Acórdão nº 08B332 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 15 de Maio de 2008
Magistrado Responsável | LÁZARO DE FARIA |
Data da Resolução | 15 de Maio de 2008 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1 -Relatório - I-AA, intentou a presente acção declarativa de condenação com processo ordinário contra BB - Embalagem, SA, sociedade com sede no Porto e contra BCP Leasing, SA, com sede em Lisboa, pedindo a condenação da primeira ré a receber da 2ª Ré a máquina vendida e a restituir a esta o valor do preço recebido; a condenação da primeira ré no pagamento dos danos sofridos pelo Autor, por ter realizado o contrato em causa, em montante a liquidar em execução de sentença; a condenação da segunda ré a restituir-lhe o valor das rendas e demais prestações pecuniárias recebidas em execução do contrato de locação financeira e a condenação de ambas as rés no pagamento de juros de mora, à taxa legal, desde a data da sentença até à da restituição.
Para tanto alegou, em suma, que a primeira ré procedeu á venda de uma máquina de pesar e embalar lulas, as quais não tinha as características que lhe foram garantidas pelo vendedor.
A 2ª ré adquiriu tal máquina, a seu pedido, tendo com esta celebrado um contrato de locação financeira.
Citadas as rés, apenas o Banco Comercial Português, SA, que incorporou por fusão a BCP Leasing SA, veio contestar, defendendo-se por impugnação e dizendo que não responde pelos vícios da coisa locada.
O processo seguiu os seus legais termos.
Após audiência de julgamento, foi proferida sentença, pela qual, tendo-se entendido que o locatário não podia requerer a anulação, na medida em que não era nisso interessado, julgou a acção improcedente e absolveu as R.R. do pedido.
Inconformada com a decisão, o autor interpôs recurso de apelação, pedindo a revogação da decisão, por entender violados os artºs.913º, 905º, 908º, 287,ºnº1 do C. Civil e artº13º do Dec.-Lei nº149/95, de 24 de Junho.
Não foram apresentadas contra - alegações.
O Tribunal da Relação, apreciando o objecto do recurso, concedeu procedência parcial ao mesmo, e revogou a decisão recorrida, declarando: - Anulado o contrato de compra e venda celebrado entre a 1ª Ré e a 2ª Ré; - Extinto o contrato de locação financeira a partir da sua celebração (por força da rectroactividade da anulação).
E condenando: - A 1ª Ré a receber a máquina objecto do contrato e a restituir o respectivo preço à 2ª Ré; - A 2ª Ré a restituir ao A. o valor das rendas e demais prestações pecuniárias em execução do contrato, acrescida dos juros de mora desde a sentença até à data da restituição.
E absolveu: - A 1ª Ré do pedido referente a prejuízos.
Interpôs, agora, recurso deste acórdão a 2ª Ré, o qual foi admitido como REVISTA.
Tendo alegado, apresentou as seguintes C O N C L U S Õ E S: 1ª) -A questão de direito que se discute neste recurso consiste em saber se o locatário de um bem que lhe está dado de locação financeira tem legitimidade para exercer contra o vendedor o direito de anulação ou resolução do contrato de compra e venda ou se este direito lhe está vedado por dispor unicamente da posição de locatário financeiro e não de comprador. E, na perspectiva de a ter, se as consequências desta invalidade operam apenas na direcção do vendedor condenado à anulação ou à resolução ou se operam também na direcção do locador em termos de este ficar constituído na obrigação de restituir as rendas recebidas por efeito do contrato anulado ou resolvido; 2a - O Acórdão recorrido, considerando que o locatário tem direito de acção contra o vendedor para dele obter a anulação ou a resolução do contrato de compra e venda do bem dado de locação financeira, chegou a este lastimável resultado: condenou o Banco a restituir à Autora o montante das prestações que recebeu em cumprimento da locação financeira de um bem que o Banco comprou por escolha da própria autora - o que fez sob o pretexto de que, sendo a compra e venda anulada, extinta se tem de ter, por força da retroactividade da anulação, a locação financeira; 3a - A questão que aqui verdadeiramente se coloca, não é tanto a de conceitualmente e por mera raciocínio de pura lógica formal, chegar à obrigação de restituição das rendas recebidas como mera consequência do efeito retroactivo da anulação ou resolução da compra e venda, senão a de saber, à luz do regime jurídico positivo da locação financeira, tomado na sua dimensão material e não formal, se a solução do caso é ou não a da restituição a cargo do locador - ele que só interveio na compra e venda para efeito de locar à Autora o bem que esta escolheu e que escolheu para ser comprado onde disse - ou seja, no estabelecimento da lª Ré; 4a - Se atentarmos no regime legal da locação financeira, uma de duas: ou o locatário, como se refere na sentença da 1ª Instância e, como o ensina Rui Pinto Duarte, não goza do direito de obter a anulação ou de exercer a resolução do contrato de compra e venda e a questão prática não se coloca, ou tem direito a fazê-lo, mas os efeitos retroactivos da anulação e da resolução são inoponíveis em relação ao locador.
5ª Se, como decorre da própria definição legal do contrato de locação, é o (futuro) locatário quem escolhe o bem e a entidade onde é comprado, não restando ao (futuro) locatário outra coisa que não seja comprar o que aquele quer e onde quer - é de todo em todo inaceitável que o locador seja obrigado a ter de restituir as rendas por ele recebidas, sendo o contrato anulado ou resolvido a pedido do locatário; 6a Se a lei protege expressamente o locador, pondo-o a coberto da obrigação de responder perante o locatário pelos vícios da coisa locada (artº12° do DL 149/95 de 24 de Junho) e se o locatário, exactamente por os não poder exercer contra o locador, pode exercê-los contra o vendedor, está bom de ver que a lei não pode estar a defendê-lo do menos (responder pelos vícios da coisa locada) e estar a expô-lo ao risco do máximo (ter de restituir ao locatário as rendas que deste recebeu em consequência da anulação ou resolução de um contrato cuja escolha do bem e cuja escolha do vendedor, não foi sua, mas do próprio beneficiário da restituição) 7a O acórdão recorrido inspira-se num tipo de pensamento jurídico de matriz exclusivamente formal ou de pura lógica dedutiva: se o contrato de compra e venda é nulo ou é resolvido, não há senão que tirar as consequências lógicas da retroactividade desta declaração e elas são a obrigação de responder pela restituição das rendas a cargo do locador por não se poder manter direito aquilo que se recebeu por causa que foi anulada ou, o que é o mesmo, resolvida; 8ª Este entendimento esquece, como ensina Antunes Varela que "ao conceito naturalístico da nulidade (quod nullum est nullum producit effectum) e à própria concepção de invalidade do...
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