Acórdão nº 610/06.2TBOVR.C1.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 22 de Maio de 2012
Magistrado Responsável | FERNANDO SAMÕES |
Data da Resolução | 22 de Maio de 2012 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Processo n.º 610/06.2TBOVR.C1.P1*Relator: Fernando Samões 1.º Adjunto: Dr. Vieira e Cunha 2.º Adjunto: Dr.ª Maria Eiró Acordam no Tribunal da Relação do Porto - 2.ª Secção: I. Relatório B…, solteiro, residente na Rua …, n.º …, …, Ovar, instaurou, em 16/3/2006, no Tribunal daquela comarca, onde foi distribuída ao 3.º Juízo, acção declarativa com processo comum e forma ordinária contra C… e mulher D…, casados no regime da comunhão geral de bens, residentes na Rua …, n.º …, Santa Maria da Feira, pedindo a condenação dos réus a: a) proceder ou mandar proceder, a expensas suas e por sua exclusiva responsabilidade, a todas as obras necessárias e adequadas a eliminarem os defeitos de construção existentes no identificado prédio, com início dos trabalhos dentro de um prazo de 20 (vinte) dias após ser proferida sentença e com conclusão nos 30 (trinta dias) subsequentes; b) em alternativa, pagar ao autor a quantia de € 50.000,00 (cinquenta mil euros), que deverá ser actualizada na proporção da variação dos preços ao consumidor desde a data de elaboração dos orçamentos juntos até à da conclusão da obra; c) pagar ao autor a quantia de € 1.500 (mil e quinhentos euros) despendida em consultas psiquiátricas; d) pagar ao autor a indemnização de todos os prejuízos já sofridos, não possíveis de liquidar naquele momento, e a sofrer em consequência dos sobreditos defeitos de construção e dos trabalhos necessários à sua eliminação, em montante a liquidar em execução de sentença.
Para tanto, alegou, em resumo, que comprou aos réus, um prédio urbano, que estes construíram, composto por casa de rés-do-chão e 1.º andar, com anexo e logradouro, destinada a habitação, o qual apresenta diversos defeitos de construção, que discrimina e que denunciou pela forma que descreve, tendo-se os réus comprometido a repará-los, mas que não repararam nem estavam dispostos a reparar devidamente, pois as obras que iniciaram limitavam-se a ocultar os vícios e defeitos do imóvel, causando-lhe prejuízos.
Os réus contestaram, por impugnação e alegando, em síntese, que o imóvel foi construído por terceiras pessoas contratadas pelo réu, o mesmo foi adquirido quando ainda faltava parte dos acabamentos que o autor se comprometeu executar por sua conta, reconhece a existência dos defeitos que se obrigou a reparar num acordo entre eles celebrado, o que não fez por ter sido impedido pelo autor, dispondo-se a executar as obras necessárias à eliminação dos defeitos que reconheceu serem da sua responsabilidade.
Após frustração de uma tentativa de conciliação entretanto designada, foi dispensada a audiência preliminar, proferido despacho saneador tabelar e condensado o processo, com selecção da matéria de facto assente e organização da base instrutória, de que não houve reclamações.
Instruído o processo, prosseguiu para julgamento, ao qual se procedeu, já no 2.º Juízo de Grande Instância Cível de Aveiro do Tribunal da Comarca do Baixo Vouga, para onde fora remetido com a instalação desta e a extinção da originária, findo o qual foi decidida a matéria da base instrutória nos termos constantes do despacho de fls. 508 a 514, que não foi objecto de qualquer reclamação.
E, em 28/6/2011, foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e condenou os réus a: a) – procederem ou mandarem proceder, a expensas suas e por sua exclusiva responsabilidade, a todas as obras necessárias e adequadas a eliminarem os defeitos de construção enunciados na factualidade provada, com excepção do jardim encostado à parede e das fissuras no pavimento exterior, devendo os trabalhos iniciarem-se no prazo de 20 (vinte) dias a contar do trânsito em julgado da sentença e serem concluídos nos 30 (trinta) dias subsequentes; b) – caso não procedam em conformidade com a alínea anterior, e findos aqueles prazos, pagarem ao autor a quantia que vier a ser apurada em liquidação de sentença, a fim de o autor mandar reparar os defeitos a terceiros; c) – pagarem ao autor a indemnização dos prejuízos que este vier a sofrer em consequência dos trabalhos necessários à eliminação dos defeitos, designadamente pela necessidade de, enquanto os mesmos perdurarem, ter que recorrer a habitação alternativa, em montante a liquidar em execução de sentença.
Inconformado com o assim decidido, o réu interpôs recurso de apelação e apresentou a sua alegação com as conclusões que aqui se transcrevem: “1. Os elementos de prova constantes dos autos não permitem sustentar a Decisão da Matéria de Facto quanto aos quesitos 4º, 5º, 6º e 7º.
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A resposta aos referidos, considerando a prova produzida deverá ser alterada nos seguintes termos: “As pessoas contratadas pelos Réus iniciaram os trabalhos de eliminação dos defeitos, tendo sido impedidos pelo Autor de prosseguir os mesmos, logo após o primeiro dia”.
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Os sujeitos de uma determinada relação material controvertida, nos termos do disposto no artº 1248º do C. Civil, podem extrajudicialmente prevenir ou terminar um litígio mediante transação.
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Da transação decorre a constituição e/ou modificação e/ou extinção de direitos diversos do direito controvertido – artº 1248º nº 2 do C. Civil.
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O acordo que, na controvérsia sobre os defeitos do imóvel vendido, foi celebrado entre Autor e Réus, previamente à instauração da presente ação, no qual foram discriminados os defeitos a eliminar e prazo para execução das obras tendentes à sua eliminação, configura uma transação preventiva ou extrajudicial.
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Tal transação prefigura-se como uma exceção perentória que impede que o Tribunal possa dirimir um conflito que foi prevenido ou terminado por acordo das partes.
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Posto perante a invocação do citado acordo, ao Tribunal competia condenar as partes nos termos do acordado e julgar, caso tal questão lhe fosse suscitada, da imputação do incumprimento.
Sem prescindir e por mera cautela; 8. A situação dos autos terá de ser juridicamente enquadrada no quadro legal das normas relativas à compra e venda de coisa defeituosa.
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A indemnização por dano emergente, só tem lugar no caso de anulação da venda por dolo ou erro.
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A condenação dos Réus no pagamento de uma indemnização ao Autor por dano emergente, carece de fundamento de facto e de direito.
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Foi violado o disposto nos artºs 1248º e 914º do C. Civil.
Termos porque, no provimento do presente recurso deve ser revogada a decisão recorrida”.
Não foram apresentadas contra-alegações.
Remetido o processo para o Tribunal da Relação de Coimbra, por despacho do respectivo Relator de 14/3/2012, foi declarado aquele Tribunal territorialmente incompetente (cfr. fls. 569 a 570).
Transitado em julgado tal despacho, foram os autos remetidos a este Tribunal, pelo que, colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir o recurso interposto.
Sabido que o seu objecto e âmbito estão delimitados pelas conclusões do recorrente – o réu, único que interpôs recurso e apresentou alegações (cfr. fls. 535 e 546 e art.ºs 684.º, n.º 3, e 690.º, n.º 1, ambos do CPC, na redacção anterior à dada pelo DL n.º 303/2007, de 24/8, a qual é aqui aplicável, visto que a acção foi instaurada antes da entrada em vigor deste diploma - 1/1/2008 – e porque o mesmo não se aplica às acções pendentes - cfr. seus art.ºs 11.º, n.º 1 e 12.º, n.º 1), importando conhecer as questões nelas colocadas, bem como as que forem de conhecimento oficioso, exceptuadas aquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras (cfr. art.º 660.º, n.º 2 do mesmo Código), as questões a dirimir consistem em saber: 1. Se deve ser alterada a matéria de facto no sentido pretendido pelo apelante; 2. Se a transacção prévia à acção é impeditiva do conhecimento de outras questões que nela não estejam incluídas; 3. E se não é devida qualquer indemnização.
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Fundamentação 1. De facto Na sentença recorrida foram dados como provados os seguintes factos: 1. O autor comprou aos Réus um prédio urbano sito na Rua …, freguesia e concelho de Ovar, composto por casa de rés-do-chão e 1.º andar, com anexo e logradouro, destinada exclusivamente a habitação e descrito na Conservatória do Registo Predial de Ovar sob o número cinco mil seiscentos e cinquenta e quatro [alínea A) dos factos assentes].
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A escritura pública do contrato de compra e venda realizou-se no dia 20 de Fevereiro de 2003, no Cartório Notarial de Estarreja, nos termos do documento junto aos autos a fls. 20 a 30, cujo teor se dá aqui por reproduzido [al. B) dos factos assentes].
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Contudo, o imóvel identificado em A) vendido pelos réus apresenta patologias e deficiências no exterior e no interior do edifício [al. C) dos factos assentes].
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Patologias e deficiências construtivas essas, que se concretizam pelo menos no seguinte: - fissuras em paredes; - fissuras em muros de vedação / separação; - fissuras em pavimento exterior; - fissuras nas ligações entre muros e construções; - fissuras em parede de anexo [al. D) dos factos assentes].
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O autor, em 8 de Março de 2004, requereu, no tribunal judicial de Santa Maria da Feira, Notificação Judicial Avulsa dos réus, nos termos do documento junto aos autos a fls. 77 a 97, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido [al. E) dos factos assentes].
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Em consequência, como resposta à referida Notificação Judicial Avulsa, os réus enviaram ao autor a carta registada com aviso de recepção datada de 13 de Abril de 2004, junta aos autos a fls. 98, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido [al. F) dos factos assentes].
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Em 28 de Setembro de 2004, o réu marido e o autor assinaram um manuscrito, junto aos autos a fls. 102, no qual o primeiro declara assumir também a responsabilidade pelos defeitos referenciados pelas fotografias constantes da Notificação Judicial Avulsa (sob os n.ºs 10, 14, 15, 18, 23, 24, 28, 51, 52, 53, 54, 55, 56, 61, 62, 64 e 65) [al. G) dos factos assentes].
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Posteriormente, em 9 de Maio de 2005, autor e réu marido assinaram o “acordo” junto aos autos a fls. 103, nos termos do qual o ora réu se obrigava “a realizar os trabalhos de reparação mediante a...
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