Acórdão nº 3326/09.4TBVFR.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Fevereiro de 2013

Magistrado ResponsávelLOPES DO REGO
Data da Resolução07 de Fevereiro de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. AA e mulher, BB, intentaram acção declarativa, na forma sumária, contra CC, DD e “EE, Lda.”, pedindo que: a) Seja declarado que os AA. são donos e legítimos senhores da fracção designada pela letra “B” do prédio urbano sito no lugar .........., freguesia de Travanca, inscrito na matriz sob o art.º 766-B e descrito na Conservatória do Registo Predial de Santa Maria da Feira sob o n.º 0000; b) Sejam os RR. condenados a reconhecer que os AA. são os legítimos donos e proprietários dessa fracção, por a haverem adquirido legitimamente aos anteriores proprietários, quer por forma derivada, quer por usucapião; c) Sejam os RR. condenados a restituir aos AA. tal fracção, livre e devoluta de pessoas e coisas; d) Sejam declaradas totalmente ineficazes, em relação aos AA., os negócios celebrados pelos RR., relativos à fracção; e) Seja declarada judicialmente a invalidade/nulidade dos negócios celebrados pelos RR., que fundaram os pedidos de registo na Conservatória do Registo Predial de Santa Maria da Feira em nome da 1.ª R. e depois do 2.º R., relativamente à fracção; f) Seja ordenado o cancelamento dos registos de aquisição da referida fracção a favor da 1.ª R., ap. 00000000 e do 2.º R. pela ap. 10 de 00000000 e de todos os registos em contradição ou em contrário à aquisição da fracção pelos AA., livre de ónus e encargos; g) Seja declarado reconhecido aos AA. o direito de conversão em definitivo do registo de aquisição da referida fracção a seu favor, referente à ap. 0000000.

Alegaram ter adquirido, em 27/04/2005, a aludida fracção na venda judicial realizada na execução n.º 387/2000, do 4.º Juízo Cível da Comarca de Vila da Feira, a qual lhes foi entregue pelo depositário judicial e sobre a qual, aliás, por si e ante possuidor (a ali executada), têm sido exercidos ininterruptamente actos de posse, pública e pacífica, há mais de vinte anos, pelo que, igualmente, adquiriram originariamente a fracção por usucapião.

Após a penhora na mencionada execução, a fracção foi, igualmente, penhorada no processo de execução fiscal n.º 00000000000000, do Serviço de Finanças-1, no qual era executada a mesma sociedade que era executada naquela primeira execução. Ora, não obstante os AA. terem comprado a fracção em 27/04/2005, na execução referida, em 03/07/2006, a mesma foi vendida na execução fiscal, mediante venda extrajudicial, à Ré CC, tendo a respectiva escritura pública de compra e venda sido outorgada pelo R. DD, na qualidade de legal representante da sociedade mandatada pelo Serviço de Finanças para proceder à venda e na qualidade de procurador da Ré CC.

Aquando da realização de tal escritura, os RR. e o Serviço de Finanças sabiam que a fracção tinha já sido vendida aos AA., tendo este Serviço feito uma venda de coisa alheia, ineficaz em relação aos AA.. Tal venda é nula em virtude de ter sido simulada, por interposição fictícia de pessoas, já que a Ré CC não quis comprar nem aceitar nada, não tendo pago qualquer preço, nem a Ré “EE” quis vender àquela, mas sim ao sócio-gerente desta, o R. DD, que foi quem pagou o preço, apenas “emprestando” a Ré CC o nome para que o R. DD não aparecesse logo no primeiro acto da declarada compra às Finanças, com o intuito de enganar os AA., cientes que estes não tinham registado a sua aquisição, consubstanciando, assim e ainda, tal venda um negócio consigo mesmo.

Tendo a fracção sido posteriormente vendida pela Ré CC ao R. DD, tal venda é, igualmente, ineficaz e nula, por se tratar de venda de coisa alheia, além de simulada, por interposição fictícia de pessoas, sendo certo que foi para se colocar numa posição de terceiro sub adquirente, que o R. DD declarou comprar à Ré CC e esta declarou vender a fracção.

Contestou o R. DD, dizendo que prevalece a aquisição feita pelos RR., uma vez que procederam ao seu registo, sendo terceiros para efeitos registrais; e, por outro lado, que os AA. não podem invocar a seu favor a posse dos ante possuidores, uma vez que a sua aquisição deriva de uma venda judicial, além de que não se verificaria nenhuma das ilegalidades, nem nenhum dos vícios, invocados pelos AA., nos negócios celebrados pelos RR..

Os AA. responderam, mantendo a sua posição.

Procedeu-se a audiência de julgamento, no termo do qual foi proferida sentença que julgou a acção improcedente.

  1. Inconformados, os AA. apelaram, tendo, todavia, a Relação confirmado a sentença recorrida - começando o acórdão por enunciar os factos provados, após ter julgado improcedente a impugnação deduzida contra a matéria de facto, salvo quanto ao aditamento da factualidade mencionada em último lugar: A) Em 27/04/2005, em venda judicial, mediante propostas carta fechada, realizada no âmbito da acção executiva n.º 387/2000, do 4.º Juízo Cível deste Tribunal, no qual era exequente a “Caixa Geral de Depósitos” e executada “FF, Lda.”, o A. adquiriu a fracção designada pela letra “B” do prédio urbano sito no lugar .........., freguesia de Travanca, inscrito na matriz sob o art.º 766-B e descrito na Conservatória do Registo Predial de Santa Maria da Feira sob o n.º 0000, pelo preço de € 18.710,00.

B) No âmbito dessa execução, o A. apresentou proposta que foi aceite no acto de abertura de propostas, ocorrido em 11 de Abril de 2005.

C) Tendo efectuado o depósito do respectivo preço em 22/04/2005.

D) Em 22/04/2005 fez a declaração para efeitos de liquidação do Imposto Municipal sobre as Transmissões Onerosas de Imóveis (IMT) no Serviço de Finanças da Feira-1, TF-94, e pagou nesse mesmo dia tal imposto, no montante de € 1.216,15.

E) Na sequência do depósito do preço e do pagamento do IMT, por despacho de 27/04/2005, proferido na aludida acção executiva, foi a referida fracção adjudicada ao A. e determinada a passagem de título de transmissão a seu favor.

F) Pelo fiel depositário da acção executiva, a fracção foi entregue ao A., bem como as respectivas chaves.

G) Os AA. mudaram as fechaduras da fracção, limparam a mesma e colocaram nela uma mesa e cadeiras.

H) Praticaram tais actos, à luz do dia, diante de toda a gente, sem hiatos, na convicção de que possuíam e exerciam direito próprio como donos exclusivos e plenos da fracção.

I) Em 18/07/2006, o A. foi notificado pelo Serviço de Finanças da Feira-1, nos seguintes termos: “Na qualidade de adquirente e, em face do título de transmissão emitido pelo 4º Juízo de Competência Cível do Tribunal Judicial de Santa Maria da Feira, em 19/05/05, na qual consta que adquiriu a fracção autónoma designada pela letra “B” do prédio urbano (…), fica V. Ex.ª por este meio notificado, para no prazo de 10 (dez) dias a contar da recepção da presente notificação, apresentar neste Serviço de Finanças a declaração para inscrição/actualização de prédios urbanos na matriz modelo 1 do IMI, para que se proceda à avaliação do citado imóvel (…)”.

J) Em 27/07/2006, os AA. apresentaram a declaração no Serviço de Finanças da Feira-1 e pagar a coima por entrega fora do prazo.

L) Notificados pelo Serviço de Finanças da Feira-1 para pagarem o IMI relativo ao ano de 2005, até 31/08/2006, procederam ao seu pagamento.

M) Em 22/08/2006 foram notificados do resultado da avaliação.

N) Através da inscrição F-1, Ap. 000000000, foi registada a penhora efectuada na execução do 4.º Juízo Cível.

O) Através da inscrição F-2, Ap. 000000000, foi registada penhora efectuada em execução fiscal.

P) Através da inscrição F-3, Ap.000000000foi registada penhora efectuada em execução fiscal.

Q) Através da inscrição G-1, Ap. 00000000, foi registada a aquisição da fracção a favor da R. CC.

R) Através do Av. 1, Ap. 0000000, foi cancelada a inscrição F-1.

S) E, através do Av. 1, Ap. 0000000, foi cancelada a inscrição F-2.

T) Através da inscrição G-2, Ap. 0000000, foi registada, a título provisório por dúvidas, a aquisição a favor do A., por “compra em execução”.

U) Tendo tal inscrição caducado, conforme An. 1, de 09/05/2007.

V) Através da inscrição G-3, Ap. 00000000, foi registada a aquisição a favor do R. DD, por “compra”.

X) Os AA. deslocaram-se em Setembro de 2006 à Conservatória do Registo Predial de Santa Maria da Feira e vieram a saber da situação registral do prédio, vindo posteriormente a apurar, através de consulta no Cartório Notarial de Vila Nova de Gaia do Dr. GG, que a fracção tinha sido posta à venda e vendida pelo Serviço de Finanças.

Z) No Serviço de Finanças-1 correu o processo de execução fiscal n.º 0000000000000000, no qual era executada a mesma sociedade que era executada no aludido processo judicial n.º 387/2000.

AA) Tendo sido, igualmente, penhorada nessa execução fiscal a fracção aqui em causa, por despacho de 09/02/2006, o Chefe do Serviço de Finanças da Feira-1 nomeou a “EE, Lda.”, representada pelo R. DD, com sede em Vila Nova de Gaia, para proceder à venda extrajudicial da fracção em causa.

BB) E, em tal execução fiscal, por despacho de 05/05/2006, o Chefe do Serviço de Finanças da Feira-1 autorizou a referida venda pelo preço de € 11.100,00, já depositado na Tesouraria de Finanças junto desse Serviço, à compradora CC.

BB) Tendo, em 22 de Maio de 2006, a R. CC procedido ao pagamento do respectivo IMT.

CC) Por escritura pública lavrada em 28/05/2001, no 1.º Cartório Notarial de Vila Nova de Gaia, a cargo do Notário HH, a R.CC constituiu seu bastante procurador o R. DD, “a quem com a faculdade de substabelecer concede poderes para comprar, gerir e administrar quaisquer bens imóveis sitos em Portugal e, em consequência, fazer e aceitar arrendamentos ou alugueres, fixando os preços, os fins e o montante das rendas ou dos alugueres, (…), passar e assinar os competentes recibos e quitações, outorgando e assinando as respectivas escrituras ou contratos de arrendamento ou de aluguer, representa-los em quaisquer Repartições Públicas, Indivíduos ou Entidades, designadamente Repartições de Finanças, Câmaras (…), nas Conservatórias do Registo Predial proceder a actos de registo, provisórios ou definitivos, seus averbamentos ou...

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