Acórdão nº 7799/10.4TBVNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 13 de Setembro de 2012

Magistrado ResponsávelAMARAL FERREIRA
Data da Resolução13 de Setembro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

TRPorto.

Apelação nº 7799/10.4TBVNG.P1 - 2012.

Relator: Amaral Ferreira (727).

Adj.: Des. Deolinda Varão.

Adj.: Des. Freitas Vieira.

Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I - RELATÓRIO.

  1. B… instaurou, no Tribunal Judicial de Vila Nova de Gaia, contra a seguradora “C…, S.A.

    ” acção declarativa de condenação, com forma de processo ordinário, pedindo a condenação da R. a pagar-lhe, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, o montante global de € 35.335,57, acrescido de juros de mora à taxa legal desde a citação até integral pagamento.

    Invoca, para tanto, um acidente ocorrido no Rio …, quando era transportado no banco traseiro de uma mota de água conduzida pelo seu proprietário, o qual, por contrato de seguro vigente à data do acidente, havia transferido para a R. a sua responsabilidade civil por danos decorrentes da sua circulação, na sequência da ondulação provocada por três barcos de turismo que desciam o rio, de que lhe advieram os danos de natureza patrimonial e não patrimonial que descrimina e cujo ressarcimento reclama da R., por força do referido contrato de seguro.

  2. Contestou a R. que, aceitando a existência do contrato de seguro, impugna todos os demais factos articulados pelo A., quer no que se refere à versão do acidente por ele apresentada, quer relativamente aos danos e respectivo montante, concluindo pela improcedência da acção e pela sua absolvição do pedido.

  3. Após resposta do A. a reafirmar o alegado e concluindo como na petição, foi proferido despacho saneador que, afirmando a validade e regularidade da instância, declarou a matéria assente e elaborou base instrutória, que se fixaram sem reclamações.

  4. Instruída a causa, com a realização de exame médico-legal na pessoa do A., procedeu-se a julgamento com gravação e observância do legal formalismo e, sem que as respostas dadas à matéria de facto controvertida constante da base instrutória tenham sido objecto de censura, veio a ser proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu a R. do pedido.

  5. Inconformado, apelou o A. que, nas pertinentes alegações, formulou as seguintes conclusões: 1ª: O tribunal “a quo” decidiu mal ao considerar improcedente o pedido formulado pelo apelante na presente acção.

    1. : Sobre o condutor da mota de água recai uma presunção de culpa, já que a prática desportiva que consiste na circulação numa mota de água é uma actividade perigosa por natureza.

    2. : O apelante nem sequer precisava de fazer a prova da culpa do condutor da mota, para que a apelada viesse a responder pelos danos que sofreu, atenta a existência da referida presunção.

    3. : A presunção não foi ilidida, o que torna o condutor da mota de água culpado pela eclosão do acidente.

    4. : Está legalmente prevista a responsabilidade pelo risco inerente à utilização das embarcações de recreio, em que se incluem as motas de água.

    5. : No caso do acidente dos autos, o proprietário da mota de água também poderia responder pelo risco inerente à utilização do veículo.

    6. : De uma maneira ou de outra, fosse pelo risco ou por culpa presumida do condutor e proprietário da mota de água, a apelada teria de ser responsabilizada.

    7. : A douta sentença nem se pronunciou sobre estas questões, que foram alegadas em sede de réplica pelo apelante.

    8. : Essa omissão determina a sua nulidade nos termos do artigo 668º, nº 1 alínea d) do C.P.C.

    9. : Ao decidir como decidiu, o tribunal “a quo” fez “tábua rasa” das condições contratuais do contrato de seguro em causa nos autos.

    10. : O contrato de seguro junto aos autos tem como riscos cobertos, para além da responsabilidade civil, os acidentes pessoais.

    11. : Para efeito da condição especial responsabilidade civil, o apelante era um terceiro, o que significa que teria de ser indemnizado ao abrigo dessa cobertura.

    12. : Mas o acidente dos autos também está garantido pela cobertura de acidentes pessoais.

    13. : A cobertura de acidentes pessoais, prevista na apólice, é uma cobertura que funciona independentemente da cobertura de responsabilidade civil, sendo certo que são ambas cumuláveis quando o lesado é um ocupante.

    14. : Esta é uma cobertura complementar que é contratada para abranger o proprietário/condutor da embarcação de recreio e para fazer face a despesas com o tratamento dos sinistrados em caso de acidente.

    15. : O apelante tem o direito de ser ressarcido com base na cobertura de responsabilidade civil, mas também com base na cobertura acidentes pessoais, complementar ao risco da responsabilidade civil.

    16. : Em todo o caso e independentemente da cobertura de responsabilidade civil, o apelante sempre teria de ser indemnizado ao abrigo da cobertura de acidentes.

    17. : Os montantes peticionados pelo apelante são razoáveis e adequados às lesões e incapacidades de que ficou a padecer.

    18. : A quantia peticionada de 30.000,00€, para ressarcimento de todos os danos que sofreu no acidente relatados nos autos deve, por isso, ser concedida ao apelante a título de indemnização.

    19. : Ao decidir como decidiu, a sentença recorrida violou, entre outros, o artigo 41º do Regulamento da Náutica de Recreio, os artigos 668º nº1 alínea d) do C.P.C e os artigos 483º e 493º nº2 do Código Civil.

    Em face do exposto, deve ser revogada a douta sentença recorrida, e substituída por outra que sustente as conclusões do apelante, com o que se fará a esperada JUSTIÇA.

  6. Contra-alegou a R.

    a sustentar a manutenção da decisão recorrida, formulando as seguintes conclusões: 1ª: O Tribunal recorrido decidiu bem ao absolver a ora recorrida do pedido.

    1. : Sobre o condutor da mota não recaía uma presunção de culpa, já que o passeio de mota de água que quer o recorrente quer o condutor da mota decidiram dar nas águas do Rio Douro não constituiu qualquer prática desportiva nem uma actividade perigosa.

    2. : A queda do recorrente em cima da mota de água e o consequente embate do braço direito deste na referida embarcação ficou-se a dever a culpa exclusiva da sua parte, pois não soube manter-se suficientemente seguro na dita embarcação.

    3. : De facto a ondulação provocada pelos barcos que desciam o rio provocou apenas que o corpo do recorrente levantasse uns centímetros o que por si só não é susceptível de provocar que o recorrente largasse o seu braço do corpo do condutor da mota e que, quando o seu corpo, “voltou” à mota tivesse o seu braço nesta embatido de tal modo que o tivesse fracturado.

    4. : O risco de circulação da mota de água reporta-se a danos provocados pela mota em terceiros, e não a danos provocados pelos terceiros que embatem na mota.

    5. : A mota conduzida pelo segurado não abalroou qualquer terceiro, tendo os danos sofridos pelo recorrente resultado na sua queda na mota.

    6. : Da prova produzida resulta que o condutor da mota conduzia com cuidado e destreza, e tanto assim era que ele próprio, sujeito também aos mesmos efeitos da ondulação das águas, nada sofreu e, pelo contrário, de imediato conduziu a mota para recolher o recorrente.

    7. : Deve, face a que os danos sofridos pelo recorrente a ele exclusivamente se devem, a ora recorrente ser absolvida do pedido, tal como o Tribunal recorrido bem sentenciou.

    8. : A assim não se entender e a julgar-se, pelo contrário, que o recorrente tem direito a ser indemnizado pela ora recorrida, a indemnização a atribuir-lhe deve ser fixada de acordo com os ditames da equidade, em valor muito inferior aos peticionado, que padece de manifesto exagero.

    9. : A sentença recorrida deve ser integralmente mantida, na medida em que interpretou de forma correcta o Direito aplicável, não tendo violado qualquer normativo legal.

    Termos em que o recurso interposto pelo recorrente deve ser julgado não provado e improcedente. Assim se fará JUSTIÇA! 7. Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

    1. FUNDAMENTAÇÃO.

  7. A sentença recorrida teve como provados os seguintes factos: 1) A 02 de Setembro de 2007, o proprietário da mota de água, com o nº de registo ……., havia transferido a responsabilidade civil por danos resultantes da circulação desta para a C…, S.A., aqui R., pelo contrato de seguro titulado pela apólice nº ../……../….

    2) No dia 2 de Setembro de 2007, cerca das 17h, o A. sofreu um acidente quando seguia numa mota de água, no rio …, junto à praia fluvial de …, mais conhecida como praia ….

    3) O A., nas...

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