Acórdão nº 214/09.8TTSTS.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 04 de Fevereiro de 2013

Magistrado ResponsávelEDUARDO PETERSEN SILVA
Data da Resolução04 de Fevereiro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 214/09.8TTSTS.P1 Relator: Eduardo Petersen Silva (reg. nº 195) Adjunto: Desembargador Machado da Silva (reg. nº 1752) Adjunto: Desembargadora Fernanda Soares Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: Inconformado com o acórdão desta Relação de 8.10.2012, que decidiu “conceder provimento ao recurso, revogar a sentença e ordenar a repetição do julgamento, exclusivamente para ampliação da matéria de facto quanto aos artigos 24, 25, 26 e 72 da contestação, após o que deverá ser proferida nova sentença, decidindo a causa conforme se entender de direito”, veio o A. interpor recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, ao qual respondeu a Ré, e veio a Ré interpor recurso de revista subordinado, ao qual respondeu o A.

No requerimento de interposição do recurso de revista do A., pelo mesmo foi mencionado que tal recurso era interposto ao abrigo do artigo 722 nº 1 alíneas b) e c) do CPC, tendo sido entendido pelo relator, atendendo aos termos essenciais do recurso – contradição entre a decisão e a sua fundamentação/inutilidade da repetição do julgamento – que, ainda que imperfeitamente expressa, estava arguida a nulidade do acórdão – artigos 722º nº 1 al. c) e 668º nº 1 al. c), ambos do CPC, a qual assim submeteu à conferência.

Está apontada a contradição entre a fundamentação e a decisão no tocante à ampliação da matéria de facto para conhecimento da matéria constante do artigo 72 da contestação.

Tal contradição existe entre a 1ª nota de rodapé, onde se diz que a questão de ter sido sempre o sócio gerente B… a pessoa a quem couberam as questões relativas ao pessoal já foi decidida e não será apreciada, e a decisão de ordenar a repetição do julgamento para apurar esta matéria.

Tem o A. razão nesta alegação de contradição. Porém, essa contradição ficou a dever-se a lapso do próprio relator pois que numa primeira versão do acórdão, que a conferência entendeu não acolher, se considerava o que constava da dita 1ª nota de rodapé. Na versão final, discutida e aprovada na conferência, entendeu-se, como consta da parte final do acórdão, que o facto da Ré não ter reclamado da não inclusão da matéria do artigo 72º da Contestação na Base Instrutória não transitava, por força do disposto no artº 511º nº 2 e 3 do CPC, pelo que era possível à Ré, no recurso para a Relação, pedir a anulação do julgamento para aditamento dessa matéria. Cumpria apenas, como é claro, ter eliminado a 1ª nota de rodapé.

Não se tratando de um lapso de escrita manifesto – visto que não se revela no contexto – há que declarar a nulidade do acórdão e em sua substituição proferir novo, no qual evidentemente, nos limitaremos a eliminar a dita nota de rodapé.

Cumpre ainda dizer que assim faremos porque, pese embora o acórdão tenha dalgum modo já indicado o sentido com que as diversas questões invocadas no recurso da Ré seriam recebidas, é mesmo discutível saber até que ponto o facto constante do artigo 72 da contestação pode determinar uma solução final diferente.

Diremos ainda, no que toca aos reparos feitos quanto à ampliação da matéria constante dos artigos 24 a 26 da contestação, que o essencial que se pretende saber não está contemplado no artigo 13º da Base Instrutória nem foi por isso respondido não provado, ou seja, não foi quesitado se a Ré tinha dado ordens em contrário à utilização das suas instalações e equipamentos para a actividade privada do Autor, o que foi por ela alegado.

Por último, diga-se que o acórdão teve o âmbito que teve, ordenando a repetição para ampliação da matéria de facto com a matéria constante daqueles quatro precisos artigos da contestação, pelo que o que deles não constar não poderá ser quesitado.

Nestes termos, anula-se o acórdão anterior e passa-se a proferir o seguinte acórdão: I. Relatório C…, residente em …, …, Trofa, veio instaurar a presente acção de processo declarativo comum contra “D…, Lda.”, com sede em …, Trofa,”, pedindo que:

  1. Seja declarada a ilicitude do despedimento do A.; b) O A. seja reintegrado no seu posto de trabalho; c) Seja a Ré condenada ao pagamento de todos os créditos salariais que o A. deixou de auferir desde a data do despedimento até à sua efectiva reintegração; d) Seja a Ré condenada no pagamento de uma Sanção Pecuniária Compulsória, no montante de € 100,00 por cada dia que passe até à efectiva reintegração do A.; e) Seja a Ré condenada ao pagamento das custas e ao pagamento de procuradoria condigna.

    Em síntese, alegou que é trabalhador da Ré desde Outubro de 1976. Em 31 de Outubro de 2008, foi-lhe comunicado que, em consequência da instauração de procedimento disciplinar, estava suspenso preventivamente da prestação de trabalho, foi posteriormente notificado da nota de culpa, e mais tarde de uma nota de culpa adicional. Esta é ilegal, pois que os factos que alegadamente lhe são aí imputados já eram do conhecimento da Ré pelo menos desde 2005. Nega os factos da primeira nota de culpa, invocando a existência de ordens contraditórias que radica em litígio entre os dois sócios da Ré.

    Contestou a Ré defendendo a verdade dos factos imputados ao Autor que, pela sua gravidade, tornaram impossível a manutenção da relação laboral, alegando ainda que o Autor, sabedor do litígio existente entre os sócios da Ré, actuou com um deles, seu sogro, numa clara estratégia de afrontamento ao outro, ao qual cabiam os poderes de representação, como o Autor sabia, e ao qual incumbia a gestão de pessoal.

    Foi proferido despacho saneador, em que se decidiu remeter para sentença a apreciação da alegada ilegalidade da nota de culpa adicional e invocada prescrição, tendo sido seleccionada a matéria de facto assente e a base instrutória.

    De tal selecção reclamou a Ré, nos termos de fls. 203 a 205, que não foram atendidos.

    Realizado o julgamento, foi proferido despacho consignado os factos provados e respectiva fundamentação, sem reclamação.

    Foi seguidamente proferida sentença cuja parte dispositiva é a seguinte: “Em face do exposto, decide-se julgar improcedentes os motivos invocados pela Ré para sustentar o despedimento do Autor no âmbito do processo disciplinar que lhe foi movido, e, em consequência:

  2. Declara-se a ilicitude do despedimento do A.; c) Condena-se a R. a reintegrar o A. no seu posto de trabalho; d) Condena-se a R. no pagamento de todos os créditos salariais que o A. deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da presente decisão, que nesta data, e por ora, se liquida já em 64.295,00 euros: 1837,00x35 meses, e a que acrescerá o subsídio de alimentação, em montante a apurar); e) Condena-se a R. no pagamento de uma Sanção Pecuniária Compulsória, no montante de € 100,00 por cada dia que passe até à efectiva reintegração do A. sendo a mesma devida após o trânsito em julgado da presente sentença”.

    Inconformada, interpôs a Ré o presente recurso, apresentando a final as seguintes conclusões: “A- Do núcleo dos poderes de representação dos gerentes das sociedades fazem parte os actos ou negócios jurídicos destinados a constituir, modificar e extinguir relações com terceiros.

    B- Na decisão em recurso não se distinguiram correctamente tais poderes dos poderes de administração.

    C- Relativamente à sociedade Recorrente o trabalhador Recorrido é terceiro.

    D- A instauração do processo disciplinar visava extinguir o contrato de trabalho entre a Recorrente e o Recorrido.

    E- A suspensão do trabalhador integra-se naquele poder disciplinar.

    F- Sendo o trabalhador terceiro relativamente à sociedade, no caso, tratava-se do exercício de um poder de representação.

    G- Nos termos da lei (artº. 261º. do CSC), conjugada com o pacto social da Recorrente (artº.6º), apenas o sócio-gerente B… tem poderes para, só por si, instaurar o procedimento disciplinar e decidir quer a suspensão quer o despedimento, pelo que foi legítima a ordem de suspensão que deu ao Recorrido e este deveria tê-la acatado.

    H- Ainda que se entenda, atento o princípio da ilimitação dos poderes dos gerentes, que o sócio-gerente E… tem poderes de representação, o mesmo só poderá exercer tais poderes conjuntamente com o sócio-gerente B…, enquanto este os pode exercer sozinho (artº. 261º. do CSC. e artº. 6º. do pacto), pelo que o trabalhador não devia obediência à “ordem” de se apresentar ao trabalho.

    I- Está provado que o trabalhador desobedeceu às ordens de um sócio-gerente e de um superior hierárquico.

    J- Está provado que o Recorrido conhecia o teor do pacto social.

    L- A antiguidade do trabalhador na empresa, o facto de ser genro do outro sócio-gerente e o seu conhecimento do conteúdo do pacto social, sempre fariam dele um terceiro de má-fé, a quem não aproveita o princípio da ilimitação dos poderes de gerência que protege os terceiros de boa-fé.

    M- Mesmo que, por hipótese, o que só como tal se concebe, se entendesse que a instauração do procedimento disciplinar e a decisão de suspensão preventiva deveriam ser precedidas de uma deliberação, nela não podia participar o sogro do Recorrido por manifesto conflito de interesses.

    N- A ordem de suspensão é legítima e o Recorrido devia-lhe obediência.

    O- A ordem que o Recorrido supostamente teria recebido através da carta subscrita por seu sogro é ilegítima, violando quer o pacto social quer a lei (artº. 261º. do C.S.C.).

    P- Depois dessa ordem, como se encontra provado, o Recorrido recebeu em 03, 17 e 18 de Novembro de 2008, novas ordens do sócio-gerente B… para acatar a suspensão e não obedeceu.

    Q- Os factos atinentes à desobediência e as suas consequências, também provadas, deveriam ter sido tomados em conta na decisão.

    R- O comportamento do Recorrido é censurável e mesmo doloso.

    T- No caso, nenhum argumento razoável tinha o Recorrido, à luz do critério de um “bom pai de família”, para que tivesse desobedecido a repetidas ordens legítimas e “obedecido” a uma “ordem” ilegítima.

    U- Os factos que traduzem a desobediência, só por si, ou conjuntamente com a restante matéria dada como provada, impunham a improcedência da acção e a declaração de que o...

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