Acórdão nº 1541/01.9GDLLE-E.S de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Janeiro de 2013

Magistrado ResponsávelSANTOS CARVALHO
Data da Resolução17 de Janeiro de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1.

“A” veio, por requerimento de 9 de julho de 2012, nos termos do art.º 449.º, n.º 1, al. d), do CPP, interpor recurso extraordinário de revisão do acórdão do Tribunal Coletivo de Loulé, proferido no processo n.º 1541/05.9GDLLE, em 2 de abril de 2009, transitado em julgado em 4 de janeiro de 2012, após ter sido confirmado, com redução da pena, pelo acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 1 de julho de 2010.

No acórdão do Tribunal Coletivo, o ora recorrente fora condenado pela prática de um crime de homicídio qualificado tentado, p. e p. pelos artigos 131º e 132.º, n.ºs 1 e 2, al. g, 22.º, 26.º e 28.º do Código Penal, na pena de 9 (nove) anos e 6 (seis) meses de prisão, que o Tribunal da Relação de Évora reduziu para 7 (sete) anos e 6 (seis) meses de prisão.

No mesmo acórdão foram julgados e condenados pelo mesmo crime “B”, “C”, “D”, “E” e “F”. Foi também julgado “G”, mas este foi condenado, quanto aos mesmos factos, pela prática de um crime de ofensa á integridade física grave qualificada, embora tenha sido condenado também por outros factos diferentes. “H”, identicamente acusado pelo MP, faleceu antes do julgamento se realizar.

2.

Ficaram provados os seguintes factos: 1.1 Cerca das 21 horas do dia 8 de novembro de 2005, foi descoberto o corpo de “I”, sem vida, com uma ferida perfurante na cabeça, provocada por bala de uma arma de fogo.

1.2 Tendo começado a circular a notícia da sua morte logo os seus amigos e familiares se deslocaram para as imediações da sua residência, no Edifício “J”, em Quarteira.

1.3 Naquele local, em conversa, tiveram, entre outros, os arguidos “B”, “D”, “E”, “F”, “C” e “A” conhecimento da morte do “I” - pelo uso de arma de fogo - e ficaram a saber que teria sido “L” o último a vê-lo com vida o que, aliado à falta de explicação para a sua morte, fez surgir o boato de que teria sido este “L” o responsável por tal facto.

1.4 Perante tal situação e após tomarem conhecimento que o “L” se encontrava junto da sua residência e próximo do "Bar C...", em Almancil, entre outros, os arguidos “B”, “D”, “E”, “F”, “C” e “A” combinaram entre si deslocarem-se ao local para aí confrontarem o “L” e se vingarem do mesmo.

1.5 Assim, munidos de paus, facas e soqueiras, dividiram-se pelos veículos automóveis disponíveis e deslocaram-se para Almancil.

1.6 Entre outros, foi utilizado o veículo automóvel de marca "Chrysler", modelo "PT Cruiser", com a matrícula ....-RI, propriedade do pai do arguido “B” e conduzido por este e foi, também, utilizado o veículo de marca "Citroên", modelo "Saxo", com a matrícula ...-RL, conduzido por “R”, no qual se fez transportar, além de outros, o arguido “C”.

1.7 Chegados ao local, nas imediações do "Bar C...", em Almancil, “H” abeirou-se de “L” dizendo "vamos matar esse filho da puta".

1.8 Após o que todo o grupo, no qual se incluíam os arguidos “B”, “D”, “E”, “F”, “C” e “A”, se precipitou sobre o “L” e começaram a bater-lhe no corpo com socos, pontapés e outros objetos que traziam consigo, como soqueiras e paus, tendo o arguido “B” feito uso de uma faca, espetando-a, pelas costas, no dorso do “L”.

1.9 Apesar de rodeado pelo referido grupo, “L” conseguiu dirigir-se para a porta do "Bar C.... " a fim de aí se refugiar e pedir auxílio e, apesar da oposição de “G”, que exercia funções de segurança no citado bar e tentou fechar a porta e empurrá-lo, conseguiu penetrar no seu interior.

1.10 Nessa altura, o arguido “G” entrou no interior do estabelecimento e, com um objeto metálico de características não apuradas, atingiu o rosto de “L”, tentando puxá-lo para o exterior.

1.11 Com a pancada desferida pelo arguido “G”, o “L” perdeu os sentidos.

1.12 O grupo, no qual se encontravam os restantes arguidos “B”, “D”, “E”, “F”, “C” e “A” entrou, também, no estabelecimento e continuou a bater no corpo do “L”, desferindo-lhe socos, pontapés, atingindo-o com outros objetos e, após, colocaram-se em fuga.

1.13 Como consequência direta e necessária das agressões de que foi vítima, “L” sofreu traumatismo craniano e encefálico, hematomas múltiplos, fraturas costais, fraturas maxilofaciais (fratura complexa nasoetmoidofrontal, por ferida incisa da região frontonasal, fratura parietal direito e frontal, feridas múltiplas do dorso, múltiplas feridas da face, ferida incisiva da região frontonasal, hemorragia subconjuntival do olho direito.

1.14 As referidas lesões determinaram 270 dias de doença, sendo 180 com incapacidade grave para o trabalho profissional e os restantes com afetação de 40%.

1.15 Resultaram, para o “L”, dos factos praticados pelos arguidos vestígios cicatriciais, constituídos por cicatrizes múltiplas do couro cabeludo parietal direito e esquerdo, cicatriz occipital e cicatriz em "Y" da zona frontal intersupraciliar e nasal, cicatrizes dorsais e lombares, sendo que a cicatriz em "Y" referida foi provocada pela atuação do arguido “G”.

1.16 Resultaram, igualmente, sequelas de traumatismo craniano e encefálico, consubstanciadas em incapacidade permanente parcial de 10%.

1.17 E das lesões resultou perigo para a vida de “L”, que só não veio a falecer em virtude de, rapidamente, as autoridades policiais se terem deslocado ao local e lhe ter sido provida rápida assistência médica.

1.18 Sabiam os arguidos “B”, “D”, “E”, “F”, “C” e “A” que as lesões causadas no “L”, atentos os meios empregues e a forma de atuação em grupo, em número manifestamente superior ao ofendido e colocando-o na impossibilidade de se defender ou de fugir, era adequadas a causar-lhe a morte, a qual só não se verificou por motivos alheios à sua vontade.

1.19 Quiseram os arguidos agir como o fizeram, deliberada, livre e conscientemente, com o propósito de tirar a vida do ofendido, mediante prévio acordo e em conjugação de vontades e esforços, cada um aceitando a conduta do outro, apesar de conhecerem a censurabilidade das suas condutas.

1.20 Sabia o arguido “G” que, ao agir da forma descrita, atingia o corpo de “L”, mas quis fazê-lo, de forma deliberada e consciente, bem sabendo ser a sua conduta proibida.

1.21 “L” teve de ser evacuado do Hospital Distrital de Faro para o Hospital de S. José, em Lisboa.

1.22 “L” ficará, como consequência direta e necessária dos factos praticados, com a cicatriz na face marcada para toda a sua vida.

1.23 “L” sofreu dor, perturbação e angústia.

Do processo apenso 330/07.0GFLLE: (…) 3.

Motivação da decisão de facto: Na formação da sua convicção, o Tribunal atendeu aos meios de prova disponíveis, considerando, naturalmente, as declarações do arguido “G” (único que se prestou a falar, antes das alegações) e do assistente, os depoimentos das testemunhas, bem como os dados objetivos fornecidos pelos documentos e perícias realizadas, tudo conjugado com as regras da experiência comum.

Em primeiro lugar, em face da abundante prova documental (documentos clínicos) e pericial, dúvidas não existiram (nem tal matéria foi, de qualquer maneira, posta em causa) de que “L” foi agredido no dia e hora indicados na acusação (ver, por outro lado, a título de exemplo de como tal questão foi pacífica em audiência, o depoimento, no mais desinteressante, de Armindo Monteiro Júnior, irmão do falecido “I”, ao afirmar que "toda a gente sabe que o “L” foi agredido").

Em face do teor do relatório pericial (fls. 718 e ss.), reforçado pelas declarações do Senhor perito médico prestadas em audiência, dúvidas também não existiram quanto às consequências dessas agressões para o corpo e saúde do “L”.

Atendeu-se aos depoimentos de J... Q... (militar da GNR, que acorreu ao local e viu o estado em que se encontrava o ora assistente “L” e falou, portanto, de forma credível do resultado das suas perceções diretas), “M” e “N” (inspetores da Polícia Judiciária que, igualmente, falaram de forma credível do que resultou das suas perceções diretas e das diligências de prova realizadas), “O” (inspetor da Polícia Judiciária, que falou das diligências de prova realizadas) e, de forma relevante, “P” (militar da GNR, que acorreu ao local, falando de forma credível das suas perceções diretas: viu o estado da vítima e os carros em fuga).

A principal questão controversa deste processo (do processo principal) acabou por ser a autoria desses factos ou, por outras palavras, a prova, ou não, da participação dos arguidos nas agressões.

Ora, atendeu o Tribunal, desde logo, às declarações sérias, sem quaisquer sinais de preparação, vívidas, sinceras e, por isso, credíveis de “L”...

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