Acórdão nº 095/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 26 de Abril de 2012

Magistrado ResponsávelSÃO PEDRO
Data da Resolução26 de Abril de 2012
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na 1ª Secção do Supremo Tribunal Administrativo 1.

Relatório A……, com os demais sinais nos autos, e o ESTADO PORTUGUÊS vieram recorrer da decisão do Tribunal Administrativo do Círculo de Lisboa, datada de 05 de Julho de 2011, que julgando parcialmente procedente a “acção declarativa comum, com processo ordinário” intentada pela recorrente particular contra o recorrente Estado, condenou este “a pagar à Autora a quantia € 4.189,92 por incapacidade permanente e a título de danos morais a quantia de 1.257€, acrescidas de juros de mora vencidos desde a citação”.

Terminaram as respectivas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: 1.1. Conclusões da Recorrente – A……: I - O Tribunal, em matéria de acidentes escolares, não está vinculado à aplicação da fórmula prevista no artigo 11º da Portaria n° 413/99, devendo ao invés socorrer-se de critérios de equidade, tal como decorre do disposto no artigo 566º do Código Civil.

II - Portanto, o calculo da indemnização, única e exclusivamente, alicerçado na fórmula prevista no artigo 11 ° da Portaria 413/99, abstraindo de critérios de equidade, viola de forma flagrante o disposto no artigo 566º do Código Civil, designadamente no seu n° 3 III - Ainda que assim se não entenda, sem conceder, o Tribunal sempre estaria vinculado à actualização da indemnização a arbitrar nos termos do artigo 566º n° 2 do Código Civil, que constitui aliás critério geral em matéria de indemnizações, pelo que no seu cálculo deverá atender-se ao valor do salário mínimo para o ano de 2011, ou seja 485,00€.

1.2. Conclusões do Recorrente Estado Português: 1 - A A. veio instaurar no Tribunal Judicial de Faro acção ordinária peticionando a condenação do Estado Português para ressarcimento dos danos sofridos com o acidente de viação ocorrido no dia 21.09.00, cerca das 18h35, na Estrada de Loulé, em Faro, que se objectivou no seu atropelamento.

2 - Na sua petição inicial, para o cálculo da indemnização peticionada, a A., não obstante fazer apelo às normas próprias do Seguro Escolar (artigo 11º da Portaria n° 413/99), nunca pretendeu que o Tribunal, nesta matéria, ficasse vinculado à aplicação da fórmula prevista neste artigo pois não é dessas mesmas normas que extrai a obrigação indemnizatória.

3 - É que, ao invés do decidido, assenta a A., a causa de pedir e o pedido nas normas próprias do Código Civil (e não do Seguro Escolar), o que se depreende com clareza do pedido formulado que corresponde ao disposto nos art.s 496º e 564º n° 2 do C.C.

4 - É destes normativos do Código Civil que extrai a obrigação indemnizatória, o que claramente se divisa do pedido formulado: muito para além do resultante da aplicação da fórmula prevista no artigo 11 ° da Portaria n° 413/99.

5 - Da sua alegação factual e argumentação jurídica pode vislumbra-se um enquadramento passível de ser reconduzido ao regime de responsabilidade civil extracontratual do R. no quadro legal definido pelo DL n.º 48051, de 21.11.1967.

6 - Assim não se entendendo, sempre deverá sublinhar-se que a A., ao delinear o pedido nesta acção, contrariamente ao defendido na douta sentença, não o fez restrita ao accionamento da indemnização pelo seguro escolar, tudo indicando pretender instaurar em simultâneo uma acção de responsabilidade civil extracontratual por facto ilícito, nos termos gerais.

7 - Nessa medida, mal andou a Mmo Juiz ao expender na sentença aquele argumento, enfermando a decisão judicial de erro de julgamento, porquanto omite que a obrigação geral de indemnizar só pode ter por fonte a responsabilidade civil extracontratual que, como é sabido, tem como pressupostos de verificação cumulativa o facto ilícito, a culpa do agente, o dano ou prejuízo, e o nexo de causalidade entre o facto e o dano.

8 - Acontece que, atentas as disposições legais nas quais a Autora fundamentou de direito o seu pedido, a Autora não demonstrou nem articulou sequer, factos suficientes para fundamentar os requisitos da responsabilidade civil extracontratual do Estado.

9 - Mas os invocados DL n° 35/90 de 25/1 e Portaria n° 413/99, de 8/6, em que - na versão da douta sentença - a A. assenta a causa de pedir e o pedido, também não lhe conferem a pretensa indemnização por danos patrimoniais e morais.

10 - O denominado seguro escolar é uma medida de assistência social ou segurança social, sendo um seguro social, onde o Estado, intervindo embora como segurador, desempenha um serviço público.

11 - Atenta a matéria de facto dada como provada, não resulta demonstrado que o acidente dos autos foi, de forma expressa, enquadrado e tratado como acidente escolar.

12 - Como se diz na douta sentença recorrida, no caso dos autos há notícia de que o procedimento administrativo se iniciou, não tendo contudo sido concluído. Ou seja, existem elementos que possibilitam concluir pela existência de um acidente escolar, tendo sido efectuada participação do acidente à DREA.

13 - Para que se verifique um acidente escolar por atropelamento, in itinere, terão de estar preenchidos os requisitos previstos nos artigos 21 ° e 22° da Portaria nº 413/99 de 8 de Junho, sendo certo que os previstos no artigo 22° são cumulativos.

14 - Não se provou (nem foi alegado) que o percurso foi efectuado pela A. no período imediatamente ulterior ao termo da actividade escolar dentro do período de tempo considerado necessário para ser percorrido a pé.

15 - Também não consta provado (nem alegado) que o acidente foi participado às autoridades policiais e judiciais competentes no prazo de 15 dias.

16 - Ao invés do decidido, a A. tinha direito a uma decisão expressa por parte da Administração - precisamente pela Direcção Regional de Educação do Algarve - a qualificar o evento como acidente escolar.

17 - É que, do quadro normativo decorrente da citada Portaria n.º 413/99, mormente, dos seus arts. 23.° e 24.°, resulta a instituição dum procedimento administrativo prévio obrigatório que condiciona e limita a possibilidade de instauração de acção judicial para a efectivação de responsabilidade no âmbito do seguro escolar.

18 - O excesso de pronúncia enquanto causa de nulidade da sentença, ocorre quando o Tribunal conhece de questões de que não pode tomar conhecimento por utilizar um fundamento que excede a causa de pedir vazada na petição, ou por extravasar o elenco legal do conhecimento ex officio ou, ainda, por conhecer de pedido quantitativa ou qualitativamente distinto do formulado pela parte – artºs 668° nº 1 d), 661 ° n° 1 do CPC, ex vi art° 1 ° LPTA.

19 - Constituindo a cominação ao desrespeito do comando contido no n° 2 do art. 660°, que impõe expressamente ao juiz que resolva todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação.

20 - É entendimento jurisprudencial que, «questões» para este efeito, são todas as pretensões processuais formuladas pelas partes que requerem decisão do juiz, bem como os pressupostos processuais e os elementos integradores do pedido e da causa de pedir, ou seja, entendendo-se por «questões» as concretas controvérsias centrais a dirimir.

21 - No caso em apreço, tendo aquele procedimento administrativo previsto nos arts. 23.° e 24.° da Portaria n.º 413/99, sido preterido, a decisão judicial recorrida, ao julgar parcialmente procedente a acção, incorreu em excesso de pronúncia, causal de nulidade «ex vi» do art. 668°, n.º 1, al. d), «in fine», do CPC.

22 - E assim não se entendendo, sempre se dirá que, concluindo pela condenação do Réu Estado aqui demandado, temos igualmente que finalizar dizendo que foi feita uma errada interpretação desta questão na decisão recorrida.

23 - Pois do mesmo quadro normativo extrai-se claramente que a dedução, instrução e decisão daquele procedimento administrativo constitui condição prévia obrigatória a verificar-se e sem a qual não poderá ser instaurada acção administrativa comum tendente a efectivar responsabilidade assente no regime do seguro escolar.

23 - Dito de outra forma, a responsabilidade pelo pagamento das quantias peticionadas ao abrigo do Regulamento do Seguro Escolar está intimamente relacionada e dependente da prática de um acto administrativo por parte da entidade administrativa, acto esse que contende directamente com a existência da obrigação de pagamento das quantias peticionadas.

24 - Assim sendo, a acção de responsabilidade emergente de acidente escolar implica que já exista uma decisão no âmbito do procedimento administrativo da qual se infira que o evento se deverá qualificar como acidente escolar.

25 - Acresce que, para atribuição de indemnização por incapacidade terá o sinistrado que se submeter a junta médica, mas a requerimento do próprio ou seu legal representante - que reunirá por iniciativa da DRE, e que fixará o grau de incapacidade a ter em consideração (arts. 14° n° 1 e 11 ° nº 1 a 3).

26 - Além de que, nesse instituto, um pedido indemnizatório por danos morais, face ao estatuído no art. 11°, nº 4, da mesma Portaria, depende também de um requerimento e de uma decisão...

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