Acórdão nº 855/09.3TTMAI.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 26 de Abril de 2012

Magistrado ResponsávelPINTO HESPANHOL
Data da Resolução26 de Abril de 2012
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

Em 19 de Maio de 2010, no Tribunal do Trabalho da Maia, Secção Única, AA instaurou acção, com processo especial, emergente de acidente de trabalho, que foi participado em 13 de Dezembro de 2009, contra BB – …, L.

da, e CC …, S. A., pedindo que as rés fossem condenadas a pagarem-lhe (i) € 1.1761,38, a título de pensão anual, obrigatoriamente remível, devida a partir do dia 18 de Março de 2010; (ii) € 3.190,32, a título de indemnizações por incapacidades temporárias; (iii) € 12, a título de despesas de transportes; e (iv) juros de mora, à taxa legal, a contar da data do acidente e até efectivo pagamento.

Alegou, em resumo, ter sido admitido ao serviço da 1.ª ré, em 17 de Abril de 2002, para exercer as funções de operador de máquinas e mediante remuneração mensal base de € 581,20, acrescida de subsídio de alimentação de € 114,40 e de um subsídio nocturno de € 36,33 mensais, sendo que, no dia 6 de Abril de 2009, quando trabalhava para a 1.ª ré, sofreu um acidente, que lhe causou lesões determinantes de uma incapacidade permanente parcial (IPP) de 25,74%.

A ré empregadora contestou, alegando que «o acidente que vitimou o Autor ocorreu involuntariamente, dentro das circunstâncias de perigo e risco inerentes ao exercício da sua actividade», não se tendo verificado «desrespeito pelas regras de segurança no trabalho» e estando a sua responsabilidade infortunística totalmente transferida para a ré seguradora, pelo que devia ser absolvida dos pedidos deduzidos.

A ré seguradora também contestou, alegando que o acidente ocorreu porque a ré empregadora não observou as regras de segurança no trabalho que, no caso, se impunham, pelo que apenas é responsável, a título subsidiário.

Ambas as rés responderam à contestação apresentada pela outra.

Findos os articulados, foi proferido o despacho saneador, seleccionados os factos assentes e organizada a base instrutória, sendo determinado o desdobramento do processo para fixação da incapacidade para o trabalho.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, com gravação da prova, foi exarada sentença, que, considerando não «poder responsabilizar, pela reparação do sinistro, a 1.ª Ré, nos termos do […] art. 18.º, n.º 1, da Lei n.º 100/97, de 13/09», julgou a acção parcialmente procedente e condenou a ré seguradora a pagar ao autor: (i) «o capital de remição da pensão anual e vitalícia de 1.819,82 euros, devida desde 18/03/2010, pela IPP de 26,25% de que ficou afectado»; (ii) «a quantia de 12 euros por despesas de transporte»; e (iii) «juros de mora, sobre as prestações anteriores, à taxa legal, desde o vencimento (18/03/2010) até integral pagamento».

Quanto ao mais, a ré seguradora foi absolvida do pedido.

A ré empregadora, por sua vez, foi totalmente absolvida do pedido.

  1. Inconformada, a ré seguradora apelou para o Tribunal da Relação do Porto, que julgou procedente o recurso de apelação, revogando a sentença recorrida na parte em que absolveu a ré empregadora dos pedidos e condenando: «1. A Ré BB – …, Lda., a pagar ao Autor a pensão anual, obrigatoriamente remível, de € 2.599,75, devida desde 18.03.2010, acrescida dos juros à taxa anual de 4% a contar de 18.03.2010 e até integral pagamento; a quantia de € 5.709,85, a título de indemnização por ITA, acrescida dos juros de mora à taxa de 4% ao ano, a contar de 07.04.2009 e até integral pagamento; a quantia de € 12,00, a título de despesas com deslocações, acrescida dos juros de mora à taxa anual de 4% a contar de 27.04.2010 e até integral pagamento.

    2. A Ré CC – … S. A., a título subsidiário, a pagar ao Autor a pensão anual de € 1.819,82, obrigatoriamente remível, devida desde 18.03.2010, acrescida dos juros de mora, à taxa de 4% ao ano, a contar de 18.03.2010 e até integral pagamento; a quantia de € 3.195,84, a título de indemnização por ITA, acrescida dos juros de mora à taxa de 4% ao ano, a contar de 07.04.2009 e até integral pagamento; a quantia de € 12,00, a título de despesas de deslocações, acrescida dos juros de mora à taxa anual de 4% ao ano a contar de 27.04.2010 e até integral pagamento.» É contra esta deliberação que a ré empregadora, agora, se insurge, mediante recurso de revista, em que alinha as conclusões seguintes: «I. Dos presentes autos não resultam provados quaisquer factos que permitam imputar ao Empregador, ora Recorrente, a responsabilidade agravada pela verificação do acidente de trabalho, ao contrário do que consta do douto acórdão recorrido; II. Ficou provado que a máquina onde ocorreu o acidente estava habitualmente dotada de protecção (factos AI e AZ), tendo ficado provado, ainda e apenas, que “no momento do acidente, não estava colocada a protecção metálica” (facto AL); III. Ficou provado que a dita protecção terá sido retirada “em data por determinar” (facto AJ); IV. Não resultou provado — porque nem sequer alegado, apesar de tal competir à Seguradora, ora Recorrida — quem é que, no momento do acidente, retirou a protecção, quando o fez e em que circunstância ou com que motivação; V. Não resultou provado qualquer facto que permita imputar ao Empregador a falta de protecção na máquina no momento do acidente, seja em razão de acção ou de omissão; VI. Mas resulta provado que o Empregador exigia a existência e a colocação da protecção na máquina, que esta protecção existia de facto, e estavam previstos procedimentos de alerta para a verificação da falta de protecção, nomeadamente através do Teste de Início de Turno; VII. Na ponderação da responsabilidade do Empregador pelo sinistro devem ser tidos em conta todos os factos dados como provados, nomeadamente aqueles que respeitam à sua actuação, exigência e rigor em matéria de segurança no trabalho, e em concreto no que respeita ao equipamento onde ocorreu o sinistro; VIII. Nomeadamente, são relevantes para este efeito os factos dados como provados sob as alíneas Z, AA, AB, AC, AO, AR, AS, AT, AV, AZ e AI, e que aqui por economia se dão por reproduzidos; IX. Assume especial relevo o facto de a Instrução de Segurança do Equipamento onde ocorreu o acidente, elaborada pelo Empregador, exigir uma protecção metálica (facto AV), o facto de essa Instrução exigir um Teste de Início de Turno, no qual o operador deve verificar a existência de protecção (facto AR) e ainda o facto de a protecção existir e estar habitualmente colocada na máquina em causa (factos AI e AZ); X. Não resultou provado ― porque nem sequer alegado, apesar de tal competir à Seguradora, ora Recorrida ― quem é que, no momento do acidente, retirou a protecção, quando o fez e em que circunstância ou com que motivação; XI. Não foi imputada ao Empregador qualquer conduta ― por acção ou omissão ― que possa qualificar-se como provocadora do acidente ou como violadora das regras legais de segurança; XII. Da mesma forma, também não resultam provados factos que permitam imputar responsabilidade ao Empregador, ainda que a título de negligência; XIII. Bem pelo contrário, resulta provado o rigor e exigência do Empregador em matéria de segurança, bem como a sua imediata reacção face à identificação de riscos (facto AC); XIV. Mais ainda, resulta provado à exaustão que o Empregador ― nomeadamente, entre outros, pelos factos acima referidos nas Conclusões VI, VIII e IX ― fez, da sua parte, tudo aquilo que lhe era exigível para que o sinistrado exercesse a sua actividade em condições de segurança; XV. O dever de cuidado e diligência do Empregador não pode ser interpretado no sentido de gerar para este um dever de fiscalização permanente e contínuo ― “24 sobre 24 horas” ― de todos os seus equipamentos e de todas as acções realizadas por todos os seus trabalhadores em todos os momentos e ocasiões. Tal dever não consta da lei, seria descabido e impraticável; XVI. Em matéria respeitante a responsabilidade emergente de acidentes de trabalho, é aceite que, na generalidade dos casos, se está perante situações de responsabilidade objectiva, isto é, independente de culpa por parte do Empregador; XVII. Porém, nos casos específicos previstos no art. 18.º, n.º 1, da LAT, já se está perante casos de responsabilidade subjectiva, com os respectivos requisitos, exigindo-se a prova da culpa; XVIII. A culpa, nos casos a que se refere o art. 18.º, n.º 1, da LAT, não se presume; XIX. Por tudo o acima dito nestas Conclusões, torna-se inviável o estabelecimento de um nexo causal entre o acidente de trabalho dos presentes autos e qualquer conduta que a Entidade Empregadora haja empreendido ou omitido; XX. O douto acórdão recorrido faz uma má avaliação dos factos dados como provados nos autos, impõe ao Empregador deveres de vigilância e cuidado que manifestamente não constam de qualquer norma em vigor à data do acidente, além de que viola, entre outras disposições que V.Exas suprirão, o disposto no art. 18.º, n.º 1, da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, uma vez que, na prática, interpreta esta norma no sentido de estipular uma verdadeira presunção de culpa do Empregador pela verificação de acidentes de trabalho.» A ré seguradora contra-alegou, defendendo a confirmação do julgado.

    Neste Supremo Tribunal, o Ex.

    mo Procurador-Geral-Adjunto pronunciou-se no sentido de que o recurso de revista devia proceder, porque «da facticidade apurada não se extrai qualquer vinculação causal entre a violação da regra de segurança consistente no facto de, aquando do acidente, o equipamento industrial em causa se encontrar sem a respectiva protecção, que possa ser imputada à Ré/empregadora e o acidente», parecer que, notificado às partes, não suscitou qualquer resposta.

  2. No caso vertente, a única questão posta reconduz-se a saber se o acidente de trabalho resultou ou não da falta de observância das regras sobre segurança no trabalho por parte da entidade empregadora.

    Corridos os «vistos», cumpre decidir.

    II 1.

    O tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto: A) O Autor AA foi admitido ao serviço da Ré empregadora, BB – …, Lda.; B) Que se dedica à actividade...

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