Acórdão nº 07S4747 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Abril de 2008

Magistrado ResponsávelPINTO HESPANHOL
Data da Resolução17 de Abril de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

Em 15 de Julho de 2005, no Tribunal do Trabalho de Aveiro, AA instaurou a presente acção declarativa, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho contra V...A...A... S. A., pedindo que fosse declarada a licitude da resolução do seu contrato de trabalho, por se verificar a justa causa invocada, e a condenação da ré a pagar-lhe € 4.225,24, a título de retribuições vencidas, € 11.770,20, a título de indemnização pela resolução do contrato, e € 50.000,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais, o que perfaz a quantia de € 65.995,44, acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados desde a citação até integral pagamento.

A ré contestou, alegando que não se verifica justa causa para resolução do contrato de trabalho, e deduziu reconvenção, pedindo que a autora fosse condenada a pagar-lhe indemnização no valor de € 2.414,14, correspondente ao incumprimento do prazo de aviso prévio para a resolução do seu contrato de trabalho, bem como € 50.000,00, «por indemnização decorrente da violação do direito ao bom-nome, crédito e imagem da Ré», e ainda a condenação da autora como litigante de má fé.

A autora respondeu à contestação, suscitando, designadamente, a questão da inadmissibilidade parcial da reconvenção, no tocante à indemnização decorrente da violação do direito ao bom-nome, crédito e imagem da ré, e pediu, por sua vez, que a ré fosse condenada como litigante de má fé.

No despacho saneador, não foi admitida a reconvenção quanto ao pedido de condenação da autora no pagamento da indemnização de € 50.000 à ré por alegada violação do seu direito ao bom-nome, crédito e imagem, «porque tal pedido não emerge do facto jurídico que serve de fundamento da acção, antes emerge de uma invocada conduta da Autora susceptível, na perspectiva da Ré, de integrar os pressupostos da responsabilidade civil contratual», e, em conformidade, absolveu-se a autora da instância relativamente ao indicado pedido de condenação.

Não se conformando com esta decisão, a ré interpôs recurso de agravo.

Realizado julgamento, proferiu-se sentença que julgou a acção parcialmente procedente e (i) declarou que o contrato de trabalho celebrado entre a autora e a ré cessou em 20 de Junho de 2005 por rescisão operada, com justa causa, pela autora, (ii) condenou a ré a pagar à autora € 7.796,62, a título de indemnização por todos os danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, (iii) bem como € 4.577,32, a título de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal referentes a trabalho prestado em 2004 e 2005, (iv) acrescendo aos montantes a que a autora tem direito «juros à taxa legal de 4%, desde a citação (27 de Setembro de 2005) e até efectivo e integral pagamento».

Note-se que, embora as partes tivessem requerido a recíproca condenação como litigantes de má fé, aquela sentença não se pronunciou sobre tal matéria.

  1. Inconformados, a ré e a autora interpuseram recurso de apelação, sendo o primeiro independente e o outro subordinado, tendo a Relação de Coimbra decidido «confirmar as decisões impugnadas, negando provimento aos recursos de agravo, de apelação e subordinado».

    É contra esta decisão da Relação que, primeiro a ré e, em seguida, a autora, agora se insurgem, mediante recursos de revista, sendo o primeiro independente e o segundo subordinado, ao abrigo das seguintes conclusões: RECURSO DA RÉ: «Questão prévia - da nulidade do acórdão: 1. A Recorrente invoca, desde já, a nulidade do douto Acórdão, nos termos conjugados dos artigos 77.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho e 668.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Civil, porquanto: 2. Nos presentes autos, [a] ora Recorrente, por diversas vezes, insurgiu-se contra a conduta processual da ora Recorrida, invocando, para o efeito, a litigância de má fé desta.

  2. Desde logo, na contestação que apresentou, e atenta a falsidade - como se veio a demonstrar - de muitos dos factos alegados pela Autora, os quais eram do seu conhecimento pessoal, a Ré invocou a litigância de má fé, com as legais consequências.

  3. Depois, aquando da resposta da Autora aos documentos juntos pela Ré (requerimento de fls. que deu entrada no Tribunal do Trabalho de Aveiro, em 9 de Novembro de 2005) e em que esta impugnou, nos termos do artigo 544.º, n.º 1, do Código de Processo Civil e com fundamento em não saber se a letra e assinatura dos mesmos era verdadeira, entre outros, os Docs. 3 e 5 da contestação, nos quais constava a própria assinatura da Autora, assim como ao impugnar a veracidade de um documento que fora ela própria que juntara aos autos com a petição inicial, e por considerar que com esta conduta a Autora faltava à verdade, deduzindo oposição cuja falta de fundamento não devia ignorar, praticando dolosamente violação grave do dever de cooperação e fazendo dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, a Ré reiterou o pedido de condenação da Autora como litigante de má fé.

  4. Ainda, após ter sido notificada da resposta apresentada pela Autora à junção aos autos, pela V... Portugal, Comunicações Pessoais, S. A., do doc. de fls., e em que aquela imputou à Ré, sob a forma de suspeita, a prática de actos ilícitos, maxime, que em conluio com outrem tivesse "forjado" um documento, e considerando que mais uma vez a conduta da Autora se traduzia num uso reprovável do processo, a RÉ reiterou o pedido de condenação da AUTORA como litigante de má fé.

  5. Não obstante os diversos requerimentos da Ré pedindo a condenação da Autora como litigante de má fé, com os diversos fundamentos oportunamente invocados, os quais como novamente se demonstrará infra foram plenamente justificados e se encontram abundantemente documentados nos autos, o tribunal a quo não se pronunciou sobre os mesmos.

  6. Na verdade, compulsada a douta sentença, bem como o douto Acórdão sob recurso, verifica-se que, não obstante os pedidos formulados pela Ré ora Recorrente nesse sentido, quer no âmbito da pendência do processo na primeira instância quer no âmbito do recurso interposto para o Tribunal da Relação de Coimbra, nem a douta sentença, nem o douto Acórdão ora recorrido, condenaram nem absolveram a Autora, não tendo sido sequer apreciadas as condutas processuais da Autora, tendo aliás o douto Acórdão recorrido decidido que nem sequer tinha que apreciar tal questão.

  7. Nestes termos, o tribunal a quo deixou de se pronunciar sobre questões que devia ter apreciado no douto Acórdão, pelo que o mesmo é nulo - cfr. artigo 668.°, n.º 1, alínea d) do Código de Processo Civil, nulidade essa que se invoca.

    Da inadmissibilidade de reconvenção: 9. A reconvenção, em processo laboral, está sujeita a requisitos mais rigorosos do que em processo civil, concretamente, está limitada aos casos previstos no artigo 30.º do Código do Processo do Trabalho e no artigo 85.º, alíneas o) e p), da Lei n.º [3]/99, de 13 de Janeiro.

  8. De acordo com o artigo 30.º do Código de Processo do Trabalho, a reconvenção só é admitida quando o pedido da Ré seja emergente do facto jurídico que serve de fundamento à acção.

  9. Por sua vez, dispõe a alínea p) do artigo 85.º da Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro, que compete aos Tribunais do Trabalho conhecer, em matéria cível, das questões reconvencionais que com a acção tenham as relações de conexão referidas na alínea anterior, ou seja, "questões entre sujeitos de uma relação jurídica de trabalho ou entre um desses sujeitos e terceiros, quando emergentes de relações conexas com a relação de trabalho, ou entre um desses sujeitos e terceiros, quando emergentes de relações conexas com a relação de trabalho, por acessoriedade, complementaridade ou dependência, e o pedido se cumule com outro para o qual o tribunal seja directamente competente", salvo no caso de compensação, em que é dispensada a conexão.

  10. A admissibilidade da reconvenção está, assim, dependente da verificação de requisitos de natureza substantiva, que se traduzem na exigência de uma certa relação de conexão entre o pedido principal e o pedido reconvencional.

  11. Relativamente aos requisitos de natureza substantiva, o citado artigo 30.º prevê três situações de admissibilidade da reconvenção: - Quando o pedido do Réu emerge do facto jurídico que serve de fundamento à acção; - Quando o pedido reconvencional está relacionado com o pedido do autor por acessoriedade, complementaridade ou dependência; - Quando o Réu invoca a compensação de créditos.

  12. No caso sub judice, o facto jurídico que serve de fundamento à acção principal (causa de pedir) é a verificação dos pressupostos da alegada justa causa, que levaram à resolução do contrato, por parte da trabalhadora.

  13. Alega a Autora, na sua petição inicial, que: - Quando se apresentou ao serviço após o gozo de licença por maternidade, o posto de trabalho que anteriormente ocupava havia sido ocupado por outra pessoa (artigo 35.º da petição inicial); - A Ré havia desactivado a password que lhe dava acesso ao computador da empresa (artigo 36.º da petição inicial); - A R. havia mandado desligar o telemóvel com o n.º 91..., que no seu entendimento lhe havia sido atribuído para uso profissional e pessoal, sem plafond (artigos 37.º e 64.º da petição inicial); - Foi transferida para um local de trabalho, que qualifica de "sítio esconso" (artigos 43.º e 58.º da petição inicial); - A R. esvaziou as suas funções, passando a organizar Diários da República (artigos 43.º, 44.º, 55.º, 58.º e 62.º da petição inicial); - Foi obrigada a picar o ponto e proibida de circular pela fábrica (artigos 41.º e 66.º da petição inicial).

  14. De forma a justificar a justa causa de cessação contratual, a Autora entende que estas condutas consubstanciam uma conduta ilegítima, ilícita e culposa por parte da Ré.

  15. Estando assim em apreciação, na presente acção, o preenchimento dos pressupostos da justa causa de cessação contratual, entende a Ré, que a sua conduta, ao contrário da Autora, se pautou sempre por comportamentos legítimos e...

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