Acórdão nº 2324/07.7TBVCD.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Janeiro de 2013

Magistrado ResponsávelABRANTES GERALDES
Data da Resolução17 de Janeiro de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

I – J.

demandou M.

em acção declarativa com processo ordinário pedindo a sua condenação no pagamento da quantia de € 19.773,00 e da quantia mensal de € 560,00 até efectiva desocupação do imóvel de que ambos são comproprietários, assim como no pagamento de 50% das prestações vincendas correspondentes ao IMI.

Alega que foi casado com a R. e que, no âmbito do processo de divórcio, foi atribuída a esta a utilização da casa de morada de família, situação que se mantém, sendo que o imóvel foi adquirido por ambos os cônjuges em regime de compropriedade, atento o regime de separação de bens que vigorava.

A R. impugnou a pretensão do A. alegando que não se verifica uma situação qualificada como enriquecimento sem causa.

Foi proferida sentença que condenou a R. no pagamento ao A. de ½ do valor locativo do imóvel desde Janeiro de 2005 até efectiva desocupação e na quantia de € 342,14 correspondente a metade do IMI pago pelo A., assim como em metade das quantias que o A. vier a pagar a esse título.

A R. apelou, mas a Relação confirmou o decidido.

A R. interpôs recurso de revista, tendo concluído que:

  1. A alusão a "pendência da acção”, tanto pode significar que as partes celebraram o acordo na pendência da acção, como o fizeram, como o de o acordo se destinar apenas a regular o destino da casa de morada de família enquanto a acção de divorcio estivesse pendente ou como se após o divorcio ficava em aberto a possibilidade de alteração ao destino da casa de morada de família, sem necessidade de prova de alteração das circunstâncias a requerimento do cônjuge que nisso tivesse interesse.

  2. Ao contrário do decidido do referido acordo não resulta que as partes quiseram estabelecer como limite temporal ao destino da casa de morada de família, a pendência da acção de divórcio.

  3. Assim o texto do referido acordo não afasta a presunção estabelecida no art. 1775°, nº 2, do CC.

  4. Celebrado um acordo quanto ao destino da casa e morada de família ou decidido judicialmente esse destino, ainda que em incidente no processo de divórcio, a alteração só pode ser feita em processo próprio de alteração do destino da casa de morada de família se a sentença de divórcio não proceder a essa alteração.

  5. A retribuição pelo uso da casa de morada de família de um dos cônjuges ao outro é fixada em processo próprio para alteração do destino da casa de morada de família, nos termos do art. 1793º do CC.

  6. O tribunal, ao atribuir o destino da casa de morada de família a um dos cônjuges, olha não só para a necessidade de cada um dos cônjuges, mas fundamentalmente para o interesse dos filhos do casal, pelo que o valor da retribuição num arrendamento que possa ser imposto não é necessariamente o valor locativo de mercado.

  7. O A., ao intentar acção de divisão de coisa comum, após o divórcio, manifesta a rejeição da possibilidade do arrendamento da casa de morada da família à R. ou a terceiro.

  8. A petição inicial e consequentemente a acção não permite a condenação da R. com base em enriquecimento sem causa, por falta de alegação de factos concretos em que se consubstancie o enriquecimento da R. e o empobrecimento do A.

  9. Analisado o circunstancialismo desde 2005 até pelo menos 2010, a R. beneficiaria com facilidade de um empréstimo a uma taxa de juro Euribor + 0,5 %, (ou spread de 0,5%) para aquisição do imóvel, o que se traduziria nesta data a um juro de 0,95 % e uma taxa de juro média no intervalo de 2005 à presente data entre 0,95 e 1,65 % ao ano, que corresponderia a se algum locupletamento houvesse ao locupletamento da R. na maior parte do período a que se refere a sentença.

  10. O A. provavelmente está a pagar pelo empréstimo à habitação que contraiu há cerca de 4 anos pela casa onde reside, antes do início da actual crise económica, mas depois da propositura da acção, uma taxa de juro, na ordem dos referidos Euribor + 0,5% ou no limite Euribor + 1,0 %.

  11. A condenação numa indemnização pelo valor locativo, além de retirar a capacidade negocial à R., impondo-se-lhe um valor de renda que esta provavelmente não aceitaria, vai muito além do eventual locupletamento da R. e do empobrecimento do A., constituindo assim in casu uma injusta fonte de enriquecimento do A.

  12. Ao proceder o pedido do A. fora do âmbito do art. 1793º do CC, está-se a dar ao A., sem o vincular a um arrendamento, uma contrapartida maior do que a de um arrendamento que fosse deferido pelo Tribunal à R., contornando-se e ultrapassando-se as regras desse instituto, em contrário à parte final do art. 474° do CC.

  13. Uma dm razões da subsidiariedade do enriquecimento sem causa em relação a outros institutos é precisamente o facto de outro instituto negar a indemnização ou atribuir ao enriquecimento efeitos diferentes da restituição do valor do locupletamento.

  14. Na obrigação alimentar, compreende-se conceder habitação aos filhos.

  15. A R. na prática é apenas um dos 4 utentes da casa, sendo que na pendência do matrimónio era um dos 5 utentes da casa e o A. outro dos 5, pelo que no limite, caso se entenda que ao A. assiste o direito a ser ressarcido pela fruição da casa, apenas lhe deve ser arbitrado o valor correspondente a l/8 do valor da fruição do imóvel ou, então, se pensarmos na quota-parte da fruição que teria se todos estivem a residir na casa, l/5 do valor da fruição do imóvel.

  16. O pagamento de metade do valor locativo do imóvel, além de ultrapassar in casu mais do triplo do valor do locupletamento da R. e do empobrecimento do A., traduz-se numa condenação da R. a pagar ao A. pela habitação que faculta aos filhos.

  17. A renda de mercado, na indicação de valor locativo do imóvel, tem incorporados custos como a fiscalidade, os intervalos entre arrendatários e as obras aquando das mudanças de arrendatários, vínculo perante o arrendatário, que não fazem sentido quando se trata de indemnização pela fruição da casa de morada de família, por parte do cônjuge inocente que ficou com a...

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