Acórdão nº 27/12.0YRCBR.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Maio de 2012

Magistrado ResponsávelOLIVEIRA MENDES
Data da Resolução09 de Maio de 2012
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça Por acórdão proferido no Tribunal da Relação de Coimbra no processo de execução de mandado de detenção europeu registado sob o número 27/12.0YRCBR, foi determinada a execução definitiva de mandado de detenção contra o arguido AA, com os sinais dos autos, tendo-se ordenado o seu cumprimento em dez dias, com entrega do arguido após trânsito em julgado e prestação de garantia, às autoridades francesas para prossecução de procedimento criminal, ficando a entrega sujeita à condição de a autoridade requerente garantir que o arguido será devolvido a Portugal para aqui cumprir pena ou medida de segurança privativas da liberdade em que venha a ser condenado em França.

O arguido interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça.

É do seguinte teor o segmento conclusivo da motivação de recurso[1]: I) O presente recurso restringe-se à decisão de execução do MDE e não às condições em que o mesmo venha a ser executado no caso de improcedência o presente recurso; II) O acórdão recorrido enferma de nulidade por não constar do mesmo fundamentação com enumeração dos factos provados bem como uma exposição dos motivos de facto e de direito que suportam a decisão, com indicação do exame crítico das provas, em contravenção ao que estabelece o art. 374°/2 do CPP aplicável por remissão dos arts. 37971, a) e 425°, ambos também do CPP e do art. 34° da LMDE, nulidade que nos termos do disposto no art. 122° do CPP implica a anulação da decisão recorrida e de todos os seus termos posteriores dela dependentes; III) O acórdão recorrido não faz correcta leitura do disposto actualmente do corpo do art. 249°/1,c) do CP (após redacção da Lei 61/2008 de 31/10) quanto ao local da prática da alegada infracção de retenção do menor filho do Recorrente, porquanto face às regras aplicáveis decorrentes do art. 7º e 10° do CP, o resultado típico verificou-se em Portugal e ainda que qualquer conduta omissiva haja sido praticada em França, a alegada acção repetida e injustificada de não cumprir o regime estabelecido relativamente ao menor, deu-se em Portugal; IV) Pelo que não pode deixar de verificar-se a existência do motivo de recusa facultativa de extradição inscrito no art. 12°/1, h) da LM DE, o que de per si deve conduzir à negação da requerida extradição.

V) O MDE não está previsto como justificado na Decisão Quadro n° 2002/584/JAI, do Conselho, de 13/06, pelo que o art. 2°/1 e 3o da LMDE (Lei 65/2003, de 23/08) violam tal normativo comunitário.

VI) Não se justificando, ou sendo razoável até para o tipo de crime em causa nos autos, incomparavelmente de gravidade superior àqueles para que foi previsto este tipo de cooperação judiciária, ou seja os crimes graves do catálogo referido no art.0 2 / 2 da referida Decisão Quadro.

VII) Tanto mais que a emissão e cumprimento de um MDE, constituindo uma imediata privação ou restituição do direito à liberdade - no caso do Recorrente com a sua detenção e imposição da medida de coacção de apresentação periódica a autoridade policial - deve desenvolver-se sob os auspícios dos princípios da legalidade, da excepcionalidade, da indispensabilidade da proibição do excesso, da proporcionalidade, da subsidariedade e da constitucionalidade.

VIII) A essa luz, a prossecução de um MDE que no seu inicio não se encontrava traduzido, ao arrepio do disposto no art.0 3.°, 4.° e 16.° da LMDE, é nulo, nulidade cuja invocação se reitera.

IX) Sendo ilegal e inconstitucional que a autoridade judiciária competente não imponha um controlo prévio à execução de um MDE nestas condições, como foi o caso, sendo, pois, indevida qualquer aceitação do carácter automático dos pressupostos da emissão do MDE, como faz a decisão recorrida; X) No caso em concreto, a extradição do Recorrente em cumprimento do MDE é uma inutilidade, uma vez que nem a lei portuguesa, nem a lei francesa permitem qualquer medida de coação detentiva face ao crime em causa nos autos é à sua moldura penal, nos termos do disposto no art. 201° e 202° do CPP; XI) Além disso, a extradição do ora Recorrente é uma violência injustificada, uma vez que, o mesmo se encontra representado por mandatário forense no procedimento criminal a decorrer em França; XII) O Recorrente tem a sua vida pessoal, familiar e profissional centrada em Portugal, em locais bem conhecidos das autoridades portuguesas e francesas; XIII) Dele dependendo em termos de apoio a sua mãe frágil e de idade avançada.

XIV) Pelo que, ao abrigo do disposto no art. 1872 da Lei 144/99, sempre esses motivos seriam ponderosos para negar a requerida extradição.

XV) Sendo que, em qualquer caso, a decisão de extradição sempre seria violadora do disposto no art. 1872 e 3 da CRP, no confronto da aplicação do direito à liberdade e da necessidade da tutela penal, inscritos respectivamente nos arts. 27° e 29° da CRP, por violação do princípio da proporcionalidade.

Na resposta o Ministério Público deixou consignado o seguinte: Salvo melhor opinião, entendemos que o recorrente não tem razão.

Na verdade, ao contrário do alegado, o acórdão recorrido de fls. 150 e ss. encontra-se bem fundamentado – de facto e de direito – e não padece de qualquer dos vícios invocados.

Por outro lado, não se vislumbra qualquer causa válida que pudesse conduzir à recusa de execução do presente mandado de detenção europeu.

Aliás, devemos chamar a atenção, a propósito, para o facto de o tribunal ter inclusive tomado uma posição prudente e até, de alguma forma, favorável ao arguido, ao ter solicitado uma garantia prévia às autoridades do Estado emitente, ou seja, a garantia de que o arguido será devolvido a Portugal, no caso de ter de cumprir pena ou medida de segurança privativas de liberdade em que venha, porventura, a ser condenado naquele país.

Quanto aos demais considerandos referenciados pelo recorrente, podemos dizer que são irrelevantes, atento o princípio do reconhecimento mútuo que enforma a Decisão Quadro 2002/584/JAI, do Conselho, de 23 de Junho de 2002, e, em geral, todo o regime de cooperação internacional em matéria penal (cfr. entre outros, Jorge Costa, in Julgar, n.º 17, 167 e ss e Luís da Silva Pereira, in RMP, ano 24, n.º 96, 39 e ss.).

Colhidos os vistos legais, cumpre agora decidir.

Delimitando o objecto do recurso verificamos serem as seguintes as questões que o recorrente submete à apreciação do Supremo Tribunal: - Nulidade insanável do mandado de detenção europeu por haver sido emitido sem tradução; - Nulidade do acórdão recorrido por deficiente fundamentação, resultante de falta de enumeração dos factos provados, violadora do disposto no n.º 2 do artigo 374º do Código de Processo Penal, aqui aplicável ex vi artigos 34º, da LMDE (Lei n.º 65/03, de 23 de Agosto) e 425º, do Código de Processo Penal; - Violação de princípios constitucionais, nomeadamente dos princípios da legalidade, da excepcionalidade, da necessidade e da proporcionalidade, resultante da circunstância de a LMDE permitir a emissão e execução de mandado de detenção relativamente a crimes puníveis com prisão não inferior a 12 meses, quando na Decisão Quadro 2002/584/JAI não se encontra prevista a possibilidade de o mandado de detenção europeu se aplicar a crimes puníveis com prisão inferior a 3 anos, sendo certo que a execução do mandado implica a restrição do direito à liberdade do recorrente face a facto delituoso de reduzida gravidade; - Ilegalidade da sua entrega ao Estado emitente do mandado de detenção, uma vez que tem a sua vida pessoal, familiar e profissional centrada em Portugal, em locais bem conhecidos das autoridades portuguesas e francesas, dele dependendo em termos de apoio a sua mãe frágil e de idade avançada, razões que obstam à execução do mandado ao abrigo do disposto no artigo 18º, n.º 2, da Lei n.º 144/99, de 31 de Agosto; - Incorrecta aplicação da LMDE, por afastamento da recusa facultativa de execução do mandado, decorrente de o facto delituoso que àquele...

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