Acórdão nº 1032/08.6TYLSB.L2 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 10 de Janeiro de 2013

Magistrado ResponsávelSÉRGIO POÇAS
Data da Resolução10 de Janeiro de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Proc. nº 1032-08.6TYLSB.L2 7ª Sec[1] (Revista) Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I. Relatório AA - …, S.A. Intentou acção declarativa com processo ordinário contra: BB, CC e DD.

Pedindo a sua condenação (depois de efectuada a redução do pedido de fls. 1030, do IV Vol.) no pagamento da quantia de € 933.008,00 a título de danos emergentes, com juros de mora.

Alegou, para tanto, a actuação ilícita dos RR., violadora dos deveres legais a que estavam obrigados como Administradores da A., consistentes no uso de fundos desta em benefício próprio e não em função dos interesses sociais.

Fundamenta a sua alegação no facto de os RR. terem realizado negócios com a própria sociedade, dos quais se constituíram destinatários ou beneficiários, directa ou indirectamente, de fundos da A. que se destinavam a investimento e participação no capital social da AA BRASIL.

Os RR. actuaram como se os fundos da A. fossem seus, projectando e executando o investimento da A. na AA BRASIL em desrespeito pelos accionistas da A. e com desconsideração dos seus órgãos sociais. Ocultaram o diferencial entre os meios financeiros transferidos e o custo real da aquisição e reforço da participação na AA BRASIL e, não satisfeitos, simularam ainda o preço e/ou todos os elementos dos contratos que apresentaram posteriormente na contabilidade da A. (aproveitando-se da sua qualidade de Administradores da A. e do facto de serem contra-parte nos mesmos), lesando com isso a A. e os seus accionistas.

  1. Contestaram 2.1. Os RR. DD e CC - impugnando os factos e deduzindo a excepção de prescrição, uma vez que decorreu prazo superior a 5 anos desde que as transferências referidas pela A. na petição inicial se mostram registadas na sua contabilidade.

    Argumentaram, para esse efeito, que os accionistas da A. sempre foram informados de todos os investimentos efectuados pela A. na AA BRASIL, desde 1994, tendo ainda sido tais investimentos evidenciados nas contas da A., devidamente certificadas e aprovadas.

    Além disso, todos os movimentos e operações eram conhecidos dos accionistas pelo menos desde a data das Assembleias-Gerais de aprovação dos relatórios e contas relativos a cada exercício a que respeitam, sendo que o último facto (aumento de capital social da AA BRASIL de 1999) foi objecto de conhecimento pela Assembleia-Geral de 31-3-2000, data a partir da qual cessaria, se tivesse existido, qualquer ocultação de conduta pelos RR.

    Assim, decorreu, desde tal data até à propositura da acção, mais de cinco anos, bem como desde a data da produção do alegado dano (20-5-1997).

    Impugnaram ainda a existência de quaisquer danos, quer porque não se verificaram, quer porque a A. alcançou, com os dividendos que recebeu, os benefícios que retirou da relação privilegiada na aquisição de matérias-primas e a venda que fez da sua participação social, um benefício quantificável em valor superior ao valor investido no próprio custo da participação.

    2.2. O R. BB argumentou, na contestação, que os accionistas da A. sempre tiveram conhecimento das transferências referidas na petição inicial, nada tendo sido ocultado ou omitido pelos RR., pelo que o valor da participação social da A. na AA BRASIL encontra-se há mais de cinco anos reflectido nos documentos contabilísticos da A., documentos que se encontram na sede da A., tendo sido com base neles que foi feita a auditoria, sendo as contas revistas anualmente pelo ROC que as aprovou sem reservas.

    Invocando também a excepção de prescrição arguiu que, entre a data da prática dos factos que a A. alega e a data da propositura da acção, decorreram mais de cinco anos.

  2. A A. replicou sustentando que os accionistas não tiveram conhecimento dos factos cuja prática imputa aos RR., devido à forma como, até ao exercício de 2002, eram registados pelos RR. na contabilidade os investimentos financeiros da A. em participações sociais noutras empresas, o que impossibilitou os accionistas de compararem o capital próprio da AA BRASIL com o custo de aquisição dispendido com o investimento, bem como pelo facto de os RR. não facultarem aos accionistas da A. e aos seus órgãos de fiscalização as contas da AA BRASIL.

    Só nas contas de 2003 é que os RR. passaram a registar as participações detidas pela A. de acordo com o critério de equivalência patrimonial, e só então disponibilizaram as contas da AA BRASIL, pelo que só na Assembleia-Geral para aprovação de contas referentes ao exercício de 2003, realizada em 31-3-2004, os accionistas tiveram conhecimento da depreciação do seu investimento e indícios de que algo estaria errado no binómio custo de aquisição/participação detida no capital da AA BRASIL.

    Concluiu que o início do prazo prescricional de 5 anos ocorreu em 18-3-2008, com a realização da Assembleia-Geral extraordinária da A. em que os accionistas tomaram conhecimento do teor do Relatório de Auditoria da M... ou, pelo menos, desde a respectiva convocatória, em 15-2-08, e, no limite, desde Abril de 2006, quando tal relatório foi entregue à Administração da A., ou então, sem conceder, desde 31-3-2004.

    Alegou ainda que, uma vez que os RR. se mantiveram como Administradores da A. até 30-5-2005, nos termos do art. 318°, ai. d), do CC, o prazo de prescrição não poderia ter decorrido.

  3. Antes da audiência preliminar, foi proferido o despacho de fls. 1818 e segts., considerando ''''não escritos", além de outros que não foram questionados no recurso, os arts. 21° a 63° da réplica apresentada pela A., com fundamento em que não correspondem à impugnação da matéria de excepção invocada pelos RR. DD e CC na respectiva contestação.

  4. No despacho saneador foi julgada procedente a excepção de prescrição, sendo os RR. absolvidos do pedido.

  5. Inconformada a Autora Apelou parta o Tribunal da Relação que revogou a decisão e mandou prosseguir os autos.

    Inconformados, os réus recorrem agora para o STJ.

    A - Conclui o Réu BB 1.O douto acórdão recorrido padece do vício de erro de julgamento na medida em que aplicou aos autos a norma do artigo 318.°, ai. d), do Código Civil, a qual não é aplicável ao caso sub judice.

  6. Consequentemente, não é de atender ao momento da cessação do mandato do administrador para efeitos do início da contagem do prazo prescricional da responsabilidade deste perante sociedade comercial.

  7. À situação dos autos é aplicável o n.° 1, ai. b), do artigo 174.° do CSC, nos termos do qual os direitos da sociedade contra os administradores, relativamente à obrigação de indemnizar a sociedade, prescrevem no prazo de cinco anos, contados a partir do termo da conduta dolosa ou culposa dos administradores ou da sua revelação, quando aquela tiver sido ocultada, e da produção do dano, sem necessidade de que este se tenha integralmente verificado.

  8. No momento em que os Réus foram citados para a presente acção, haviam já decorrido mais de cinco anos sobre a prática do factos que a Autora imputava aos Réus, os quais eram, para além disso, por esta conhecidos também há mais de cinco anos, pelo que, nos termos do artigo 174.°, n.° 1, ai. b), do CSC, o direito invocado encontrava-se prescrito.

  9. Atento o exposto, o direito indemnizatório por alegados danos emergentes que a Autora com fundamento na conduta que na Petição Inicial imputa aos Réus encontra-se prescrito nos termos do disposto na alínea b) do n.° 1 do artigo 174.° do CSC.

    Nestes termos e nos mais de direito que v. exas. doutamente suprirão, deverá ser julgado procedente a revista, revogando-se, consequentemente, o douto acórdão recorrido, com o que se fará justiça.

    B - Concluem os Réus DD e CC 1. O Tribunal a quo ao revogar o despacho saneador, na parte em que nele se julgou procedente a excepção de prescrição do direito de indemnização, com fundamento de que o prazo de prescrição não havia decorrido pela aplicação da alínea d) do n.° 1 do artigo 318.° do Código Civil, com preterição do disposto n.° 1 aliena b) do artigo 174.° do Código das Sociedades Comerciais, decidiu com violação da lei substantiva por erro na determinação da norma aplicável.

  10. O regime da prescrição para o direito societário autonomizado no artigo 174° do CSCom, para as relações societárias, é uma norma especial não só porque estabelece um prazo diferente do estatuído no CC, mas também porque estabelece o momento a partir do qual ele se conta, sem que deste normativo se possa concluir omissão ou lacuna legislativa que permita apelar à aplicação por integração da ai. d) do art. 318.° do C. Civil.

  11. A génese do art.°174º do CSCom. tem a ver com razões de segurança jurídica que impõem, no que ao giro comercial respeita, a fixação de prazos curtos para exercer a responsabilização e que não se compadece com o regime geral previsto no código civil da suspensão do prazo de prescrição.

  12. Ao estatuir expressamente o artigo 174.° do CSCom. o termo da conduta ou ao seu conhecimento, quando haja ocultação, como critério de início do computo do prazo de prescrição e ao não sujeitar o inicio do computo do termo à cessação de funções do administrador, o Código das Sociedades Comerciais regula integralmente o instituto, sem lacunas e sem necessidade de recurso ao regime previsto no Código Civil para as pessoas colectivas.

  13. O direito societário é direito especial por referência ao direito civil comum regulador das pessoas colectivas em geral, com uma génese e disciplina própria que se autonomizou das regas das pessoas colectivas previstas no código civil.

  14. O conjunto das disposições do CSCom reguladoras das relações entre a sociedade e os seus administradores vai no sentido da efectivação da responsabilidade quando a ela haja lugar sem sujeição a qualquer outra condição que não seja o conhecimento do acto ou omissão gerador de responsabilidade.

  15. O legislador ao usar no art.°157.° do Código Civil a expressão nominal "sociedades" para aplicação do regime das pessoas colectivas, "... quando a analogia das situações o justifique ", expressamente exclui as sociedades do conceito legal "pessoas colectivas", o que permite concluir que nem...

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