Acórdão nº 261/2000.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Abril de 2012

Magistrado ResponsávelSEBASTIÃO PÓVOAS
Data da Resolução17 de Abril de 2012
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça A “Caixa de Crédito Agrícola Mútuo da ...” intentou acção, com processo ordinário, contra AA, sua mulher BB, “A...C... – Imobiliária, Limitada”, “R... – Contabilidade e Assistência Limitada” e CC com sua mulher DD.

Pediu que fossem: - Declarados nulos, por simulação absoluta os contratos de compra e venda formalizados pelas escrituras públicas celebradas entre os 1.ºs Réus e a 2.ª Ré, nos dias 11 de Maio de 1998 e 8 de Junho de 1998; - Declaradas ineficazes as decisões que atribuíram ou vierem a atribuir aos 3.º e 4.º Réus os direitos de preferência que invocam nas acções que acima se identificaram; - Ordenados os cancelamentos dos registos de aquisição que, com base naquelas escrituras tivessem sido ou viessem a ser efectuados pela 2.ª Ré, bem como todos aqueles que, eventualmente, venham a ser feitos pelos 3.º e 4.º Réus.

Subsidiariamente, e para a hipótese de não ser julgado procedente o pedido formulado, devem então: - Serem declarados ineficazes em relação à Autora os negócios celebrados entre os 1.ºs Réus e a 2.ª ré e que as escrituras de 11 de Maio de 1998 e de 8 de Junho de 1998 formalizaram; - Serem consideradas ineficazes em relação à Autora as transmissões de bens reconhecidas ou a reconhecer por via judicial em favor da 3.ª Ré e dos 4.ºs Réus; - Ser reconhecido à Autora o direito de executar os bens transmitidos no património da 2.ª e 3.ª Rés e dos 4.ºs Réus, tudo de harmonia com o preceituado no artigo 616.º do Código Civil.

Alegou em síntese que, no exercício da sua actividade, concedeu um financiamento ao 1.º Réu, no montante de 116.450.150$00, do que foi emitida uma livrança nesse valor, com vencimento em 31 de Janeiro de 1994, avalizada pela 1.ª Ré; e, ainda, ser portadora de uma outra livrança no valor de 120.000.000$00, com vencimento em 5 de Julho de 1994, subscrita pela P... – Comércio de Plásticos Limitada, da qual eram sócios e gerentes o 1.º Réu e EE, livrança essa avalizada pelos 1.ºs Réus.

Que tais livranças não foram pagas pelo que executou os subscritores e avalistas.

Porém, aquando da penhora, não foram encontrados bens livres e desembaraçados suficientes para satisfação do seu crédito.

Por isso propôs a presente acção, com o seguinte núcleo: Efectivamente, por escrituras de 11 de Maio de 1998 e 8 de Junho de 1998, os 1°s RR venderam à 2.ª R. os bens que integravam o seu património; escrituras em que todos emitiram, intencionalmente, declarações de vontade divergentes das respectivas vontades reais, uma vez que nem os 1.ºs Réus tinham intenção de vender, nem a 2.ª R. tinha a intenção de comprar, continuando os 1°s RR a actuar como donos dos bens. Após tais escrituras, a R. R... instaurou acção de preferência (contra os 1°s RR e a 2.ª ré) que correu termos no 2° Juízo do Tribunal de Leiria com o n.º 17/99 pedindo lhe fosse reconhecido o direito de preferir na venda da fracção autónoma designada pela letra “D”, vendida pelos 1°s RR à 2 R. em 11 de Maio de 1998, invocando ser arrendatária da mesma desde 27.11.95; Acção que não foi contestada, tendo vindo a ser proferida decisão (em 26/04/99), transitada em julgado, reconhecendo à R. R... o direito a haver para si a aludida fracção. Do mesmo modo, após tais escrituras, os RR. CC e DD, com fundamento num contrato de arrendamento rural, também instauraram acção de preferência, que correu termos sob o n.º 521/99 no 1.º Juízo Cível de Leiria, pedindo que lhes fosse reconhecido o direito de preferir na venda (efectuada pela escritura de 11 de Maio de 1998) do prédio misto denominado Quinta da Cortiça. Acção que também não foi contestada, tendo, após recurso para a Relação, sido proferida decisão (em 2 de Maio de 2000), transitada em julgado, reconhecendo os Réus CC e DD o direito de haverem para si aquele prédio misto.

As acções de preferência também foram simuladas.

Conclui afirmando que a intenção subjacente às escrituras e às acções referidas foi impedir à Autora a realização coerciva do seu crédito uma vez que todos dele tinham conhecimento.

À excepção dos 1.ºs Réus, todos contestaram.

Entretanto a Autora provocou a intervenção principal de “T... – investimentos Imobiliários Turísticos e Agrícolas, Limitada” e de FF e GG.

Fundou o pedido no facto de a 2.ª Ré ter vendido (escrituras outorgadas em 10 de Dezembro de 1999 e de 8 de Fevereiro de 2000) à chamada “T...” parte dos imóveis adquiridos aos 1.ºs Réus e ter sido vendido pela Ré “R... aos chamados FF e GG (escritura de 5 de Abril de 2000) a fracção identificada por letra D, sendo que os compradores nada quiseram comprar tendo, apenas, o propósito de dificultarem a satisfação do crédito da Autora.

Na 1.ª Instância foi proferida sentença, além do mais, com o seguinte segmento decisório: “I – Declaro nulos por simulação absoluta os contratos de compra e venda formalizados pelas escrituras públicas celebrados entre os réus AA e BB e a Ré A...C... – Imobiliários Lda. nos dias 11.05.98 e 08.06.98 e em consequência, todas as aquisições e transmissões subsequentemente efectuadas; II – Ordeno o cancelamento dos registos de aquisição feitos com base nas escrituras referidas em I, bem como todos os registos de aquisição efectuados com base nas transmissões posteriores (…)”.

Os Réus, e também a “T...” apelaram para a Relação de Coimbra que julgou “parcialmente procedente o recurso; confirmando-se a sentença recorrida, com excepção do que diz respeito às transmissões dos imóveis referidos em 15 e 18 dos factos assentes, a favor, respectivamente, da Ré “R... Limitada” e de CC e esposa, DD, operados pelas sentenças de preferência já passadas em julgado, e do que respeita às transmissões dos mesmos bens, como é o caso da transmissão referida no ponto 60 dos factos provados) transmissões estas que não se declaram nulas e de que não se ordena o cancelamento dos respectivos registos.” A Autora não se conformou e veio pedir revista, limitando o objecto do recurso ao segmento acima transcrito.

E assim concluiu a sua alegação: “l) Por força da definitivamente julgada simulação absoluta verificada nas transmissões dos imóveis referidos em 15 e 18 dos factos provados, A., ora recorrente, viu nascer na sua esfera jurídica, como, aliás, na de quaisquer outros credores dos 1°s RR., simuladores transmitentes, por força do preceituado nos art°s 240°, n.º 2, 286° e 605°, do CC, o direito a invocar tal nulidade e a vê-la produzir todos os efeitos constantes do art° 289° do CC.

2) Por outro lado, estando assente (cfr. ponto 27 dos factos provados) que todos os bens imóveis que foram objecto das vendas tituladas pela escritura de 11/05/1998 (entre outros, os imóveis mencionados sob os pontos 15 e 18 dos factos provados, objecto das acções de preferência referenciadas sob os pontos 39 a 45 dos factos provados) estavam, nessa data, penhorados no âmbito do processo executivo n.º 146/94, instaurado pela A. contra os 1°s RR. e outro (cfr. ponto 3 dos factos provados) , na esfera jurídica da A., ora recorrente, a par dos direitos de crédito sobre os 1°s RR., ora recorridos, passaram igualmente a integrar-se os direitos de garantia específica sobre o património dos devedores, criados pela penhora.

3) Por último, da esfera jurídica da A., ora recorrente, faz também parte o direito, ou expectativa juridicamente tutelada, a que só os terceiros de boa fé possam estar resguardados dos efeitos da nulidade consagrados no art° 289°/CC, nos termos do art° 243°/CC, para o caso de simulação invocada pelos simuladores, e nos do art° 291°/ CC, para os demais casos.

4) Assim, a aceitar-se a oponibilidade à A., ora recorrente, do decidido nas sentenças proferidas nas acções de preferência mencionadas sob os pontos 39 a 45 dos factos provados, estar-se-ia a esvaziar de conteúdo os direitos surgidos na esfera jurídica da A., ora recorrente, identificados nas precedentes conclusões, e a impedir o seu legítimo exercício por parte da A., ora recorrente, o que, inevitavelmente, configura inaceitável ingerência na sua esfera jurídica e lhe causa evidente prejuízo jurídico.

5) Pelo que, contrariamente ao sustentado no acórdão recorrido, a situação ou esfera jurídica da A., ora recorrente, não é apenas constituída pelos direitos de crédito sobre os 1°s Réus mas também pelos direitos identificados nas precedentes conclusões.

6) Não sendo a A., ora recorrente, terceiro juridicamente indiferente face aos RR/preferentes R... Lda. e CC e mulher, DD, mas sim terceiro juridicamente interessado ou prejudicado.

7) Mas ainda que assim não fosse, o que não se admite e só por hipótese de raciocínio se coloca, sempre o acórdão recorrido ajuizou mal ao não estender aos RR/preferentes os efeitos da nulidade, declarada e admitida por todos os recorridos, dos contratos de compra e venda celebrados entre os 1°s Réus e a 2.ª R.

8) Na verdade, face ao efeito retroactivo da nulidade do negócio de compra e venda dos imóveis identificados sob os pontos 15 e 18 do factos provados, definitivamente decidida por implícita aceitação dos recorridos que dela não apelaram, resultante do art° 289°/CC, os direitos adquiridos sobre tais imóveis pelos RR/preferentes, R... Lda. e CC e mulher, DD, por via das sentenças, transitadas, proferidas nas acções de preferência instauradas antes da presente acção, só poderiam ser opostos à A., ora recorrente, como credora terceira arguente da nulidade, caso estivessem reunidos os requisitos exigidos no art°. 291.º do CC.

9) Porém, não só o prazo de protecção de três anos constante desse art° 29 1°, n.º 2, não se mostrou transcorrido sem que a presente acção tivesse sido proposta e registada, como, sobretudo, por força do que demonstrado ficou no ponto 46 dos factos provados, os ditos RR/preferentes não são terceiros de boa fé posto que bem conheciam a simulação com que os 1°s RR e a 2.ª Ré celebraram o negócio de compra e venda dos imóveis mencionados sob os pontos 15 e 18 dos mesmos factos.

10) Deste modo, independentemente do caso julgado decorrente de tais sentenças de preferência...

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