Acórdão nº 3618/12.5TBSTS-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 28 de Janeiro de 2013

Magistrado ResponsávelJOSÉ EUSÉBIO ALMEIDA
Data da Resolução28 de Janeiro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo 3618/12.5TBSTS-A.P1 Recorrente – B…, Lda.

Recorrida – C… Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto: 1 – Relatório 1.1 – O processo na 1.ª instância C… instaurou o presente procedimento de suspensão de deliberações sociais contra a requerida B…, Lda.

e pediu que a) seja declarada suspensa a execução das deliberações sociais tomadas na Assembleia Geral de 7 de agosto de 2012, e b) a Requerida deverá abster-se de praticar qualquer ato tendente à execução das deliberações tomadas; c) mais deverá ser a requerida advertida que, com a citação do presente procedimento cautelar, não poderá executar as deliberações em causa.

A requerente, fundamentando a providência pretendida, veio dizer – ora em síntese: - A requerida, que se dedica à atividade de farmácia e perfumaria, tem o capital social de 498.797,90€, dividido em três quotas, uma com o valor nominal de 20.076,62€, titulada pela requerida[1] D…, uma com o valor nominal de 381.455,69€ e outra com o valor nominal de 97.265,59€, ambas tituladas em comum e sem determinação de parte ou de direito a favor de E…, C…, D…, G… e H…. Ou seja, a requerente é sócia em comum de duas quotas, tendo como tal legitimidade para instaurar a presente ação.

- Teve conhecimento que se realizou no dia 7 de agosto último (2012) uma Assembleia Geral Extraordinária da requerida, sem que a requerente dela tivesse prévio conhecimento; a Assembleia realizou-se sem prévia convocação, sendo como tal nulas as deliberações aí tomadas.

- Como ordem de trabalhos da “suposta” Assembleia constava: “Ponto Um – Apreciação da providência cautelar e respetivas consequências para a sociedade. Ponto Dois – Ratificação das contas apresentadas desde a morte do Dr. L… (2002 a 2011). Ponto Três – Nomeação de novo gerente.” Relativamente ao ponto um, correu termos no 2º Juízo Cível (atualmente apensada à ação principal que corre termos no 1º Juízo - Proc. Nº 3.224/12.4 TBSTS–A) uma providência de suspensão de gerente e nomeação de novo gerente, que foi decretada. Nessa sequência visou a gerente suspensa (D…) ultrapassar, à má-fila, as consequências da decisão judicial e nomeou como gerente J…. Quanto ao ponto dois da ordem de trabalhos, já constava de anterior deliberação social a apreciação das contas de 2002 a 2011.

- A assembleia em causa não é universal, porquanto não foi deliberada por todos os sócios reunir-se, nem tão pouco deliberar sobre os assuntos constantes da ordem de trabalhos, sendo certo que nem todos os sócios estavam presentes ou sequer convocados.

- A cabeça de casal, E…, não é representante comum das quotas que se encontram registadas em comum e sem determinação de parte ou de direito, e mesmo que fosse teria sempre de dar conhecimento aos outros contitulares da quota do teor da convocatória - Ac. STJ de 14.03.06; nunca foi eleito o representante comum das quotas que se encontram em comum e sem determinação de parte ou de direito, pelo que é abusiva e ilícita e indiciadora de crime a intervenção da cabeça de casal como representante comum.

- Ainda que se entenda que estavam presentes todos os sócios, certo é que a D. E… não é representante comum e como tal nunca poderia validamente deliberar reunir sem formalidades prévias, nem tão pouco deliberar sobre qualquer assunto, sendo que aquela também não deu a conhecer aos restantes contitulares nem a convocatória, nem a deliberação social tomada.

- O que se visou foi, em conluio com a então gerente, despir todo o conteúdo da decisão judicial tomada, nomeando gerente sem o conhecimento dos restantes contitulares da quota.

- A deliberação tomada de nomeação de gerente é nula por três ordens de razões: 1) porque a assembleia não foi validamente convocada; 2) porque não foi validamente constituída porque a cabeça de casal presente não é representante comum das quotas; 3) porque a alegada Assembleia Geral não foi constituída sob a forma universal. A deliberação sobre a ratificação das contas também não é válida: por um lado, trata-se de uma deliberação tomada em Assembleia Geral não convocada e não validamente constituída, por outro porque, na realidade, nunca foram apresentadas as contas para que as mesmas fossem ratificadas.

- Tendo havido lucros para distribuir aos sócios, a sócia Dra. D… e cabeça de casal deliberaram a não distribuição de quaisquer lucros, sendo certo que, mesmo que a cabeça de casal fosse ou tivesse sido eleita como representante comum não poderia unilateralmente votar a redução do direito dos seus contitulares. Posteriormente, veio a gerente referir que as contas foram aprovadas em Assembleia de 28-11-2011, mas o certo é que todos os sócios deliberaram a repartição dos lucros.

- Não foi apresentado relatório de gestão, contas do exercício, ou quaisquer documentos previstos na Lei. A atitude da sócia Dra. D… e da cabeça de casal é deveras arrasadora e atentatória aos direitos da requerente; o facto de uma sociedade comercial não apresentar as suas contas há vários anos é extremamente grave e indicia claramente, no mínimo, irregularidades contabilísticas e fiscais.

- Os factos referidos justificam o receio de que o gerente nomeado ilegitimamente comece a praticar os mesmos atos danosos da anterior gerente que serviram de base à sua suspensão e o presente procedimento não terá qualquer impacto negativo à sociedade, pelo contrário, só com a nomeação judicial de um gerente é que se poderá colmatar os ilícitos e irregularidades que têm sido praticados.

Uma vez citada, a requerida veio deduzir oposição. Refere, ora em síntese: - O procedimento não tem fundamento, sendo totalmente ilegítimo. Ilegitimidade que é manifesta do ponto de vista processual (a requerente não tem legitimidade processual para o intentar) e do ponto de vista substancial (deduz uma pretensão ilegítima).

- Depois de esclarecer a divisão do capital social[2], refere que a requerente "não é a única herdeira contitular da quota indivisa; não é cabeça de casal da quota indivisa, e não é representante comum da quota indivisa", carecendo, em absoluto, de legitimidade para intentar, por si só, o presente procedimento, qualquer que seja a posição sufragada, das (duas) que dividem a doutrina e a jurisprudência nacionais. A ilegitimidade conduz a que o tribunal se abstenha de conhecer o pedido e absolva a requerida da instância.

Sem prescindir, refere a requerida: " Os requisitos para a procedência de um procedimento cautelar como este, são os seguintes: i. Legitimidade processual (já abordada); ii. O facto de a deliberação ainda não ter sido executada; iii. A deliberação ser contrária à lei ou ao pacto social; iv. Resultar da deliberação dano apreciável; e ainda v. Não ser o prejuízo da suspensão da deliberação superior ao prejuízo da sua execução (…) Não deixando de afirmar que as deliberações da assembleia de 7 de agosto já não podem ser suspensas porque já foram executadas, não se aceita que a deliberação seja contrária à lei ou ao pacto social; na assembleia geral esteve presente ou representado a totalidade do capital social, e não havendo uma deliberação formal a designar outro representante comum, esse papel cabe ao cabeça de casal (…) O cabeça de casal é o cônjuge sobrevivo, D. E… (facto que a própria requerente reconhece), ou seja, é manifesto que na assembleia geral esteve presente ou representada a totalidade do capital social, qualificando-se tal assembleia como universal. E ainda que, por mera hipótese, se aceitasse que faltam elementos à ata que foi junta, tal documento tem a virtualidade de servir de Deliberação Unânime por Escrito, adotada nos termos e para os efeitos do disposto no nº 1 do art. 54.º do CSC, e acresce que é o próprio art. 56.º do CSC que retira o efeito da nulidade da ata quanto todos os sócios estiverem presentes ou representados (…) Por outro lado, parece manifesto que das deliberações em causa não resulta qualquer dano, muito menos apreciável: a aceitação da renúncia da Dra. D… era um dos efeitos que a requerente pretendia com a interposição do anterior procedimento; a aprovação de contas em si mesma considerada não traduz nenhum dano, apreciável ou não, à sociedade (…) Quanto à aplicação de resultados, a deliberação em causa implica apenas que os sócios deliberaram - no momento da aplicação dos resultados - não distribuir lucros aos sócios e nada impede os sócios de, posteriormente, deliberar distribuições de lucros acumulados ou reservas, ou seja, distribuir ou não distribuir lucros é pois uma decisão para os sócios patrimonialmente neutra, considerando o momento em que é tomada (…) Por fim, o prejuízo da suspensão (se é que a suspensão é possível...) seria sempre superior ao prejuízo da execução; a suspensão da deliberação de nomeação do gerente voltará a fazer com que a sociedade fique sem gerentes, fazendo com que a Dra. D… reassuma, por força do disposto no n.º 1 do art. 253.º do CSC, as funções de gerente.

A requerente veio ainda responder, através do articulado de fls. 155. Fundando a resposta na notificação da oposição com documentos (tratar-se-ia do assento de óbito junto a fls. 146) responde apenas à questão da ilegitimidade, acentuando que "a requerente invoca vícios de nulidade, requerendo a suspensão das deliberações tomadas em Assembleia nula. Ora tratando-se de vício de nulidade, a requerente e independentemente da sua qualidade de sócia é interessada e como tal tem legitimidade para instaurar procedimento de suspensão das deliberações sociais tomadas".

A requerida (fls. 161/168) veio dizer, então, que o articulado da requerente não tinha cabimento, processual ou substantivo. E, sem prescindir, acrescenta que a invocação da nulidade surge agora apenas para sustentar a legitimidade. A requerida diz ainda que desde a notificação da interposição da providência cautelar se encontra totalmente paralisada e que, por isso, as desvantagens da mera pendência do procedimento há muito superaram as vantagens que (hipoteticamente) poderiam advir do seu decretamento.

De seguida foi designada a...

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