Acórdão nº 5066/07.0TBVFR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 29 de Janeiro de 2013
Magistrado Responsável | M. PINTO DOS SANTOS |
Data da Resolução | 29 de Janeiro de 2013 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Pc. 5066/07.0TBVFR.P1 – 2ª Sec.
(apelação) _____________________________ Relator: Pinto dos Santos Adjuntos: Des. Francisco Matos Des. Maria João Areias* * *Acordam nesta secção cível do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório: B…, Lda.
, com sede em S. João da Madeira, instaurou a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra C…, Lda.
, sediada em Lobão, Santa Maria da Feira e D… – Companhia de Seguros, SA, com sede em Lisboa, pedindo a condenação solidária destas a pagarem-lhe, a título de indemnização por danos patrimoniais, a quantia de 43.372,95 €, acrescida de juros de mora, à taxa legal, a partir da citação.
Alegou, para tal (considerando já o articulado em que, a solicitação do Tribunal, aperfeiçoou a p. i.), que: ● no exercício da sua actividade vendeu à sociedade «E…, Lda.» dois quadros eléctricos; ● com vista à colocação da mercadoria no destino, acordou com a 1ª ré o respectivo transporte até ao local de descarga, nas instalações da unidade industrial de … da F…; ● a mercadoria foi expedida em 25/07/2006, tendo sido emitidas as competentes guias; ● na viagem, o veículo transportador da mercadoria embateu com a galera numa ponte em ferro que atingiu também os quadros eléctricos, causando a destruição destes (ficaram danificados e irrecuperáveis, tendo ido para a sucata) e impedindo que chegassem ao seu destino; ● em consequência disso, sofreu a autora um prejuízo de 43.372,95 €; ● instada a pagar-lhe tal valor, a 1ª ré informou-a que havia transferido para a 2ª ré a sua responsabilidade, através de contrato de seguro titulado pela apólice nº CR …….., até ao limite de 140.000,00 €; ● a 2ª ré, contactada, enviou-lhe um recibo de indemnização, para que a demandante o assinasse, no valor de 9.500,00 €, quantia que esta não aceitou por não cobrir os danos que sofreu.
As rés contestaram, separadamente, a acção.
A 1ª ré excepcionou a sua própria ilegitimidade passiva, por entender que, por ter transferido para a 2ª ré a sua responsabilidade, só esta devia ter sido demandada pela autora, bem como a prescrição do (eventual) direito da autora, por ter sido citada depois de expirado o prazo a que alude o art. 24º do DL 239/2003, de 04/10, tendo, no mais, impugnado a versão factológica descrita na p. i..
Concluiu, pugnando pela procedência das excepções (dilatória e peremptória) que invocou e, em qualquer caso, pela improcedência da acção, com as legais consequências.
A 2ª ré excepcionou também a prescrição do (eventual) direito da autora e impugnou a essencialidade do que esta alegou no articulado inicial, tendo concluído em termos idênticos aos da 1ª ré (excepto quanto à excepção dilatória, que não arguiu).
A autora replicou sustentando a improcedência das excepções arguidas pelas demandadas.
Dispensada a audiência preliminar, foi proferido despacho saneador – que julgou improcedente a excepção dilatória da ilegitimidade da 1ª ré e relegou para final o conhecimento da excepção peremptória da prescrição – e foram seleccionados os factos assentes e os controvertidos, estes formando a base instrutória, sem reclamação das partes.
Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, no termo da qual, após produção da prova, foi proferido despacho de resposta aos quesitos da base instrutória, igualmente sem reclamação das partes.
Seguiu-se a prolação da sentença que julgou a acção parcialmente procedente e condenou as rés a pagarem à autora a quantia de 11.000,00 (onze mil euros), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação.
Inconformada com o sentenciado, interpôs a ré seguradora o recurso de apelação em apreço [a 1ª ré também recorreu, mas, por falta de alegações, o seu recurso acabou por ser julgado deserto], cuja motivação concluiu do seguinte modo: “1. O nº 13 da Base Instrutória - onde se perguntava se «O derrube da mercadoria, aludido em 3), ficou a dever-se a defeito de fabrico na estabilidade dos quadros eléctricos?» - deve ter resposta diferente daquela que lhe foi dada pelo Tribunal recorrido.
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Deve ter a seguinte resposta: “O derrube da mercadoria ficou a dever-se a defeito na instalação dos quadros eléctricos” - é o que se requer atento o disposto no nº 1 do art. 712º do CPC.
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É que tal resposta resulta dos depoimentos das testemunhas G…, H…, I… e J…, cujos depoimentos foram prestados na audiência de julgamento de 17 de Janeiro de 2012 e estão gravados no Sistema “Habilus Media Studio”.
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Face aos factos provados, conjugado com o facto que também deve agora ser dado como provado, a acção tem de improceder e a Ré tem de ser absolvida do pedido.
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É que de tais factos resulta que ficou provado que a Ré transportadora não agiu com culpa e que o sinistro se ficou a dever a acto da responsabilidade da Autora - foi o defeito na instalação dos quadros eléctricos e não o transporte a causa do sinistro.
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Assim, o Tribunal recorrido - ao condenar as Rés - violou o disposto nos arts. 799º do Cód. Civil e ainda nos arts. 483º e 505º do mesmo diploma legal.
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A não se provar o que se pergunta no nº 13 da Base Instrutória, sempre a Autora é co-responsável pelo sinistro, na medida em que a Autora foi a responsável pela embalagem da mercadoria, pela orientação, verificação e aceitação como correcto de todo o processo de acondicionamento da mercadoria e pela orientação e controlo do amarramento da mercadoria com três cintas.
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Uma vez que o transporte decorreu com normalidade e nenhum facto ficou provado que o veículo transportador sofreu algum sinistro ou interveio em qualquer acidente, tem de se concluir que o tombo dos quadros eléctricos ficou a dever-se ao seu deficiente embalagem e acondicionamento, em que a Autora também interveio.
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Logo, a Autora é co-responsável pelo sinistro em igual proporção à Ré transportadora e, assim, as Rés apenas deviam ter sido condenadas em metade da indemnização devida.
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Assim, ao condenar as Rés como únicas responsáveis pela indemnização devida à Autora, o Tribunal recorrido violou o disposto nos arts. 799º do Cód. Civil e ainda nos arts. 483º e 505º do mesmo diploma legal.
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Seja como for, está prescrito o direito da Autora, pois que as Rés foram citadas para a presente acção mais de um ano depois de a mercadoria ter sido devolvida à Autora.
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Atentos os factos provados (a mercadoria ficou danificada – resposta ao nº 4 da Base Instrutória; a mercadoria foi devolvida à Autora, nas suas instalações em 25/7/2006 – resposta ao nº 9 da Base Instrutória; dos dois quadros eléctricos, no estado em que ficaram por força do sinistro, era possível aproveitar alguns acessórios de cablagem, no valor global de 1.500 €) é manifesto que não ocorreu perda total da mercadoria e nem sequer perda parcial.
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O que ocorreu foi avaria da mercadoria, pois que a mercadoria não desapareceu, não se extinguiu, não se consumiu – a mercadoria foi devolvida e apenas ficou danificada, logo, ocorreu avaria da mercadoria.
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Assim, o prazo prescricional - que é de um ano - começava a contar em 25 de Julho de 2006, dia da devolução da mercadoria à Autora.
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E as Rés apenas foram citadas mais de um ano depois desse dia 25 de Julho de 2006, estando, na data da citação das Rés (e a citação é que interrompe o prazo prescricional), já prescrito o direito da Autora.
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Decidindo em contrário, o Tribunal recorrido violou o disposto nos arts. 24º do D.L. nº 239/2003 e 323º do Cód. Civil.
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Mesmo que assim se não entenda, sempre a indemnização nunca pode ultrapassar a quantia de 9.500 €, pois que não houve declaração do valor da mercadoria transportada nas respectivas guias de transporte.
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Funciona, nesse caso, a regra do peso e a indemnização tem de corresponder ao peso da mercadoria transportada, na base de 10 € por quilograma - e como a mercadoria pesava 1.110 Kgs, a indemnização nunca podia ultrapassar o montante de 11.000 €.
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Mas como a Autora recebeu a mercadoria danificada, com o valor de 1.500 €, há que deduzir esse valor ao da indemnização - logo, 9.500 €.
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Ao decidir em contrário, o Tribunal recorrido violou o disposto nos arts. 20º do D.L. nº 293/2003 e 566º do Cód. Civil.
Nestes termos (…), deve o presente recurso ser admitido e a final deve ser julgado provado e procedente, nos termos expostos, como é de lei e de JUSTIÇA!” A autora-apelada não apresentou contra-alegações.
Foram colhidos os vistos legais.
* * *II. Questões a apreciar e decidir: O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações da recorrente [art. 684º nº 3 e 690º nºs 1 e 3 do CPC, na redacção aqui aplicável, anterior às alterações introduzidas pelo DL 303/2007, de 24/08, por os autos terem sido instaurados antes de 01/01/2008], sendo elas que fixam o «thema decidendum» a cargo deste Tribunal de 2ª instância.
As questões suscitadas pela apelante são, sequencialmente, as seguintes [apesar de não ser esta a ordem por que constam das conclusões das alegações]: ● Há que alterar a matéria de facto? [conclusões 1 a 3] ● O direito que a autora exerce está prescrito? [conclusões 11 a 16] ● O sinistro é da exclusiva responsabilidade da autora? [conclusões 4 a 6]; ● Ou por ele (sinistro) são co-responsáveis a autora e a 1ª ré? [conclusões 7 a 10]; ● A indemnização fixada é a correcta? [conclusões 17 a 20].
* * *III. Factos dados como provados na 1ª instância: Na douta sentença recorrida foram dados como provados os seguintes factos: 1. A Autora dedica-se, como actividade regular, à indústria e comercialização de quadros e sistemas eléctricos. [alínea A) dos Factos Assentes] 2. A Ré “C…, Lda.” dedica-se, como actividade regular, ao transporte nacional e internacional de mercadorias. [alínea B) dos Factos Assentes] 3. A Autora acordou com a Ré “C…, Lda.” o transporte de dois quadros eléctricos para as instalações da unidade industrial de … da empresa “F…”. [alínea C) dos Factos Assentes] 4. A mercadoria aludida em 3) foi expedida em 25 de Julho de 2006 das instalações da Autora, sitas na Zona Industrial …, em São João da Madeira. [alínea D) dos Factos Assentes] 5. No decurso do...
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