Acórdão nº 08455/12 de Tribunal Central Administrativo Sul, 12 de Abril de 2012

Magistrado ResponsávelANA CELESTE CARVALHO
Data da Resolução12 de Abril de 2012
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul: I.

RELATÓRIO O STAL – Sindicato Nacional dos Trabalhadores da Administração Local, devidamente identificado nos autos, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Castelo Branco, datada de 04/11/2011 que, no âmbito da ação administrativa especial instaurada contra os Serviços Municipalizados da Guarda, determinou o desentranhamento da petição inicial e a sua devolução ao autor, por julgar improcedente a subsunção à isenção prevista na alínea g), do nº 1 do artº 4º do Regulamento das Custas Processuais.

Formula o recorrente nas respetivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem (cfr. fls. 132 e segs. do processo físico): “A) A Douta sentença recorrida assenta em erro de interpretação e aplicação dos arts. 150°-A e 474° al. f) ambos do CPC, violando-os; B) Com efeito, a PI que instaurou a presente ação não foi recusada antes foi distribuída tendo seguido os seus ulteriores termos; C) Só depois dos articulados, a questão da falta da junção à PI do documento comprovativo da autoliquidação da taxa de justiça foi suscitada, portanto em momento em que já não era possível rejeitar a petição; D) Sendo assim, o que eventualmente poderia existir, que não se admite, seria uma situação processual irregular que cumpriria sanar em respeito do disposto no art. 265.° do CPC, onde se determina ao juiz o dever de providenciar pelo andamento regular do processo e pela sanação de pressupostos processuais; E) Por isso, o Tribunal deveria ter marcado prazo ao A para comprovar o pagamento da taxa de justiça, sob pena de se decidir em conformidade com essa falta de pagamento, o que não foi feito, pois o A foi apenas advertido da possibilidade do mesmo Tribunal ter entendimento diverso a respeito da isenção de custas: “Perspetiva que pode não ser acolhida”.

  1. Por isso, a decisão de desentranhamento da PI dos autos foi prematura; G) À presente ação é aplicável o Regulamento das Custas Processuais aprovado pelo DL n° 34/2008 de 26/02 (cfr artigo 26° n°1 na redação dada pelo artigo 156° n°1 da Lei n°64-A/2008 de 31/12, que aprovou o Orçamento de Estado para 2009) que estabelece que se encontram isentas de custas as pessoas coletivas privadas sem fins lucrativos, quando atuem exclusivamente no âmbito das suas especiais atribuições ou para defender os interesses que lhe estão especialmente conferidos pelo respetivo estatuto ou nos termos de legislação que lhes seja aplicável [artigo 4° n°1 alínea f)].

  2. O sindicato A é uma associação sindical, privada, sem fins lucrativos, constituída pelos trabalhadores nele filiados que, independentemente do seu vínculo, tipo de regime ou de contrato, exerçam atividade profissional na Administração Pública, Local ou Regional, nas empresas públicas ou concessionárias de serviços públicos ou em quaisquer entes públicos ou privados que se encontrem investidos em poderes de autoridade na prossecução de fins públicos ou prossigam atividades de utilidade pública local, regional ou inter-regional; I) O Tribunal Constitucional já entendeu que “as associações sindicais são qualificáveis como associações de natureza privada que assumem uma função constitucional relevante” – cfr. Ac. T.C. n° 250/2008, in Ac. Dout. n° 563, p. 2129, tendo-se neste sentido pronunciado os Acs. do TCA Sul de 23.03.2011 e do TCA Norte de 26.11.2009, respetivamente, nos Rec. n° 7307/11 e 00005/09.68BC PRT; J) Salvo o devido respeito, a distinção feita na douta sentença recorrida entre a atuação das associações sindicais “para defesa dos direitos e interesses coletivos” e “para defesa coletiva dos direitos e interesses individuais legalmente protegidos pelos trabalhadores que representam”, como determinante para a aferição da isenção ou não do pagamento de custas e taxas de justiça, carece de fundamento legal; K) Enquadrando-se o sindicato A, manifestamente, na previsão da referenciada al. f) do n° 1 do art. 4º do Regulamento das Custas Processuais, não faz qualquer sentido nela distinguir as situações em que as associações sindicais atuam na defesa de direitos e/ou interesses coletivos das situações em que atuam na defesa de direitos e/ou interesses individuais dos seus associados, sob pena do intérprete distinguir o que a lei não distingue; L) Neste preciso sentido, confira-se o doutamente decidido por recente Acórdão deste TCA Sul de 30/06/2011 proferido no proc. n° 7736/11, in wwwdgsi.pt: no seguinte sentido: “1 - As associações sindicais são qualificáveis como associações de natureza privada que assumem uma função constitucional relevante; II - A letra da alínea f) do n° 1 do artigo 4° do Regulamento das Custas Processuais no admite a tese da exclusão das associações sindicais da isenção ali consagrada, quando atuem na defesa dos direitos e interesses individuais dos trabalhadores que representem; M) Por outro lado, também a este respeito, como se decidiu no douto acórdão do TCA Norte, proferido no processo n° 357/10.5BEVIS, em caso de vencimento de causa os Sindicatos não têm que pagar custas ou quaisquer encargos, nem tinha que, com a pi, demonstrar, porque indevida, a taxa de justiça inicial, sendo assim inócua a pretendida subsunção da situação à al. h) do n° 1 do art. 4° do RCP; N) A douta sentença recorrida efetuou uma errada interpretação do art. 310° n° 3 da Lei n° 59/08 de 11/9 e do art. 4º n° 1 al. f) do Regulamento das Custas Processuais, que violou, devendo consequentemente ser revogada; O) A entender-se que o art. 310° n° 3 da L n° 59/08 de 12/09 deve interpretar-se no sentido de não isentar as associações sindicais do pagamento de custas quando atuam na defesa coletiva de interesses individuais, como é o caso, o mesmo será inconstitucional por violação do art. 55 n° 1 e 56° n° 1 da Constituição da República Portuguesa; P) A vingar tal interpretação, defendida na douta sentença recorrida, e exigindo-se às associações sindicais em casos como o dos presentes autos o pagamento de taxas de justiça e custas, o que implicaria uma restrição intolerável ao direito de defesa dos direitos e interesses dos trabalhadores que elas representam, o referido art. 310° n° 3 seria inconstitucional por violação dos referidos preceitos constitucionais, inconstitucionalidade essa que desde já se invoca para todos os devidos e legais efeitos.”.

Termina pedindo o provimento do recurso e a revogação da sentença.

* Os Serviços Municipalizados de Água e Saneamento da Câmara Municipal da Guarda apresentaram contra-alegações (cfr. fls. 168 e segs. do processo físico), assim tendo concluído: “- Em qualquer fase do processo, o Juiz deve, oficiosamente, providenciar pela regular tramitação processual, expurgando os processos de vícios e irregularidades que possam obstar ao conhecimento do mérito da causa.

- A PI não foi rejeitada como se diz, foi desentranhada por não se ter dado cumprimento ao despacho do M° Juiz, onde se deu a possibilidade do A. vir aos autos juntar “comprovativo do pagamento ou comprovar outra isenção”.

- Não pode ser acolhido o argumento da “prematuridade do desentranhamento da PI’ com a justificação de que o Tribunal “deveria ter marcado prazo ao A. para comprovar o pagamento da taxa de justiça”.

- A decisão de desentranhamento foi precedida da oportunidade se de juntar aos autos comprovativo de autoliquidação ou comprovação de outra isenção, em dez (10) dias uma vez que a invocada isenção “não pode ser acolhida” o que torna, deste modo, a decisão do Tribunal inatacável.

- O A. invoca a inexigibilidade do pagamento da taxa de justiça ao abrigo da isenção prevista na alínea f) do art. 4° do RCP, que de modo algum se pode aplicar ao caso concreto.

- Não obstante a revogação do art. 4° n.° 3 do DL 84/99 de 19 de março, esta norma encontra expressão no Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas (Lei n.° 59/2008) no n.° 2 do artigo 310 da Lei n.° 59/2008.

- Este artigo prevê o vigente regime de isenção de custas aplicável ao caso concreto; dispondo que as associações sindicais beneficiam de isenção do pagamento de custas para defesa dos direitos e interesses coletivos, aplicando-se no demais o regime previsto no RCP.

- Foi o próprio legislador que definiu e diferenciou o regime de isenção de custas; a isenção que decorre do RCTFP aplica-se no caso de defesa de direitos e interesses coletivos, e a isenção que pode eventualmente ocorrer na defesa de direitos e interesses individuais encontra-se estatuída na alínea h) do n.° 1 do art. 4° do RCP, caso se verifique e se comprove a situação nele prevista.

- Esta isenção não foi invocada, não se comprovou, nem sequer foi suscitada apesar do convite feito pelo tribunal.

- A defesa em juízo de interesses puramente individuais, pelas Associações Sindicais, fora do âmbito da al. h) do n.° 1 do art. 4°, não justifica uma isenção de custas, sob pena de violação dos Princípios Constitucionais da Igualdade e até da Liberdade Sindical, nomeadamente em relação a outros trabalhadores com problemas idênticos e que não sendo sócios de um sindicato teriam que, em igual situação pagar custas (Ac.TCA –Sul de 09/21/2004).

- O espírito da norma - e da isenção - é facilitar e estimular o exercício de funções públicas em prol do bem comum e que aproveitem à comunidade em geral, tutelar interesses coletivos, comuns e indivisíveis. No caso concreto, o círculo de interesses está reduzido a uma só pessoa - que tem todo direito á tutela jurisdicional efetiva, ao acesso ao direito e aos tribunais, mas nas mesmas circunstâncias e condições que terá qualquer outro trabalhador não sindicalizado.”.

Conclui pedindo que se mantenha a sentença recorrida e seja julgado improcedente o recurso.

* O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto no art. 146.º do CPTA, emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso e que a decisão impugnada deve ser confirmada (cfr. fls...

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