Acórdão nº 836/09.7TBLSD.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 21 de Janeiro de 2013

Magistrado ResponsávelMANUEL DOMINGOS FERNANDES
Data da Resolução21 de Janeiro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 836/09.7TBLSD.P1-Apelação Origem: Tribunal Judicial de Paços de Ferreira, 1º Juízo Relator: Manuel Fernandes 1º Adjunto Des. Caimoto Jácome 2º Adjunto Des. Macedo Domingues 5ª Secção Sumário: I- O contrato de arrendamento para comércio celebrado em Maio de 2006 é nulo por vicio de forma quando não seja celebrado por escrito.

II- O tribunal a pretexto do pedido principal, que se estribava no trespasse do estabelecimento, não pode deixar de conhecer e decretar tal nulidade se aquele pedido improcede.

III- Declarado nulo o contrato, porque tal nulidade opera retroactivamente (ex-tunc), haverá lugar à repristinação das coisas no estado anterior ao negócio, devendo ser restituído tudo o que houver sido prestado ou, se a restituição em espécie não for possível, o valor correspondente - art. 289.º nº 1 do C. Civil.

IV- Para além disso o nº 3 do citado preceito conduz, a que se conceda tutela jurídica à situação de facto constituída por força de um acto nulo.

V- Tutela que, todavia, se mitiga o regime da nulidade, só abarca significativamente o regime dos frutos e benfeitorias, e já, não como acontece no enriquecimento sem causa, o reflexo económico do adquirente do destino dado à coisa.

**I-RELATÓRIO Acordam no Tribunal da Relação do Porto: B… intentou a presente acção de processo ordinário contra “C…, Lda.”, pedindo que esta seja obrigada a pagar-lhe, uma indemnização em montante não inferior a € 90.000,00 acrescido de juros, à taxa legal, contados desde a citação até efectivo pagamento ou, subsidiariamente, a restituir igual montante a título de enriquecimento sem causa.

Para o efeito alega, em síntese que celebrou com a Ré, em Maio de 2006, um contrato verbal de arrendamento, da fracção identificada no art. 1º da p.i. que se encontrava totalmente vazia, configurando um espaço amplo, sem divisórias.

Com vista à instalação de um estabelecimento de bar na referida fracção realizou inúmeras obras de construção, instalação de equipamentos e materiais, que orçaram o montante de € 85.000,00, quantia que pagou.

No final do mês de Setembro de 2007, decidiu encerrar o estabelecimento, tendo ficado acordado com a Ré que ambos iam tentar encontrar pessoa interessada no trespasse do estabelecimento, pela quantia de € 90.000,00, assegurando a Ré, deste modo, que o estabelecimento continuaria a funcionar, mantendo um arrendatário.

No mês de Abril de 2008, foi informado por D… que esta havia celebrado um contrato de trespasse com a Ré, tendo adquirido todo o estabelecimento comercial, com todos os seus pertences, incluindo a designação “E…”, mantendo uma relação de arrendamento com a ré, tendo esta recebido daquela, a título de trespasse o montante de € 90.000,00.

Refere, ainda, que a Ré enriqueceu o seu património à custa do seu património sem qualquer causa justificativa.

*Citada a Ré, veio contestar impugnando os factos alegados pelo Autor, referindo que o arrendamento se destinava a comércio e que aquele procedeu à realização de obras de adaptação com vista à instalação de um estabelecimento de café/bar.

Acordaram, ainda, que as obras seriam por conta do Autor e, uma vez realizadas, ficariam a pertencer ao imóvel, sem que pudesse reclamar de si o seu custo ou qualquer outra forma de compensação ou indemnização.

Refere, ainda, que quando o Autor encerrou portas retirou do locado grande parte do recheio que compunha aquele estabelecimento, tendo lá ficado apenas bens de baixo valor, ficando acordado que o réu ficaria com esse parco recheio por conta do débito da autora, a título de rendas, no valor de € 8.500,00.

Conclui, dizendo, que a acção deve ser julgada improcedente.

*A autora, na réplica, manteve os factos alegados na petição inicial.

*Realizou-se a audiência de discussão e julgamento com a observância do formalismo legal, após o que se decidiu sobre a matéria de facto, sem que tivesse sido apresentada qualquer reclamação tendo, a final, sido proferida sentença que julgou a acção totalmente improcedente, por não provada, absolvendo, em consequência, a Ré dos pedidos formulados.

*Não se conformando com o assim decidido veio o Autor interpor o presente recurso, concluindo as suas alegações nos seguintes termos: A - Recorre-se, deste modo, da Douta Decisão “a quo” pois a mesma viola o disposto nos art. 660, nº 2 e 668, nº 1 c) e d) do C.P.C. e 473º e 479º do C.C.

B - Manifestamente verificou-se erro na apreciação da prova produzida e na aplicação do direito ao caso concreto, sendo que os fundamentos estão manifestamente em oposição com a Decisão.

C - A Decisão de que se recorre conclui, erradamente, que não se alegou a existência de qualquer recusa da ora Recorrida em restituir os referidos bens ou mesmo que aqueles já não se encontravam no local em questão, não se peticionando uma indemnização pelos prejuízos sofridos em consequência de tais factos.

D - Incorre, assim, em contradição a Decisão quando, por um lado, dá como provados tais factos e, por outro, julga improcedente a atribuição, a título subsidiário, de indemnização.

E - Tendo a Recorrente se apropriado da totalidade do estabelecimento comercial, de valor estimado em 90.000€, tendo recusado a sua restituição ao impedir o acesso ao locado e, por fim, tendo retirado todos os equipamentos ali existentes, com excepção dos referidos em 8º (que resulta de confissão da Recorrida), dúvidas não poderiam subsistir que a Recorrida enriqueceu ilegitimamente à custa do Recorrente, F - Pelo que deveria a Recorrida ser condenada, a este título, no pagamento ao Recorrente de indemnização no montante de 90.000€.

G - Não se pronunciou o tribunal sobre as questões infra descritas, sendo que tal omissão de pronúncia é geradora de nulidade, o que se requer.

H - Apreciando erradamente a questão jurídica de fundo, designadamente o enriquecimento sem causa, não condenou a Recorrida em indemnização pelos prejuízos sofridos pelo Recorrente em consequência dos factos alegados.

*Devidamente notificada a Ré não contra-alegou.

*Após os vistos legais cumpre decidir.

*II- FUNDAMENTOS O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso-cfr. arts. 684º, nº 3, e 685º-A, nº 1 e 2, do C.P.Civil.

**No seguimento desta orientação são três as questões no recurso: a)-saber se a decisão está em manifesta oposição com os seus fundamentos; b)-saber se houve omissão de pronúncia;c)-saber se foi correcta a subsunção do direito aos factos **A)- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO É a seguinte a matéria de facto que o tribunal de 1ª instância deu como provada: 1º) - Por contrato verbal celebrado no início do mês de Maio de 2006, entre A. e R., o A. tomou de arrendamento e o R. deu de arrendamento uma fracção autónoma pertença da R, destinada a comércio, sita na ..., nº .., na freguesia …, do concelho de Paços de Ferreira. (A) 2º) - Acordaram A. e R. que o valor da renda anual seria no montante de 6.000€, a ser paga em duodécimos no montante de 500€ mensais. (B) 3º) - O A. entrou na posse do referido locado no início do mês de Maio de 2006, nele tendo instalado um estabelecimento comercial de bar, denominado “E…”. (C) 4º) - O referido estabelecimento comercial iniciou a sua actividade, abrindo ao público, no dia 4 de Maio de 2006, tendo mantido tal actividade até ao final do mês de Setembro de 2007, data em que encerrou as suas portas. (D) 5º) - Anteriormente à celebração do contrato aludido em A), a fracção autónoma encontrava-se totalmente vazia, configurando um espaço amplo, sem quaisquer divisórias. (1º) 6º) - Com vista à instalação do estabelecimento de bar, o A. realizou obras de construção. (2º) 7º) - E apetrechou o estabelecimento com todo o material e equipamentos necessários à prossecução da sua actividade, designadamente lâmpadas, copos, colunas, mesas e talheres. (3º) 8º) - O preço global despendido pelo A. na construção e instalação do estabelecimento orçou o montante de 85.000€. (4º) 9º) - No mês de Setembro de 2007 o A. decidiu encerrar o estabelecimento tendo, para o efeito, informado a R. de tal facto. (5º) 10º) - Atento o facto de o estabelecimento se encontrar completamente montado, com capacidade de funcionamento, ficou acordado entre o sócio gerente da ré, Sr. F…, o autor e seu pai G…, que os equipamentos e materiais instalados no locado e bem assim todas as construções não seriam removidos desde que o autor conseguisse trespassar o estabelecimento comercial, não pretendendo a ré exercer qualquer “preferência”. (9º e 10º) 11º) - A ré, com aquele acordo, pretendia assegurar que o estabelecimento continuaria a funcionar, auferindo a renda mensal já anteriormente acordada. (11º) 12º) - Bem sabendo que seria difícil arrendar a sua fracção, se não continuasse ali instalado o estabelecimento comercial em apreço. (12º) 13º) - A R. tentaria encontrar pessoa interessada no referido trespasse, comprometendo-se a informar o A. de qualquer interessado no negócio. (13º) 14º) - Acordaram A. e R. que o preço a anunciar seria de 90.000€. (14º) 15º) - Acordando, de igual modo, que o valor das rendas que eventualmente se fossem vencendo seriam compensadas e pagas na data da concretização do negócio. (15º) 16º) - Por causa do acordo referido em 9º e 10º, o autor continuou a deter as chaves das portas das entradas do estabelecimento com o conhecimento e autorização da ré, com o intuito de mostrar o estabelecimento a pessoas interessadas no trespasse. (16º e 17º) 17º) - Durante o mês de Março de 2008, o A. constatou que se encontravam a ser distribuídos folhetos publicitários na área de …, concelho de Paços de Ferreira, anunciando a abertura do E…, com nova Gerência. (18º) 18º) - O autor, constatando que tal folheto se referia ao seu estabelecimento comercial, contactou a ré, indagando da sua veracidade uma vez que desconhecia a existência de qualquer negócio. (19º) 19º) - Nessa data, verificou o A. que as fechaduras e chaves das portas de entrada...

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