Acórdão nº 212/11.1TVPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 29 de Maio de 2012

Magistrado ResponsávelM. PINTO DOS SANTOS
Data da Resolução29 de Maio de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Pc. 212/11.1TVPRT.P1 – 2ª Secção (apelação) ___________ Relator: Pinto dos Santos Adjuntos: Des. Ondina Carmo Alves Des. Ramos Lopes* * * Acordam nesta secção cível do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório: B….., Lda.

instaurou a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra C……, na qual conclui pedindo a condenação deste a pagar-lhe a quantia de 45.400,00 €, acrescida de IVA e dos respectivos juros de mora vencidos e vincendos até efectivo pagamento.

Para tal alegou que: • celebrou com o réu contrato de prestação de serviços, nos termos do qual se obrigou à elaboração de um projecto de arquitectura relativo à construção de uma habitação multifamiliar, tendo como contrapartida o recebimento da importância de 104.000,00 €, a liquidar faseadamente em função do desenvolvimento desse projecto; • devido à entrada em vigor do novo Plano Director Municipal de Vila Nova de Gaia, foi necessário proceder a algumas alterações ao projecto original, o que motivou uma redução da respectiva área de construção e determinou um ajuste nos honorários, acordando as partes que os mesmos passariam a cifrar-se em 70.000,00 € mais IVA, igualmente a liquidar na forma faseada que havia sido convencionada; • interpelou o réu para proceder à liquidação da quantia em dívida, no montante de 45.400,00 € mais IVA, pela execução que havia levado a cabo das quatro primeiras fases acordadas, pagamento que aquele, contudo, não efectuou, continuando em dívida apesar das interpelações que lhe fez.

O réu, citado, contestou a acção, impugnando parte da factualidade alegada pela autora e excepcionando o pagamento da parte da dívida que reconhece e a prescrição presuntiva prevista na al. c) do art. 317º do CCiv..

Pugnou pela procedência destas excepções e pela improcedência da acção, com as legais consequências.

A autora replicou às excepções arguidas pelo réu e concluiu pela sua improcedência.

Foi proferido despacho saneador tabelar, fixou-se a matéria de facto assente e organizou-se a base instrutória, sem reclamação das partes.

Realizada a audiência de discussão e julgamento e dada resposta aos quesitos da base instrutória (despacho de fls. 70 a 72), foi proferida sentença (fls. 73 a 88) que julgou a acção parcialmente procedente e condenou o réu a pagar à autora a quantia de 42.000,00 € (quarenta e dois mil euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal, vencidos e vincendos até efectivo pagamento, tendo ainda a autora e o réu nas custas, “na proporção da respectiva sucumbência”.

Inconformado com o sentenciado, interpôs o réu o recurso de apelação em apreço, cujas alegações culminou com as seguintes conclusões: “1) Com o presente Recurso, pretende-se a alteração da matéria de facto dada como provada no ponto 9º dos factos controvertidos dado que a recorrida não logrou provar que no dia 31 de Março de 2010 foi aprovado o projecto que estava incumbida de realizar e, nesse sentido, não poderia o Tribunal a quo ter dado como provada a parte final do quesito 9º.

2) Acerca desta matéria, no seu depoimento (constante da ata com a referência 8326261, gravado CD, com início às 10:05:59 e fim às 10:38:46), mais concretamente entre o minuto 22:50 e o minuto 25:50, quanto confrontada com o Doc. 3 anexo à Réplica e no qual sustenta a recorrida a alegada aprovação do projeto, confirmou a testemunha que essa aprovação foi condicionada, tal como resulta aliás do referido documento.

3) Além disso, quando questionada pelo meritíssimo juiz e pelo mandatário da recorrente sobre o teor dessas condicionantes, a testemunha afirmou que não se recordava e que não podia esclarecer. Apenas acreditava que se reportasse à mera junção de documentos, contudo, não podia assegurar.

4) Apesar de a notificação em causa também ter sido dirigida ao recorrente e de este ter sido notificado para juntar o mesmo aos autos e não o ter feito nem ter levantado a questão, não pode o Tribunal a quo ignorar que esse mesmo documento ou a informação que nele consta, era deveras pertinente ao apuramento da verdade e que, mesmo não tendo a questão sido levantada em tempo pelo recorrente, tal não elide a obrigação do Tribunal a quo de procurar a verdade material dos factos, ao invés da verdade formal.

5) Tanto assim o era que, não podia o Tribunal a quo olvidar que, a esta questão é tão mais pertinente quando as testemunhas não conseguiram, sobre elas, ser esclarecedoras, tendo inclusivamente a testemunha D…… confirmado mesmo a existência de condicionantes, contudo, não logrando esclarecer de que tipo.

6) Em face disto, deveria a resposta do Tribunal ao quesito 9º ter sido: “Apresentou soluções e esclarecimentos de ordem técnica e construtiva, com vista a aprovação do projecto junto da G........” 7) Não pode o recorrente aceitar que aos quesitos 11º, 12º e 13º da matéria controvertida, tenha o Tribunal a quo respondido “Provado”.

8) Ora, acerca desta matéria, ficou claro que a testemunha D….. já não trabalha ao serviço da recorrida, nem participou nos trabalhos nem em qualquer reunião que sobre este mesmo assunto decorreu entre a recorrida e o recorrente, não podendo atestar qualquer dos factos vertidos nestes três quesitos, tal como se pode aferir pelo teor do seu depoimento, na totalidade (constante da ata com a referência 8326261, gravado CD, com início às 10:05:59 e fim às 10:38:46).

9) Releva sobretudo que não participou a testemunha D….., como não participaram nenhuma das outras testemunhas ouvidas em sede de julgamento, conforme se pode aferir pelos respetivos depoimentos: testemunha E….. (depoimento constante da ata com a referência 8326261, gravado CD, com início às 10:39:28 e fim às 10:48:32) e a testemunha F…. (depoimento constante da ata com a referência 8326261, gravado CD, com início às 10:49:24 e fim às 10:55:33).

10) Como consequência, não teve nem tem o Tribunal a quo qualquer documento ou prova testemunhal de que foi a pedido do recorrente que o valor total dos honorários peticionados pela recorrida, foram reduzidos (resposta ao quesito nº11).

11) Assim como não tem qualquer suporte probatório para responder positivamente ao quesito 12, dando como provado que foi o recorrente que propôs um acordo de pagamento.

12) Assim como inexiste qualquer prova que suporte a conclusão do Tribunal a quo de que o recorrente não deu qualquer resposta à recorrida, ignorando as alegadas insistências da mesma.

13) Desta forma, a resposta ao quesito 11º deveria ter sido a seguinte: “…e isso determinou um ajuste nos honorários, passando os mesmos a ser de 70.000,00 Euros mais IVA (setenta mil euros) ao invés dos 104.000,00 Euros referidos em 1º.”.

14) Por sua vez, a resposta ao quesito 12º deveria ter sido: “Foi proposto pela Autora um acordo para pagamento faseado do montante em dívida.”.

15) Assim como ao quesito 13º, deveria o Tribunal a quo ter respondido apenas como: Não provado.

16) Quanto aos quesitos 17º e 18ºdos factos controvertidos, entendeu o Tribunal a quo que se deram como não provados.

17) Ora, acerca desta matéria respondeu a testemunha F….. (constante da ata com a referência 8326261, gravado CD, com início às 10:05:59 e fim às 10:38:46) que, tal como já se disse, já não presta serviços no gabinete da recorrida nem participou em quaisquer negociações do projecto em crise.

18) Desde logo porque o depoimento da testemunha não deve ser valorizado por se tratar de depoimento indirecto, violando assim regras da prova testemunhal e o princípio constitucional da igualdade perante a lei (cfr., nomeadamente, artigos 392º do Código Civil, 616º e seguintes do Código de Processo Civil; e 13º da Constituição).

19) Foi a testemunha quem referiu no seu depoimento – desde o minuto 00:00 ao minuto 00:01, que em momento algum interveio nas negociações do projecto, nem tão pouco nas alegadas reuniões quanto pagamento foram efectuados, por já não existir qualquer relacionamento profissional entre esta e a recorrida.

20) Por outro lado, tendo sido invocada a prescrição presuntiva prevista no artigo 317º al. c) do Código Civil que, tal como impõe a lei e atendendo que está em causa a presunção de um pagamento, presume-se que este tenha sido efectuado, dispensando assim o devedor da respectiva prova e, além do mais, 21) Dada a inversão do ónus da prova, o afastamento desta presunção apenas poderia ser efectuado pelo recorrido mediante confissão do recorrente, o que não foi feito dado não ter sido requerido o depoimento de parte do recorrente e inexistir qualquer confissão extrajudicial.

22) Em face do que se expõe e com base em tais considerações, deverão os quesitos 17º e 18º ser dados como “Provado(s)”.

Da solução de Direito 23) Tal como já foi abordado, o tribunal a quo errou na apreciação da prescrição presuntiva invocada pelo recorrente, concluindo que “não se mostra preenchida a previsão da al. c) do art. 317º, já que na mesma se tem em vista os créditos emergentes dos serviços prestados por profissionais liberais, qualidade de que a autora, enquanto sociedade por quotas, não comunga, sendo certo outrossim que os serviços prestados não são resultantes do exercício de profissões liberais, como é pressuposto pela aludida normatividade.

24) Contudo e tal como vimos de referir no tocante à prova dos factos 17º e 18º, a não elisão da presunção de pagamento, implica obrigatoriamente diferente solução de e direito. Vejamos, 25) O facto da recorrida ser uma sociedade comercial por quotas, não afasta o objecto do serviço prestado, este sim, no exercício de uma profissão liberal, mostrando-se irrelevante a qualidade subjectiva da entidade que presta o serviço.

26) Neste sentido, pronunciou-se o Supremo Tribunal de Justiça por acórdão de 12.09.2006 (processo 06A1764), disponível em www.dgsi.pt, de onde resulta expressamente que para efeitos de aplicação do art. 317.º, al. c), do CC é essencial a natureza dos serviços prestados, mas indiferente a qualificação jurídica da entidade que os presta; nada impede que se trate uma sociedade comercial tendo por objecto a...

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