectiva matriz sob o art.1786 e que, após a junção, fica a confrontar do norte com caminho e G…, do sul com caminho público, do poente com os vendedores e do nascente com F….

    4. Esta compra foi efectuada com reserva de usufruto para os vendedores, os quais já faleceram.

    5. Os AA., por si e pelos seus antecessores, são possuidores do prédio há mais de 50 anos, onde cultivam e colhem o milho, batata, vinho e outros produtos agrícolas.

    6. Os AA também habitam há mais de 30 anos a casa que no prédio construíram, à vista de toda a gente, na intenção e convicção de que o prédio lhes pertence.

    7. O prédio dos AA é um prédio urbano, com um logradouro de 3009,84m2 e área coberta com 90,16 m2, confronta pelo Norte com a Rua …, pelo Sul com a Rua …, pelo Nascente com H… e outros e pelo lado Poente confronta actualmente com a via férrea, uma vez, que o prédio rústico que confrontava pelo lado Poente, com o prédio dos AA., e que era propriedade dos herdeiros de I…, foi expropriado pela Ré, a fim de nele ser construída a Linha ….

    8. Em consequência da dita expropriação, foi constituída uma zona non aedificandi numa extensão de 105 m, a favor do domínio público ferroviário, sobre o prédio dos AA. e que terá no mínimo uma distância de 10 m, podendo mesmo atingir os 25 m, ao longo do comprimento do referido prédio onerado.

    9. A configuração do prédio dos AA. é a de um polígono irregular alongado no sentido Norte-sul, por onde confronta com a via-férrea.

    10. De acordo com o Regulamento do PDM do concelho da Trofa, está inserido em zona de solo apto para construção, nomeadamente numa zona urbanizada onde predominam construções destinadas a habitação uni ou bifamiliar, com três pisos, o local é servido de ruas pavimentadas de asfalto, tem rede de abastecimento água, electricidade, gás, telefone, drenagem de águas pluviais, saneamento e colector para recolha.

    11. Em sede de negociação particular, pagou a Ré, pela expropriação do prédio confrontante com o dos AA., a quantia global de €202.847,72, a qual inclui as benfeitorias aí existentes.

    12. A imposição referida em G) vai tornar impossível a construção no prédio dos autores na área abrangida pela servidão, enquanto que na restante área a construção é possível, embora condicionada pela configuração geométrica do prédio.

    13. A imposição referida em G) constitui prejuízo para os autores na medida em que diminui a área de construção possível no prédio, o qual sendo um prédio destinado a construção ficou onerado e...

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