Acórdão nº 0364/12 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 26 de Abril de 2012

Magistrado ResponsávelPEDRO DELGADO
Data da Resolução26 de Abril de 2012
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1.

Vem a Fazenda Pública recorrer para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Tributário do Porto de 13 de Fevereiro de 2012, que julgou procedente a reclamação de decisão de órgão de execução fiscal deduzida pelo banco A……, SA, e anulou o despacho do Chefe do Serviço de Finanças do Porto 5, que determinou a prestação de uma garantia no valor de € 900.552,95, no âmbito do processo executivo nº 3379200301012703.

Termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: «A. A douta sentença padece de erro de julgamento, em violação, nomeadamente, do disposto nos art.°s 103°, 169° e 183°-A, todos do CPPT.

B. Alega o douto tribunal, em síntese, que, por virtude da garantia bancária n.º 879-02-0000480, prestada na execução 3379200301012703 e cuja caducidade foi entretanto declarada pelo órgão competente da Administração Tributária em 29.01.2007, a execução suspendeu-se, mantendo-se essa suspensão até à presente data, C. uma vez que a decisão tomada na reclamação graciosa foi objecto de recurso hierárquico e a decisão deste foi impugnada judicialmente, pelo que ainda não teve lugar a "decisão de pleito" no que concerne à legalidade da liquidação de IRC em cobrança no processo de execução fiscal nº 3379200301012703.

D. Entende, pois, o douto tribunal que, por força do disposto no art.º 169° n.º 1 do CPPT, a execução fiscal mantém a sua suspensão na sequência da apresentação da garantia bancária, independentemente da caducidade daquela garantia, suspensão que se mantém até trânsito em julgado da decisão que vier a ser proferida na impugnação judicial, não sendo, pois, devida qualquer outra garantia para obter o referido efeito suspensivo.

E. Ora, a Fazenda Pública discorda com o entendimento do douto tribunal, entendimento que além de ferir o sentido jurídico do disposto nos arts. 103°, 169° e 183°-A todos do CPPT, atenta contra vários princípios, nomeadamente o princípio da prossecução do interesse público.

F. Os princípios jurídicos subjacentes ao instituto da prestação de garantia idónea reconduzem-se à necessidade do Estado assegurar que o contribuinte, em caso de litígio com a Administração Tributaria esteja em condições económicas de, finalizada a contenda - quando e se improcedente - cumprir com a quantia exequenda devida.

G. Este instituto consagra, pois, o princípio da prossecução do interesse público na conduta da Administração Fiscal, em todas as suas vertentes.

H. O instituto jurídico da prestação da garantia subsume-se, prima facie, à função primordial da Administração Tributária e de todo o complexo normativo tributário, ou seja, "das normas que têm por objectivo assegurar a capacidade funcional do Estado, proporcionando-lhe os meios financeiros que suportam tanto a existência como do seu funcionamento”.

I. Ora, a necessidade de obtenção de receita fiscal é uma incumbência decorrente de um imperativo constitucional previsto nos termos do art.° 103° da Constituição da República Portuguesa, o qual prescreve no seu nº 1 que “o sistema fiscal visa a satisfação das necessidades financeiras do Estado e outras entidades públicas ... ", pois de outra forma não se poderá assegurar "uma repartição justa dos rendimentos e da riqueza. " J. Donde, a ratio do instituto da prestação da garantia é, pois, a de assegurar o pagamento da dívida tributária - a qual é inteiramente indisponível - efectivando-se, desse modo, os interesses públicos do Estado.

K. Feito este enquadramento e no tocante à caducidade da garantia, dispõe o nº 1 do art.° 52° da LGT, n.º 1 e 5 do art.° 169° e 212°, ambos do CPPT, que a execução fiscal se suspende se for apresentada reclamação, recurso, impugnação judicial que tenham por objecto a discussão da legalidade da dívida exequenda ou se for recebida oposição à execução fiscal.

L. No entanto, para obter aquela suspensão deverá ser prestada garantia, nos termos previstos nos art.°s 52° da LGT, 169° e 199º do CPPT.

M. Previa o então nº 1 do artº 183°-A do CPPT, norma aditada pela Lei 15/2001, de 5 de Junho, e entretanto revogada pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, que a garantia prestada para suspender a execução em caso de reclamação graciosa, impugnação judicial, recurso judicial ou oposição caducava se a reclamação graciosa não estivesse decidida no prazo de um ano a contar da data da sua interposição, N. ou se a impugnação judicial, ou a oposição não estivessem julgados em 1ª instância no prazo de três anos a contar da data da sua apresentação (na redacção conferida pela Lei nº 300-B/2002, de 30 de Dezembro).

O. Verifica-se, pois, que o legislador admitiu que devia conceder tratamentos diferentes a situações obviamente diferenciadas.

P. ''A «voluntas legis» é claramente a de permitir ao contribuinte ver a sua reclamação ou qualquer outros dos procedimentos ou processos indicados nos citados normativos rapidamente decididos, sem perder de vista o interesse de garantia de segura e certa cobrança da dívida exequenda e prevenção contra expedientes dilatórios do contribuinte.

Q. A ratio subjacente ao instituto da caducidade da garantia, em sede de reclamação graciosa, assenta no princípio da eficiência e do dever de decisão a que a Administração tributária está vinculada. Assenta, também, num princípio de racionalidade económica.

R. A Administração Tributária tem o dever de decidir em tempo útil.

S. Sendo que a garantia é prestada no interesse do Estado, implicando a sua manutenção custos para o executado, o protelamento de uma decisão da Administração Tributária não deve implicar custos para aquele, devendo, outrossim, esses custos ser devolvidos à Administração Tributária.

T. Princípios que também imperaram nas motivações do legislador (ao tempo) ao atribuir um prazo "razoável" para os tribunais produzirem uma decisão.

U. Resulta, assim, da leitura do art.º 183°-A, e de forma clara, que o legislador distinguiu o contencioso administrativo, do contencioso judicial, V. penalizando de forma distinta a demora na prolação em sede de contencioso administrativo, da demora em sede de contencioso judicial.

W. E se assim o fez é porque entendeu que o procedimento administrativo e o procedimento judicial são vias recursivas distintas e sem ligação entre elas que determine a continuação dos efeitos da caducidade no âmbito da nova via impugnatória, X. não configurando a impugnação judicial como uma via recursiva da reclamação graciosa, Y. pois, como é entendimento dos tribunais superiores, o sujeito passivo não está inibido de, em sede de impugnação judicial, esgrimir com vícios de que entenda padecer o acto tributário ainda que os não tenha suscitado em prévia reclamação graciosa.

Z. Utilizando o dizer de Joaquim Freitas da Rocha, in Lições de Procedimento e Processo Tributário, 3ª edição, Coimbra Editora, pág. 261 ''Assim, reclamação e impugnação são duas garantias distintas, com igualmente distintos espaços de actuação, apesar de terem em comum os objectivos (como vimos, a anulação de actos tributários), os fundamentos ("qualquer ilegalidade"), a inexistência de efeito suspensivo da respectiva liquidação e, em certa medida, os prazos (em regra, 120 e 90 dias).

Contudo...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT