Acórdão nº 08P1018 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Março de 2008

Magistrado ResponsávelPIRES DA GRAÇA
Data da Resolução18 de Março de 2008
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de JustiçaNos autos de processo comum (tribunal colectivo) com o nº 351/99.SCJBOBR do Tribunal Judicial de Oliveira do Bairro, o arguido JL, com os demais sinais dos autos, tendo sido detido pelas 16h30 do dia 10 de Março de 2008 no Tribunal Judicial de Oliveira do Bairro, vem apresentar petição de providência de habeas corpus, nos termos do disposto no artº 222º do Código de Processo Penal de 2007 e artº 31º da C.R.P.com a fundamentação, que se sintetiza de que: Por acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 09 de Março de 2005, o arguido ora requerente foi condenado na pena de 5 anos e 6 meses de prisão pela prática dos crimes de associação criminosa , burla e falsificação.

O arguido nunca foi preso à ordem dos presentes autos.

Com a entrada em vigor do novo Código Penal que estabeleceu um regime mais favorável ao Arguido relativamente ao crime de associação criminosa, o Arguido requereu a reabertura da audiência nos termos do disposto no Artº 371º-A do C.Penal.

Por decisão de 04-02-2008 foi deferida a requerida reabertura da audiência, tendo sido designado o dia 06 do corrente mês de Março, para o início da audiência, tendo sido notificado para comparecer e comparecido na mesma e sido realizado o julgamento Na referida audiência foi designado o dia 10 de Março pelas 15h 30 para a leitura do acórdão, tendo o Arguido sido notificado para comparecer e comparecido à leitura do acórdão que teve lugar cerca das 16 horas e 15 minutos.

O acórdão proferido na sequência da reabertura da audiência reduziu a pena aplicada ao Arguido pela prática do crime de associação criminosa em 6 meses, e em cúmulo, condenou o arguido na pena única de 5 anos e 4 meses de prisão, - menos 2 meses que a condenação do anterior acórdão.

Após a leitura do acórdão, o M.Juiz informou o Arguido do seu direito ao recurso do acórdão acabado de ler.

Contudo, ao sair da sala de audiência e após lhe ter sido lido o referido acórdão condenatório, o Arguido foi interceptado por três agentes da GNR que, exibindo-lhe o mandado de detenção de que se junta cópia como documento nº 2, emitido nesse dia, o qual ordenava a detenção do Arguido para cumprimento de prisão de 5 anos e 6 meses que o Arguido acabava de ver ouvir -, momentos antes, ser substituída por outra que a reduziu para 5 anos e 4 meses de prisão.

Do referido acórdão condenatório, o Arguido poderia recorrer nos termos das disposições legais aplicáveis e no prazo concedido para o efeito.

A decisão condenatória do Arguido até ao momento do seu trânsito, não podia ser executada face ao direito ao recurso do Arguido e ao efeito suspensivo do mesmo.

O mandatário do Arguido que com ele se encontrava, explicou aos Agentes encarregados de cumprir o mandado de detenção, que tal pena acabava de ser revogada e substituída por outra que ainda não havia transitado.

Os agentes perante tal informação do mandatário do Arguido obtiveram informação no Tribunal de que mesmo a ser assim, tinham que cumprir o mandado que tinham para executar.

O mandado com base no qual o Arguido foi detido terá sido elaborado na manhã do dia 10 de Março dia da leitura do acórdão na sequência da reabertura da audiência supra referida.

A GNR havia sido informada, ao que parece telefonicamente, durante a manhã do dia 10 ou ao princípio da tarde de que tinham que executar o mandado naquela tarde.

Com efeito o mandado refere: O arguido tem leitura de acórdão neste tribunal designada para hoje pelas 15h 30.

Acontece porém que, desde a reabertura do julgamento que teve lugar no dia 06 de Março até ao dia designado para a leitura do acórdão, o Arguido esteve em liberdade, nada tendo sido ordenado quanto às medidas de coacção a aplicar neste período.

O Arguido nas diferentes fases dos autos supra identificados, nomeadamente durante o inquérito, a instrução, o julgamento e os recursos, manteve-se sempre em liberdade mediante a prestação de TIR.

Com a reabertura da audiência o Arguido retomou, salvo melhor e mais avalizada opinião, a situação processual que manteve durante as diferentes fases processuais.

Com a prolação do acórdão de 10 de Março, lido ao Arguido na situação de liberdade pelas 16 horas e 15 minutos, o acórdão condenatório do Tribunal da Relação de Coimbra de 09-03-2005, foi revogado, Não tendo existência jurídica.

Por outro lado, o acórdão de 10 de Março, ainda não transitou em julgado, tendo-se iniciado a contagem do prazo para a interposição do recurso no dia 11 de Março de 2008.

O Arguido vai interpor recurso do referido acórdão.

Após a leitura do acórdão de 10 de Março, o acórdão de 09/03/2005 encontrava-se revogado, sendo inexistente, razão pela qual não podia fundamentar qualquer mandado de detenção do Arguido, para cumprimento daquela pena, a qual se encontrava no momento da detenção do JL revogada e substituída por outra ainda não transitada.

O mandado de detenção do Arguido no momento da sua execução 16 horas e 30 minutos do dia 10 de Março de 2008 estava ferido de nulidade.

O Arguido não pode obviamente, estar condenado pela prática dos mesmos ilícitos pelo acórdão de 10 de Março de 2008 proferido pelas 16 horas e 15 minutos, na pena de 5 anos e 4 meses de prisão.

E, simultaneamente estar condenado a iniciar o cumprimento da pena aplicada pelo anterior Acórdão de 09 de Março de 2005 na pena de 5 anos e 6 meses de prisão, já revogada e substituída por aquele outro, ainda não transitado.

A prisão do Arguido, efectuada para cumprimento da pena de 5 anos e 6 meses de prisão que 15 minutos antes havia sido revogada e substituída por outra que na sequência da reabertura da audiência condenou o Arguido na pena de 5 anos e 4 meses, é ilegal nos termos do disposto na alínea b) do nº 2 do Artº 222º do Código de Processo Penal, visto ser motivada por facto pela qual a lei a não permite, não sendo admissível a condenação de qualquer pessoa com fundamento numa pena revogada e inexistente.

A inexistência jurídica do acórdão de 09 de Março de 2005, face à sua revogação e substituição pelo acórdão de 10 de Março de 2008, determina a nulidade do mandado de detenção do arguido.

Não podendo o mesmo iniciar o cumprimento duma pena inexistente.

O Arguido encontra-se detido por detenção ilegal e inadmissível, sendo a presente providência admissível nos termos do disposto no nº 2 do Artº 31º da C.R.P. e Artº 222º do Código de Processo Penal.

Tendo o acórdão de 08 de Março de 2005 sido revogado pelo acórdão de 10 de Março de 2008, o Arguido tem direito ao recurso de tal acórdão.

Presumindo-se a sua inocência até ao trânsito de tal condenação nos termos do disposto no nº 2 do Artº 32º da C.R.P.

A interpretação da Meritíssima Juiz do Tribunal Judicial de Oliveira do Bairro, feita no sentido de que após a leitura do acórdão de 10 de Março de 2008 se mantinha em vigor o anterior acórdão de 09 de Março de 2005, por aquele revogado, é materialmente inconstitucional por violação do princípio da legalidade e do princípio da presunção de inocência do Arguido e do seu direito ao recurso previsto nos nºs 1 e 2 do Artº 32º da C.R.P.

O Arguido detido ilegalmente para cumprimento duma pena inexistente, encontra-se em regime de prisão ilegal desde as 16 horas e 30 minutos do dia 10 de Março de 2008.

Tendo direito nos termos legais e constitucionais supra referidos a lhe seja deferida a presente providência de habeas corpus.

Termos em que (...) cumprido o disposto nos nºs 2 e 3 do citado Artº 223º do C.P.P., deverá ser dado cumprimento ao disposto na al. b) do nº 1 da citada disposição legal, restituindo-se o Arguido à liberdade na sequência do deferimento da Providência...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
16 temas prácticos
16 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT